• Nenhum resultado encontrado

2.2 SÚMULA VINCULANTE

2.2.3 Previsão Normativa

2.2.3.2 Lei nº 11.417/2006

Após dois anos de inclusão do Art. 103-A, o mesmo fora regulamentado pela Lei nº 11.417, de 19 de dezembro de 2006, cujo objeto é a regulamentação do mencionado artigo constitucional, no que tange à edição, revisão e cancelamento das súmulas vinculantes emitidas pelo STF.

A referida regulamentação entrou em vigor três meses após a sua publicação. Registre-se que a mesma, foi alvo de muitas críticas, principalmente por

denotar uma preocupação política, de modo que o seu projeto (Projeto de Lei nº 13/2006) foi protocolado no Senado no mês de janeiro de 2006, sendo aprovado na Câmara dos Deputados (Projeto de Lei nº 6.636/2006) em novembro do mesmo ano, denotando celeridade no processo ordinário legislativo, o que não configura a normalidade do respectivo Poder, comparando-se a outros trâmites de Leis Ordinárias.

No referido diploma, visualiza-se os contornos específicos em relação à Constituição Federal do procedimento de aprovação da súmula vinculante. Nota-se que a legislação em análise, em determinados aspectos, ficaria em posição intermediária entre a Constituição e o RISTF, observando-se o disposto no § 2º do art. 3º e no art. 10 da Lei nº 11.417/06.

De fato, a previsão legal trouxe o seu próprio objeto, disposto no art.1º, reiterando a disciplina tratada em sede constitucional, especificamente no §§ 1º e 2º do art. 103-A da CF, a partir do seu art. 2º, §§ 1º e 2º, in verbis:

Art. 1o Esta Lei disciplina a edição, a revisão e o cancelamento de enunciado de súmula vinculante pelo Supremo Tribunal Federal e dá outras providências.

Art. 2o O Supremo Tribunal Federal poderá, de ofício ou por provocação, após reiteradas decisões sobre matéria constitucional, editar enunciado de súmula que, a partir de sua publicação na imprensa oficial, terá efeito vinculante em relação aos demais órgãos do Poder Judiciário e à administração pública direta e indireta, nas esferas federal, estadual e municipal, bem como proceder à sua revisão ou cancelamento, na forma prevista nesta Lei.

§ 1o O enunciado da súmula terá por objeto a validade, a interpretação e a eficácia de normas determinadas, acerca das quais haja, entre órgãos judiciários ou entre esses e a administração pública, controvérsia atual que acarrete grave insegurança jurídica e relevante multiplicação de processos sobre idêntica questão.

§ 2o O Procurador-Geral da República, nas propostas que não houver formulado, manifestar-se-á previamente à edição, revisão ou cancelamento de enunciado de súmula vinculante.152

152

BRASIL, Legislativo (2006). Lei nº 11.417, de 19 de dezembro de 2006.Regulamenta o artigo 103- A da Constituição Federal de 1988 e altera a Lei nº 9.784, de 29 de janeiro de 1999, disciplinando a edição, a revisão e o cancelamento de enunciado de súmula vinculante pelo Supremo Tribunal Federal, e dá outras providências. Disponível em: <http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/_Ato2004- 2006/2006/Lei/L11417.htm>. Acesso em 07 jun. 2012.

Observa-se que a Lei nº 11.417/06 prevê a manifestação prévia do Procurador-Geral da República, à edição, revisão ou cancelamento de súmula vinculante, nas propostas em que não houver formulado.

Quanto ao quórum, para edição, revisão ou cancelamento, verifica-se a reiteração do quanto disposto em sede constitucional, prevendo a manifestação de dois terços dos membros do Supremo, § 3º, art. 2º.

