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Múltiplos presbíteros

No documento Igreja Forma e Essencia - Gene a. Getz (páginas 155-161)

Que podemos dizer com certeza acerca da existência de múltiplos presbíteros em uma determinada igreja?

Primeiramente, é certo que a Bíblia sempre fala de “presbíteros” da igreja, ou seja, a palavra vem no plural. A única exceção é quando o presbítero é mencionado como pessoa (veja 1 Tm 3.1, 2), mas aí também esse tipo de referência está sempre no contexto de plu­ ralidade.

Em segundo lugar, a palavra igreja, quando empregada para falar de igrejas locais, foi usada pelos escritores bíblicos em referência a todos os fiéis de determinada área, quer se reunissem regularmente, quer não. Por exemplo, Lucas referiu-se à “igreja em Jerusalém” (At 8.1). Mas, pelos registros bíblicos, sabemos que os cristãos não puderam continuar reunindo-se num só local. Não havia um prédio suficientemente grande, nem teriam permissão para se reunir, caso houvesse. O fato é que, no início, reuniam-se no templo (2.46a). Em conseqüência, pouco depois da fundação da igreja, eles reuniram-se junto ao pórtico de Salomão para ouvir Pedro pregar. Em conseqüência, tanto Pedro quanto João foram presos (3.11; 4.1-3). Finalmente, a perseguição atingiu toda a igreja, e Lucas registrou que “todos, exceto os apóstolos, foram dispersos pelas regiões da Judéia

e de Samaria” (8.1). Até isso ocorrer, em Jerusalém, o lugar normal para reuniões eram as casas. Eles se reuniam “de casa em casa”

(2.46b). ^

A igreja de Éfeso dá-nos outro exemplo. Lucas referiu-se aos “presbíteros da igreja” daquela cidade (20.17). Nessa passagem a palavra presbítero está no plural, sendo usada em conjunto com um singular, a igreja local, única, da mesma forma que em Jerusalém (21.28). Mas isso não se refere ao fato de que a igreja possuísse um local de reuniões permanente ou mesmo temporário, como é comum em nossa cultura americana no século xx. E verdade que Paulo se reuniu com cristãos (e provavelmente não-cristãos) diariamente na escola de Tirano durante um período de dois anos (19.9, 10). Mas o contexto deixa claro que esse não era o lugar em que a igreja se reunia regularmente para comunhão, adoração e ensino. Em vez disso, sem dúvida também se reunia em lares. '

O fato é que não conseguimos encontrar nenhum registro sobre prédios de igrejas, tal como estamos acostumados a pensar neles, senão nalgum momento do século III. Aliás, um dos primeiros prédios utilizados basicamente como lugar de reuniões regulares dos cristãos foi descoberto por arqueólogos nas ruínas da antiga cidade de Dura- Europus, no deserto da Síria. Era usada como residência de uma pessoa de posses. A data da construção seria 232-233 d.C .14

Antes de tirar alguma conclusão, examine mais um exemplo do Novo Testamento. Paulo deixou Tito em Creta para ajudar essas novas igrejas a se organizar. O processo era nomear “presbíteros [...] em cada cidade” (Tt 1.5). Mais uma vez encontramos a palavra presbítero no plural. Mas também temos menção a mais de uma cidade. De modo que podemos concluir somente uma coisa: Tito devia nomear mais de um presbítero em cada cidade.

Presumindo-se que as “igrejas-lares” eram a norma quanto ao local de reunião das igrejas em Creta, da mesma forma que em outros locais no mundo do Novo Testamento, podemos agora levantar algumas indagações interessantes (veja a figura 14).

1. Havia somente um presbítero para cada igreja-lar? Em caso afirmativo, isso certamente não estaria contradizendo a menção anterior à pluralidade de presbíteros em Jerusalém ou em Éfeso. Simplesmente significaria que haveria mais de uma igreja-lar em cada cidade.

