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Manifestações contra o projeto

3. Cultura e gentrificação nas cidades

3.9 Manifestações contra o projeto

(decisão provisória) da 6ª Vara da Fazenda Pública obriga a prefeitura a interromper o edital de privatização para o projeto. A ação foi movida pela Defensoria Pública. Na decisão do dia 6 de junho, o juiz afirma que os moradores e comerciantes da região não foram consultados para a deliberação tomada pelo conselho gestor das ZEIs (Zonas Especiais de Interesse Social).

O projeto da prefeitura prevê a desapropriação e a transformação, pela iniciativa privada, de 45 quadras na área central de São Paulo, que incluem parte das lojas da Santa Ifigênia. As empresas que investirem nas obras poderão lucrar com a venda posterior dos imóveis.

O Conselho Gestor das Zeis é formado por oito membros da prefeitura e oito membros da sociedade civil (moradores, comerciantes e integrantes de movimentos sociais). Para a prefeitura, esse órgão garante a democracia. Para os comerciantes e moradores, porém, não existe voz real para os membros da sociedade civil.204

Entretanto, em 21 de junho de 2012, a Justiça de São Paulo suspende outra vez a liminar (decisão provisória) que interrompia o edital de privatização, permitindo, novamente, que a prefeitura continue com o processo já tantas vezes impedido pelas diferentes causas explicitadas anteriormente – por enquanto a última notícia até o momento da conclusão desta dissertação:

O projeto estava parado desde o dia 6 deste mês, quando a 6ª Vara da Fazenda Pública obrigou a prefeitura a parar o edital. À época, o juiz alegou que os moradores e comerciantes da região não foram consultados para a deliberação tomada pelo conselho gestor das ZEIs (Zonas Especiais de Interesse Social). A Prefeitura de São Paulo recorreu e, no julgamento em segunda instância, a liminar perder o seu efeito.205

3.9 MANIFESTAÇÕES CONTRA O PROJETO

204 Matéria intitulada "Justiça de SP suspende mais uma vez projeto Nova Luz" publicada em 8 de junho de 2012

no jornal Folha de São Paulo.

(Disponível em: <http://www1.folha.uol.com.br/cotidiano/1102082-justica-de-sp-suspende-mais-uma-vez-o- projeto-nova-luz.shtml>. Acesso em: jul. 2012.)

205

Matéria "Justiça suspende liminar que interrompia o projeto Nova Luz" publicada em 28 de junho de 2012 no jornal Folha de São Paulo.

(Disponível em: <http://www1.folha.uol.com.br/cotidiano/1112066-justica-suspende-liminar-que- interrompia-o-projeto-nova-luz.shtml>. Acesso em: jul. 2012.)

Não foram poucos os protestos e todos os tipos de ações contra o projeto Nova Luz. Nosso desejo aqui não é documentar todas as manifestações ocorridas e sim demonstrar como a população não apenas atuou através da organização política e jurídica (através de ações populares que seguidamente impediram o projeto de continuar e foram seguidamente derrubadas na Justiça), mas também como se manifestou publicamente das mais variadas formas, não havendo a menor possibilidade de se defender a posição de que a "sociedade" deseja o projeto, ou de que a mera participação da sociedade civil no Conselho Gestor das Zeis seria elemento de comprovação "democrática" do projeto.

Uma "pesquisa-ação", como foi chamada pelo Coletivo PI (Política do Impossível)206, ocorreu ao longo do ano de 2008 com a realização de ações, debates, conversas, entrevistas, etc. em São Paulo e culminou na publicação do livro Cidade-Luz, citado algumas vezes neste capítulo. Nesse processo, ressaltamos a ação "Traga sua luz", contra os procedimentos de confinamento que remetiam à política gentrificadora do centro. Tal pesquisa-ação teve ampla participação de diversos indivíduos e coletivos em São Paulo. Imagem abaixo207:

Foto 5 – Traga sua Luz

206

Pesquisa específica sobre a atuação do coletivo no bairro da Luz está sendo atualmente realizada por Joana Zatz, orientada por Vera Pallamin, na FAUUSP.