No que tange aos legitimados, o tratamento legal está disposto no art. 3°,

in verbis:

Art. 3o São legitimados a propor a edição, a revisão ou o cancelamento de enunciado de súmula vinculante:

I - o Presidente da República; II - a Mesa do Senado Federal;

III – a Mesa da Câmara dos Deputados; IV – o Procurador-Geral da República;

V - o Conselho Federal da Ordem dos Advogados do Brasil; VI - o Defensor Público-Geral da União;

VII – partido político com representação no Congresso Nacional; VIII – confederação sindical ou entidade de classe de âmbito nacional;

IX – a Mesa de Assembléia Legislativa ou da Câmara Legislativa do Distrito Federal;

X - o Governador de Estado ou do Distrito Federal;

XI - os Tribunais Superiores, os Tribunais de Justiça de Estados ou do Distrito Federal e Territórios, os Tribunais Regionais Federais, os Tribunais Regionais do Trabalho, os Tribunais Regionais Eleitorais e os Tribunais Militares.

§ 1o O Município poderá propor, incidentalmente ao curso de processo em que seja parte, a edição, a revisão ou o cancelamento de enunciado de súmula vinculante, o que não autoriza a suspensão do processo.

§ 2o No procedimento de edição, revisão ou cancelamento de enunciado da súmula vinculante, o relator poderá admitir, por decisão irrecorrível, a manifestação de terceiros na questão, nos termos do Regimento Interno do Supremo Tribunal Federal.153

Os legitimados supracitados podem ser teoricamente classificados em: legitimados universais ou neutros, legitimados especiais ou sectários e os municípios154.

Nesta senda, os legitimados universais ou neutros seriam todos aqueles que atuam na defesa geral dos interesses sociais, especificamente, o Presidente da

153

BRASIL, Legislativo (2006). 154

República; a Mesa do Senado Federal; a Mesa da Câmara dos Deputados; o Procurador-Geral da República; o Conselho Federal da Ordem dos Advogados do Brasil; o Defensor Público-Geral da União e partido político com representação no Congresso Nacional.155

De outro lado estão os legitimados especiais ou sectários, sendo aqueles que atuam na defesa específica de interesses inerentes à determinada categoria ou sociedade restrita à determinado território. São eles: a confederação sindical ou entidade de classe de âmbito nacional; a Mesa de Assembleia Legislativa ou da Câmara Legislativa do Distrito Federal; o Governador de Estado ou do Distrito Federal; e os Tribunais Superiores, os Tribunais de Justiça de Estados ou do Distrito Federal e Territórios, os Tribunais Regionais Federais, os Tribunais Regionais do Trabalho, os Tribunais Regionais Eleitorais e os Tribunais Militares.156

Por fim, observa-se a condição de legitimado do Município. Esse legitimado necessita titular a condição de parte em processo judicial para propor a edição, a revisão ou o cancelamento de súmula vinculante, sendo que o referido processo não será suspenso caso o mesmo exerça tal prerrogativa.157

Nesse caso, a LSV exige que o Município comprove ser parte no processo e que a proposta de cunho sumular seja incidental ao referido processo em tramitação.158

Ademais, impende ressaltar a possibilidade de restrição dos efeitos da súmula vinculante, conforme o previsto no art. 4º da LSV, dispondo que “a súmula com efeito vinculante tem eficácia imediata, mas o Supremo Tribunal Federal, por decisão de 2/3 (dois terços) dos seus membros, poderá restringir os efeitos vinculantes ou decidir que só tenha eficácia a partir de outro momento, tendo em vista razões de segurança jurídica ou de excepcional interesse público”.159

De acordo com tal previsão, observa-se a possibilidade de restrição dos efeitos vinculantes e a restrição temporal da eficácia do enunciado da súmula vinculante para outro momento (futuro).160

155 Ibidem, p. 132-133. 156 Ibidem, p. 133. 157

CADORE, Márcia Regina Lusa. Op. Cit., p. 140. 158

TAVARES, André Ramos. Op.Cit., p. 20. 159

BRASIL, Legislativo (2006). 160

Como já verificado anteriormente, o efeito vinculante não atinge o Poder Legislativo, e nem o próprio Supremo, sendo que, deste modo, a alteração ou revogação de lei em que tenha baseado a formalização de súmula vinculante autoriza a revisão ou o cancelamento da mesma. Essa é a previsão do art. 5º da Lei em análise que é alvo de críticas, porquanto não obriga a revisão ou o cancelamento, deixando em aberto o procedimento.

