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JOSINEIDE SILVEIRA DE OLIVEIRA

No documento A história como testemunho, "eu estava lá" (páginas 147-161)

ELES ESTAVAM LÁ! POLIFONIA DO TESTEMUNHO

Testemunho 15: JOSINEIDE SILVEIRA DE OLIVEIRA

2 Carminho. Álbum "Canto" (2014.) Música: Marisa Monte. Letra: Arnaldo Antunes. Animação: Nicolau.pt. Disponível em <https://youtu.be/hIiRXFz7C24>

Pedagoga. Fez seu mestrado e doutorado no Programa de Pós-Graduação em Ciências Sociais da UFRN. Tem também mestrado em Ciências da Religião pela UNICAP – PE. É vice-coordenadora do GRECOM e professora do Programa de Pós- Graduação em Educação da UFRN. É Professora do Curso de Ciências da Religião da Universidade do Estado do Rio Grande do Norte (UERN).

GRECOM: nutriente das ideias e da vida

As primeiras lembranças que eu tenho do GRECOM remetem ao tempo da minha chegada ao mestrado em 1993. Eu não era orientanda de Ceiça, mas já frequentava o grupo, porque estudávamos juntos eu, Alex Galeno e Eugênia Dantas, colegas do mestrado em Ciências Sociais e orientandos de Ceiça. Havia uma parceria acadêmica entre as Bases de Pesquisa GRECOM, coordenada por Ceiça, e Educação e Sociedade, coordenada por José Willington Germano que era o meu orientador no mestrado, e isso facilitava nossa aproximação com estudantes.

Foi então que o GRECOM apareceu para mim como um lugar de reflexão, de estudo; um lugar para fazer e refazer ideias. Até hoje, todas as vezes que estou precisando pensar, me reencontrar é para o GRECOM que eu vou. E isso começou lá atrás, na angústia de fazer uma dissertação de mestrado nas Ciências Sociais. Minha área de formação era a Pedagogia e Ciências Sociais era um terreno completamente estranho para mim e, nesse contexto, Alex e Eugênia, ambos geógrafos e, portanto, mais familiarizados com as discussões da área, me ajudaram. Isso prova que o GRECOM sempre foi um lugar onde circulam pessoas de diferentes formações como a Física, a Biologia, a Comunicação, a Psicologia, a Filosofia, as Ciências da Saúde, dentre outras.

Nessa época já se tinha uma aproximação muito grande com a professora Marta Pernambuco que era da Física e com o pessoal da Filosofia, a exemplo de Jaime Biella. Sempre tive dificuldade de pertencer a um só lugar, ler os mesmos autores, e o GRECOM se apresentava como um espaço

de circularidade pelo qual passavam pesquisadores de vários pertencimentos e traziam discussões novas. Lembro das frequentes vindas do prof. Edgard de Assis Carvalho trazendo leituras de autores novos. Gostava de ouvi-lo contar das Mitológicas de Claude Levi-Strauss e de outras reservas de complexidade. Edgard era o modelo de intelectual que me parecia perfeito. As aulas e orientações proferidas por Edgard eram momentos de deleite. Ainda hoje a relação de Ceiça e Edgard testemunha o valor da amizade na vida acadêmica. Eles são cúmplices na vida e nas ideias. Como eu os admiro!

Logo que me aproximei do GRECOM, o que mais chamou a minha atenção foram os Seminários Temáticos, nos quais se estudava autores que ajudassem à compreensão da complexidade. O primeiro que me recordo foi ministrado por Marta Pernambuco, que me falou pela primeira vez de Gastón Bachelard. Naquele momento fecundo ficava claro que era possível fazer dialogar Bachelard, um filósofo, matemático e epistemólogo, com Karl Marx, Max Weber e Durkheim, autores das Ciências Sociais. Nesse primeiro seminário sobre Bachelard, pude contemplar o lado do cientista duro que falava do novo espírito científico. Ao mesmo tempo, com ele conheci o valor da imaginação para a construção da ciência. Essa descoberta era a coisa mais especial que podia me acontecer. Você pensar na imaginação material e na imaginação imaginada era desafiador e ao mesmo tempo prazeroso demais. Nessa época, me apressei em ler as obras de Bachelard, como A psicanalise do fogo, A água e os sonhos, O ar e os sonhos, A Terra e os devaneios da vontade e A poética do espaço. O GRECOM era o lugar de ler essas coisas; onde encontrávamos pessoas para dialogar sobre essas questões. Foi tanto que Bachelard fez parte do referencial teórico da minha dissertação, mesmo sem ser indicado pelo meu orientador, que era José Willington Germano.

