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Capítulo 2 – O Programa Minha Casa Minha Vida: da informalidade

2.2 Lei e Regulamentação do PMCMV para a Faixa 1

A Lei 11.977, lançada em 2009, regulamenta o Programa Minha Casa Minha Vida e dispõe das finalidades, recursos e regras aos quais os beneficiários se submetem em um período de 10 anos. Para fins de pesquisa, esse tópico tratará apenas das disposições previstas para a Faixa 1 do programa, relacionadas às diretrizes que norteiam o uso e à comercialização dos imóveis do PMCMV. A referida lei, que dispõe sobre o programa e documentos disponibilizados pela Caixa

Quanto vale a minha casa? CHAVES, Carina Aparecida Barbosa Mendes 52 Econômica Federal como o „Instrumento Particular de Compra e Venda‟ e a „Declaração do Beneficiário‟, ambos assinados pela população contemplada pelo Faixa 1 do programa, será analisada. Ao final, apresentam-se as discussões que se dão em torno do tema por meio dos “Projetos de Leis” apresentados na Câmara dos Deputados.

A Faixa 1 do programa, que beneficia a população de baixa renda (zero a R$1.800,00) é financiada com recursos advindos do Fundo de Arrendamento Residencial (FAR). Esse fundo é administrado pela Caixa Econômica Federal e tem o objetivo de investir em habitação para a população de baixa renda e em construção de “equipamentos de educação, saúde e outros complementares à habitação” (BRASIL, 2009, Art. 82-D). Para ter direito a essa categoria de imóvel, além da renda familiar ser de até R$ 1.800,00, a família não pode possuir outro imóvel7 ou já ter recebido benefícios habitacionais concedidos pelo FAR, do Fundo de Desenvolvimento Social (FDS) ou descontos do Fundo de Garantia do Tempo de Serviço (FGTS).

O artigo 6-A da Lei 11.977 trata dos subsídios concedidos a famílias do Faixa 1. O subsídio concedido aos beneficiários se dá na forma das prestações ao longo de 10 anos. Ao assinar o contrato com a Caixa Econômica Federal e ter o acesso à “chave” de seu imóvel, não é exigido um valor de entrada, pois o valor restante ao subsídio recebido é dividido nos 120 meses do financiamento e sem taxa de juros. O inciso I do art. 6-A dispõe que é exigido de cada beneficiário a participação financeira com as prestações mensais, o que Cardoso e Aragão (2013) chama de “valor simbólico” pago pelo beneficiário.

Ainda no que se refere ao formato do PMCMV para a faixa 1, destaca-se que a locação e a comercialização de tais imóveis são proibidas durante todo o período do financiamento, isto é, por 10 anos, desde a celebração do contrato com a Caixa Econômica Federal (CEF). O artigo 6-A, § 6o, enuncia sobre a proibição dos contratos de compra e venda quando diz que: “As cessões de direitos, promessas de cessões de direitos ou procurações que tenham por objeto a compra e venda

7 Para as famílias que foram removidas em razão de obras do PAC e ficaram desabrigadas, perdendo seu único imóvel ou estão com a moradia em situação de emergência, o teto de renda familiar se equipara ao do Faixa 2 e o critério de não possuir outro imóvel não se aplica.

Quanto vale a minha casa? CHAVES, Carina Aparecida Barbosa Mendes 53 promessa de compra e venda ou cessão de imóveis adquiridos sob as regras do PMCMV, quando em desacordo com o inciso III do § 5o, serão consideradas nulas”. Os incisos do § 5o enunciam que:

I – a subvenção econômica será concedida nas prestações do financiamento, ao longo de 120 (cento e vinte) meses;

II – a quitação antecipada do financiamento implicará o pagamento do valor da dívida contratual do imóvel, sem a subvenção econômica conferida na forma deste artigo;

III – não se admite transferência inter vivos de imóveis sem a respectiva quitação. (BRASIL, 2009)

Mais adiante, no artigo 7º, a Lei 11.977 estabelece que os desvios de finalidade aos subsídios concedidos acarretam pagamento integral da subvenção concedida e determina que os beneficiários do programa devem ocupar os imóveis em até 30 dias após a assinatura do contrato com a CEF. Assim, o artigo 7-B enumera três causas que podem fazer com que o beneficiário perca os subsídios concedidos e assim tenha o vencimento antecipado da dívida8 ou, na hipótese de não poder saldar com esse valor, perca o imóvel:

I - a alienação ou cessão, por qualquer meio, dos imóveis objeto de operações realizadas com recursos advindos da integralização de cotas no FAR antes da quitação de que trata o inciso III do § 5o do art. 6o-A desta Lei;

II - a utilização dos imóveis objeto de operações realizadas com recursos advindos da integralização de cotas no FAR em finalidade diversa da moradia dos beneficiários da subvenção de que trata o inciso I do art. 2o desta Lei e das respectivas famílias; e

III - o atraso superior a noventa dias no pagamento das obrigações objeto de contrato firmado, no âmbito do PMCMV, com o FAR, incluindo os encargos contratuais e os encargos legais, inclusive os tributos e as contribuições condominiais que recaírem sobre o imóvel.

8 O vencimento antecipado da dívida é o caso em que o contrato é finalizado antes do prazo e o valor total é cobrado antecipadamente.

