3. OBJETIVOS E METODOLOGIAS
3.2 Metodologias
3.2.1 Metodologias/objetivo O1
3.2.1.2 Medição da segurança ocupacional
A quantificação da segurança ocupacional é um dos fatores, a par da produtividade, que envolve maior complexidade na sua determinação, no contexto do presente trabalho. As propostas de medição desta grandeza, indicadas na literatura (cap. 2), baseiam-se nas seguintes métricas:
a) Determinação de taxas e índices, estipulados para avaliar a evolução de acidentes e da mortalidade (Leger 1991), (Blank, et al. 1998), (Hendryx e Ahern 2009), (Sanmiquel, et al. 2010), entre outros;
b) Número de ocorrências, assentes no registo do número absoluto de acidentes e/ou mortes, num determinado período de tempo (Li, et al. 2004), (Shi 2009), (Kecojevic e Nor 2009), (Zhang, et al. 2011), entre outros;
c) Evolução das taxas Experience Modification Rate (EMR) (Hoonakker, et al. 2005) ou Total Factor Productivity (TFP) (Shi e Gao 2010);
d) Contabilização de dias perdidos (Coleman e Kerkering 2007), (Kukic, Ikanovic e Kudumovic 2009);
e) Média de dias perdidos (Vazirinejad e Esmaeili 2009);
f) Custos de cuidados médicos relativos a doenças respiratórias (Houtven, et al. 2010). A análise das propostas elencadas para mensuração da grandeza ‘segurança’ permitem identificar os seguintes ‘campos de ação’ e restrições nas suas aplicações práticas:
i. Os valores obtidos em a) e b) são úteis para comparações inter e intra-setoriais, bem como entre realidades de países diferentes, numa visão geral do problema. Tratam os dados de modo global, não diferenciando as suas causas, pelo que não é possível identificar a parcela de ocorrências nefastas causadas pelo ambiente térmico. Também o horizonte temporal para esta contabilização estatística é necessariamente
Unidade º C % m/s º C º C Variáveis Temperatura do ar Humidade do ar Velocidade do ar Temperatura média radiante
WBGT
longo, no mínimo superior a um ano, o que não se compagina com a monitorização de efeitos e variações em ‘tempo real’, pretendida neste estudo;
ii. As taxas consideradas na alínea c) computam parâmetros que não se integram no âmbito do trabalho, nomeadamente, tomando como exemplo a TFP: medição do impacte económico, no longo prazo, de alterações tecnológicas e outras, que não os input tradicionalmente considerados (capital e trabalho);
iii. A determinação do número absoluto ou média de dias perdidos, indicados nas alíneas d) e e), fará sentido se abranger um período temporal amplo, analogamente ao referido em i;
iv. Também a análise de custos com cuidados médicos, proposta em f), é uma medida que se revela, neste caso, pouco eficiente, em virtude de não serem conhecidos registos globais e dados desagregados por causa, sobre essa matéria, no plano nacional.
No âmbito da aplicação pretendida e pelas razões invocadas (i. a iv.), resulta inviável a utilização direta de uma qualquer métrica, de entre as que foram identificadas nos estudos publicados sobre o tema.
Considerando que não existe informação quantitativa disponível, que identifique as consequências na segurança induzidas pelas condições ambientais, o pretendido relacionamento entre essas grandezas não será exequível, por essa via. Consequentemente, será necessária uma nova abordagem para atingir essa finalidade. Nesse sentido, a metodologia que se propõe para contornar os constrangimentos identificados consiste na medição do denominado ‘tempo fora da tarefa’, parâmetro referido por Parsons (2009) e utilizado no estudo deste autor sobre o efeito do ambiente térmico na produtividade laboral94. Esse parâmetro, como a sua designação indica, mede o tempo de paragem do trabalhador. Os pressupostos para a utilização desse indicador na medição da segurança são:
O tempo fora da tarefa (TFT) ser contabilizado, apenas e só, se for consequência evidente do ambiente térmico e diretamente relacionado com problemas de segurança (acidentes, incidentes ou quase-acidentes);
O TFT ser medido em simultâneo com o registo das condições de ambiente térmico existentes (temperatura equivalente, WBGT).
Se cumpridos os pressupostos indicados, a relação dos TFT e WBGT pode esquematizar-se na figura 3.6.
Com base nos dados recolhidos (pontos a preto) é possível ajustar uma função (linha a vermelho escuro) que traduza a relação entre as duas grandezas: segurança, representada pelo indicador TFT (em ordenada) e ambiente térmico, representado pelo índice WBGT (abcissa).
As vantagens comparativas da utilização desta métrica podem sintetizar-se nos seguintes pontos:
94
Parâmetro que será retomado quando for descrita a forma de medição da produtividade (ponto seguinte).
