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Jogo de linguagem: uma perspectiva ecológico-cognitva da interação

1.1 A ABORDAGEM ECOLÓGICA-COGNITIVA DA LINGUAGEM: UMA PROPOSTA

1.1.3 Jogo de linguagem: uma perspectiva ecológico-cognitva da interação

Para abordar a concepção dos Jogos de linguagem, fazemos uso de ideias difundidas por teóricos como: Wittgenstein (2012), Steels (2011) e Duque (2017). O filósofo da linguagem Wittgenstein (2012, p. 27) considera “ [...] que falar uma língua é parte de uma atividade ou de uma forma de vida”, assim, admite que as interações sociais são formas dos indivíduos “[...] compartilharem percepções, controlarem e selecionarem as atuações uns dos outros no ambiente (DUQUE, 2016, p. 163)”. Segundo Wittgeinstein (2012), os jogos de linguagem iniciam na infância, com os tipos mais simples de jogos, em que as crianças nomeiam, adivinham, entre outras

atividades, e aprendem com alguém mais experiente a “técnica” para dominar as faculdades comunicativas. Dessa forma, o autor inaugura a teoria dos jogos de linguagem.

Steels (2011, p. 25), por sua vez, em sua teoria da evolução cultural da linguagem, defende uma abordagem da comunicação em que a sua modelagem se baseia em termos de jogos de linguagem e destaca o papel da comunicação situada entre sujeitos corporificados como relevante na “[...] formação, seleção e auto- organização dos sistemas de linguagem”. O autor ressalta também que esses jogos não apresentam elementos em comum, pois “[...] são baseados em uma realização específica, que relaciona os participantes a um mundo, o qual possui um ambiente e configurações ecológicas específicas”. Desse modo, compartilham apenas as bases ecológicas responsáveis pela emergência da linguagem, o que corresponde às condições iniciais de um Sistema Complexo Adaptativo (SCA).

Considerando as características dos jogos de linguagem, percebemos que tais interações funcionam também como modeladores e remodeladores de frames – e, consequentemente, de frames interacionais – que exigem, no mínimo, dois sujeitos, um contexto e uma intenção comunicativa (STEELS, 2011), incluindo aspectos pragmáticos nos processos comunicativos iniciais, aspecto que é destacado nesta pesquisa. Ao jogarem um jogo, então, tais participantes estabelecem trocas mediante uma situação sobre a qual possuem conhecimentos prévios, armazenados nos frames linguísticos (DUQUE, 2017) relacionados a essa interação, isto é, “as regras” para jogar tal jogo. Esse processo dinâmico possibilita a comunicação entre as partes e uma modelagem de seus frames, por meio do reframing (FILLMORE, 1982), mesmo que momentânea, para atingir seu objetivo comunicativo.

Tais aspectos dos Jogos de linguagem parecem se equivaler ao dos esquetes analisados neste estudo, uma vez que apresentam interações com dois ou mais em um contexto, ou seja, em um determinado espaço e ambiente, os quais possuem um intuito comunicativo. Para interagir, esses sujeitos utilizam seus conhecimentos de vivências anteriores que possuam relação com a situação atual em que estão envolvidos, isto é, as regras dessa interação. No caso do esquete Milagre, por exemplo, Jesus, Zaqueu e mais um homem interagem em um espaço que se assemelha a um salão de festa, em um tempo não atual, pois o ambiente possui características que remetem ao tempo relatado em cenas bíblicas, cujo intuito é comemorar o aniversário do filho de Zaqueu.

Ao estabelecer tais equivalências, parece que consigo comprovar a hipótese de que os esquetes são Jogos de linguagem. No intuito obter mais informações sobre essa questão, aprofundarei a questão sobre os jogos de linguagem apresentando os tipos de jogos de linguagem na seção a seguir.

1.1.3.1 Tipos de jogos de linguagem

Para esta pesquisa, admito que todas as interações entre no mínimo duas pessoas é um jogo de linguagem, conforme a Abordagem Ecológica-cognitiva da Linguagem (DUQUE, 2016, 2017, 2018). Tendo esclarecido esse ponto, sigo explicando que esses jogos podem ser classificados de acordo com seu propósito comunicativo. A esse respeito, Wittgenstein (2012, p.27) ressalta que a expressão “jogo de linguagem” se refere ao fato de que o uso de uma língua “é parte de uma atividade ou de uma forma de vida”. Assim, são inúmeros os jogos, como jogo de ordenar e agir segundo ordem, descrever um objeto pela aparência e suas medidas, relatar um acontecimento, entre outros; e novos jogos podem surgir, da mesma forma que outros podem envelhecer e ser esquecidos.