207

Foto Daniel Camilleri Fonte: Cidade-Luz

Entretanto, as mais constantes manifestações contra o projeto vêm sendo realizadas pelos comerciantes de Santa Ifigênia, que estão completamente descontentes com o andamento, sua falta de voz na construção e na realização do projeto Nova Luz, motivo pelo qual vêm se organizando juridicamente, bem como posicionando-se através de manifestações públicas. Em matéria "Comerciantes vão à Justiça contra aprovação de projetos sobre áreas degradadas de SP"208, podemos observar pelo excerto a seguir a insatisfação daqueles que habitam e trabalham na região, mais especificamente sua posição contrária às desapropriações:

A associação de comerciantes do bairro de Santa Ifigênia, no centro de São Paulo, irá recorrer à Justiça para tentar barrar os projetos de lei 87/09 e 158/09 – aprovados na noite desta quarta-feira pela Câmara de Vereadores – que preveem a revitalização de áreas degradadas da cidade. Para o presidente da associação, Paulo Garcia, 50, as propostas possuem "centenas de armadilhas" e podem causar desempregos na região.

"Esse projeto, da maneira como foi colocado, tem centenas de armadilhas. Ele foi feito vendendo a ideia que vai haver uma revitalização e que serão criados ali empregos, um mito, porque os empregos serão transferidos", afirmou.

Na semana anterior, a entidade protocolou uma representação no Ministério Público contra a proposta. Para a associação, uma das maiores falhas do projeto é o fato de dar à empresa licitada o direito de desapropriar imóveis para a construção de novos bairros, podendo até realizar desapropriações e, com isso, lucrar com a venda dos imóveis.

Temos também acesso à notícia de um outro protesto – esse especificamente contra o projeto como um todo –, na matéria "Lojistas fecham portas contra projeto Nova Luz; ruas do centro de SP são bloqueadas"209:

208 Publicada em 22 de abril de 2009 no jornal Folha de São Paulo.

(Disponível em: <http://www1.folha.uol.com.br/folha/cotidiano/ult95u 554830.shtml>. Acesso em: jul. 2012.)

209

Matéria publicada em 14 de janeiro de 2011 no jornal Folha de São Paulo.

(Disponível em: <http://www1.folha.uol.com.br/cotidiano/860676-lojistas-fecham-portas-contra-projeto- nova-luz-ruas-do-centro-de-sp-sao-bloqueadas.shtml>. Acesso em: jul. 2012.)

Comerciantes do entorno da rua Santa Ifigênia, no centro de São Paulo, fecharam as portas na tarde desta sexta-feira e realizam, desde por volta das 15h, um protesto contra o projeto de revitalização da região. Ruas como Vitória e Andradas, além da Santa Ifigênia, estão interditadas.

Segundo estimativa da Polícia Militar, cerca de 1.100 pessoas participam do protesto, sob chuva. Muitos usam nariz de palhaço e apitos. Os manifestantes estão acompanhados de dois carros de som e devem seguir até a Fatec, na avenida Tiradentes, onde haverá uma audiência pública para discussão do projeto às 19h.

Entretanto, após a manifestação pública referida no parágrafo anterior, a audiência pública sobre o projeto Nova Luz é cancelada, como podemos notar no seguinte excerto de matéria de jornal:

Segundo a Polícia Militar, cerca de 1.100 pessoas participaram do início da passeata. Já na Fatec, os manifestantes reivindicavam entrar no auditório para acompanhar a audiência.

Com capacidade para 350 pessoas, o local ficou lotado e muitas pessoas aguardavam do lado de fora. Alertado pela PM sobre a impossibilidade de garantir a segurança se mais pessoas participassem, o secretário decidiu cancelar a audiência.

"Foi motivo de segurança. Despertou interesse muito grande. A gente não podia arriscar a fazer. Vamos remarcar o quanto antes e tentar fazer em um lugar maior", afirmou Bucalem.

O secretário afirma que o andamento do projeto não será prejudicado. (grifo

nosso) "É normal, faz parte do processo democrático. Veio mais gente, aí não pôde fazer [a audiência]."