A medição dos tempos de paragem traduz o impacte direto do ambiente térmico na segurança dos trabalhadores, em dois vetores importantes:
a) incidência, medido no momento em que ocorre;
b) severidade, associada à duração real de imobilização ou não produção;
Os TFT são mensurados numa escala de tempo (minutos) compatível com a utilizada nas restantes medições, no quadro de vigência do estudo (necessariamente, de curto prazo);
Numa perspetiva instrumental, como se verá adiante, a utilização desta mesma métrica na medição da produtividade, facilita a adição dos efeitos das duas grandezas e as suas conversões para unidades monetárias.
Figura 3.6 – Ajustamento da função segurança / ambiente térmico
Para a determinação prática do “tempo fora da tarefa”, relacionado com questões de segurança, subsiste uma dificuldade:
Como identificar que o problema que conduz à paragem (TFT) é consequência direta das condições de ambiente térmico presentes?
Num plano teórico, esta dificuldade pode ser contornada de diferentes modos, dependendo do tipo de dados a obter ou existentes a priori, nomeadamente:
a) Existência de estudos validados, com dados publicados (dias perdidos, taxas) que relacionem inequivocamente as duas grandezas;
b) Medição de TFT associadas a ocorrências de segurança reais em cada patamar de condições ambientais, conforme proposto. Neste caso, para se estabelecer a correlação existente entre as duas grandezas, será necessário efetuar um elevado número de medições, garantindo a constância dos restantes fatores (ex.: equipas, atividades, processos tecnológicos), por forma a construir uma série de dados representativa do problema;
c) Para cada condição ambiental, realizar a monitorização de parâmetros metabólicos dos indivíduos (ex.: consumo de oxigénio, temperatura corporal, ritmo cardíaco) e estabelecer a sua relação com os níveis de atenção, agilidade, destreza, tempo de reação (entre outros), que potenciam a probabilidade de ocorrência de acidentes.
A concretização com sucesso, de qualquer uma das três alternativas indicadas, possibilita o estabelecimento da relação entre o ambiente térmico e a segurança ocupacional, traduzida na função esquematizada na figura 3.6.
Porém, a transposição das alternativas de resolução apontadas, do plano teórico para o prático, têm as seguintes limitações:
No momento presente, de acordo com o levantamento realizado na pesquisa bibliográfica e pelas razões já anteriormente evocadas (métricas diferenciadas, dados não desagregados, etc.), a alternativa a) não é concretizável, por ausência de informação disponível;
A opção c), em que se relacionam parâmetros metabólicos com o desempenho em segurança, é apontada na literatura como uma evidência consensual, num plano qualitativo (Sá 1999), (Wagner 2001), (Lamberts e Xavier 2002), (Costa, Baptista, et al. 2011), entre outros.
As sintomatologias que fundamentam este efeito (ex.: vertigens, tonturas, diminuição da destreza e da capacidade mental, aumento do tempo de reação, cãibras) são elencadas por Sá (1999) e encontram-se sintetizadas no quadro 2.4, capítulo 2. No entanto, como refere Parsons (2009), a relação do calor com os níveis de distração não é conhecida, sendo necessários mais estudos para aprofundar o tema. Consequentemente, no plano quantitativo, a informação disponível é também insuficiente, para o corrente propósito;
Por fim, a alternativa b) baseia-se no tipo de medição proposta para a avaliação da grandeza, pelo que, desse ponto de vista, é exequível e consistente com a metodologia proposta.
Há, no entanto, um óbice ao estabelecimento da relação entre as grandezas, por esta via: para que a série seja representativa, a recolha de dados deve abranger um período de tempo extenso, no sentido de compilar as ocorrências que se sucedem, a espaços de tempo, analogamente ao indicado para as restantes alternativas. Essa necessidade constitui um constrangimento intransponível, no âmbito do presente estudo, face às limitações de tempo para a sua execução.
Como se verifica, existem limitações ou insuficiente informação de suporte, para qualquer das alternativas disponíveis.
A opção apontada – medição dos TFT – é entendida como a mais viável e assertiva no atual contexto, considerando que:
É possível estabelecer uma relação causa/efeito entre as condições de ambiente térmico e a ocorrência de acidentes, o que possibilita a sua aplicação direta;
Permite integrar novos dados validados, quando surjam, convertendo as taxas e índices determinados em ‘tempos fora da tarefa’. Este processo – aberto e dinâmico – possibilita a integração da informação disponível a cada momento, tornando a medida (TFT) evolutiva, abrangente e permanentemente atualizada;
A conversão dos tempos de imobilização em valores monetários, associados à perda de produção, é facilitada.
Aspetos metodológicos complementares, referentes à medição simultânea da segurança ocupacional e da produtividade, relacionadas com o ambiente térmico, serão objeto de descrição conjunta posterior, quando se finalizar a exposição do corrente ponto (3.2.1). Analogamente ao realizado para o ambiente térmico, apresenta-se no quadro 3.2 a síntese das variáveis, índice e unidades a utilizar.
Quadro 3.2 – Segurança ocupacional (variáveis, índice e métricas)