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Considerando que o estudo pretende analisar os princípios relativos à racionalidade ambiental no espaço praiano, necessário se torna ponderar quais são as vocações prioritárias desse espaço para que se possa avaliar se os comportamentos sociais detectados no local refletem as tendências naturais do mesmo, incluindo as práticas tradicionais das comunidades locais.

De modo geral, o ambiente praiano tem o condão de ensejar um estilo de vida urbano próprio, mais despojado, norteado pela sociabilidade e com grande vocação para o lazer. A diversidade de atividades que caracterizam o lazer nas áreas de praia é grande. Descanso, práticas esportivas, entretenimento, interação social e tantas outras motivações atraem os usuários das praias.

Sob o enfoque de sua dimensão econômica, as atividades relativas ao lazer em praias encontram-se muito atreladas ao “Turismo de Sol e Praia”, que por sua vez, tem recebido grande incentivo por parte das políticas públicas governamentais.

Mas nem sempre foi assim. As manifestações iniciais de admiração e de prazer à beira- mar datam do século XVII, pelos poetas franceses barrocos, tais como Théophile, Tristan e Saint- Amant, que celebraram o prazer de passear pelas praias e contemplar as variações do mar. Segundo Alain Corbin (1989), o desejo coletivo das praias surgiu por volta de 1750, período de afluxo de pessoas ao local, em busca de saúde e como tática de lutas contra melancolia e ansiedades. Antes disso, continua Corbin, as representações do mar estavam ligadas a catástrofes, a naufrágios, à lembrança ameaçadora do dilúvio, ao símbolo do purgatório e a outras imagens repulsivas.

No Brasil, a área litorânea traz a reminiscência dos primeiros assentamentos lusitanos existentes. “De todos os 18 núcleos pioneiros fundados pelos portugueses o século XVI, apenas São Paulo não se encontrava à beira-mar”, diz Moraes (2007, p.33). As primeiras zonas de adensamento foram se formando ao redor dos portos dando origem às primeiras cidades. Desse modo, o povoamento da zona costeira brasileira foi realizado por um povoamento pontual. Os quatro conjuntos mais expressivos de ocupação do espaço litorâneo do Brasil, formados durante o período colonial, podem ser resumidos da seguinte forma: 1) litoral oriental da zona da mata nordestina, área de Olinda/Recife, produtora de cana de açúcar (1570/1670), onde se fixou a maior parte dos assentamentos coloniais da época, com núcleos urbanos litorâneos localizados na desembocadura dos principais rios existentes; 2) Recôncavo baiano, área polarizada pela cidade de Salvador, sede do governo geral durante boa parte do período colonial (até 1763), apresentando um conjunto de núcleos assentados nas desembocaduras dos rios que vertem para baía de Todos os Santos e litoral imediato; 3) Litoral fluminense, área polarizada pela cidade do Rio de Janeiro, que conheceu grande crescimento ao abrigar a corte portuguesa no início do

 

século XIX; 4) Litoral paulista, polarizado por Santos/São Vicente, constituído por vários núcleos litorâneos (MORAES, 2007).

Fator expressivo da urbanização litorânea, que se verificou em toda a costa, foi o fenômeno denominado de “segunda residência” ou de “residência de veraneio”, “altamente disseminado em longos espaços dos entornos das capitais estaduais e das aglomerações do litoral brasileiro” (MORAES, 2007, p. 38).

Como figuras urbanas - que é o tema de maior interesse do presente trabalho - foi no início do século XX que as praias passaram a ser socialmente aceitas, tendo sido nesse período o início dos loteamentos de trechos significativos da orla marítima. O Bairro de Copacabana, na cidade o Rio de Janeiro, representou um marco desse processo, tendo desencadeado, em diversas cidades costeiras, a eclosão de bairros que foram construídos à semelhança de Copacabana (MACEDO, 2004). O modelo associava, ao mesmo tempo, uma área residencial com as qualidades higiênicas da praia.

A ocupação de Copacabana ocorreu a partir de 1892, com uma proposta diferenciada e atrelada aos benefícios dos ares marítimos. A teoria higienista, que propagava as benesses do banho de mar, apresentava-se como predominante na época, seguindo, portanto, uma tendência do modelo europeu e que popularizou a relação das práticas marítimas com a saúde nas cidades. No caso do Rio de Janeiro, sua importância como capital da República, propagadora da moda e dos novos costumes, foi fundamental para difundir esse novo modo de moradia à beira-mar às outras capitais litorâneas. Macedo (2004), nesse sentido, lembra do desenho urbano (em xadrez), com a Avenida Atlântica bordejando a praia, e os prédios verticalizados nos lotes lindeiros à Avenida.

