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Teoria da Evolução do Acidente de Viação

No documento Direito Estradal (páginas 91-95)

INVESTIGAÇÃO DE ACIDENTES DE VIAÇÃO

2) Teoria da Evolução do Acidente de Viação

O acidente de viação, apesar da sua rapidez, não se produz de uma forma instantânea, antes sofre uma evolução que se desenvolve no tempo e no espaço, mediante uma série de circunstâncias sucessivas que se vão produzindo até ao surgimento do resultado final22.

O tempo durante o qual se desenvolve um acidente deve ser reconstruído, sequencialmente, com base em “momentos” nos quais as pessoas intervenientes no acidente deviam intervir de uma determinada maneira e o objeto da investigação visa averiguar se o fizeram ou não e de que modo.

No espaço existem “zonas” e “áreas” nas quais os acontecimentos se produziram e, dentro destas, existem determinados “pontos”, onde se situam ações concretas.

O conjunto de um “momento” e de um “ponto” constitui uma “posição”. A união de várias posições dá lugar a uma “fase” do acidente.

Na classificação clássica, segundo a Escola de Tráfico da Guardia Civil, as “zonas” e “áreas” dos acidentes podem distinguir-se três fases, conforme a representação na figura nº 1:

- A Fase de Perceção; - A Fase de Decisão; - A Fase de Conflito.

Pg. 153 e ss. Na versão publicada LOPEZ-MUÑIZ GOÑI MIGUEL: Acidentes de Trânsito: Problemática e

Investigação. 2ª Edição Colex. Madrid (1995). Pg. 163, faz referência à versão de 1964 do “Traffic Accident

Investigator´s Manual for Police” dizendo que é um dos manuais mais completos para a investigação de acidentes. 22 Op.Cit.In Borrel Vives, Algaba Garcia, Raposo Piedrafita. Investigación De Accidentes De Tráfico. 1991. Pg. 41-48.

Figura nº 1 – Representação da Teoria da Evolução do Acidente de Viação

Fonte: Guardia Civil, Espanha

a) Fase de Perceção

A Fase de Perceção23 está delimitada pelo Ponto de Perceção Possível e pelo Ponto Final. Esta fase compreende duas posições ou pontos diferentes:

Ponto de Perceção Possível (PPP). O PPP representa o momento e o lugar onde o movimento, condição inesperada ou perigo podia ter sido percebido por uma pessoa média24.

Geralmente, o PPP é objetivo e pode ser verificado no local. Deve determinar-se corretamente, já que servirá de base para valorar a conduta das pessoas que intervêm no acidente.

Ponto de Perceção Real (PPR). O PPR representa o momento e o lugar no qual o condutor

ou peão percebeu, realmente, pela primeira vez o perigo ou a situação anormal.

23 Apesar da forma clássica os considerar como pontos, estes correspondem a espaços. No Departamento de Investigação da Escola de Tráfico, alguns autores começaram a denomina-los por posições. Esta denominação e explicação parece ser mais correta, já que as fases do acidente são compostas por posições e não por pontos ou momentos em separado. Para efeitos de formação de investigadores é mais benéfico ter sempre em conta conjuntamente o tempo e o espaço no momento de investigar a evolução de um acidente de viação. O primeiro a formular esta correção foi MERA REDONDO, ANTONIO: La reconstrucción del accidente. FEMP (Federación Española de Municipios y Provincias): Curso de Investigación de Accidentes y Primeros Auxilios. 19-21 junio. Valladolid. 2001. Pg. 32. Baker nunca se refere a fases ou posições, mas fala sempre em pontos. Este pode ser o motivo desta confusão. BAKER, STANARD; FRICKE, LYNN: Op. cit. Pg. 64-3 y ss.

24 LOPEZ-MUÑIZ GOÑI MIGUEL: Op. Cit. Pg. 154. No Manual de Investigação de Accidentes da Guarda Civil introduz-se o conceito de pessoa media. MERA REDONDO, ANTONIO: Las Técnicas y métodos de la investigación

de accidentes de tráfico (plano microscópico). No Curso Seletivo de Técnicos de Trânsito organizado pela Dirección

General de Tráfico. Madrid (2001). Pg. 28. Define como pessoa média, aquela que está habilitada para a condução e como tal terá superado as provas de aptidões -psicofísicas- para a obtenção de carta de condução, e que além disso, se encontra “livre” da “influência ou efeitos” de “substâncias estranhas” ou doença súbita.

O PPR é subjetivo e, portanto, dificilmente determinável sem as declarações do condutor ou do peão. Porém, é possível realizar estudos analíticos de reconstituição de acidentes, através da estimação de velocidades, pela utilização de modelos matemáticos e físicos aplicáveis. Em todo o caso, é necessário socorrermo-nos de presunções ou simplificações para que o procedimento de cálculo matemático não seja excessivamente complicado.

