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4 LIGA DAS NAÇÕES

4.5 MANUTENÇÃO DA PAZ E SEGURANÇA MUNDIAL

A Liga das Nações existiu juridicamente de 1919 a 1946. Teve como base de sua criação o conceito de segurança coletiva, sendo essa a “pedra lapidar” da proposta de administração do sistema internacional (HERZ; HOFFMAN, 2004). Segundo Steinfus (2005, p.94), a Liga “advogava que a segurança de um é a segurança de todos”.

O sistema de segurança coletiva tinha como objetivos, segundo Herz e Hoffmann (2004), lidar com a guerra como uma forma de ameaça a ordem, ou seja, uma ameaça localizada deveria ser tratada como uma ameaça a todo o sistema internacional, e defender que os Estados pequenos deveriam ser protegidos da coerção que sofrem num sistema de balança de poder. Assim, os artigos 10, 11 e 16 do Pacto tratam da primeira formulação da ideia de um sistema de segurança coletiva.

Segundo o artigo 10 do Pacto, “cada Estado membro se compromete a respeitar e preservar a integridade territorial e a independência política de todos os membros da Liga” (HERZ; HOFFMANN, 2004, p. 90), já o artigo 11 diz que “qualquer ato de guerra ou ameaça de guerra, não importando se afetando algum membro da Liga ou não, é declarada uma questão de importância para a Liga como um todo e a Liga deverá agir da forma que parecer

sábia e efetiva para proteger a paz das nações” (HERZ; HOFFMANN, 2004, p. 90). Por fim o artigo 16 afirma que

1. Se algum membro da Liga recorrer à guerra (...) será considerado que cometeu um ato de guerra contra todos os outros membros da Liga. Estes se comprometem a romper imediatamente, com ele todas as relações comerciais e financeiras, a proibir todas as relações entre seus nacionais e os do Estado que tiver rompido o Pacto e a fazer que cessem todas as comunicações financeiras, comerciais ou pessoais entre os nacionais desse Estado e os demais de qualquer outro Estado, membro ou não da Liga.

2.Nesse caso, o Conselho terá o dever de recomendar aos diversos governos interessados os efetivos militares, navais ou aéreos, pelos quais os membros da Liga contribuirão (...) – para se fazer valer o compromisso com a Liga.

3. Os membros da Liga concordam (...) em se prestar, uns aos outros, apoio mútuo (...).

4. Todo membro da Liga que se tornar culpado da violação de algum dos compromissos resultantes do Pacto poderá dela ser excluído (...) (GARCIA, 2000, p. 161).

Conforme Steinfus (2005), em caso de controvérsias entre Estados membros da Liga, o Pacto da organização internacional invocava para a solução pacífica do litígio a arbitragem, que propunha, apenas, um plano recomendatório – como é possível observar no artigo 16, inciso 2 do Pacto. Assim sendo, “os mecanismos de manutenção da paz previstos pelo Pacto dependiam da existência de boa-fé dos Estados-Membros” (STEINFUS, 2005, p. 95).

É importante notar que tal organização, além do sistema de segurança coletiva, segundo Herz e Hoffmann (2004, p.87), também “tornou-se um fórum importante de encontro dos líderes europeus, embora fosse notável a ausência da URSS e dos EUA”. Ainda conforme as autoras (2004, p. 89),

Embora a Liga não tenha sido desenhada para ligar com questões econômicas e sociais, a organização exerceu algumas funções nesse campo. Ela foi um fórum para a discussão dos problemas econômicos globais, tendo sido realizadas uma série de conferências internacionais que, contudo, não geraram nenhum resultado, em um momento no qual a economia mundial encontrava-se em uma crise profunda.

Ao longo de sua história, a Liga das Nações, atuou de forma a tentar cumprir com seus objetivos e, assim, obteve alguns sucessos e fracassos.

Entre alguns de seus sucessos pode-se citar a administração do território de Sarre, entre 1919 e 1935, reivindicada pela Alemanha e a França. A Liga das Nações, nesta ocasião, foi pioneira na sua forma de atuação, pois foi à primeira organização internacional a organizar um plebiscito junto à população de um território para que se fizesse a sua vontade, neste caso

a maioria extraordinária optou ao retorno da administração de Sarre pela Alemanha (SEITENFUS, 2000).

De acordo com Cretella Neto (2007), a Liga das Nações obteve vários sucessos no que tange os domínios técnicos especializados, como, por exemplo, a Corte Permanente de Justiça Internacional responsável pela regulamentação jurídica da solução de controvérsias. A criação da Corte, segundo Araújo (2002), era prevista no artigo 14º do Pacto da Liga e tinha como finalidade resolver conflitos e divergências que emergissem entre os Estados e pudessem comprometer a paz mundial, sua jurisdição, entretanto não era obrigatória. Ainda conforme Araújo (2002), assim como a Liga, a Corte foi dissolvida oficialmente em 1946.

