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3.4 Um Outro Rumo (1)

Apresento a seguir a narrativa de um outro procedimento de escrita das Histórias de Família: fotografias. A narrativa refere-se à história de escrita da aluna participante Camila e sua família.

3.41. Desenvolvendo narrativas de vida por fotografias

[...]

O retrato não me responde, Ele me fita e se contempla Nos meus olhos empoeirados.

E no cristal se multiplicam Os parentes mortos e vivos Já não distingo os que se foram Dos que restaram. Percebo apenas

A estranha idéia de família Viajando através da carne. (Carlos Drummond de Andrade)

3.4.1.1. Imagens sem identificação, sem identidade... sem história

No processo de escrita das Histórias de Família, deparei-me com uma situação que muito me inquietou: alguns alunos anexaram, à narrativa, fotografias antigas da família, sem identificação e sem registro de suas histórias de vida.

Pareceu-me que a maioria dessas famílias tem guardado as fotos que vêm sendo passadas de geração em geração: retratos dos tataravós guardados pelos bisavós; retratos das bisavós guardados pelos avós; retratos dos avós guardados pelos pais. Assaltou-me a incômoda incerteza: os retratos dos pais serão guardados pelos filhos? Até que ponto as gerações mais recentes atribuem valor a esses retratos de pessoas das gerações mais antigas, cujas histórias de vida cada vez menos se conhecem? Até quando preservá-los?

Kossoy (2000, p. 128) faz uma descrição dos fatos que vêm acontecendo com as fotografias de família, pessoas estimadas que, um dia, foram retratadas em sua época, mas com o passar das gerações, não se conhecem mais seus nomes e se perdem as referências de quem foram e do que representaram. Essas pessoas retratadas tornam-se estranhas dentro da casa e, afirma:

Milhões de imagens foram destruídas desde o advento da fotografia, inúmeras em virtude de catástrofe e guerras, porém, a maioria certamente, pela vontade do homem. Desaparecidos os referentes ficaram apenas as representações. Essas ainda são mantidas pelos descendentes mais próximos, até o momento em que, mais tarde, passam a ocupar demasiado espaço nas casas dos descendentes afastados; em épocas mais recentes essas imagens já se constituem, efetivamente, um estorvo. [...] Essa gente toda, inquilinos desconhecidos da memória, deve ser de alguma forma desalojada, despejada... e o é de várias maneiras.

Conversando com os alunos sobre as fotografias da família, perguntei-lhes onde suas famílias costumam guardá-las e eles disseram que as fotos são guardadas em sacos plásticos ou envelopes, em caixas de papelão ou em latas junto com as cartas antigas, ou em álbuns de plástico que vêm juntamente com as fotos, após terem sido reveladas. Há também, os álbuns de papel grosso, de capa dura, reservados para as fotos mais significativas da família. Disseram, também, que algumas fotografias antigas, em preto e branco, estão emolduradas e suspensas nas paredes da casa e, as atuais e coloridas estão em porta-retratos, sobre os móveis da sala ou dos quartos.

Comecei a prestar mais atenção nas muitas fotografias que meus alunos traziam para a sala de aula. Traziam-nas, dentro de envelopes ou em sacos plásticos transparentes e já amarelados pelo tempo. Eram imagens de uma época, já um tanto antiga. A maioria eram fotografias em preto e branco de pessoas retratadas em trajes que costumavam usar quando iam à missa ou, então, naquelas roupas que ficavam reservadas aos momentos importantes.

Parece relevante, também, observar como as fotos antigas têm, todas elas, características muito parecidas: a pose dos fotografados, os enquadramentos revelavam o caráter de perenidade, marcadas para a posteridade. Pode-se considerar a evolução da fotografia e dos modos de fotografar até a digitalização. Essa, a foto digital, parece revestida do caráter de efêmero. Essas fotos digitalizadas são para o momento e podem ser apagadas em seguida.

Kossoy (2000) observa que a fotografia faz uma conexão com a realidade primeira que a gerou. Porém, quando se perdem os dados sobre aquele passado e não mais existindo informações dos referentes, resta apenas uma imagem perdida, sem identificação, sem identidade e sem história.

Por essas razões, descritas nos parágrafos acima, resolvi desenvolver um estudo de escrita de Histórias de Família, com as fotografias antigas e buscar recuperar as histórias de vida daquelas pessoas.

A aluna-participante das Histórias de Família, pelo procedimento Fotografias é Camila. Sua família tem guardadas as fotografias dos tataravós, dos bisavós, dos avós, enfim, daquelas pessoas que viveram, em outras gerações.

3.4.1.2. História de escrita de Camila

Camila era aluna de uma turma de trinta e dois alunos de sétima série, para a qual foi proposta a escrita das Histórias de Família. Camila escreveu a primeira narrativa das Histórias

de Família utilizando um roteiro de entrevista, o qual foi desenvolvido com a família para obter as informações do passado.

Um fato curioso: a aluna anexou fotografias antigas e aquelas pessoas retratadas, na foto, não estavam identificadas por seus nomes.

Inseri, nesta minha narrativa, uma fotografia da família porque acredito que a visualização contribui com dados para o desenvolvimento de minha escrita e para a leitura deste capítulo. As imagens, abaixo, me inspiraram a desenvolver este estudo de escrita das Histórias de Família.

Foto 25