Já o seminário sobre Ludwig Wittgenstein, ministrado por Jaime Biella, mexeu comigo porque falava de uma linguagem dupla da Filosofia que poderia vazar para a ciência, no instante em que as vozes que estavam na periferia dos paradigmas poderiam fazer sentido dentro da ciência, como é o

caso da ligação Filosofia-Ciência-Teologia. Isso me fez enxergar caminhos para a religação de saberes. Um último seminário que eu gostaria de relembrar foi sobre o Teorema de Goethe e a incompletude. Nele aprendi que sentenças e axiomas não se demonstram de todo completo e essa incompletude dos axiomas permite sempre um resto a reorganizar o contexto. Isso tudo chega num momento em que eu ainda não entendia nada de complexidade, mesmo assim me encantava pelas ideias. Foi nesse desarranjo do pensar que eu fui parar no GRECOM.

Finalmente, não posso deixar de citar a aproximação que vivenciei nos primeiros anos do GRECOM com a literatura. Hermano Machado, que era doutorando em Educação e orientando de Ceiça falava muito bem da narrativa literária e daí surgia mais uma chave: fazer dialogar a literatura com as teorias que eu estava conhecendo e com a vida. A leitura de Vidas Secas de Graciliano Ramos me fez lembrar homens, mulheres, crianças e outros animais que sofriam o flagelo da seca, fenômeno climático que eu conhecia tão bem! Outras obras como Menino de Engenho, Iracema, Morte e Vida Severina, A Pedra do Reino fortaleciam a aproximação entre as paixões humanas e a ciência. Tudo isso ia fervilhando lá no GRECOM. Saíamos muito à noite, conversávamos com artistas, fazíamos amizade com pessoas de “tribos” completamente diferentes.

Nessa época, eu cursava três disciplinas desafiantes: Teoria Geral do Estado, com Willington Germano; Fundamentos das Ciências Sociais, com Darcier Barros; e Cultura, com a própria Ceiça. Essas três disciplinas me desafiavam e o lugar que eu ganhava segurança para enfrentar esse desafio era o GRECOM.

Participava ativamente dos Dias de Estudo que era uma experiência rica, porém assustadora. Era um momento que você tinha leituras novas e deveria compartilhar com quem estava ali, mas nem sempre você tinha domínio do conteúdo, mesmo assim era obrigado a se expor. Essa exposição era traumática porque tinha um pouco do atiçar a fogueira das vaidades, onde todos queriam fazer o seu melhor discurso sobre aquela leitura e isso é uma tortura. Ninguém se atrevia ir para o encontro se ter lido o texto que

seria discutido. Aquela era uma vitrine. Porém, esse era um lugar onde você aprendia a organizar sua fala; era como um treinamento para a vida; era um lugar para você se fortalecer. É tanto que, no decorrer dos anos, esse Dia de Estudos teve que se refazer várias vezes e acabou por definhar.

Os Dias de Estudos tinham uma coisa muito importante: os autores escolhidos para o estudo em cada ano precisavam ter relação com a problemática dos trabalhos de quem estava fazendo suas monografias, dissertações e teses na época. Lembro que num dos dias tive que apresentar Livro do Desassossego de Fernando Pessoa, obra e autor que até então eu nunca havia tido contato, porque eu estava interessada em compreender o texto de René Descartes Paixões da Alma. Essa foi uma prova de fogo. Fazer conexões entre Descartes e Fernando Pessoa foi desafiante, mas também foi um dos Dias de Estudos mais rico de ideias que já vivenciei no GRECOM. Ali você se fortalecia como expositor, capaz de apresentar com clareza as ideias extraídas do texto e narrador, quando o leitor se apropria dessas ideias e constrói a interpretação.

