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LITERATURA AFRO-BRASILEIRA: A HORA E A VEZ DOS NEGROS NAS PÁGINAS LITERÁRIAS

No documento Ensino de literatura no ensino fundamental (páginas 195-198)

LITERATURA AFRO-BRASILEIRA E IDENTIDADES: A HORA E A VEZ DOS

5 LITERATURA AFRO-BRASILEIRA: A HORA E A VEZ DOS NEGROS NAS PÁGINAS LITERÁRIAS

Percorremos um caminho histórico e social, tendo como guia o texto literário, expressão estética que há séculos nos encanta, nos seduz e também nos ensina, na medida em que nos torna seres humanos mais críticos. Traçamos de forma objetiva o percurso e as mudanças ocorridas na literatura infantil e juvenil até chegar ao nosso foco de interesse maior que é a literatura afro-brasileira. É, pois, através dessa literatura também que as personagens negras deixam de ser invisibilizadas e vistas através de um único ângulo, obtuso e euro descendente, mas por diversos outros, poderosos, belos e multiculturais. Entendemos ser fundamental trabalhar com essa modalidade literária, não por mero modismo mercadológico,

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mas para que nossos adolescentes afro-brasileiros possam se reconhe- cer nela, ou seja, para que possam ver-se textualmente retratados de forma positiva, humanizada, sem estereótipos e respaldados por uma nova visão pluri(multi)cultural capaz de traduzir a riqueza do povo brasi- leiro. Reiteramos também nosso desejo de formar leitores para a vida e para sociedade – não somente para os bancos escolares –, pois só assim teremos cidadãos capazes de ler/ler-se o/no outro, isto é, entendendo a leitura na sua multiplicidade, seja ela histórica, social, cultural e humana. Assim, pensamos a literatura enquanto direito, enquanto resistência, enquanto acesso a formação integral do leitor. Este direito deve ser exer- cido primordialmente na escola para que nossas crianças e jovens possam ser estimulados a se tornarem leitores literários, ou seja, leitores mais plurais e mais sensíveis à palavra enquanto arte. Este caráter humanizador tem a função de revelar o homem em sua essência e atuar na sua formação cidadã. Nesse sentido, a literatura é entendida como uma imitação da vida, que nos abre as portas de um mundo novo, que não se encerra na última palavra, do último parágrafo, de um livro literário. Ao contrário, esta função humanizante, permanece incorporada ao leitor como vivência e experiên- cia de vida, às quais estão diretamente relacionadas ao seu conhecimen- to de mundo e ao seu universo social, possibilitando-lhe estabelecer um significado único e pessoal para o texto. Ressaltamos que, embora, a lite- ratura tenha um caráter ficcional, retrata a sociedade, em muitos aspectos, mostrando seus vícios, mazelas e também suas qualidades e esperanças, espelhando-a em seus processos.

O valor da leitura tem sido reconhecido como uma base insubstituível para a aprendizagem e para o enriquecimento interior, bem como para a forma- ção cultural e identitária de nossos alunos. Com base nestas premissas esperamos que a literatura tenha mais espaço dentro de nossas salas de aula, não como mero coadjuvante, mas como peça principal capaz de: (i) humanizar-nos diante do Outro, (ii) fomentar a valorização da convivên- cia na diversidade e na pluralidade, (iii) contribuir para a (re)construção da identidade e da autoestima das crianças e jovens afrodescendentes e, (iv) fazer com que os demais alunos entendam e respeitem a diversidade étnico-racial existente aqui, no Brasil.

O contato com o texto literário, o quanto antes, é imprescindível para o amadurecimento, para o desenvolvimento emocional e cognitivo de nossas crianças e adolescentes, para que possam se transformar em cidadãos mais críticos e conscientes de si e do mundo que os circundam. É preciso que atentemos à história da Literatura e às forças ideológicas que atuam sobre ela, para que possamos utilizá-la de forma crítica e responsável na sala de aula visto que Literatura Infantil e Juvenil (LIJU) é, antes de tudo, Literatura, ou melhor, é uma arte que representa o mundo, o homem e a vida de maneira criativa, mas também leva a juven- tude a questionar a estrutura social, a promover o diálogo com outras

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artes e outros tipos de texto. Assim, nossos jovens alunos podem inte- ragir de maneira mais dinâmica e autônoma com o mundo das letras, ou seja, por meio da motivação e da atitude colaborativa do professor. Não devemos, contudo, nos esquecer de que o adolescente muitas vezes paira num mundo de abandono e silenciamento, portanto é essencial que o professor pense e escolha um livro que lhe traga “vivências próximas às suas e questionamentos semelhantes aos seus” (GREGORIN FILHO, 2011, p. 72) para que pratiquem o diálogo com o outro e exerçam sua cidada- nia, na sociedade na qual estão inseridos, desde a mais tenra idade.

Sabemos que é recente a aparição de personagens negras na LIJU. Somente no século XX, durante o início da década de 1920 e final da déca- da de 1930, é que as personagens negras começam a surgir nas histórias infantis até então ocupadas somente por personagens brancas (JOVINO, 2006). As personagens negras (homens, mulheres e crianças), quando apareciam nas histórias infantis e juvenis, reforçavam o imaginário este- reotipado de que os negros eram ignorantes, animalizados, subalternos, conformados, feios e satânicos. Dessa forma, o negro era retratado, tanto na História quanto na Literatura, por poetas e romancistas, de forma este- reotipada e caricata. Tanto é que mesmo aqueles que descreviam o negro com mais afeição e simpatia, como Castro Alves, ainda no século XIX, não se identificavam com a história nem com a cultura desse povo. Apenas correspondiam ao momento histórico-social no qual viviam, retratando o negro num misto de idealização e medo (SOUZA et al., 2005).

Após a abolição da escravatura, a exibição do negro como objeto e merca- doria, pertencente a um dono, é substituída pelo discurso do negro livre. Entretanto, ele continua a ser exposto ora como sujo, bruto, tentação carnal, ora como um “pai João” pacato, passivo e inerte. A essa “imagem” de resignação e passividade podemos agregar, ainda, figuras/persona- gens das obras de Lobato, como Tia Anastácia e Tio Barnabé. O movimen- to modernista pode exemplificar essa situação, pois tem como objeto ideológico a exaltação dos valores nacionais, promovendo a valorização do negro e do índio. Porém, o negro é retratado como uma criatura exóti- ca e com a sexualidade à flor da pele. O índio, por outro lado, é totalmente idealizado e esculpido à moda não apenas do colonizador europeu, mas também dentro de um padrão imaginado para a nossa brasilidade, àquela altura (SOUZA et al., 2005). Reiteramos também nosso desejo de formar leitores para a vida e para sociedade - não somente para os bancos esco- lares -, pois só assim teremos cidadãos capazes de ler/ler-se o/no outro, isto é, entendendo a leitura na sua multiplicidade, seja ela histórica, social, cultural e humana.

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6 LITERATURA E IDENTIDADE: SEQUÊNCIA DIDÁTICA

No documento Ensino de literatura no ensino fundamental (páginas 195-198)