Outra previsão que comporta crítica é a do art. 10 do mesmo diploma legal, posto que confere poderes ao RISTF, na condição de normatividade subsidiária, ao procedimento de edição, revisão e cancelamento de súmula vinculante. Nesse sentido, observa-se a ratificação da argumentação supra, de que a Lei nº 11.417/2006 estaria em localização intermediária entre a Constituição e o RISTF.

Por fim, impende destacar outras duas novidades trazidas pela LSV: o contencioso administrativo obrigatório mitigado e a responsabilização plena do administrador público, construções conceituais de André Ramos Tavares.161

Com efeito, o §1º do seu art. 7º estabeleceu um contencioso administrativo mitigado, uma vez que a exigência de esgotamento das vias administrativas aplica-se exclusivamente à reclamação por eventual descumprimento de súmula vinculante, referente a ato ou omissão da Administração. Nesse caso, apenas se houve o ingresso com a reclamação é que deverá cumprir o requisito do prévio esgotamento das instâncias administrativas.162

No caso da responsabilização plena do administrador público, o art. 9º da LSV alterou a Lei nº 9.784/99163, que regula o processo administrativo no âmbito da Administração Pública Federal, para regulamentar a responsabilização pessoal da autoridade e órgão administrativos, para André Ramos Tavares, em caso de

161

TAVARES, André Ramos. Op.Cit., p. 20-21. 162

TEIXEIRA, Oldemir Bilhalva. Op. Cit., p. 135. 163

Art. 64-A. Se o recorrente alegar violação de enunciado da súmula vinculante, o órgão competente para decidir o recurso explicitará as razões da aplicabilidade ou inaplicabilidade da súmula, conforme o caso. (Incluído pela Lei nº 11.417, de 2006).Art. 64-B. Acolhida pelo Supremo Tribunal Federal a reclamação fundada em violação de enunciado da súmula vinculante, dar-se-á ciência à autoridade prolatora e ao órgão competente para o julgamento do recurso, que deverão adequar as futuras decisões administrativas em casos semelhantes, sob pena de responsabilização pessoal nas esferas cível, administrativa e penal. (Incluído pela Lei nº 11.417, de 2006). BRASIL, Legislativo (1999)c. Lei nº 9784, de 29 de janeiro de 1999.Regula o processo administrativo no âmbito da Administração Pública Federal. Disponível em :<www.planalto.gov.br/ccivil_03/leis/L9784.htm>.Acesso em: 07 jun. 2012.

“descumprimento de súmula vinculante cuja incidência para caso semelhante já tenha sido determinada em sede de reclamação pelo STF”.164

Segundo o supracitado autor, essa regulamentação seria “um mecanismo que procura, de maneira radical, cercar a Administração Pública para que cumpra o estabelecido em súmula vinculante. A ideia é clara: diminuir o número de contendas envolvendo a Administração Pública”.165

Destarte, em que pese a Lei nº 11.417/2006 regulamentar os procedimentos e determinados efeitos quanto à edição da súmula vinculante no ordenamento jurídico brasileiro, nota-se a opção do legislador em deixar nas mãos do Poder Judiciário o tratamento do instituto no que se refere à sua pratica.

Indaga-se, portanto, se o referido instituto seria ou não mais uma opção legislativa em transferir o trabalho de interpretação da norma para a Justiça, utilizando-se do manto que é formado pela defesa suprema da sua celeridade processual com o consequente “desafogamento” dos processos da Suprema Corte brasileira.

Essa aresta, de caráter obscuro, situada nos corredores que ligam os Poderes Legislativo e Judiciário, é o grande enigma a ser desvendado na prática dos intérpretes brasileiro, posto que o tratamento dado à súmula vinculante está longe dos caracteres existentes na estrutura do stare decisis, o que gera variadas dúvidas quanto ao seu papel de guardiã da segurança jurídica.

2.3 DOS REQUISITOS E PROCEDIMENTOS PARA APROVAÇÃO, REVISÃO E