Steels (2011), em sua definição de jogo de linguagem, corrobora a ideia de Wittgenstein (2012) sobre a interação uma atividade cooperativa, de diálogo situado, com falantes reais, em um contexto e com um propósito comunicativo. No entanto, avança, ao deixar mais clara o seu funcionamento, destacando a importância da corporalidade (SHAPIRO, 2011) na construção dos sistemas linguísticos, ou seja, o seu caráter ecológico. Além disso, sua perspectiva de jogos de linguagem estabelece que esses eles se comportam como um Sistema Complexo Adaptativo (SCA). Dessa forma, argumenta que eles não são iguais, mas compartilham uma base ecológica, a qual está relacionada ao compartilhamento de dados iniciais compartilhados pelos humanos. Assim, vai de encontro à hipótese norteadora desta pesquisa de que a dinâmica dos jogos de linguagem se comporta como um Sistema Adaptativo Complexo.

O refinamento da proposta dos jogos de linguagem se dá por meio das investigações de Duque (no prelo), que declara que esses jogos são eventos de interação social em que os participantes têm sua atenção sobre algo presente no ambiente, seja pessoa, seja objeto. Enfatiza, ainda, que esses jogos de linguagem são geralmente complexos, uma vez que há a coexistência de jogos mais simples, estabelecendo o autor uma relação com o que se dá com os frames, em que essas

estruturas neurais mais simples constituem outras mais complexas. Isso acontece por meio da combinação dos seus elementos constituintes, o que é possível por um mecanismo denominado constituência (DUQUE, 2017). Assim, os esquetes analisados nesta pesquisa seriam jogos de linguagem complexos, por apresentarem eventos sociais em que os participantes têm sua atenção sobre elementos do ambiente em que as cenas se passam, cenas essas construídas por outros jogos de linguagem mais simples entre os personagens, conforme o exemplo mostrado no quadro a seguir sobre o esquete Palavra.

Quadro 4 – Jogo de linguagem complexo esquete Palavra – primeira cena

Fonte: autoria própria.

Numa perspectiva ecológica do Jogo de linguagem, Steels (2011) e Duque (no prelo) apontam que é necessário que falante e ouvinte cumpram algumas etapas, para que um jogo de linguagem complexo seja bem-sucedido, conforme o quadro a seguir mostra.

✓ Jogo de identificação e construção de protótipo - homem identifica o homem à sua porta como Jesus

✓ Jogo de ação, postura e movimento - homem cumprimentando Jesus

✓ Jogo de ação, postura e movimento – Jesus cumprimentando o homem

Quadro 5 – Etapas falante e ouvinte na execução de um jogo de linguagem

9 As esquematizações são processos cognitivos extremamente básicos, podendo ser considerados

frames muito básicos, relacionados às ações realizadas pelos nossos corpos no ambiente, tais como, por exemplo, àquelas relacionadas à nossa movimentação, conforme Fillmore (1982) e Duque (2015).

10 Língua Brasileira de Sinais.

ETAPA FALANTE

ATERRAMENTO

Há um conjunto de processos que conectam esquematizações9 e

frames a estados e ações do mundo que o falante pretende comunicar. Segundo Steels (2011), entre esses processos destacam-se: a segmentação e a extração de elementos do ambiente; o reconhecimento de um objeto ou evento, bem como a sua categorização; a identificação perceptual de um objeto ou evento; e a manipulação de objeto(s).

CONCEPTUALIZAÇÃO

Um falante, por meio de processos cognitivos, seleciona aquilo que precisa ser dito e, a partir disso, conceptualiza o mundo, concretizando-o em expressões linguísticas para alcançar o seu objetivo comunicativo. Por exemplo, quando O homem do esquete Jesus te ama diz “ eu vou à missa todo domingo”, ele conceptualiza MISSA da perspectiva de uma trajetória, cujo trajetor é ele, que se descola de um ponto de saída (não identificado, nesse caso) a um ponto de chegada (missa). Obviamente, além dessa esquematização, a falante ativa e aciona conhecimentos prévios (frames) sobre MISSA: IGREJA, RELIGIÃO etc.

PRODUÇÃO

Processos que tomam uma estrutura semântica e a transformam em uma série de pareamento de forma-significado, considerando as convenções linguísticas (fonológicas, morfológicas, gramaticais e lexicais) capturadas por uma rede de construções.

ARTICULAÇÃO DA FALA

Há um conjunto de processos responsáveis pela produção do enunciado por meio do controle motor do sistema articulatório necessário para a execução da fala, bem como do controle motor para a execução de gestos e expressões, no caso de LIBRAS10.