Os trabalhadores, no entanto, comemoraram. "A gente queria ser ouvido. Eles queriam fazer um projeto desse sem consultar ninguém e perceberam nossa força. Agora vamos participar [da próxima audiência] e queremos ouvir. Somos comerciantes. Primeiro nos oferecem alguma coisa, aí avaliamos se vale a pena. Mas tudo tem que ser feito a portas abertas", afirmou o vice-presidente da ACSI, Luiz Cláudio Vieira.210

Em 28 de janeiro, ou seja, cerca de duas semanas depois, nova audiência acontece e

210

Matéria "Após manifestação, audiência pública sobre projeto Nova Luz é cancelada em SP" publicada em 14 de janeiro de 2011 no jornal Folha de São Paulo.

(Disponível em: <http://www1.folha.uol.com.br/cotidiano/860882-apos-man ifestacao-audiencia-publica- sobre-projeto-nova-luz-e-cancelada-em-sp.shtml>. Acesso em: jul. 2012.)

novas manifestações também acontecem, de acordo com matéria211 publicada no jornal Folha

de São Paulo, que evidencia a existência de muita discordância entre aqueles participantes do

Conselho Gestor que se manifestavam contra o projeto e os parlamentares presentes para defender o projeto. Ao ler o artigo "Nova Luz: Plano Urbanístico da Zeis de Santa Ifigênia é aprovado sob protestos da sociedade civil"212, podemos também observar como se deu tal aprovação do plano urbanístico da região, não levando em conta as manifestações do Conselho, o que fez com que não se constituísse de fato a "participação da sociedade civil". Portanto, as manifestações contrárias à aprovação não foram devidamente escutadas e as condições e informações requisitadas pelos conselheiros e por eles consideradas necessárias para a deliberação não foram fornecidas nem discutidas:

Em uma conturbada votação na Prefeitura de São Paulo durante reunião do Conselho Gestor da Zeis (Zona Especial de Interesse Social) da Santa Ifigênia, foi aprovado, na noite de ontem, o Plano Urbanístico da Zeis-3, área da Santa Ifigênia inserida no Projeto Nova Luz. Metade dos conselheiros, todos da sociedade civil, ponderou na reunião que o desenvolvimento do documento era insuficiente para que se deliberasse sobre sua aprovação. Apesar dos apelos destes conselheiros para que a votação da minuta do Plano Urbanístico fosse adiada até que todas as questões pendentes fossem devidamente debatidas e esclarecidas, a coordenação do Conselho, consciente da maioria da Prefeitura no espaço, abriu o regime de votação e aprovou o documento do Plano.

Questões importantes que constam nas Diretrizes do Plano Urbanístico da

Zeis-3 – aprovadas pelo mesmo Conselho –, como as garantias e os

procedimentos de realocação dos atuais moradores da região na própria área de

intervenção, sequer foram debatidas e sequer foram apresentadas propostas definitivas dentro do Plano aprovado. Muitas demandas e questionamentos levantados pela sociedade civil, desde a instalação do Conselho em junho de 2011, não foram discutidos ou contemplados pela versão votada ontem, que exclui termos acordados previamente entre Prefeitura e sociedade civil, sem qualquer justificativa. Desde sua formação, há nove meses, o Conselho Gestor da Zeis-3 da Nova Luz tem sido o único espaço aberto à participação e deliberação ativa da sociedade civil para debate do projeto previsto para a região, apesar de a Zeis-3 incluir apenas 11 das 45 quadras do projeto. A pressão para aprovar o Plano Urbanístico o mais rápido possível deixou de lado pontos essenciais, inclusive exigências do próprio Plano Diretor de São Paulo. A aprovação do Plano, para a Prefeitura, era o último entrave à publicação do edital de licitação da concessão urbanística da Nova Luz. Entretanto,

uma aprovação como esta, além de ilegítima, é certamente ilegal e deverá ser

211 Matéria de 28 de abril de 2011 intitulada "Lojistas fazem nova passeata contra o projeto Nova Luz em SP".

(Disponível em: <Folha.com - Cotidiano - Lojistas fazem nova passeata contra o projeto Nova Luz, em SP – 28/01/2011>. Acesso em: jul. 2012.)

212

Publicado em 5 de abril de 2012 no blog de Raquel Rolnik.

