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CAPÍTULO 3: JORNADA METODOLÓGICA

3.2. Caminhada pela Pesquisa Narrativa

3.3.1. Abrindo as portas da sala de aula

3.3.1.2 Roteiro de entrevista

Por se tratar, naquele momento, de outro gênero textual – a entrevista, procurei apresentá-lo destacando sua forma característica, a qual se apresenta numa estrutura marcada por perguntas feitas pelo entrevistador e respostas fornecidas pelo entrevistado.

Quanto aos tópicos da entrevista, tomando como base a leitura de Ilka Laurito (1999), recorremos aos assuntos tratados por ela, nas narrativas “A menina que fez a América” e “A menina que descobriu o Brasil”. Verificamos como importantes a identificação da pessoa, o trabalho da família, a caracterização de pessoas, os lugares, as brincadeiras de infância, a escola, a religião, as histórias fantásticas, as atividades de lazer, o casamento, o nascimento dos filhos, as alegrias, as tristezas, bem como a reflexão sobre o atual momento. Em seguida, elaboramos um roteiro de entrevista, com perguntas que buscaram as memórias da família, acerca dos referidos temas.

Abaixo, no Quadro I – “Roteiro de Entrevista”, apresento as perguntas que o constituíram.

Perguntas ROTEIRO DE ENTREVISTA

01 Qual é o seu nome completo, data e local de nascimento?

02

Você poderia falar algo sobre seus pais? Quem foram eles?Onde moravam? Como viviam?

03 Você poderia descrever o lugar onde morava com seus pais? 04 Quanto à sua infância, quais eram os brinquedos e como eram as

brincadeiras?

05 Quanto à escola, como era escola, os professores, quando você estudava ?

06 Sobre religião, você e sua família freqüentavam alguma igreja? 07 Que tipo de histórias ou músicas você conheceu, na sua infância? 08 Como você se divertia, naquela época?

09 Como era o relacionamento entre as pessoas da família?

10

Como foi que você conheceu a mãe (ou o pai)? Como foi que o senhor conheceu a avó (ou o avô)?

11 Que tipo de dificuldades você encontrou na educação dos filhos? 12 Você saberia citar uma grande alegria de sua vida? Por quê? 13 Você saberia dizer uma grande tristeza de sua vida?

14 Como você se vê, hoje, diante de todas as suas experiências? O que você pensa de tudo isso?

15 Outras perguntas, que gostaria de fazer ? Quadro I: Roteiro de Entrevista

Em seguida, orientei os alunos a esclarecer à família o objetivo da entrevista e que a mesma fosse desenvolvida por meio de um diálogo, levando-se em conta, principalmente, o fato de as pessoas que seriam entrevistadas serem membros de suas respectivas famílias. Informei, ainda, que a entrevista com a família poderia ser gravada, em áudio, ou anotada pelo próprio entrevistador.

As entrevistas não foram realizadas num mesmo momento por todos os alunos, tendo em vista que alguns tiveram que se deslocar para outras cidades, enquanto outros tinham seus parentes próximos às suas casas. As entrevistas foram realizadas durante a segunda e terceira semana de abril de 2004.

Os alunos trouxeram as informações das pessoas e dados de gerações anteriores: bisavós, avós, pais e tios, das famílias paterna e materna. Diante de tantas informações de diferentes pessoas, não sabiam como organizá-las no texto.

Para elucidar as dúvidas que surgiam, desenvolvemos uma análise das leituras realizadas com o objetivo de rever o esquema textual do gênero narrativo. Em “A menina que fez a América” e “A menina que descobriu o Brasil”, a autora escreveu a história de cada membro da família em capítulos individuais e organizou-os segundo seqüência temporal - do antigo para o atual (do passado para o presente).