OUVINTE

RECONHECIMENTO DA FALA

O sinal da fala precisa ser processado por meio do processamento de sinais e de processos de reconhecimento de padrões. Assim, elabora um conjunto de hipóteses sobre os elementos que podem estar presentes na fala do interlocutor.

ANÁLISE O ouvinte usa esses elementos para reconstruir tão bem quanto possível o significado do enunciado transmitido pelo falante.

INTERPRETAÇÃO O ouvinte precisa confrontar o significado resultante do processo de análise com esquematizações e frames e compreender o jogo de

Fonte: adaptado de Duque (no prelo).

Partindo desses pré-requisitos para um bom funcionamento dos jogos de linguagem complexos, Duque (no prelo) propõe um esquema que relaciona os tipos de jogos de linguagem simples a cada uma dessas etapas, conforme o Quadro 2.

Quadro 6 – Jogos simples e etapas de um jogo de linguagem complexo

ETAPA JOGOS DE LINGUAGEM SIMPLES E SUAS FUNÇÕES

ATERRAMENTO

Jogos ostensivos e observacionais.

Função: preparar e alinhar as pessoas em um ato comunicativo, e rastrear os segmentos salientes do ambiente.

Jogo de identificação

Função: relacionar segmentos do ambiente com protótipos armazenados na memória.

Jogo de discriminação: detectar propriedades do ambiente; segmentar o ambiente; selecionar objetos como tópicos; identificar propriedades singulares suficientes para identificar uma cena do jogo de descrição de evento.

Jogo de seguir

Função: compor cenários; reconhecer as ações direcionadas a objetos.

ARTICULAÇÃO E RECONHECIMENTO DA

FALA

Jogo de imitação

Função: reproduzir movimentos articulatórios, gestos e expressões corporais.

11Frame interacional é um frame complexo relacionado às nossas interações socioculturais conforme

as concepções de Fillmore (1982) e Duque (2017).

12 “Roteiros constituem eventos estruturados cronologicamente” conforme Duque (2017).

linguagem, para encontrar a interpretação adequada do enunciado conforme suas expectativas e observações. Por exemplo, Jesus precisa recuperar, em sua memória, as informações sobre missa que o homem mencionou e o frame interacional11 MISSA, contendo o

roteiro 12 do jogo de linguagem em tela: “. “E aí tem que falar o cordeiro

de Deus que eu tinha que falar “Eu”, não falo, tô desatento. Aí tinha que benzer as hostiazinhas, muitas eu não benzo...vira pãozinho”.

ATERRAMENTO

O ouvinte precisa manter, por meio da percepção e ação, uma conexão entre esquematizações e frames e estados do mundo, incluindo os possíveis estados mentais do falante, como desejos, intenções e crenças.

PRODUÇÃO E ANÁLISE

Jogo de nomeação

Função: Construir um léxico. Jogo de ação, postura e movimento

Função: executar uma ação, postura ou movimento especificado linguisticamente.

Jogo de descrição de evento

Função: descrever um evento e as funções dos participantes (objetos, pessoas e locais).

INTEPRETAÇÃO Jogo de ativação e acionamento de frames Função: ativar, acionar e entrelaçar frames.

FEEDBACK

Jogo de adivinhação

Função: Fornece o feedback corretivo (para jogos da etapa de aterramento)

Fonte: baseado em Duque (no prelo).

Apesar de os jogos estarem distribuídos por fases, colocados em uma sequência, esse processo não se dá de forma linear, mas, sim, cíclica. Ou seja, a cada tentativa de conseguir um feedback positivo, objetivo de todo jogo de linguagem, a qualquer momento pode ser necessário recorrer aos jogos anteriores. Assim, durante um jogo, podemos ter que voltar várias vezes as fases anteriores para alcançar o resultado positivo. Quanto mais um jogo é jogado com a intenção de categorizar ou recategorizar, mais precisaremos voltar à fase do aterramento, ou seja, utilizar jogos de linguagens mais simples.

Duque (no prelo) aponta que de todos os jogos citados, há quatro jogos básicos aos quais recorremos frequentemente para organizarmos a nossa forma de ver o mundo, o que acontece desde a infância: jogo de discriminação; jogo de ação, postura e movimento; jogo de identificação de objetos e construção de protótipo; e jogo de descrição de evento, conforme Quadro 7.

