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Jurisprudência do Supremo Tribunal de Justiça (STJ)

No documento Direito Estradal (páginas 148-154)

ESPECIFICIDADES DAS CONTRAORDENAÇÕES RODOVIÁRIAS O REGIME ATUAL E AS PROPOSTAS EM SEDE DE PROJETO DE REVISÃO DO CÓDIGO DA ESTRADA

2. Jurisprudência do Supremo Tribunal de Justiça (STJ)

Acórdão do Supremo Tribunal de Justiça n.º 5/2009, Processo n.º 2807/08-5, de 19 de março de 2009 — Uniformização de jurisprudência (Relator: Neves Magalhães) Resumo: Acordam os juízes do pleno das secções criminais do Supremo Tribunal de Justiça,

em:

a) Fixar a seguinte jurisprudência:

«O depositário que faça transitar na via pública um veículo automóvel apreendido por falta de seguro obrigatório comete, verificados os respectivos elementos constitutivos, o crime de desobediência simples do artigo 348.º, n.º 1, alínea b), do Código Penal e não o crime de desobediência qualificada do artigo 22.º, n.os 1 e 2, do Decreto -Lei n.º 54/75, de 12 de Fevereiro.»

b) Revogar a decisão recorrida que deverá ser reformulada, face ao que aqui se decide, pelo que se reenvia o processo nos termos do n.º 2 do artigo 445.º do CPP.

Acórdão do Supremo Tribunal de Justiça de 19 de junho de 2009 (Relator: Oliveira Vasconcelos)

Resumo: - Trânsito público não pode deixar de ser entendido como trânsito que pertence a

todos, que é do uso de todos, que se destina a todos. - Quando de dá como provado que uma via pertencente ao domínio privado serve para o acesso a várias empresas, tem que se concluir que não servia para acesso a qualquer veículo. - A circulação não era livre porque quem não tivesse que ir às instalações daquelas empresas não podia nem devia aceder aquela via. - Não se tratava, assim, de uma via de domínio privado aberta ao trânsito público.

Acórdão do Supremo Tribunal de Justiça n.º 2/2013, P.º 146/11.0GCGMR-A.G1-A.S1, de 8 de janeiro de 2013 — Uniformização de jurisprudência (Relator: Souto de Moura)

Resumo: Em caso de condenação, pelo crime de condução em estado de embriaguez ou sob a

influência de estupefacientes ou substâncias psicotrópicas, do art. 292.º do CP, e aplicação da sanção acessória de proibição de conduzir prevista no art. 69.º, nº 1, al. a), do CP, a obrigação de entrega do título de condução derivada da lei (art. 69.º, nº 3 do CP e art. 500.º, nº 2 do CPP), deverá ser reforçada, na sentença, com a ordem do juiz para entrega do título, no prazo legal previsto, sob a cominação de, não o fazendo, o condenado cometer o crime de desobediência do art. 348.º, nº 1, al. b), do CP.

Acórdão do Supremo Tribunal de Justiça de 4 de outubro de 2007 (Relator: Santos Bernardino), Processo n-º 07B1710

Resumo: 1. A causa de pedir, nas acções de indemnização por acidente de viação, é o próprio

acidente, e abrange todos os pressupostos da obrigação de indemnizar. Se o autor pede em juízo a condenação do agente invocando a culpa deste, ele quer presuntivamente que o mesmo efeito seja judicialmente decretado à sombra da responsabilidade pelo risco, no caso de a culpa se não provar. E assim, mesmo que não se faça prova da culpa do demandado, o tribunal pode averiguar se o pedido procede à sombra da responsabilidade pelo risco, salvo se dos autos resultar que a vítima só pretende a reparação se houver culpa do réu.

2. De acordo com a jurisprudência e a doutrina tradicionais, inspiradas no ensinamento de Antunes Varela, em matéria de acidentes de viação, a verificação de qualquer das circunstâncias referidas no art. 505º do CC – maxime, ser o acidente imputável a facto, culposo ou não, do lesado – exclui a responsabilidade objectiva do detentor do veículo, não se admitindo o concurso do perigo especial do veículo com o facto da vítima, de modo a conduzir a uma repartição da responsabilidade: a responsabilidade pelo risco é afastada pelo facto do lesado.