Com a entrada do pessoal da área da Comunicação, quando chegaram Margarida Knobbe, Ângela Almeida e Josimey Costa, inaugurou-se uma fase nova com uma outra perspectiva de leitura. Passei a gostar dos textos do Morin que davam conta da cultura de massa e com eles vieram o interesse por Martin Heidegger e os pensadores da Escola de Frankfurt. Nesse momento, estávamos mais afiados na postura de narrador, de expositor. Estávamos mais afeitos à autoformação como uma exigência do bem pensar.

Uma coisa é certa, essa cobrança de se preparar para a exposição não era só de Ceiça. Na verdade, era uma cobrança da condição de ser do GRECOM e às vezes as pessoas não suportavam. Ser GRECOM é assumir a complexidade como jeito de viver, que não é simplesmente estar naquela sala ou estar fora; é um jeito de pensar. Isso eu adquiri nos Dias de Estudos. A exigência dessa atividade nos formava como sujeitos para a vida inteira. Para mim aconteceu assim. Eu considero que o Dia de Estudos foi a espinha dorsal do grupo.

Entrar no GRECOM e fazer uma dissertação ou uma tese não se resume a um tempo rápido, em que você cumpre a pesquisa e vai embora, essa não é a proposta do grupo. A proposta é formar pesquisadores que permaneçam com essa vontade e com a “responsabilidade” de que fala Henri Atlan quando trata da formação do sujeito responsável. Fazer da ciência alimento para vida é difícil, porque exige de você coisas que às vezes você não está a fim de fazer porque a vida lhe oferece outras possibilidades, mais fáceis, mas nem sempre tão éticas. As leituras voltam para nós, para nos reconstituir. Não é, portanto, o texto pelo texto; é fomento de reflexão. Há dois anos estamos sem os Dias de Estudos. Eu não sei ainda que metamorfose vai acontecer sem o Dia de Estudos.

Em paralelo a isso, existia uma outra atividade que nunca funcionou bem, as Oficinas do Pensamento, na qual um colega apresentava seu tema de pesquisa e todos discutiam o tema e davam a sua colaboração. Ela não funcionou bem porque as pessoas não assumiram o trabalho do colega como sendo responsabilidade sua. Então, tornou-se uma orientação coletiva. Era mais de responsabilidade apenas do orientador. Era uma ideia brilhante, mas que não teve muito corpo.

Aproveitando para falar das orientações, posso dizer que as minhas nunca foram muito tranquilas. Talvez porque seja uma marca minha gostar de trazer para a cena autores fora do script, como foi o caso de Gastón Bachelard no mestrado e, mais tarde, de Baruch Spinoza no doutorado. Embora eu não tivesse cacife para trabalhar autonomamente com aquelas ideias, eu queria muito, e tanto Willington no mestrado quanto Ceiça no doutorado, me permitiram estudar autores desconhecidos para que eu crescesse no conhecimento e na discussão.

Quando fui fazer o doutorado, foi uma relação bem difícil, mas uma história bem interessante. Tanto Ceiça quanto Edgard de Assis Carvalho queriam que Alex, Eugênia, eu e Gustavo de Castro fossemos para a PUC- São Paulo fazer essa etapa lá. Eugênia logo disse que não queria ir; queria ficar em Caicó, pois estava dando aulas. Nesse momento, eu era uma das predestinadas a ir para São Paulo para ser orientanda de Edgard ou de

Edson Passetti. Nessas alturas, eu já havia me tornado muito amiga de Ceiça; saía com ela para as festas e para os eventos, mas tinha grande admiração por suas ideias e postura intelectual. Eu também não queria ir para São Paulo. Até li alguns dos trabalhos de Edson Passetti para conhecer o que ele fazia e me aproximei dele e da família nas várias vindas dele a Natal. Porém, quando eu conversava com ele não o via como um orientador. Eu era uma carola libertária, com princípios cristãos muito presentes e ao mesmo tempo princípios trotskistas muito visíveis. Isso era conflitante. Por outro lado, havia um problema, só havia uma vaga para orientação de doutorado com Ceiça na UFRN e Eugênia ia concorrer, então conversamos, ela e eu num entendimento de que não estávamos numa disputa, nós apenas queríamos fazer doutorado com a mesma orientadora. Seguimos para a seleção dessa única vaga. Na época, uma das pessoas que concorriam para a linha foi reprovada sobrando uma vaga a mais para Ceiça, Eugênia e eu fomos aprovadas. Alex e Gustavo de Castro seguiram para São Paulo para serem orientandos de Edgard Carvalho.