(Disponível em: <http://raquelrolnik.wordpress.com/2012/04/ 05/nova-luz-p lano-urbanistico-da-ze is-de- santa-ifigenia-e-aprovado-sob-protestos-da-sociedade-civil/>. Acesso em: jul. 2012.)

objeto de contestação, inclusive judicial, por parte das entidades que compõem o Conselho e que procuraram apostar em um espaço de construção coletiva.213

(grifos nossos)

Por fim, pouco antes da conclusão desta dissertação, acontece no dia 10 de julho a Marcha contra os despejos e remoções em São Paulo214, outro fator bastante característico e relacionado ao início do projeto Nova Luz. A marcha acontece com o apoio não apenas dos movimentos de luta por moradia, mas de diversos outros movimentos e coletivos215 de diferentes agrupamentos da sociedade civil, buscando evitar mais despejos na região – o que acaba por se confirmar com o recente anúncio da reintegração de posse ao proprietário do edifício conhecido como Ocupação Mauá – apenas prorrogado para agosto de 2012, conforme o seguinte texto, extraído na íntegra do site da Frente de Luta por Moradia (FLM), onde foi publicado em 19 de julho de 2012:

A situação da Mauá não está fácil, tudo indica que sofreremos mais um golpe do judiciário, ontem fomos informados que a policia estava mantendo a reunião de hoje as 9:30 da manhã para tratar da reintegração de posse da rua Mauá. Fomos para o 7o batalhão da policia e na reunião fomos comunicados que o efeito suspensivo da reintegração foi meramente por incidentes processuais, ou seja, merecia melhor esclarecimentos quanto ao recolhimento da diferença do valor da causa, e em se tratando de famílias pobres para recolhimentos das custas processuais e que a liminar para reintegrar na posse estava mantida.

Depois de muito debate prorrogou-se a reintegração para dia 21.08.2012, temos aí mais um mês para trabalhar e tentar evitar um mal maior para as famílias.

213

Artigo "Nova Luz: Plano Urbanístico da Zeis de Santa Ifigênia é aprovado sob protestos da sociedade civil" publicado no blog de Raquel Rolnik e assinado por ela.

(Disponível em: <http://raquelrolnik.wordpress.com/2012/04/ 05/nova-lu z-plano-urbanistico-da-zeis-de- santa-ifigenia-e-aprovado-sob-protestos-da-sociedade-civil/>. Acesso em: jul. 2012.)

214

Ver chamada pública pela internet. (Disponível em:

<http://apropriacaodaluz.blogspot.com.br/2012/07/marcha-contra-os-despejos-e-remocoes-em.ht ml>. Acesso em: jul. 2012)

215

De acordo com lista fornecida no site do coletivo Apoio Mútuo:

Amparar (assoc. de apoio a presidiários e familiares), Assembléia Nacional do Estudantes – Livre (ANEL), Campo Rompendo Amarras, Coletivo Anarcopunk Diversidade, Coletivo Contra Tortura, Coletivo

Desentorpecendo a Razão (DAR), Coletivo Merlino, Coletivo Perifatividade, Coletivo Universidade em Movimento (USP), Coletivo Zagaia, Comitê Pró-Haiti, CSP-Conlutas, DCE USP, Educação Popular, *Frente do Esculacho Popular*, Força Ativa, Fórum de Esquerda, Fórum de Hip Hop, Instituto Luiz Gama, Levante Popular da Juventude, Luta Popular, Movimento Negro Unificado, Núcleo de Consciência Negra (USP), Observatório das Violências Policiais de SP, PSOL, Quilombo Raça e Classe, Sarau da Fundão, Sarau da Ocupa, Sarau do Binho, Secretaria de Negros e Negras do PSTU, Sindicatos dos Metroviários, Sintusp, Sujeito Coletivo, Tortura Nunca Mais, Tribunal Popular, Uneafro – Brasil, União dos Estudantes Angolas – SP, Unidos pra Lutar. (Disponível em: <http://apoiomutuo.wordpress.com/>. Acesso em: jul. 2012.)

Falamos na reunião com batalhão e as autoridades presentes que CAFO, Organização Humanitária realiza campanha contra os despejos e que estava enviando essa petição às autoridades brasileiras.216