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PARTE III – APRESENTAÇÃO E ANÁLISE DOS ELEMENTOS

2. Percurso Histórico do Estilo de Liderança na Escola

2.1. Líderes Escolares

Após alguns anos de funcionamento em locais diferentes e em edifícios provisórios, a escola em questão transferiu-se, no ano lectivo 1973/74, para as instalações actuais. Nessa altura, o líder da escola era um professor ao qual estava instituída a figura de Director. Esse professor acompanhou o processo de transferência de instalações da escola, mantendo-se no cargo até ao final desse ano lectivo.

Após a revolução do 25 de Abril, o cargo de “Director”, nomeado pelo Ministério de Educação, foi extinto. Este processo começou, segundo Lima (1992), com a aprovação do Decreto-Lei nº 221/74, legalizando as chamadas “iniciativas democráticas” (como eram apelidadas no diploma).

Esse decreto-lei legalizava as chamadas “comissões de gestão” que resultassem dessas iniciativas democráticas, sendo esse o modelo que assegurou a gestão da generalidade das escolas até à aprovação do Decreto-Lei nº 735-A/74, de 21 de Dezembro, revogado mais tarde pelo Decreto-Lei nº 769-A/76. Esse decreto-lei revogou o Decreto-Lei nº 221/74, passando a escola a ser gerida não pelas “comissões de gestão”, mas por conselhos directivos eleitos, com representação paritária de docentes e discentes.

Esta gestão ficou conhecida por “gestão democrática” e manteve-se até à aprovação da Lei de Bases do Sistema Educativo (Lei nº 46/86, de 14 de Outubro). Dando cumprimento a esta lei, foi então aprovado o Decreto-Lei nº 172/91 que veio estabelecer um modelo de gestão assente na figura do Director Executivo. Este modelo foi aplicado experimentalmente em algumas escolas do país, tendo, o seu resultado, dado origem ao Decreto-Lei 115-A/98, de 4 de Maio, que revogou o anterior. Este diploma mantinha não só o modelo assente na figura

do Director Executivo, como criava um modelo de gestão baseado num Conselho Executivo. Segundo esse diploma, as escolas poderão optar por um ou outro dos modelos apresentados.

Com o cargo de “Director” extinto, o professor atrás mencionado, apesar de ter sofrido pressões para se propor para presidente do Conselho Directivo, regressou às funções docentes.

Posteriormente, os Conselhos Directivos sucederam-se a um ritmo de dois em dois anos até à entrada em vigor do Decreto-Lei nº 115-A/98, de 4 de Maio, a partir do qual se começou a eleger, de três em três anos, o Director Executivo ou os elementos do Conselho Executivo.

Inicialmente, a escola funcionou alguns anos só com o 2º ciclo e frequentavam-na 1500 alunos. Estes estavam repartidos por 48 turmas do ensino diurno e por duas do ensino nocturno. O número de professores rondava uma média de 110. A partir do ano lectivo de 1990/91, a escola passou a ter o 3º ciclo de escolaridade, obrigando a uma redução progressiva das turmas do 2º ciclo, à medida que os alunos transitavam de um ciclo para o outro.

De entre os vários professores que desempenharam as funções de Presidente do Conselho Directivo, entre o ano lectivo de 1973/1974 e 1999/2000 inclusive, destaca-se um que esteve no cargo doze anos. Apesar dos mandatos não terem sido seguidos, mas sim interpolados, o seu estilo de liderança marcou profundamente o funcionamento da escola. Esse professor deixou de ser o “eterno” candidato ao cargo porque se aposentou. Segundo um professor entrevistado, existiu sempre dificuldade em aparecerem listas para o Conselho Directivo. Sobre isto, disse o seguinte:

Nesta escola existe o problema de aparecerem listas para o Conselho Executivo, na altura, Conselho Directivo. Apareciam sempre pessoas que acabavam por ser presidentes por nomeação. O corpo docente reunia-se e indicava um nome e o

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165 Conselho Directivo anterior apontava os nomes mais votados para a Direcção Regional de Educação e eles nomeavam um dos que eram apontados. Portanto, este sistema tem sido utilizado desde há muitos anos, talvez desde o 25 de Abril de 1974, e, que tenha conhecimento, só houve a eleição de listas de um ou dois Conselhos Directivos. Houve uma fase, após o 25 de Abril de 1974, em que isso se verificou, até porque foi uma fase de consolidação da democracia. Depois, deixou de haver. (E: 207)

Após a retirada do “eterno” candidato, houve uma Comissão Executiva Instaladora que preparou a escola para funcionar segundo o modelo de gestão com Conselho Executivo. Na sequência disso, esta foi gerida pela mesma equipa anterior, que apresentou uma lista, agora como Conselho Executivo, durante três anos. Como os elementos dessa equipa não quiseram apresentar-se a eleições para novo mandato, porque tiveram receio de enfrentar os problemas que o processo de instalação do agrupamento de escolas lhes causaria, a escola ficou novamente com dificuldades em arranjar uma nova equipa disponível, neste caso para formar a Comissão Executiva Instaladora.