Iniciado o doutorado, começamos as orientações individuais. Eu queria trabalhar com os amores proibidos pela Igreja, como Abelardo e Heloisa, Francisco e Clara de Assis. Depois de muitos recortes, ficaram somente Abelardo e Heloísa, duas figuras do século XII, por conta da Filosofia e da Literatura. Nessa mesma época, Ceiça começou a ter uma aproximação grande com profissionais da Psicanálise. Houve alguns Seminários realizados em parceria entre o GRECOM e o grupo da Psicanálise. Foi quando conheci Zeferino Rocha, grande leitor de Abelardo pela via da psicanálise. Ele enxergava Abelardo como um narcisista confesso e Heloísa como uma vítima desse narcisismo, e com isso eu não concordava. Neguei imediatamente essa tese. A partir daí, defini com Ceiça o papel de Aberlardo como formador e Heloísa como sua discípula. O corpus da pesquisa foi a correspondência entre esses amantes, que para mim não eram apenas cartas de amor. Eram cartas de formação. Havia 8 séculos de interpretações dessa história por várias áreas do conhecimento como a Lógica, a Arte, a Filosofia, o Direito e, nesse meio, o meu desafio era encontrar o que dizer de novo num contexto tão farto. Definimos então a

relação mestre e discípulo. O ponto chave era o formador. Como amante da Psicanálise, Ceiça defendia que o mestre poderia ser o narcisista e Heloisa uma brilhante discípula. Eu não percebia dessa maneira, compreendia que havia uma complexidade maior, mas não tinha ainda argumentos para refutar. Essa turbulência coincidiu com a vinda do médico e biólogo franco- argelino Henri Atlan a Natal. Na ocasião, Ceiça incumbiu a mim e a Eugênia da tarefa de ler alguns livros desse autor para compartilhar a leitura com os demais colegas e, assim, o recebermos no GRECOM. Foi ao ler Atlan que descobri o filósofo Baruch Spinoza e isso fez toda diferença. Mas a fragilidade das minhas primeiras leituras de Spinoza me levava a grandes conflitos.

Nessa confusão, eu não fiz o seminário doutoral II no tempo previsto e pedi para adiar porque não me sentia preparada. Ceiça ficou muito irritada porque não estava acostumada com prorrogações. Então, teve uma hora que não era mais possível prorrogar o Seminário para não comprometer a defesa da tese em tempo hábil. Esse seminário foi devastador para mim. Na banca estavam José Eduardo Moura, Marta Maria Pernambuco e Edgard de Assis Carvalho. O primeiro, Eduardo Moura, afeito ao estudo da lógica, e como eu ia encarar isso se eu não conhecia de fato a Lógica, e nem queria ir por esse caminho? A segunda, Marta Pernambuco com sua discussão freiriana de libertação, mas eu não queria falar de libertação, pois não se tratava de uma relação entre oprimido e opressor. O caminho era contrário, eu estava falando sobre dois apaixonados que não queriam se libertar um do outro. E o terceiro membro, o antropólogo Edgard Carvalho que me dizia, com toda razão, que eu não daria conta de Spinoza a tempo de colocar na tese. Eu saí de lá devastada porque eu não queria abandonar o projeto, uma vez que a história de Abelardo e Heloisa já era parte da minha vida, e conservar Spinoza como principal referência requeria uma entrega total. Eu tinha que estudar Ética de Spinoza para entender a relação entre determinismo e liberdade; defender com propriedade a racionalidade de Abelardo para confrontar com a interpretação narcisista feita por Zeferino Rocha, a quem li exaustivamente por ser ele um dos principais comentaristas de Abelardo no Brasil.

Contei essa história para ilustrar como acontecia o processo de orientação. Um tempo de fortalecimento do sujeito, de descoberta de si, de se deixar testar. Penso que é preciso viver essa etapa para sair bem fortalecido. Quem se nega esse aprendizado pode até fazer um bom texto no trabalho final, mas não sairá com maturidade.