Área de Perceção – É o espaço existente entre o PPP e o PF. Com esta ampliação da área de

perceção pretende-se atingir um duplo objetivo: o primeiro, que não se deixem de investigar factos que são percebidos posteriormente ao primeiro indício de perigo observado; o segundo, o condutor mesmo depois do Ponto de Conflito continua a perceber e, inclusive, pode realizar manobras evasivas, como se verá adiante. Isto não deve fazer-nos perder de vista o que realmente é importante para efeitos da investigação do acidente, que é a área compreendida entre o PPP e o Ponto de Decisão (PD), como se evidencia na Figura 1.

b) Fase de Decisão

Lograda a perceção real do perigo, segue-se a fase de decisão, que é aquela em que o condutor ou peão reage ante o estímulo anterior.

A Fase de Decisão compreende o Ponto de Decisão e o Ponto-Chave. É o tempo que demora o condutor ou peão a compreender a situação, tomar uma decisão e efetuar uma manobra de evasão.

Desde que o condutor ou peão se apercebe do perigo até que atua, com o fim de evitá-lo, decorre um tempo denominado por tempo de reação.

Tempo de Reação. É o intervalo de tempo entre o estímulo sensorial e a correspondente

reação voluntária, que pode ser mais ou menos automática. É o tempo que decorre desde que o condutor ou peão se dá conta do perigo, no PPR, até que decide atuar com o intuito de o evitar ou minimizar25.

Este período de tempo é constituído por três fases: a primeira, a chegada de estímulos exteriores; a segunda, o processamento da informação e a elaboração da decisão; e a terceira, a execução da decisão. A quantificação dos tempos de reação será abordada mais adiante.

Manobra de Evasão, é a manobra ou conjunto de manobras que podem ser realizadas pelo

interveniente para evitar que o acidente se produza.

As manobras de evasão podem ser classificadas como simples ou complexas. E estas, por sua vez, podem ser subdivididas em passivas ou ativas.

25 Na Teoria da Evolução do acidente, este conceito, como outros vistos até agora, fazem-nos ver claramente que temos que adotar uma perspetiva psicológica na investigação de acidentes de trânsito.

O conjunto de manobras possíveis, no exercício da condução, são as seguintes:

Passivas: Tocar a buzina e fazer sinais de luzes.

Ativas: Diminuir a velocidade, parar o veículo, aumentar a velocidade, mudar de direção

(para a direita ou para a esquerda), fazer marcha atrás, estando o veículo parado.

Manobra de evasão simples, considera-se a execução de apenas uma das manobras atrás identificadas e manobra de evasão complexa, consideram-se quando se combinam mais do que uma daquelas manobras.

Jordán Montañes26 considera, também, como manobra de evasão optar por conseguir uma minimização dos danos.

Esta fase é facilmente determinável, mediante cálculos físico-dinâmicos, quando existam marcas de travagens antes do PC.

A fase de decisão, por vezes, pode não existir, devido à rapidez dos eventos, ocorrendo, nestes casos, apenas a perceção do perigo e o acidente.

Área de Manobra. Corresponde ao espaço onde se realiza a manobra de evasão.

c) Fase de Conflito

É o culminar do acidente, ou seja, compreende a última fase da evolução do acidente, a sua conclusão.

Nesta fase podem distinguir-se três pontos, o Ponto-Chave, o Ponto de Conflito e o Posição Final.

Ponto-Chave (PCh). É o ponto no qual o acidente é inevitável. Pode coincidir com o ponto de

perceção real, em cujo caso não existirá manobra evasiva ou será muito reduzida.

Ponto de Conflito (PC). É aquele no qual se consuma o acidente e que corresponde à posição

de máximo efeito.

No PC surgem diversos momentos e pontos complementares: o ponto inicial do acidente ou ponto de contacto; o ponto ou posição de máximo efeito e, por último, o ponto de derivação até à posição final.

26 JORDAN MONTAÑES, MANUEL: “La Investigación de accidentes” em comentários em torno da Ley de 24 de dezembro de 1962. Colégio de Abogados. Valencia (1963).

Posição Final (PF). A posição final é aquela em que se posicionam os veículos e objetos

quando se imobilizam.

Área de Conflito. É o espaço onde se verifica a possibilidade de ocorrer o acidente. É muito

variável, pois depende da trajetória dos veículos, dos elementos intervenientes e das ações evasivas realizadas pelos mesmos.

A área de conflito pode coincidir com a área de manobra, embora geralmente sempre mais reduzida.

No documento Direito Estradal (páginas 91-95)