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JULGAMENTO DE RECURSOS ESPECIAIS REPETITIVOS E

CAPÍTULO 4 – JULGAMENTO DE RECURSOS ESPECIAIS REPETITIVOS

4.1 JULGAMENTO DE RECURSOS ESPECIAIS REPETITIVOS E

O procedimento para julgamento de recursos especiais repetitivos é, a nosso ver, o desdobramento de um sismo que irrompeu em 8 de dezembro de 2004, com a publicação da EC 45/2004, mais conhecida por reforma do poder judiciário. Dentre as muitas inovações dela constantes, destaca-se a inserida no art. 102, § 3º, da Constituição da República, qual seja, a necessidade de demonstração da repercussão geral como requisito de admissibilidade do recurso extraordinário218.

Desse tema tratamos no Capítulo 1 do presente trabalho e demos especial atenção àquilo que chamamos de análise por amostragem da repercussão

geral, classificando-a como um caso radical de objetivação do processo. A verdade

é que estamos convencidos, talvez pela obviedade, que o procedimento criado para o julgamento de recursos especiais repetitivos é uma espécie de transplante, com adaptações para a seara dos recursos especiais, daquilo que já ficara estabelecido para o julgamento de recursos extraordinários quando a análise da repercussão geral se desse por amostragem – art. 543-B do CPC.

Exatamente por isso é que a estrutura do presente capítulo será equivalente à do referido Capítulo 1 e, sempre que possível, faremos análise comparativa dos institutos.

218

“Nota-se uma simetria procedimental entre as duas reformas, ambas voltadas à superação do volume exagerado de recursos com idênticas questões de direito que chegam ao STF ou ao STJ. THEODORO JUNIOR, Humberto. Recurso especial e o novo artigo 543-C do Código de Processo Civil (Lei nº 11.672, de 08.05.08). Recurso especial e o novo artigo 543-C do Código de Processo Civil (Lei nº 11.672, de 08.05.08). Recurso especial e novo artigo 543-C do Código de Processo Civil (Lei nº 11.672, de 08.05.08). Revista Magister de Direito Civil e Direito Processual Civil. São Paulo, Magister, n. 24, jun./2008. p. 35-36.

A exposição de motivos da Lei nº 11.672/08 deixa bastante claro esse elo entre as duas normas em comento: “[...] o presente Anteprojeto inspira-se no procedimento previsto na Lei nº 11.418/06, que criou mecanismo simplificando o julgamento de recursos múltiplos, fundados em idêntica matéria, no Supremo Tribunal Federal”.

Nessa linha, acabamos por considerar o julgamento de recursos especiais

repetitivos – o seu procedimento – como um caso radical de objetivação do

processo, como melhor se verá.

No entanto, já neste breve introito, mister atentar para uma importante, e grave, distinção entre aqueles dois procedimentos: a análise por amostragem da repercussão geral do recurso extraordinário tem respaldo explícito na Constituição da República219; o procedimento para julgamento de recursos especiais repetitivos não.

Isso implicaria a inconstitucionalidade das inovações legislativas pertinentes ao tema. Estamos firmes em que não.

Foi a Lei nº 11.672, de 8 de maio de 2008, que introduziu no CPC o art. 543-C220, dispondo regras para julgamento de recursos especiais múltiplos,

fundados em idêntica questão de direito. Referida lei entrou em vigor noventa dias

depois, merecendo já em agosto do mesmo ano, resolução específica do STJ: a Resolução nº 8, de 8 de agosto de 2008.

Note-se, portanto, a ausência de dispositivo constitucional a respeito.

219 Trata-se do já referido § 3º do art. 102 da CF, introduzido pela EC nº 45.

220 “Art. 543-C. Quando houver multiplicidade de recursos com fundamento em idêntica questão de direito, o recurso especial será processado nos termos deste artigo.

§ 1º Caberá ao presidente do tribunal de origem admitir um ou mais recursos representativos da controvérsia, os quais serão encaminhados ao Superior Tribunal de Justiça, ficando suspensos os demais recursos especiais até o pronunciamento definitivo do Superior Tribunal de Justiça.

§ 2º Não adotada a providência descrita no § 1º deste artigo, o relator no Superior Tribunal de Justiça, ao identificar que sobre a controvérsia já existe jurisprudência dominante ou que a matéria já está afeta ao colegiado, poderá determinar a suspensão, nos tribunais de segunda instância, dos recursos nos quais a controvérsia esteja estabelecida.

§ 3º O relator poderá solicitar informações, a serem prestadas no prazo de quinze dias, aos tribunais federais ou estaduais a respeito da controvérsia.

§4º O relator, conforme dispuser o regimento interno do Superior Tribunal de Justiça e considerando a relevância da matéria, poderá admitir manifestação de pessoas, órgãos ou entidades com interesse na controvérsia.

§ 5º Recebidas as informações e, se for o caso, após cumprido o disposto no § 4º deste artigo, terá vista o Ministério Público pelo prazo de quinze dias.

§ 6º Transcorrido o prazo para o Ministério Público e remetida cópia do relatório aos demais Ministros, o processo será incluído em pauta na seção ou na Corte Especial, devendo ser julgado com preferência sobre os demais feitos, ressalvados os que envolvam réu preso e os pedidos de habeas corpus.