3. Esta corrente doutrinal e jurisprudencial, conglobando na dimensão exoneratória do art. 505º, e tratando da mesma forma, situações as mais díspares – nas quais se englobam comportamentos mecânicos dos lesados, ditados por medo ou reacção instintiva, factos das crianças e dos inimputáveis, comportamentos de precipitação ou distracção momentânea, etc.

– e uniformizando as ausências de conduta, as condutas não culposas, as pouco culposas e as muito culposas dos lesados, conduz, muitas vezes, a resultados chocantes.

4. Mostra-se também insensível ao alargamento crescente, por influência do direito comunitário, do âmbito da responsabilidade pelo risco, e da expressa consagração da hipótese da concorrência entre o risco da actividade do agente e um facto culposo do lesado, que tem tido tradução em recentes diplomas legais, que exigem, como circunstância exoneratória, a culpa exclusiva do lesado, bem como à filosofia que dimana do regime estabelecido no Cód. do Trabalho para a infortunística laboral.

5. O texto do art. 505º do CC deve ser interpretado no sentido de que nele se acolhe a regra do concurso da culpa do lesado com o risco próprio do veículo, ou seja, que a responsabilidade objectiva do detentor do veículo só é excluída quando o acidente for devido unicamente ao próprio lesado ou a terceiro, ou quando resulte exclusivamente de causa de força maior estranha ao funcionamento do veículo.

6. Ao concurso é aplicável o disposto no art. 570º do CC.

7. A este resultado conduz uma interpretação progressista ou actualista do art. 505º, que tenha em conta a unidade do sistema jurídico e as condições do tempo em que tal norma é aplicada, em que a responsabilidade pelo risco é enfocada a uma nova luz, iluminada por novas concepções, de solidariedade e justiça.

8. Ademais, na interpretação do direito nacional, devem ser tidas em conta as soluções decorrentes das directivas comunitárias no domínio do seguro obrigatório automóvel e no direito da responsabilidade civil, já que as jurisdições nacionais estão sujeitas à chamada obrigação de interpretação conforme, devendo interpretar o respectivo direito nacional à luz das directivas comunitárias no caso aplicáveis, mesmo que não transpostas ou incorrectamente transpostas.

9. Não pode, no caso concreto, concluir-se que o acidente é unicamente ou exclusivamente imputável à menor, condutora do velocípede, e que o veículo automóvel foi para ele indiferente, isto é, que a sua típica aptidão para a criação de riscos não contribuiu para a eclosão do acidente.

10. Na verdade, não obstante a actuação contravencional da menor, que manifestamente contribuiu para o acidente, a matéria de facto apurada permite também concluir que a estrutura física (as dimensões, a largura) do veículo automóvel, na ocasião timonado por uma condutora inexperiente, habilitada há menos de seis meses, está inelutavelmente ligada à ocorrência do acidente.

11. Na fixação da indemnização pelos danos não patrimoniais sofridos pela menor deve, depois de determinado o seu valor, de acordo com a equidade, fazer-se funcionar o critério da

repartição do dano, nos termos do art. 570º do CC, não se perdendo de vista a própria condição da vítima, decorrente da sua idade, ao tempo da produção do dano, não podendo valorar-se a sua conduta causal por critério igual ao que seria aplicável a um ciclista adulto.

Acórdão do Supremo Tribunal de Justiça de 5 de junho de 2012 (Relator: Orlando Afonso), Processo n.º 100/10.9YFLSB

Resumo: I - As novas concepções comunitárias têm vindo a pôr em causa a jurisprudência e

doutrina tradicionais em matéria de acidentes de viação, para as quais a imputação causal do acidente ao lesado exclui, por si só, a responsabilidade objectiva.

II - Com efeito, o direito comunitário, apresentando-se como garante de uma maior protecção dos lesados (alargando o âmbito da responsabilidade pelo risco), veio – em várias directivas – consagrar a protecção dos interesses dos sinistrados, vítimas de acidentes de viação, numa sociedade como a nossa em que, o excesso de veículos (estacionados ou em circulação) criou desequilíbrios ambientais, limitou o espaço pietonal e aumentou potencialmente a sinistralidade.