Quadro 7 – Descrição de jogos responsáveis pela categorização Tipo de jogo de linguagem Descrição Jogo de discriminação

Desenvolve a capacidade de identificar e reconhecer propriedades de objetos (STEELS, 2006): detectar propriedades, segmentar o ambiente, selecionar item ou propriedade tópico do jogo de linguagem, identificar por meio de propriedades a cena de um jogo de evento.

Jogo de ação, postura e movimento

Desenvolve a capacidade de identificar e reconhecer ações, posturas e movimentos executados pelo corpo humano e suas partes (STEELS; SPRANGER, 2012). Implica também em discriminação.

Jogo de identificação de

objetos e construção de

protótipo

Desenvolve a capacidade humana de organizar itens em torno de um protótipo na configuração de uma categoria (VOGT, 1999).

Jogo de descrição de evento

Desenvolve a capacidade humana de categorizar eventos (VAN TRIJP, 2012). Evento: processo que relaciona um estado prévio a um posterior, em que experiências provocam mudança de estado.

Fonte: autoria própria baseada em Duque (no prelo).

É a partir desses quatro jogos de linguagem responsáveis pela categorização que analisarei o corpus desta pesquisa, com o intuito de demonstrar que por meio deles nós realizamos a construção e a reconstrução dos sentidos, mediante as rupturas dos jogos de linguagem complexos. Assim, detalharei os jogos que foram identificados nas análises do material audiovisual que lastreou esta pesquisa: esquetes do coletivo Porta dos Fundos.

1.1.3.2 Jogos de linguagem em termos de Sistema Complexo Adaptativo (SCA) Há uma grande diversidade de definições de Sistema Complexo Adaptativo (SCA), como a defendida por Palazzo ([201?]). O autor declara que um sistema complexo é todo aquele que possui dois ou mais elementos interdependentes, mas ao mesmo tempo relacionados de forma estável em uma estrutura. Nessa perspectiva, a dinâmica da relação entre esses elementos exige uma ordem, possibilitada por invariâncias de sua macroestrutura, o que permite mudanças nos elementos em um nível interno, microestrutura. Isso significa dizer que há estabilidade da estrutura maior

propicia que haja instabilidades momentâneas no nível interno do sistema, seguidas de adaptações desses elementos a essas situações, o que impede o seu colapso.

Em termos de jogos de linguagem, isso resultaria em eu dizer que dois ou mais participantes em interação possuem uma relação de interdependência entre si, que também está em relação com uma estrutura maior e estável, nesse caso, o frame interacional (FILLMORE, 1982; DUQUE, 2017). A dinâmica desses participantes, então, precisa considerar as possibilidades de eventos que esse frame interacional proporciona para manter uma estabilidade, o que propiciaria instabilidades momentâneas na interação deles, ou seja, rupturas semânticas a nível de frames (DUQUE, 2017), e consequentes adaptações nesses frames, via reframing (FILLMORE, 1982) para retornar à estabilidade, impedindo que o jogo de linguagem em andamento entre no caos, isto é, não possa atingir seu objetivo comunicativo.

Em uma outra concepção de SCA, essa de natureza social, Rzevisk ([201?], p. 2), explica que essas mudanças não ocorrem ao mesmo tempo em todos os elementos do sistema, fato que é responsável pela sua manutenção. E, assim, apresenta as características necessárias para a sua existência:

1. interdependência: um sistema complexo se constitui de diversos componentes, chamados agentes, que dependem uns dos outros (uma mudança em um desses agentes normalmente causa a mudança de comportamento de alguns outros agentes.

2. autonomia: os agentes não são controlados de forma centralizada; eles são parcialmente autônomos (têm um certo grau de liberdade de escolha), mas estão sujeitos a determinadas leis, regras ou normas.

3. emergência: o comportamento global do sistema emerge da interação dos seus agentes e isso é imprevisível.

4. não equilíbrio: o comportamento global do sistema está longe de ser equilibrado porque a frequente ocorrência de eventos perturbadores não permite ao sistema voltar ao equilíbrio no intervalo entre dois eventos perturbadores imprevisíveis.

5. não linearidade: a não linearidade das relações pode resultar em insignificantes em entradas insignificantes [no sistema] que serão ampliadas em eventos extremos (efeito borboleta).

6. auto-organização: um sistema é capaz de se auto-organizar (mudanças autônomas de comportamento /ou configuração) em resposta a eventos perturbadores. Auto-organização pode também ser iniciada automaticamente em resposta a uma necessidade percebida, o que pode ser chamado de criatividade.

7. coevolução: um sistema evolui de forma irreversível com seu ambiente.