Em um balanço geral, pode-se citar alguns outros sucessos da Liga em sua trajetória nos quais se resolveram alguns pequenos conflitos “ente Polônia e Lituânia, 1920, a respeito de Vilna; entre Polônia e Alemanha, 1921, a respeito de Carélia Oriental; entre Itália e Grécia, em 1923, a respeito de Corfu” (ARAÚJO, 2002, p. 23)

Outro litígio que, num primeiro momento, pode se considerado um pequeno sucesso da Liga foi a questão do território livre de Dantzig. Entre as propostas apontadas pelo presidente norte-americano, Wilson, estava a de reorganização da Europa no pós-guerra, que compreendia o acesso polonês ao mar Báltico. Desta forma, contra a vontade da Alemanha, criou-se o território livre de Dantzig, que ficaria sobre proteção da Liga. Com a chegada do nacional-socialismo ao poder da Alemanha, em 1933, iniciou-se uma onda de protestos da população local que era essencialmente alemã. A Liga, com seus poderes limitados pouco pode fazer três anos mais tarde com a ocupação de Dantzing por Berlim, um dos motivos que desencadeou a Segunda Guerra Mundial. (SEITENFUS, 2000).

Segundo Cretella Neto (2007, p. 466),

muitas são as razões apontadas para a incapacidade da Liga ter evitado a 2ª Guerra Mundial, dentre estas as ausências da URSS, EUA e da Alemanha como partes contratantes do Pacto, bem como a inexistência de mecanismos mais eficazes de decisão e atuação internacionais.

Percebe-se que a maioria dos conflitos solucionados com participação da Liga das Nações caracterizava-se por serem litígios localizados e envolvendo países secundários no cenário internacional, ou seja, nota-se a ausência de maiores interesses das grandes potências da época nessas desavenças (SEITENFUS, 2000).

Há quem defenda, segundo Cretella Neto (2007), que não tenha havido propriamente uma crise na Liga das Nações, mas sim uma profunda crise internacional que atingiu a organização.

A crise de 1929, com a quebra da Bolsa de Valores de Nova Iorque, fez com que o capitalismo entrasse em profunda depressão. Nesse contexto, segundo Seitenfus (2000, p. 103),

o crescente desemprego, a falta de perspectiva e as decepções acumuladas tornaram- se um fértil terreno para (...) – que o egoísmo nacional renascesse – materializando- se na tradicional diplomacia bilateral e secreta. Assim surgiu o nazismo na Alemanha e o militarismo expansionista no Japão. O fascismo italiano recuperou suas posições mais intransigentes. A Liga ficou desamparada perante esta nova e inesperada situação.

Nesse panorama, pouco a Liga das Nações pode fazer para solucionar ou evitar o surgimento de conflitos que envolvessem os interesses das potências da época. Cretella Neto (2007) cita como exemplo dessa incapacidade, a invasão japonesa na Manchuria (território chinês) e a anexação da Áustria, além do desmembramento da Checoslováquia, pela Alemanha. Araújo (2002) acrescenta, ainda, que a Liga fracassou na questão da Etiópia, quando a Itália invadiu o território etíope e a Organização não conseguiu atender aos pedidos de ajuda do Estado agredido.

O fracasso das ações da Liga nos casos supracitados, conforme Seitenfus (2000, p. 106), foi acompanhado de um processo de esvaziamento da Organização, seja pela extinção de alguns países, como: Albânia, Áustria, Checoslováquia e Etiópia, ou pelo abandono, por diversos motivos, de outros, como: Brasil, Peru, Chile, Venezuela, Espanha, Honduras, Hungria, Nicarágua, Japão, Itália e Paraguai.

Outro fato marcante, apontado por Seitenfus (2000), foi que em 1933, a Liga das Nações convocou a Conferência de Londres com a proposta de adotar medidas multilaterais frente à crise que se alastrava pelo mundo, todavia, o presidente norte-americano na época, Franklin D. Roosevelt, foi contra a esta proposta, pois já havia elabora do plano de recuperação New Deal, com um claro objetivo isolacionista. Assim, cada Estado teria que fazer esforços individuais para lidar com a crise mundial.

Percebe-se, portanto, segundo Miyamoto e Carvalho (2003, p. 49-50), que

apesar do surgimento da Liga das Nações, o que ocorria de fato é que os Estados continuaram implementando suas políticas individuais como se a entidade não existisse. Procuravam-se soluções através de relacionamentos bilaterais, e não no âmbito da organização que pouca possibilidade tinha, portanto, de resolver situações agudas, quando qualquer uma das potências de então estava diretamente envolvida.

Em 1939, em condições já insustentáveis, a eclosão da Segunda Guerra Mundial – com a invasão alemã no território livre de Dantzig – inviabilizou de vez a atuação da Liga das Nações, desta forma, segundo Seitenfus (2000, p.109), a Liga das Nações “nasceu com a guerra e pela guerra foi morta”.

As experiências da Liga das Nações, entre seus sucessos e fracassos, no entanto, viriam a influir diretamente na criação de uma nova Organização Internacional pós-Segunda Guerra Mundial, a Organização das Nações Unidas.

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