A partir desse modelo, por todas as cidades costeiras brasileiras, surgiram bairros que foram construídos à semelhança de Copacabana. Muitos surgiram como loteamentos costeiros, que foram se multiplicando por todo país, bordejando praias e costões. Destinavam-se, a princípio, ao lazer sazonal, com estruturação focada em função da temporada de verão. Poucos foram os loteamentos previstos, desde o início, para assumirem configuração vertical (MACEDO, 2004).

A característica principal dos bairros praianos é a exploração máxima dos valores paisagísticos relativos ao mar e à praia. O espaço da praia passou a ser considerado um local onde se desenvolvem as formas de lazer urbano, tornou-se palco de relacionamento social. “A via

beira-mar transforma-se em pólo aglutinador da população e a praia assume a função urbana do parque, sendo utilizado como centro de lazer por um público amplo” (MACEDO, 2004, p. 50).

A apropriação social da praia costuma gerar ações de estruturação espacial por parte dos gestores das cidades costeiras. Durante o século XX, muitas delas reproduziram o modelo utilizado na praia de Copacabana no Rio de Janeiro, em especial no que se refere à instalação de um “calçadão” ao longo da praia. Tornou-se comum a implantação de projetos urbanísticos na orla marítima que contemplam vários tipos de equipamentos de forma a receber o maior número de usuários possível. Assim, é possível se verificar, à beira mar, estruturas que albergam bares, restaurantes e demais estabelecimentos de apoio a serviços oferecidos no local focados para o lazer.

Sílvio Macedo (2004) aponta para a existência de uma figura típica de praia urbana brasileira, caracterizada especialmente pela trilogia “praia-mar-edificação”. O presente trabalho adota essa concepção, razão pela qual, a expressão “praia urbana” deve ser entendida como atrelada a esse sentido que, por sua vez, contrasta com as praias mais rústicas, com pouca infraestrutura, com predominância do ambiente natural.

As praias urbanas são importantes áreas para o desenvolvimento urbano. Além do valor natural que representam, são vocacionadas para o lazer que - junto com a moradia, o trabalho e locomoção – corresponde a uma das funções essenciais da cidade. O Estatuto da Cidade associa o direito à cidade sustentável como sendo o direito à terra urbana, à moradia, ao saneamento ambiental, à infraestrutura urbana, ao transporte e aos serviços públicos, ao trabalho e ao lazer, para as presentes e futuras gerações(Lei 10.257/2001, art. 2º, I).

O lazer, como assevera Carlos, Souza e Sposito (1999), é, também, um elemento do processo de reprodução, um tempo em que se organiza em função da reprodução de relações sociais.Pelo lazer é possível se chegar à compreensão do espaço, da paisagem urbana e da sociedade.

Estudos relativos ao lazer demonstram definições distintas relativas à expressão, que variam conforme a área do conhecimento De forma geral, os conceitos de lazer relacionam-se ao “tempo”, à “atividade” e à “atitude”, que são elementos interdependentes. No aspecto relativo ao “tempo”, o lazer é associado ao espaço temporal ocupado em atividades que não revertem em benefícios econômicos, ou seja à folga das obrigações de subsistência (tais como final do dia, final de semana, férias). Como bem assevera Dumazedier (1979, p. 28), “o lazer não é a

 

ociosidade, não suprime o trabalho; o pressupõe”. A concepção de lazer como “atividade” reflete um conteúdo ativo, diz respeito a ocupações, atividades, razão pela qual tem sido considerado também como recreação. O lazer enquanto “atitude” diz respeito a um estilo de vida, a um modo pessoal como cada indivíduo planeja a sua vida cotidiana.

Na Constituição Federal de 1988, em vigor, o lazer foi incluído no art. 6º, como um direito social, juntamente com a educação, a saúde, a alimentação, o trabalho, a moradia, a segurança, a previdência social, a proteção à maternidade e à infância e a assistência aos desamparados. Embora a Constituição Federal contenha normas com grande caráter de abstração e seja considerada uma Lei no sistema brasileiro, ela possui superioridade hierárquica. Pelo Princípio da supremacia da Constituição, as leis, atos normativos e atos jurídicos em geral não poderão existir validamente se incompatíveis com alguma norma constitucional (BARROSO, 2004).