A partir dessa concepção de SCA, Duque (2016, p. 163, grifo nosso) busca elaborou a sua proposta a respeito do uso linguístico, conforme os critérios a seguir mostram.

1. interdependência: [...] A mudança de comportamento de um agente pode causar a mudança de comportamento de outros agentes. O comportamento linguístico parece emergir de interações básicas entre o ser humano.

2. autonomia: [...] As características do ambiente só podem ser consideradas em relação às peculiaridades do ser animado que está sendo estudado. Nesse sentido, consideram- se as oportunidades de comportamento que o ambiente fornece (affordances, para Gibson (1979) ao indivíduo ou à espécie, tais como as formas de ancoragem, por exemplo, a composição de superfícies: tamanho, formato, textura, peso etc.) e as informações perceptuais disponíveis ao organismo. 3. emergência: [...] A interação social (e o comportamento linguístico) parece emergir de estratégias de compartilhamento de foco. Na visão de Wittgenstein (1953), essas estratégias se assemelham a jogos. Cumpre ressaltar que esses “jogos de linguagem” não se restringem à mera designação de objetos isolados. De acordo com o filósofo austríaco, ao mesmo tempo em que aprende a língua materna, a criança se apropria de um determinado entendimento do mundo, de “forma de vida”.

4. não equilíbrio: [...] Caso o sistema tivesse em equilíbrio, ele não teria a dinâmica interna necessária para responder ao ambiente e se extinguiria. Por outro lado, caso o sistema atingisse o caos, deixaria de funcionar como um sistema. 13Por essas razões, o estado mais

produtivo para um sistema é estar à beira do caos, onde a máxima variedade e criatividade possibilitam sua constante auto- organização em resposta às demandas do ambiente [...].

5. não linearidade: [...]pequenas mudanças nas condições iniciais podem levar a alterações importantes no sistema a médio e longo prazo. A condição inicial do sistema de comportamentos linguísticos é a interação perceptual e motora de um organismo no seu ambiente. Essa interação é quase sempre mediada socialmente por pessoas mais experientes, por meio do uso de estratégias de compartilhamento de atenção. Tal mediação acaba criando perturbações na condição inicial por impor perturbações conceptuais a empilhamentos por similaridade física (cor, tamanho, forma etc.), por selecionar no ambiente o que é saliente e merece ser alvo de atenção, por exigir assunção de perspectivas (de 1ª e 3ª pessoas) para eventos percebidos e por transformar despretensiosos locais de chegada em intenções.

6. auto-organização: [...] Uma conversa se auto-organiza, dentro de uma estrutura gramatical (que fornece o recipiente da emergência). A auto-organização do sistema de comportamento linguístico tem

13 Nesta pesquisa, utilizarei o estado de beira do caos como guia nas análises. Por meio de sua

emergência, que se revela como um momento de desequilíbrio, realizarei a identificação e classificação dos jogos de linguagens das cenas dos esquetes que compõem o corpus deste estudo, bem como os frames acionados por pistas linguísticas, verbais e não verbais, presentes na fala dos personagens e no ambiente.

início com a adaptação de informações perceptuais recorrentes (sensações térmicas, luminosidade, texturas etc.) e o desenvolvimento de formas básicas de atuação no ambiente (movimento, alcance, manipulação e transferência). Com a mediação social, os padrões perceptuais-motores iniciais ganham enquadramento culturais, perfis, perspectivas e intenções. A atualização ocorre à medida que novos jogos de linguagem são jogados.

7. coevolução: [...] À medida que o sistema se auto-organiza, o ambiente se torna um conjunto de cenários onde cenas são encenadas o tempo todo. E a interação organismo-ambiente, antes limitada à percepção direta do ambiente, se torna mediada pela informação linguística, que cria novas formas de compreensão e, consequentemente, de se viver a vida. O significado deixa de ser a ação em si do organismo sobre o ambiente e se projeta em formas cada vez menos físicas de conhecermos o mundo. Com isso, o acesso direto ao ambiente passa a ser o recurso de ancoragem e de atualização on-line das nossas interações linguísticas.

Da mesma forma, para comprovar que o jogo de linguagem se comporta também como um SCA, demonstro, a seguir, que ele atende a todos os critérios para isso:

1. interdependência: os agentes envolvidos nos jogos de linguagem, que precisa ter ao menos dois participantes, são interdependentes, ou seja, a ação de um pode ocasionar uma reação no outro;

2. autonomia: os participantes de um jogo de linguagem não são controlados de forma centralizada, mas são levados a agir de acordo com as possibilidades de ação que seus corpos podem executar em relação aquilo que o ambiente lhes fornece, o

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