III - Embora a escolha do regime de responsabilidade civil aplicável aos sinistros resultantes a circulação de veículos seja, em princípio, da competência dos Estados-membros, impõe-se uma interpretação actualista das regras relativas à responsabilidade pelo risco, na consideração do binómio risco dos veículos/fragilidade dos demais utentes das vias públicas. IV - As disposições das directivas comunitárias em matéria de responsabilidade civil e seguro automóvel obrigatório – nomeadamente da Directiva n.º 2005/14/CE de 11-05 devem estar presentes em sede de interpretação do direito nacional e nas soluções a dar na aplicação desse direito, razão pela qual não é compatível – com o direito comunitário – uma interpretação do art. 505.º do CC da qual resulte que a simples culpa ou mera contribuição do lesado para a consecução do dano exclua a responsabilidade pelo risco, prevista no art. 503.º do CC.

V - Não resultando provada a violação, por parte do condutor do veículo automóvel, de qualquer norma específica do CEst ou que o mesmo tenha agido com inconsideração, negligência ou falta de destreza, resulta inviável concluir pela culpa deste.

VI - No que diz respeito ao menor de seis anos, condutor do velocípede sem motor, que descia a rua com uma inclinação acentuada, com os pés fora dos pedais, sem luz sinalizadora, não se

pode igualmente falar em culpa, posto que – para uma criança desta idade, em que na normalidade da vida esta se confunde com a brincadeira despreocupada – andar de bicicleta não representa mais do que o preenchimento da sua vida lúdica, pelo que a imprevidência não faz parte do seu quadro mental, não lhe sendo exigível que possa, ou deva, prever as consequências de um dado acto.

VII - Muito embora a culpa in vigilando se presuma, a mesma não dispensa a sua alegação, o que nos presentes autos não foi feito.

VIII - De acordo com o art. 488.º, n.º 1, do CC, “não responde pelas consequências do facto danoso que, no momento em que o facto ocorreu, estava, por qualquer causa, incapacitado de entender ou querer, salvo se o agente se colocou culposamente nesse estado, sendo este transitório”.

IX - Sabendo-se que ninguém se coloca culposamente em determinado estádio etário, sempre se terá de concluir pela não responsabilidade do menor pelas consequências do acidente para o qual contribuiu.

X - Na ausência de culpas atribuíveis aos intervenientes no acidente, resta a responsabilidade objectiva de cada uma das partes em presença, nos termos dos arts. 503.º, 489.º, 505.º e 506.º, todos do CC.

XI - Ainda que não se possa falar em culpa do menor, não deixou a sua conduta de contribuir seriamente para a eclosão do evento lesivo, pelo que – se em abstracto, as potencialidades do risco causado por uma bicicleta não sejam comparáveis às que decorrem da utilização de um veículo automóvel – a condução destemida do menor (sem pés nos pedais e a grande velocidade) por uma via pública, aberta ao trânsito, criou um grave risco, extremamente próximo do risco criado pelo veículo automóvel, razão pela qual se fixa este em 60% e aquele em 40%.

XII - É perfeitamente aceitável a quantia peticionada pelos autores de € 50 000 pela perda do direito à vida do seu filho, uma criança de seis anos, bem como se afigura adequada a indemnização de € 20 000 atribuída a título de danos não patrimoniais decorrentes do sofrimento da vítima durante o período que antecedeu a sua morte, que se provou terem sido 6 dias em estado de permanente agonia e sofrimento.

XIII - Afigura-se adequada a indemnização de € 40 000, a cada um dos progenitores, a título de danos não patrimoniais sofridos com a perda do filho, uma vez que resultou provado o sofrimento dos mesmos, o amor que os unia à criança e o desgosto incomensurável por eles padecido.

A culpa nos acidentes de viação na jurisprudência das Secções Cíveis do Supremo Tribunal de Justiça - Sumários de Acórdãos de 1996 a 2012 - Gabinete de Juízes

Assessores do Supremo Tribunal de Justiça - Assessoria Cível

I - Concorrência de culpas II - Concorrência de culpa e risco

I - CONCORRÊNCIA DE CULPAS

No documento Direito Estradal (páginas 148-154)