O direito ao lazer, portanto, da forma que foi exposta no texto constitucional, não pode ser suprimido, é norma de ordem pública, imperativa e inviolável. A interpretação que se realiza, nesse contexto dos direitos sociais, é de que o direito ao lazer encontra-se atrelado aos direitos dos trabalhadores, aos direitos de segunda geração, uma conquista adquirida pelo esforço de movimentos sociais que foram se fortalecendo aos poucos no curso da história. Muitos estudos relativos ao lazer referem-se portanto a essa conjuntura. O livro/panfleto “O Direito à preguiça”, de Paul Lafargue, escrito em 1880, serviu como inspiração para reflexão acerca da sobrecarga que enfrentam os trabalhadores na sociedade capitalista. “Num regime de preguiça, para matar o tempo que nos mata segundo a segundo” (LAFARGUE, 1997, p. 48).

O direito ao lazer também aparece no Texto Constitucional brasileiro no capítulo dedicado à educação, cultura e desporto(CF/88, art. 217, §3º), que estabelece como dever do Poder Público, o incentivo ao lazer como forma de promoção social. No capítulo dedicado à família, criança, adolescente, jovem e idoso, consta que é dever da família, da sociedade e do Estado assegurar à criança, ao adolescente e ao jovem, com absoluta prioridade, o direito ao lazer (CF/88, art. 227).

Numa abordagem mais funcionalista, Dumazedier (2004) esclarece que o lazer pode ser diferenciado em três categorias, que, por sua vez, estão sempre intimamente unidas umas às outras: 1) descanso, que tem como função reparadora das deteriorações físicas e nervosas provocadas pelas tensões resultantes das obrigações cotidianas e do trabalho; 2) divertimento,

recreação e entretenimento, que possuem a função de compensação e de fuga por meio de variadas atividades que podem incluir mudanças reais, tais como de lugar, ritmo e estilo (viagens, jogos, esportes) ou atividades fictícias (tais como cinema, teatro, romance); 3) desenvolvimento da personalidade, que permite a prática de uma cultura desinteressada do corpo, da sensibilidade e da razão, além da formação prática e técnica; oferece novas possibilidades de integração voluntária à vida de agrupamentos recreativos, culturais e sociais e possibilita o desenvolvimento livre de atitudes adquiridas na escola.

Considerando as mencionadas funções, Dumazedier(2004, p. 34) assim define o lazer:

O lazer é um conjunto de ocupações às quais o indivíduo pode entregar-se de livre vontade, seja para repousar, seja para divertir-se e para entreter-se ou ainda para desenvolver sua informação ou formação desinteressada, sua participação social voluntária ou sua livre capacidade criadora após livrar-se ou desembaraçar-se das obrigações profissionais, familiares e sociais.

O lazer pode ser concebido, também, como um estilo de vida, conceituado por Dumazedier(2004, p. 263)como “o modo pessoal pelo qual cada indivíduo ajeita sua vida cotidiana”. Nesse aspecto, o lazer ocasiona o reexame das rotinas, estereótipos e ideias já prontas que concorrem para a repetição e especialização das obrigações cotidianas. O tempo de lazer apresenta-se como uma atitude mediadora entre a cultura de uma sociedade ou de um grupo e as reações de um indivíduo às situações da vida cotidiana.

As praias urbanas, portanto, são importantes espaços para a efetivação do direito ao lazer dos moradores de uma cidade. Podem, inclusive, ensejar um estilo de vida próprio, principalmente quando existe o sentimento de pertencimento e de afetividade dessas praias com os seus usuários locais. No entanto, as praias urbanas podem ser caracterizadas como lugares de lazer não só para os moradores locais. Muitas praias urbanas são alvo de grande interesse turístico da população em geral.

A questão que se apresenta nesses casos - de praias urbanas turísticas, que despertam interesse de visitação por parte da população -é até que ponto esses lugares, no afã de ofertarem lazer para os visitantes, têm considerado a identidade, a história, as peculiaridades do ambiente, da cultura e da comunidade local?

