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5.1 “Ficção extravagante hoje Fato amanhã”.

5.2 Mapeando o Universo

A ideia de tornar-se equiparável, em tamanho, às estrelas e gal|xias para “ver com os próprios olhos” é uma oportunidade para se fazer algo que seria impossível com os pés cravados no planeta Terra. A antiga percepção de que é difícil fazer um mapa de um lugar quando se está dentro dele é crucial para entender o problema de determinar a forma da Via Láctea (e de associar o formato observado das espirais ao da nossa própria galáxia). Os jornalistas tinham trabalhado essa questão, nas matérias, através de imagens, infográficos, comparações. Os autores de ficção científica trabalhariam através da imaginação.

A “obsess~o entre os astrônomos norte-americanos” 525 de descobrir a configuração do Universo refletiu-se na história de Wertenbaker e em matérias de divulgação da Popular Science. Muito provavelmente, ciente da controvérsia sobre o tamanho da Via Láctea e natureza das nebulosas, e de que, seria desejável, para

525Bartusiak, The day we found the Universe. p. xvi; Butler, Orville Roderick, The birth of American

astrophysics: The science in its cultural context. 1993. 290 fls. Tese (Doutorado em Filosofia) - Iowa State University, Iowa. 1993. pp. 7-9.

resolver a questão, observar a configuração do Universo desde um ponto de vista fora da gal|xia, Peyton Wertenbaker escreveu, em 1923, “The man from the atom”. Wertenbaker escreveu não mais do que cinco histórias de ficção científica, e, logo depois, voltou sua carreira para o gênero das novelas tradicionais526. “The man from the atom” foi, primeiro, publicada pela revista Science and Invention e transformada em sequência de duas partes (nas duas primeiras edições da Amazing Stories, abril e maio de 1926) 527.

Wertenbaker encontrou uma solução para apresentar, ao grande público, através de met|foras e da ficç~o, “a configuraç~o exata do Universo” - em macro e microescala: enviar um “homem” para os confins atômicos e estelares. Aquele que vê o Universo com os próprios olhos tem autoridade para fazer dele um mapa. “Dificilmente alguma coisa ser| desconhecida. A astronomia estar| completa, sendo que não há nada a fazer a não ser crescer suficientemente em tamanho para observar além da nossa atmosfera” 528.

A personagem enviada por Wertenbaker para “ver com os próprios olhos” é Kirby, assistente de um grande cientista, inventor de uma engenhoca que faria uma pessoa aumentar ou diminuir de tamanho. Wertenbaker menciona explicitamente o “mistério das nebulosas” como motivaç~o para Kirby aumentar de tamanho, dando a entender que, daquela forma, poderia solucioná-lo. E isso é exatamente o que se passa na sequência, conforme a personagem aumenta seu tamanho (Figura 27) e parte rumo a desvendar os mistérios da astronomia. Ele atinge o conhecimento sobre a configuração do planeta, compara a Terra a um átomo; redescobre o sistema solar, “As estrelas movendo-se com incrível rapidez em torno de um centro perto do qual estava o que eu imaginei ser o Sol” 529; e a gal|xia, “As estrelas se fundiam cada vez mais próximas umas das outras […] Elas eram todas parte de uma

526The Enciclopedia of Science Fiction, Peyton G. Wertenbaker. (Abril, 2015).

527Wertenbaker, Peyton. “The man from the atom – Part I”. AS, Vol.1, n. 1, (Abril, 1926). pp. 62-6. p. 65. 528Wertenbaker, “The man from the atom – Part I”, (Abril, 1926). p. 65.

grande nuvem agora” 530; e, finalmente, do cosmo:

Era pálido, difuso nas bordas, mas espesso e branco no centro, como uma nebulosa, uma nebulosa! Era isso! Uma grande luz se fez sobre mim. Todas essas estrelas eram parte de um grande sistema que formava uma nebulosa. Isso explicava o mistério das nebulosas […] As estrelas, universos dentro de universos! De repente comecei a me perguntar. Poderia haver algo mais no infinito que universo após universo, cada um uma parte de um outro universo ainda maior?531

Se a ficção científica da AS era capaz de prever o futuro, então nele a questão da existência de outras galáxias seria solucionada e de forma indubitável. As regiões que a personagem explora não poderiam ser atingidas pelos telescópios, graças às limitações técnicas, ou eram regiões para as quais os dados obtidos pelos astrônomos com os telescópios eram insuficientes e aumentavam a discordância entre eles, fazendo crescer também o senso de mistério a respeito do tema.

Além da configuração do Universo, Wertenbaker tinha em mente outro conflito, que rondava a imaginação do público: a TRG de Einstein, e o mundo do muito pequeno. Esse seria “O maior enigma do Universo”, segundo “The atom's amazing secret of power near solution?”, Popular Science de 1925532. Outra matéria da Popular Science sobre o estudo dos |tomos: “Science is the newest feat, explodes atom”, 1922533. Na mesma edição, o editor da revista falou sobre as possibilidades industriais da pesquisa científica: “Você consegue perceber as possibilidades industriais do estudo deles [cientistas]?”.

530Wertenbaker, “The man from the atom – Part I”, (Abril, 1926). p. 65.

531Wertenbaker, “The man from the atom – Part I”, (Abril, 1926). p. 65. Grifo nosso.

532Seybold, G.B. “The atom's amazing secret of power near solution?” PS, Vol.106, n.1, (Janeiro, 1925).

pp.47-8.

533Bragdom, E.L. “Science is the newest feat, explodes atom”. PS, Vol.101, n.2, (Agosto, 1922). pp.30-2.

Figura 27. “The man from the atom” - O

gigante Kirby começa a crescer para explorar os confins do Universo e resolver as pendências que a astronomia não poderia, naquela época. O autor cita limitações dos telescópios, e dá a impressão de que uma maneira de resolver esses conflitos seria “ver com os próprios olhos”. Wertenbaker, Peyton. “The man from the atom – Part I”. AS, Vol. 1, n. 1, (Abril, 1926). p. 62-6. p. 65.

Na segunda parte da história de Wertenbaker, publicada em maio, aparecem também ideias de relatividade restrita, como o conceito de tempo em viagens espaciais – o tempo seria relativo, e o viajante espacial volta para a Terra quando ela j| n~o existe: “Um ano na Terra é um segundo para mim”. E ele explica aos alienígenas sobre Einstein e que o espaço-tempo seria curvo534. Voltaremos a falar sobre “The man from the atom” nas próximas sessões.

Havia uma conexão entre os assuntos das histórias de ficção e as matérias da divulgação em revistas, e, à época, ainda havia muita confusão sobre o que eram galáxias, o que eram nebulosas, e como isso se encaixava no grande esquema do Universo (mesmo considerando que Hubble já tivesse publicado seus resultados da distância de Andrômeda, que não repercutira com grande alarde em 1923, mesmo ano em que Wertenbaker escreveu sua história). Supomos que o Wertenbaker acompanhava divulgação de ciência, talvez, na escola, porque ele tinha entre 15 e 16 anos quando escreveu “The man from the atom”.