Ao encontrar Spinoza eu também encontrei o meu lugar no GRECOM. Compreendi que podia contribuir mais com o grupo e experimentei a condição de sujeito responsável, por perceber a ideia de intuição, que significa responsabilidade de ação. Ele diz que existem 3 gêneros do conhecimento: o primeiro, o conhecimento acessível a todas as pessoas. O segundo, o conhecimento racional obtido através da leitura da Ciência e da razão e um terceiro que é aquele que o sujeito adquire para agir eticamente. É a intuição que faz do sujeito agente da vida e provedor de uma estética responsável no mundo. Foi isso! Engraçado, muito tempo depois, lendo as cartas de Nise da Silveira a Spinoza, quando ela cita Antonin Artaud “eu vi a abelha e isso mesmo me basta”, você percebe que esse é o momento onde nos descobrimos. Foi nesse momento que eu me descobri que não estava no GRECOM de passagem. Para mim, o GRECOM é o lugar de reencontro comigo mesma. Do imperativo “Conhece-te-a-ti mesmo” e assume tua responsabilidade. Eu me descubro na conjugação ciência e vida! As pessoas nos questionam sobre a metodologia de como escrevemos e não existe essa fórmula. O GRECOM faz com que os autores nos provoquem para que a gente se reconheça e possa se inscrever no mundo.

Para falar desse grupo não existe uma metáfora única. Existe a metáfora da borboleta que representa a metamorfose. Isso é verdade. Quem vive intensamente a atmosfera do GRECOM experimenta a metamorfose nas ideias e na vida. Mas, para mim, existe também o frenesi da roda que eu sempre cito como uma alegoria para dizer da efervescência de como as coisas acontecem no GRECOM. É como se existisse uma roda girando no teto e as pessoas que estão indo todos os dias ao GRECOM estivessem penduradas pelas duas mãos e daí se movem com a mesma velocidade. Se uma delas deixar de ir um dia, é como se soltasse umas das mãos. Se passar uma semana, as duas mãos soltam-se por completo e a pessoa não consegue

mais acompanhar o ritmo. Vive um longo tempo de desatino até conseguir se reposicionar.

Além disso, mais recentemente tenho visto uma outra metáfora: "brasas sob cinzas". Quando abrimos hoje a porta da sala do GRECOM e vemos a disposição dos móveis e dos painéis, temos a impressão de que adentramos a um museu. Como se as recordações fossem mais fortes que os acontecimentos do presente. Mas as imagens do passado escondem o potencial do presente. Existe um potencial ali; as brasas estão embaixo das cinzas, e um exemplo disso foi a participação de Eugênia, Patrícia Limaverde e Fagner no seminário de formação pós-doutoral em 2017 que serviu de casulo para o Seminário Fronteiras Borradas realizado em outubro de 2018. Bastou o calor dessas discussões trazidas por eles e orquestradas por Ceiça para vermos a potência do GRECOM. Percebemos quanta força existe submersa ali. São como brasas sob cinzas. A própria resistência do Estaleiro de Saberes, um projeto de extensão que se mantém durante 10 anos e é capaz de congregar professores da região do Vale do Assú sob a direção do GRECOM é uma demonstração da força e da importância desse grupo.

Para mim, essa metáfora das brasas sob cinzas diz muito da atualidade do GRECOM, porque as pessoas, por não compreenderem muito da potência do grupo, centralizam tudo na pessoa de Ceiça. É claro que tudo ali só foi, só é e só será possível devido a ela. Ela é alguém que demonstra como viver a complexidade, mas subsumir o GRECOM à figura de Ceiça é reduzir tanto o GRECOM quanto a própria Ceiça. Ela é uma ideia, é um jeito de ser acolhedor que encarna a complexidade. Ceiça nunca fechou a porta para ninguém, mesmo que ela abra essa porta para brigar. Mas também quando ela está brigando, está abrindo espaço. Acho fantástico ela discordar da pessoa, achar insuportável conviver com essa pessoa, mas querer cegamente conviver com essa diferença. Isso é de uma grandeza imensurável. Isso não faz de Ceiça uma deusa, como se costuma dizer de maneira apressada. Ela na verdade é uma grande mestra. Sabe como fazer desabrochar potencialidades que as pessoas não conhecem de si mesmas. Um grande mérito de Ceiça é a capacidade de abertura; é a sedução que ela

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