Em se tratando de lugares turísticos – como os praianos – Ana Fani Carlos (1999) alerta para o fato de que os momentos destinados ao lazer não escapam das regras do mercado, onde tudo vira mercadoria e esta transforma lugares, muitas vezes em cenários para uma multidão

 

amorfa, sem história e sem identidade, podendo até mesmo causar um “sentimento de estranhamento” por parte dos moradores locais.

O não-lugar não é a simples negação do lugar, mas uma outra coisa, produto de relações outras; diferencia-se do lugar pelo seu processo de constituição, é nesse caso produto da indústria turística que com sua atividade produz simulacros ou constroem simulacros de lugares, através da não identidade, mas não para por aí, pois também se produzem ‘comportamentos e modos de apropriação desses lugares’ (CARLOS; SOUZA; SPOSITO, 1999, documento online não paginado).

Essa noção é importante pelo fato de que as praias urbanas turísticas de uma forma geral têm sido alvo de práticas de intervenções urbanísticaspara possibilitar usos destinados ao lazer. Algumas intervenções chegam a ser simplesmente reproduzidas de outros lugares. Questiona-se, por exemplo, se na Praia de Ponta Negra, que é uma praia turística, as intervenções urbanísticas existentes no local têm respeitado a história, os costumes e as peculiaridades naturais locais. O presente estudo pretende avaliar essa questão.

O turismo foi qualificado por Bertha Becker (2001, p. 2)como híbrido, no sentido de que é “ao mesmo tempo, um enorme potencial de desenvolvimento e um enorme potencial de degradação sócio-ambiental”. Becker afirma que as praias ensolaradas são produtos de venda fácil, mercadorias valorizadas e criam uma multiplicação de serviços, de empregos diretos e indiretos e de circulação de mercadorias. Mas criam também um potencial de impactos perversos, tanto ambientais, como sociais.

O conceito de turismo adotado oficialmente pelo Brasil foi estabelecido pela Organização Mundial do Turismo (OMT), compreendendo “as atividades que as pessoas realizam durante viagens e estadas em lugares diferentes do seu entorno habitual, por um período inferior a um ano, com finalidade de lazer, negócios ou outras” (BRASIL, 2006, p. 4). Oscar de La Torre, por sua vez, ao definir o turismo, enfatiza as suas características complexas e diversificadas, com destaque para seus aspectos sociais, culturais e econômicos.

[...] fenômeno social que consiste no deslocamento voluntário e temporário de indivíduos ou grupos de pessoas que, fundamentalmente por motivos de recreação, descanso, cultura ou saúde, saem de seu local de residência habitual para outro, no qual não exercem nenhuma atividade lucrativa nem remunerada, gerando múltiplas inter-relações de importância social, cultural e econômica (BADARÓ, 2003, p. 21).

O turismo tem sido classificado de acordo com diferentes critérios. De acordo com a sua natureza (emissiva ou receptiva); de acordo com a nacionalidade do turista (nacional ou estrangeiro); observando-se o critério territorial, o turismo é considerado internacional, quando implicar a passagem, a travessia de fronteiras; pelo volume (de minorias ou de massas). Os destinos turísticos procurados por muitas pessoas, por exemplo, pertence ao turismo de massa. Conforme a autonomia, o turismo pode ser livre ou dirigido. Diversos outros tipos podem ser encontrados, de acordo com os critérios escolhidos para avaliação (BADARÓ, 2003).

De forma a organizar o turismo para fins de planejamento, gestão e mercado, o turismo tem sido tratado de forma segmentada. A partir da oferta, a segmentação define tipos de turismo, tais como: Ecoturismo, Turismo de Aventura, Turismo Cultural, Turismo de Pesca etc. Com enfoque na demanda, a segmentação pode ser classificada conforme grupo de consumidores, tais como: adolescentes, idosos, pessoas com deficiência, grupos familiares, grupos religiosos etc. (BRASIL, 2006).

Dentro dessa segmentação, o que interessa no presente estudo é o denominado Turismo de Sol e Praia; que também recebe outras acepções tais como: Turismo de Sol e Mar, Turismo Litorâneo, Turismo de Praia, Turismo de Balneário, Turismo Costeiro, entre outros. Para fins de formulação de políticas públicas, o governo federal considera o segmento como Turismo de Sol e Praia, constituindo-se das atividades turísticas relacionadas à recreação, entretenimento ou descanso em praias, em função da presença conjunta de água, sol e calor (BRASIL, 2006).

