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CAPÍTULO 3: JORNADA METODOLÓGICA

3.5. Um Outro Rumo (2)

A narrativa que apresento a seguir refere-se ao outro procedimento de escrita das Histórias de Família: autobiografias. Trata-se da história de escrita do aluno participante Arley e sua família.

3.5.1 Desenvolvendo narrativas de vida por autobiografias

Este procedimento de escrita das Histórias de Família apresenta características, particularmente diferentes. Trata-se de uma escrita produzida por membros da família, com a participação do aluno num compartilhamento de experiência de letramento.

Tendo em vista que esta pesquisa se situa no âmbito do ensino da língua e, considerando o aluno como o sujeito aprendiz da escrita deste gênero, faz-se necessário um esclarecimento das atividades de linguagem desenvolvidas por ele e das suas formas de participação nesse processo.

Quanto às atividades de linguagem, o aluno transcreveu a narrativa oral dos avós e escreveu a história de vida da bisavó, como também produziu textos sobre a reflexão acerca da experiência do vivido familiar e as configurou no texto, organizando a ordem seqüencial das autobiografias.

3.5.1.1. História de escrita do Arley

Arley entregou a primeira versão escrita das Histórias de Família. Ao perguntar ao aluno como tinha sido a entrevista com a família, ele me informou que não tinha conseguido realizá-la conforme planejara, pois o avô contava histórias que não tinham sido perguntadas e, seu jeito rápido de dizê-las não permitiu que ele as anotasse. Ao realizar a leitura da primeira versão, notei que algumas experiências tinham sido escritas pelo próprio sujeito que as viveu ou testemunhou.

Tal fato chamou minha atenção. Pareceu-me curioso o fato de o avô contar histórias que lhe eram significativas e não aquelas previstas no roteiro. O envolvimento de membros da família que escreviam suas próprias histórias também foi um dado que eu não havia previsto. Não queria ignorar o avô e seu impulso de contar suas próprias histórias, tampouco o fato de haver outros membros da família participando da escrita.

Assim, busquei uma forma de aproveitar aquelas realidades, transformando-as em procedimento de escrita das histórias dessa família. Propus um processo de produção de texto pelo qual os membros da família tivessem a oportunidade de escrever, do próprio punho, histórias de vida nas quais pudessem contar aquelas experiências que lhes foram significativas.

A minha visita à família foi uma oportunidade de conhecê-los. A proposta de escrita autobiográfica foi aceita pelos pais e pelo tio. O avô respondeu-me que gostava muito de contar suas histórias, mas quanto à escrita de sua história de vida, achava que não seria capaz de fazê-la, pois escrevia apenas coisas simples, no seu dia-a-dia. A avó respondeu-me que sua história de vida daria um livro, no entanto não saberia como escrevê-la e que sentiria vergonha da caligrafia que nunca foi boa. Ao propor-lhes narrativa autobiográfica, os avós disseram que prefeririam contar, oralmente, suas experiências, a escrevê-las.

Desta forma, combinamos que os membros da família poderiam escolher uma forma. Poderiam optar por contar suas histórias e teriam suas falas gravadas em áudio e, posteriormente, transcritas, como também poderiam escrever, eles mesmos, suas narrativas de vida. Combinamos, ainda, que as narrativas colhidas, por meio da gravação, seriam também transcritas.

De acordo com esse critério, os pais, o tio-avô fizeram a opção pela escrita da narrativa autobiográfica. Os avós fizeram a opção por contar, oralmente, suas histórias de vida. Quanto à bisavó, propus ao aluno que escrevesse a história da vida dela, pois ela, sendo analfabeta, não teria condições de fazê-lo.

O aluno assumiu a responsabilidade de coordenar as atividades que foram planejadas com os membros de sua família, da seguinte forma: (a) acompanhou o processo de escrita pelos membros (essas pessoas, ao entregarem a escrita, se mostraram preocupados com questões ortográficas, solicitando ao aluno a correção); (b) escreveu a narrativa de vida da bisavó; (c) participou dos encontros com os avós (eu e o aluno constituímo-nos como escutadores das histórias que os avós, como narradores, tinham para contar).

Em seguida, o aluno digitou as narrativas autobiográficas das pessoas que optaram pela escrita de suas experiências. O aluno e eu fizemos a transcrição das histórias contadas: eu ditava os enunciados dos avós e o aluno os transcrevia.

Sobre essa produção textual - as experiências da família - Geraldi (1993) observa que num projeto desenvolvido, na escola, sobre a escrita da história de família do aluno, se o vivido ficar apenas no registro corre-se o risco de não haver uma reflexão. Considera que o vivido passa a ser o ponto de partida para a reflexão e para que isso ocorra a ação educativa do professor é fundamental.

Pensando nestas questões abordadas pelo autor, preocupei-me em interagir com o aluno sobre essa produção. Lemos as narrativas autobiográficas e de cada uma, destaquei as experiências, bem como a forma de cada um de dizê-las. Procurei dialogar com o aluno sobre

os temas. Em seguida, pedi-lhe que escrevesse suas reflexões sobre as experiências de sua família e as configurasse na narrativa.

Síntese do capítulo

Nesse capítulo, apresentei a busca por uma metodologia de pesquisa. A minha opção pela Pesquisa Narrativa pareceu-me coerente, considerando não apenas o trabalho desenvolvido em sala de aula com narrativas de vida, mas também os aspectos ligados ao método investigativo e estratégia de formação.

Discorri o percurso dessa metodologia, neste estudo com histórias de família. Na primeira parte, apresentei os paradigmas nas vozes de Clandinin & Connelly (2000) e Cunha (1997). Apresentei o contexto de pesquisa, os alunos participantes e os procedimentos de coleta e análise do material documentário.

Na segunda parte, descrevi os três procedimentos de escrita das histórias de família: (1) roteiro de entrevista; (2) fotografias e (3) autobiografias.