A solução apareceu quando três colegas, pertencentes ao quadro de outras escolas, mas destacados nesta escola, se disponibilizaram para formar uma equipa para o Conselho Executivo, desde que o Ministério da Educação não pusesse objecções. Esgotadas que foram todas as hipóteses para formar uma equipa com professores do quadro da escola, o Ministério da Educação não teve outra alternativa senão autorizar a formação da equipa naquelas condições.

Mas esta dificuldade em aparecerem listas, primeiro, para o Conselho Directivo e, depois, para os Conselhos Executivos, foi uma constante ao longo dos tempos. Existem várias razões para que isso tenha tivesse acontecido. Um dos professores entrevistados apresentou-nos algumas. Na sua opinião, o medo de errar e a falta de coragem para, como diz o professor, “pôr ordem nisto”, são algumas delas.

Eu vejo duas razões e são antagónicas. Umas pessoas não queriam aceitar, não se queriam propor, porque pensavam não poder responder de modo a que conseguissem uma qualidade de funcionamento como os outros tinham conseguido. Era corrente, eu ouvia as pessoas dizerem-no. Isto na fase em que a escola funcionou muito bem. Por outro lado, houve anos, houve alturas, em que se deu o contrário. Problemas a resolver eram tantos que as pessoas, determinadas pessoas que eu também ouvi, não se achavam com coragem para, digamos, pôr, entre aspas, ordem nisto. Portanto, são duas razões contrárias mas, a meu ver, existiram as duas no decorrer deste tempo. (E: 207)

Ainda na opinião do mesmo professor, o medo está no subconsciente e, quer numa das razões quer na outra, ele existia.

Sim, pode estar no subconsciente (…) Era o mesmo sentimento, quer fosse baixar um bocado o nível em relação à qualidade de funcionamento, quer fosse não conseguir elevá-lo, para aquilo que pretendiam. (E: 207)

Também é de opinião que, para além do medo, existe o sentimento da não realização pessoal, ao não conseguirem satisfazer as expectativas.

(…) o primeiro receio é um receio pessoal. É não se sentirem realizados, se não conseguem fazer o trabalho. Eu senti isso e tive essa dúvida: se devia aceitar [aceitar pertencer ao Conselho Directivo]. Em primeiro lugar, nem era pelas críticas. Era por dizer assim: vou assumir uma coisa e depois não consigo, não fico bem comigo próprio, mas, se calhar, também era em relação às críticas. Se, calhar, por trás disto está o medo. (E: 207)

De acordo com a hierarquia das necessidades proposta por Maslow (Graça Seco, 2002), as razões aqui apresentadas resultaram da não satisfação de necessidades sociais, de auto-estima e de auto-actualização dos professores. Aquele autor defende que os indivíduos são motivados por cinco níveis de necessidades que formam uma hierarquia, a saber: fisiológicas (alimento, água, etc.), de segurança (protecção de danos físicos e emocionais), sociais (desejo de pertença, de amizade e de aceitação no grupo), de auto-estima (englobam factores internos: autoconfiança, autonomia, sentido de realização e valor pessoal; e

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factores externos de estima: reconhecimento, prestígio e a atenção dos outros) e de auto-actualização (necessidades de crescimento e de realização pessoal).

No entanto, uma outra razão ainda relacionada com as anteriores foi a germinação do culto da personalidade, principalmente na figura do professor que esteve no Conselho Directivo doze anos. Como não aparecia ninguém para o cargo, alguns grupos de “poder” começaram a exercer a sua acção sobre essa pessoa, que até não se importava que a indicassem para o cargo. Ele não se propunha. Esperava que procedessem a uma votação nominal e, no caso de ser ele o escolhido, o que sempre acontecia, nunca rejeitou o cargo.

Os professores ligados aos grupos de poder pretendiam ver o problema do Conselho Directivo resolvido, sem terem que ficar sujeitos a todos os constrangimentos atrás referidos. Por outro lado, os professores que não partilhavam desse “poder” não se arriscavam a avançar, porque sabiam que, para além de não terem hipóteses de chegar ao cargo, também não se queriam expor a manifestações de preconceitos que, segundo Neto (1998), provocam a discriminação.

Todas estas atitudes deram origem a uma cultura de escola que condicionou as interacções entre professores e o estilo de liderança. Voltaremos a este assunto nos pontos seguintes.