Na tentativa de elucidar o esquema textual da narrativa de vida, neste caso individual, lemos o texto biográfico “Fotografia”, de Sebastião Salgado. A leitura permitiu-nos conhecer o fotógrafo brasileiro, sua trajetória pelo mundo quando documenta a história fotografando e sua posição política acerca da miséria por que passam os migrantes das e nas várias partes do mundo. Quanto ao esquema textual, propus que os alunos verificassem o assunto do texto: identificar a história de um narrador ou de uma terceira pessoa; a incidência de datas: análise do emprego do adjunto adverbial de tempo; os locais por onde passou o narrador: análise do emprego do adjunto adverbial de lugar e os tempos verbais da narrativa: observar o uso do

verbo no pretérito. O texto forneceu algumas pistas quanto à organização. Em Fotografias, os fatos e os eventos aparecem em uma seqüência temporal.

3.3.1.3. A estruturação do texto

Tomando como base este método cronológico de organização, os alunos, ao produzirem as narrativas das histórias de suas famílias, escreveram as histórias de seus bisavós, avós, pais, tios, irmãos, separadamente.

Atentos à ordem cronológica dos eventos, as histórias individuais foram organizadas na seqüência dos acontecimentos, sendo que a progressão da narrativa direcionava a configuração textual.

A atividade de escrita começou a ser desenvolvida no final de abril. Os alunos, ao entregarem a primeira versão de seus textos, apresentavam comportamentos diferentes. Enquanto alguns traziam, orgulhosamente, a história escrita e comentavam os fatos da vida de uma determinada pessoa da família, outros pediam que seus textos não fossem lidos em sala.

A leitura das narrativas trouxe muita informação a respeito da realidade dos alunos e, ao mesmo tempo, foi prazerosa. Em cada texto, conhecia-se uma nova história.

3.3.1.4. O processo de escrita

Uma trajetória de leitura de cada produção textual repercutiu numa relação interlocutiva entre mim e o aluno escritor sobre o que ele tinha a dizer. Cada texto foi discutido individualmente com o aluno, pois considerei não apenas as diferentes histórias e problemas textuais de cada um, mas também o respeito à privacidade do aluno e à de sua família. Debruçamo-nos sobre o texto e lemos as histórias que ele trazia - temas diversos que retratavam culturas de países e estados diferentes. Registravam, ainda, comportamentos marcados por hábitos antigos, rompimento de famílias motivado por preconceito racial, a religiosidade presente no dia-a-dia da comunidade (terços, missas, festas religiosas, etc.), as escolas da época dos avós lembradas por suas festas e comemorações cívicas, entre outros.

A interlocução entre mim e o aluno como norteadora do processo de ensino- aprendizagem favoreceu reflexões acerca dos diversos aspectos da produção do texto. As diversas perguntas que o texto narrativo suscitava foram se transformando em assuntos da narrativa, à medida que eu fazia intervenções. Como leitora de meus alunos, comecei a conhecê-los melhor, e assim, interessei-me por suas histórias e passei a direcionar a atenção dos alunos para a necessidade de se observar a forma de dizer o que tinham a dizer.

A produção de texto das Histórias de Família se desenvolveu no período de quatro meses, no qual a narrativa passou por fases de reelaboração que envolveu atividades de reflexão e de operações com a linguagem.

O processo de produção escrita das narrativas também incluiu os aspectos que foram emergindo enquanto refletíamos sobre os textos produzidos. Esses aspectos são:

3.3.1.5. Interdisciplinaridade com História

Diversos assuntos entravam nas Histórias de Família, com destaque para as migrações. Considerei oportuno tratar desse assunto, neste contexto no qual os alunos estavam conhecendo as experiências de suas famílias. Propus uma parceria com as professoras de História e Geografia destas mesmas turmas, para que assuntos relacionados ao processo de imigração, no Brasil fossem tratados. Sugeri às colegas que desenvolvêssemos aulas relacionadas às vivências relatadas pelas famílias de nossos alunos, considerando aspectos relacionados à religiosidade, educação e, notadamente, o analfabetismo, uso de línguas estrangeiras, culinária, artes, etc., sob o ponto de vista do conhecimento da Geografia e da História e da Língua Portuguesa.

A parceria foi possível com a professora de História, que tratou do processo de imigração no Brasil, solicitando uma pesquisa acerca do país de origem de cada família, com aulas expositivas relacionadas ao assunto. Parte deste material produzido pelos aprendizes, nesta disciplina, foi incorporada à produção das Histórias de Família.