Quanto vale a minha casa? CHAVES, Carina Aparecida Barbosa Mendes 54 Portanto, seja por atraso, utilização indevida do imóvel ou pela comercialização deles, o beneficiário corre o risco de perder o subsídio ou o próprio imóvel. As mesmas regras estão dispostas nos documentos acessados pelos beneficiários do programa. Ao se cadastrar para participação dos sorteios realizados pelas prefeituras junto à Caixa Econômica Federal, é exigido que se preencha a “Declaração do Beneficiário”, documento esse em que os interessados declaram a renda familiar; a não posse de outro imóvel na localidade em que residem; não recebimento de subsídios habitacionais; e, por fim, declaram “ter ciência de que o imóvel ora adquirido destina-se a residência do(s) adquirente(s), não podendo alugá- lo ou cedê-lo” (CAIXA, 2009).

No documento que o beneficiário assina com a Caixa Econômica Federal para o financiamento do imóvel com que foi contemplado, o “Instrumento Particular de Venda e Compra Direta de Imóvel Residencial com Parcelamento e Alienação Fiduciária”, é destacado, no item 1, que o subsídio concedido é pessoal e intransferível e, ainda, que esse imóvel se destina exclusivamente para a moradia do beneficiário e de sua família. Sobre a possibilidade de quitar antecipadamente o valor financiado, o mesmo documento diz:

É facultada ao(s) DEVEDOR(ES) a liquidação antecipada da dívida, apurada pelo saldo devedor atualizado [...] A quitação antecipada da operação implicará na obrigatoriedade de pagamento do valor integral da dívida contratada pelo DEVEDOR, sem a dedução decorrente da subvenção econômica, já concedida nas prestações vencidas, pagas ou não, e nas vincendas (CAIXA ECONÔMICA FEDERAL, 2015).

O contrato assinado pelo beneficiário adverte também que o imóvel, em todo o período em que se encontra financiado, “constitui patrimônio do FAR” e “será mantido sob a propriedade fiduciária da CAIXA”. A Caixa Econômica Federal salienta que caso exista a prática de comercialização e de locação do imóvel, ao conhecimento do órgão, este pode ser retomado. Destaca ainda que o beneficiário que foi contemplado uma vez com subsídios habitacionais não poderá novamente ter esse benefício.

Dadas as regras dispostas na Lei 11.977, que regulamenta o programa e reproduzidas nos documentos acessados e assinados pelos beneficiários, o tempo

Quanto vale a minha casa? CHAVES, Carina Aparecida Barbosa Mendes 55 de restrição à venda e à locação do imóvel produz diferentes opiniões na câmara dos deputados, o que são refletidos nos Projetos de Leis (PL) propostos. No ano de 2015, o PL 2450/2015 recomendou mudanças na Lei 11.977 exigindo maior rigor quanto às locações nos imóveis da Faixa 1. O PL 2450/2015 propôs que quando comprovado o caso de aluguel, o contrato teria que ser rescindido e os valores recebidos serem devolvido. O mesmo documento defende que o locatário do imóvel do PMCMV, no caso de se qualificar como beneficiário do programa, teria o direito de preferência para aquisição do mesmo imóvel. O argumento é que há um desvio quanto à finalidade do programa, quando seu proprietário se utiliza da moradia cedida pelo governo para lucrar. O parecer dado ao documento alega que as restrições de venda servem para evitar desvios como a especulação imobiliária e lucros de aluguéis por pessoas que não tenham real necessidade de moradia. Porém, esclarece que regras demasiadamente rígida podem fragilizar o programa e seus objetivos. Nesse propósito, o parecer defende que casos de exceções à comercialização sejam analisados, como por exemplo, de pessoas que, por motivos de força maior, necessitam se mudar de localidade ou famílias que tiveram melhorias financeiras e podem escolher outras localidades para a sua moradia. Foi proposto também pelo mesmo PL que o prazo para liberar o imóvel para a comercialização seja de cinco anos, tempo equiparado para a caracterização de usucapião dentro da legislação. No entanto, não foi considerado justo que o locatário do imóvel a ser retomado tenha preferência na aquisição, pois “se a o PL condena a cessão, venda ou aluguel de imóvel inserido no PMCMV, considera, por decorrência lógica, condenável a conduta de todas as partes de compactuam e participam desses contratos”. Além das opiniões até agora relatadas, existe quem defenda que sendo o imóvel do PMCMV um bem de seu proprietário, cabe a ele usá-lo com os mesmos direitos que cabem a qualquer outro proprietário (Brasil, 2016, p.8).

Em 2017, o Projeto de Lei nº 7141/2017 propôs que as restrições quanto à venda e locação sejam aplicadas também para as demais faixas de renda, podendo haver transferência apenas se o comprador se enquadrar nos mesmos requisitos exigidos pela faixa ao qual o mutuário está inserido.

Após a apresentação das regulamentações sobre os imóveis do PMCMV Faixa 1, o tópico a seguir dedica-se a maiores esclarecimentos sobre a alienação

Quanto vale a minha casa? CHAVES, Carina Aparecida Barbosa Mendes 56 fiduciária prevista no contrato assinado pelos beneficiários e o contrato de gaveta, forma alternativa utilizada como documento contratual entre as partes.