2. Havia mais de um presbítero em cada igreja-lar? Talvez, mas provavelmente só quando a igreja-lar era excepcionalmente grande. Entretanto, existe essa possibilidade, visto que descobriram residências utilizadas para reuniões da igreja, nas quais havia salas onde podiam sentar-se até 500 pessoas. De uma perspectiva prática, provavelmente seria preciso mais de um presbítero para governar e pastorear adequadamente uma igreja desse tamanho.

Com base nesses exemplos bíblicos, podemos concluir com segu­ rança que havia mais de um presbítero nas igrejas de Jerusalém, de Éfeso e das cidades de Creta. O mesmo seria o caso de Listra, de Icônio e de Antioquia da Pisídia, visto que nessas cidades Paulo e Barnabé “em cada igreja [...] escolhiam presbíteros ” (At 14.23; b l h).

Mas não se pode afirmar mais que isso. Não há dados bíblicos suficientes sobre a estrutura da igreja para explicar de forma mais completa o conceito da pluralidade de presbíteros e como isso funcionava de fato em determinada localidade. Podemos, no entanto, fazer algumas considerações pragmáticas que dizem respeito à obser­ vação de que as igrejas do Novo Testamento aparentemente pos-

cidade

suíam mais de um presbítero ou bispo. Mas falaremos disso mais tarde.

5. Esses líderes espirituais deviam delegar responsabilidades a outros homens e mulheres qualificados que cuidariam das neces­ sidades culturais da igreja.

Os presbíteros não eram os únicos líderes nomeados para cuidar dos negócios da igreja local nos dias do Novo Testamento. A Bíblia também se refere a diáconos e diaconisas.

Na carta de Paulo a Timóteo, que na ocasião estava morando em Éfeso, o apóstolo especificou, antes de tudo, as qualificações dos presbíteros (1 Tm 3.1-7). E então especificou as qualificações dos diáconos, homens com a função de servir (3.8-10, 12), e das diaconisas, mulheres com a função de servir (3.I I ) . 15

As funções dos diáconos e das diaconisas. Que deviam essas pessoas fazer na igreja? Para alguns, pode ser surpreendente que os escritores bíblicos não tenham especificado as funções desses líderes como o fizeram em relação aos presbíteros. Em vez disso, as Escrituras especificam qualificações para os dois postos, mas deixam abertas as funções dos diáconos e das diaconisas. (Veja a figura 15.)

Líd e r e s Qu a l i f i c a ç õ e s Fu n ç õ e s Presbíteros ou supervisores Especificadas Pastor e mestre (supraculturais) D iáco no s e/ou diaconisas Especificadas Várias (culturais)

Figura 15: Comparação da liderança

Por quê? Uma vez mais, vemos a importância de compreender a cultura. O papel dos presbíteros é supracultural. Não importa o contexto social, sempre será necessário que os cristãos sejam governados, pastoreados, ensinados na Palavra de Deus e ministrados

em outras formas espirituais. Por outro lado, as necessidades culturais variam de uma sociedade para outra e até de uma época para outra numa mesma comunidade.

Exemplo disso é a igreja de Jerusalém. Quando as viúvas helenistas estavam sendo negligenciadas na distribuição diária de mantimentos (At 6.1-7), os apóstolos indicaram sete homens para certificarem o atendimento das necessidades das viúvas. Embora não tenham sido diretamente identificados como diáconos, fica evidente que eles estavam agindo como diáconos.16 Posteriormente, quando a igreja foi dispersa, esses homens já não eram necessários para tal tarefa. De fato, sabemos que pelo menos dois, Estêvão e Filipe, tornaram-se evangelistas (At 7—8).