§7º Publicado o acórdão do Superior Tribunal de Justiça, os recursos especiais sobrestados na origem: I - terão seguimento denegado na hipótese de o acórdão recorrido coincidir com a orientação do Superior Tribunal de Justiça; ou II - serão novamente examinados pelo tribunal de origem na hipótese de o acórdão recorrido divergir da orientação do Superior Tribunal de Justiça.

§ 8º Na hipótese prevista no inciso II do § 7º deste artigo, mantida a decisão divergente pelo tribunal de origem, far-se-á o exame de admissibilidade do recurso especial.

§ 9º O Superior Tribunal de Justiça e os tribunais de segunda instância regulamentarão, no âmbito de suas competências, os procedimentos relativos ao processamento e julgamento do recurso especial nos casos previstos neste artigo.”

Todavia, como já concluímos nos capítulos anteriores, os nobres objetivos do fenômeno da objetivação do processo respeitam o modelo constitucional de

processo civil. Assim, inovações legislativas tendentes a objetivar o processo

prescindem de respaldo em normas constitucionais explícitas a respeito, desde que respeitadoras dos direitos e garantias das partes.

Posto isso, é de concluir que, por esse motivo, não há inconstitucionalidade no art. 543-C do CPC, restando naturalmente analisá-lo amiúde, como faremos ao longo desta etapa221,222.

Importa reafirmar agora que o art. 543-C é um caso radical de objetivação do processo. Seremos redundantes sem receio, ao reforçar aqui os mesmos motivos que impuseram essa qualificação ao art. 543-B do CPC. Isso por imperativo lógico, pois acabamos de afirmar que o art. 543-C é a continuação mais longínqua de um movimento iniciado com a EC 45/2004 e que passa pelos arts. 543-A e 543-B do diploma processual civil.

É assim que o procedimento para julgamento de recursos especiais repetitivos foi, antes de tudo, uma necessidade imposta pelas circunstâncias, ou seja, a grave crise que assolava de há muito o STJ, entulhando-o de milhares de recursos especiais que demoravam a ser julgados223.

Encontra-se aqui a primeira característica dos casos de objetivação: o escopo de redução da demanda excessiva. Explica-se. O art. 543-C do CPC autoriza que, havendo múltiplos recursos especiais fundados em idêntica questão de

direito, selecionem-se apenas alguns para imediato julgamento pelo STJ, ficando os

demais sobrestados. O julgamento dos recursos selecionados terá violento influxo sobre os recursos sobrestados – e também sobre futuros recursos a serem interpostos sobre o mesmo tema –, abreviando-lhes em muito o procedimento e impedindo, na maioria dos casos, que esses recursos subam ao STJ.

221

“Como o recurso especial não é um instrumento de revisão dos julgamentos dos tribunais locais em toda a extensão da lide, mas apenas de reapreciação da tese de direito federal em jogo, não se pode considerar, em princípio, ofensiva ao acesso àquele recurso constitucional a restrição imposta ao seu julgamento diante de causas seriadas ou repetitivas”. THEODORO JUNIOR, Humberto. Recurso especial e novo artigo 543-C do Código de Processo Civil (Lei nº 11.672, de 08.05.08). Revista Magister de Direito Civil e Direito Processual Civil. p. 31-32.

222 Não obstante, há interessante discussão na doutrina a respeito da inconstitucionalidade da Resolução nº 8 do STJ. Mais adiante trataremos dela.

223

A já citada exposição de motivos aponta claramente para esse objetivo: “O presente projeto de lei é baseado em sugestão do ex-membro do Superior Tribunal de Justiça, Ministro Athos Gusmão Carneiro, com o objetivo de criar um mecanismo que amenize o problema representado pelo excesso de demanda daquele Tribunal”.

O julgamento com base em precedentes, tendente à busca de resultados idênticos para temas idênticos dispostos em múltiplos processos, é, como se sabe, importante marca dos mecanismos de objetivação do processo. Nesse ponto, o procedimento para julgamento de recursos especiais repetitivos não foge à regra.

O mecanismo engendrado pelo art. 543-C do CPC possibilita que o STJ, exercendo sua função constitucional de guardião da legislação federal e uniformizador da jurisprudência nacional a respeito, fixe o precedente sobre o tema de repetitivo para que, após, outros órgãos fracionários do próprio STJ ou tribunais inferiores limitem-se a guiar-se pela luz já acendida224. Conquanto não seja vinculante o precedente criado pelo STJ, veremos – como já vimos no estudo da

repercussão geral por amostragem – que ele exerce forte influência sobre os demais

órgãos do poder judiciário.

Quando os órgãos inferiores recorridos optarem por manter suas decisões divergentes de posicionamento firmado pelo STJ – possibilidade concedida pelo § 8º do art. 543-C – haverá, ainda assim, nítida aceleração do procedimento desses recursos, graças ao disposto no art. 557 do CPC, como também será examinado. Por ora, basta lembrar que a aceleração do procedimento é, também, importante traço dos mecanismos de objetivação do processo.

É, portanto, certo que o art. 543-C do CPC traz-nos um relevante mecanismo de objetivação do processo e, como tal, ele será por nós aferido225.

4.2 PROCEDIMENTO DO JULGAMENTO DE RECURSOS ESPECIAIS