As atividades turísticas pertinentes a esse segmento são caracterizadas pela oferta de serviços, produtos e equipamentos de: operação e agenciamento turístico; transporte; hospedagem; alimentação; recepção e condução de turistas, além de outras atividades complementares. A recreação, entretenimento e descanso em praias estão relacionados ao divertimento, à distração ou ao usufruto e contemplação da paisagem. A combinação dos elementos de água, sol e calor constitui-se o principal fator de atratividade, ocasionada especialmente por temperaturas quentes ou amenas propícias à balneabilidade (MMA, 2010).

O Ministério do Turismo considera que, no Brasil, o turismo de praia surgiu no Rio de Janeiro, tendo se expandido para o Sudeste e o Sul e, posteriormente, para quase todo o litoral brasileiro. A partir dos anos 1970, porém, o Nordeste foi considerado como principal destino de Turismo de Praia do país (BRASIL, 2006).

 

A década de 1990 pode ser considerada como a ocasião em que o turismo passou a ocupar lugar de destaque no planejamento governamental federal, culminando na criação do Ministério do Turismo no ano de 2003. Grandes programas de governo surgiram nos anos 90. O Programa de Ação para o Desenvolvimento do Turismo no Nordeste (PRODETUR/NE) foi gestado nessa década, mais precisamente em 29/11/19917. Para alcançar os objetivos da Política Nacional de Turismo 1996-1999, bem como do Plano Nacional de Turismo de 2003-2007, o Governo Federal fortaleceu instrumental público de fomento ao setor, possibilitando linhas de financiamento, além de outras formas de incentivo financeiro com vistas a financiar o PRODETUR. Os programas governamentais implicaram, também, na criação de infraestruturas relativas a sistemas de engenharia. E foi nesse contexto que, em razão de suas qualidades naturais climáticas, o litoral nordestino passou a ser alvo privilegiado das mudanças ocorridas nessa década (CRUZ, 2005). “Como se sabe, o Prodetur- NE transforma o litoral nordestino em um extenso ‘canteiro de obras’, como resposta às demandas de um almejado turismo massivo e internacionalizado” (CRUZ, 2005, p. 33).

Mesmo diante do grande incentivo governamental para o desenvolvimento da atividade turística no país, na visão de Rita Cruz, o território, em si, foi negligenciado, ofuscado por uma visão econômica e economicista da atividade turística (CRUZ, 2005). Ao analisar o Plano Nacional de Turismo de 2003-2007, que por sua vez deu continuidade à Política Nacional de Turismo de 1996-99, Rita Cruz chega a afirmar que o que está nas linhas e entrelinhas do mencionado plano é o espaço reduzido à mercadoria, não se podendo deixar de considerar que o principal objeto de consumo do turismo é o espaço compreendido na sua totalidade(CRUZ, 2005). O planejamento do turismo, seja ele numa escala regional ou local, não se dá sobre um espaço “plano” ou “vazio”, Ao contrário, este planejamento se dá sobre um espaço concreto, herdado, histórica e socialmente construído (CRUZ, 2005).

Levando em consideração todas as atividades decorrentes do tipo de turismo que incide sobre as praias urbanas, bem como as alterações urbanísticas decorrentes, avalia-se que muitos desses locais têm sido transformados por uma racionalidade econômica estabelecida por padrões impostos pelo segmento.

E esse processo de mercantilização do espaço praiano costuma contar com o apoio governamental, que cria ou remodela infraestrutura para incentivar esse modelo econômico e

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facilitar as relações comerciais existentes. Não são raras as situações, em que a obtenção de recursos federais tem sido usada como fundamento para suprimir etapas de estudos ambientais ou para simplificar licenciamentos de obras potencialmente poluidoras do meio ambiente, em total dissonância com a Política Nacional do Meio Ambiente (Lei Federal 6.938/81) e o Plano Nacional de Gerenciamento Costeiro (Lei Federal 7.661/88). Conforme bem ressalta Becker (2001), em nível federal, existe um nítido conflito entre políticas setoriais, onde diretrizes desenvolvimentistas e ambientalistas por vezes se chocam, sendo a zona costeira o palco de tais choques.

Aspecto que merece destaque no que diz respeito à apropriação econômica do espaço praiano, refere-se aos conflitos que decorrem das relações sociais daqueles que exploram o espaço como mercadoria. Outro aspecto que demanda análise diz respeito à reorientação de usos