Repare em outro detalhe. Quando Paulo instruiu Tito a constituir “presbíteros [...] em cada cidade” de Creta (Tt 1.5), nada disse a respeito de diáconos. No entanto, quando Timóteo esteve em Éfeso, Paulo deu instruções acerca de presbíteros e também de diáconos e de diaconisas. A questão é: por quê? Com base num estudo de todos os textos que tratam da liderança da igreja local, parece que a razão está relacionada a necessidades culturais. A igreja de Éfeso já se tinha firmado e vinha funcionando havia algum tempo. Quando a igreja cresceu, com o tempo foram surgindo necessidades culturais. No en­ tanto, as igrejas de Creta eram novas. O primeiro passo era nomear presbíteros que atendessem às necessidades espirituais, tal como Paulo e Barnabé haviam feito em Listra, em Icônio e em Antioquia da Pisídia (At 14.21-23). A implicação é clara. Os diáconos seriam nomeados em Creta quando surgisse a necessidade.

6. Esses líderes espirituais deviam ser nomeados de acordo com sua condição espiritual.

Há duas passagens que especificam as qualidades dos presbíteros (1 Tm 3.1-13; Tt 1.5-9, NVi). A carta de Paulo a Timóteo contém as qualificações de presbíteros, diáconos e diaconisas. Sua Carta a Tito contém apenas as qualificações dos presbíteros.

Embora cada “perfil de maturidade” dos presbíteros seja completo em si mesmo e, em essência, seja qualitativamente igual ao outro, é útil juntá-los para termos uma perspectiva mais completa daquilo que Deus espera que os líderes espirituais reflitam com suas vidas. Esta é a lista conjunta:17

1. Irrepreensível (1 Tm 3.2; Tt 1.6), ou seja, sem culpa ou de boa fama. Não devia haver margem para acusar tal homem de comportamento cristão impróprio. Em resumo, isso significa ter boa reputação. E a qualificação de maior importância, aparecendo no topo de cada lista. 2. Marido de uma só mulher (1 Tm 3.2; Tt 1.6), ou seja, sem envolvimento com mais de uma mulher. Numa cultura onde os homens freqüentemente possuíam mais de uma mulher em suas vidas, Paulo deixou claro que um presbítero da igreja devia ser um “homem de uma só mulher” — leal a sua esposa e somente a ela.

Dessa maneira, não parece que Paulo esteja-se referindo à poligamia, visto que ter mais de uma esposa era ilegal no Império Romano. Também não parece que esteja referindo-se ao divórcio e a um novo casamento. Aparentemente Paulo está declarando um fato simples: numa cultura em que os homens casados freqüentemente se envolviam sexualmente com outras mulheres, que não suas esposas legítimas, o cristão devia ser um “homem de uma só mulher” . E, visto que alguns desses novos cristãos não modificavam seus estilos de vida imediatamente, Paulo deixou claro que jamais se devia colocar em função de liderança na igreja um homem que ainda violasse esse padrão moral.18

3. Sóbrio (1 Tm 3.2; Tt 1.8), ou seja, que tem domínio próprio, que sabe controlar-se. Não deve ser um homem escravizado a si mesmo e aos desejos da carne. Além disso, não deve ser dado a desvios. Enxerga claramente para onde a história está indo. Percebe que sua principal preocupação deve ser cumprir a grande comissão do Senhor, não importa qual seja sua ocupação. Assim, não deixa que os interesses morais, políticos, materiais ou sociais o afastem do propósito básico de sua vida.19

4. Deve ser prudente (1 Tm 3.2; Tt 1.8), ou seja, sensato, sábio e equilibrado em seus juízos. Não deve ser dado a decisões apressadas e superficiais, baseadas num pensamento imaturo. Nem pensa “de si mesmo além do que convém”. Pelo contrário, ele tem “uma justa estima” (Rm 12.3; B J).20

5. Respeitável (1 Tm 3.2), ou seja, deve ter uma vida ordeira. Deve revelar bom comportamento. A palavra respeitável é tradução da palavra grega kosmios, da qual vem a palavra “cosmético” . Muitas vezes o verbo kosmeõ é traduzido por “adornar” .

KOSMIOS KOSMEO

cosmético * * adornar

No documento Igreja Forma e Essencia - Gene a. Getz (páginas 155-161)