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A medicalização da vida e da educação

Para realizar um resgate histórico da gênese do fenômeno denominado medicalização da vida, foi necessário ler autores como Ivan Illich e Michel Foucault, assim como textos de pesquisadores que se inspiram neles, pois ambos trouxerem relevantes contribuições para a compreensão do fenômeno. Segundo o Fórum sobre Medicalização da Educação e da Sociedade (2015b):

Desde que o filósofo austríaco Ivan Illich passou a criticar as tendências de transformar as dores e questões da vida humana em temas de domínio médico (na passagem da década de 70 para a década de 80), discursos comprometidos com a ética e com a dignidade das pessoas têm trazido preocupação com relação aos processos de medicalização engendrados na cultura ocidental. O filósofo Michel Foucault, o escritor

Peter Conrad e os psiquiatras Peter Breggin e Thomaz Szasz figuram entre alguns dos nomes importantes que deram continuidade à crítica do fenômeno da medicalização (p. 11).

Essa leitura não implicará no abandono dos pressupostos filosóficos e teóricos e da Psicologia Histórico-Cultural para desenvolver uma análise a partir de uma concepção idealista (Carvalho, 2014). As ideias são determinadas por condições da realidade objetiva, portanto, o “uso do método histórico-dialético exige a análise concreta destas experiências concretas” (Carvalho, 2014, p. 250). Dessa forma, a elaboração da análise da gênese do fenômeno da medicalização terá como base autores ancorados na Psicologia Histórico-Cultural, a partir dos pressupostos de Vygotsky, coerentes com o método materialista histórico-dialético.

A imposição de normas padronizadas de comportamento existia antes da medicalização da vida ser engendrada na sociedade. As mudanças que ocorreram na sociedade ocidental no final do século XVIII provocaram transformações na Medicina, que atingiu estatuto de ciência moderna, a partir de raízes positivistas. A modernidade viveu um processo de reformulação epistemológica, a partir de uma concepção de ciência ancorada no Positivismo que propõe a ciência experimental, que vai estudar os fenômenos humanos observáveis, que podem ser controlados, quantificados (Guarido, 2010).

Os diagnósticos surgiram primeiro na Psiquiatria, depois na Neurologia e desde o início provocavam a segregação, transformando a diferença em algo inato, biológico, anulando a historicidade do objeto. A medicina moderna também prometeu erradicar a doença no futuro, algo que não ocorreu, mas sim se intensificou a ponto de ser colocado que o século XXI se transformou na era dos transtornos (Moysés & Collares, 2013a).

Essa ciência moderna também se inseriu na lógica mercantilista, consequentemente, o seu surgimento está ligado ao capitalismo, possui relação de mercado, em alguns aspectos pode

ser compreendida como medicina individual, mas por outro lado é uma medicina que busca exercer uma forma de controle da população. Para Foucault (1979):

Minha hipótese é que com o capitalismo não se deu a passagem de uma medicina coletiva para uma medicina privada, mas justamente o contrário, que o capitalismo, desenvolvendo−se em fins do século XVIII e início do século XIX, socializou um primeiro objeto que foi o corpo enquanto força de produção, força de trabalho. O controle da sociedade sobre os indivíduos não se opera simplesmente pela consciência ou pela ideologia, mas começa no corpo, com o corpo. Foi no biológico, no somático, no corporal que, antes de tudo, investiu a sociedade capitalista. O corpo é uma realidade bio−política. A medicina é uma estratégia bio−politica (p. 47).

Na transição entre o séc. XVIII e XIX houve o surgimento da medicalização do Estado, das cidades e da população, dando início a um novo regime de historicidade denominado bio- história (Martins & Peixoto Júnior, 2009). A medicalização do Estado teria surgido na Alemanha, a urbana na França e a da força do trabalho na Inglaterra.

A Alemanha investiu na produção do conhecimento, a partir da ciência médica, com o objetivo de melhorar o nível de saúde da população. Nesse sentido, o Estado alemão se preocupou em normalizar a medicina e o médico, ou seja, todos deveriam ter a mesma formação e atuação. Surge assim uma organização médica estatal ou a medicina de Estado, para controlar e desenvolver ações com foco na saúde de determinadas regiões (Foucault, 1977). Para propor intervenção na saúde da população, foi criada a polícia médica, que serviu como tecnologia de poder para manter a força do Estado e o controle da população (Martins & Peixoto Júnior, 2009).

Posteriormente, na França, a medicina que se desenvolveu no final do século XVIII, não teve a estrutura de Estado como suporte, mas sim a urbanização, pois surgiu a necessidade de unificar e organizar a cidade de forma homogênea e que dependesse de um único poder. A primeira justificativa foi a econômica em função das relações comerciais. A segunda foi política, pois a população operária surgiu e causou tensões políticas e revoltas até a Revolução Francesa. Nas cidades, as doenças que surgiram, também provocadas pelo amontoamento dos

cadáveres de pessoas pobres que não tinham onde enterrar seus mortos, provocou uma ação por parte da burguesia baseada no modelo médico e político da quarentena, que se transformou numa forma de organização sanitária das cidades (Foucault, 1977). Esse processo significou a emergência de outra tecnologia disciplinar compreendida como dispositivos de segurança para possibilitar a governabilidade (Martins & Peixoto Júnior, 2009).

Dessa forma, a medicina urbana, social e coletiva, com sua prática de vigilância e controle, possibilitou sua inserção “no funcionamento geral do discurso e do saber científico” (Foucault, 1979, p. 54). Inicialmente o foco foi a condição de vida, de meio de existência, para depois analisar os efeitos do meio sobre o organismo.

Após o Estado e a cidade, o último alvo da medicina social foi a força de trabalho e os pobres, quando no final do século XIX estes começaram a ser vistos como perigo. Esse processo teve destaque na Inglaterra, em função do desenvolvimento industrial e do proletariado e a criação da assistência controlada por meio da intervenção médica. Essa assistência cuidava das necessidades de saúde, tornava essa população mais apta para o trabalho e protegia as classes mais ricas dos fenômenos endêmicos. Para Foucault (1979), a medicina social inglesa foi original, pois conseguiu sobrepor três sistemas médicos que implicavam em faces e formas de poder diferentes complexos: a assistencial destinada aos pobres, a administrativa que se encarregava dos problemas gerais como as epidemias, e a privada que beneficiava quem podia custeá-la.

Surge a clínica médica, baseada numa descrição incessante sobre o indivíduo, da doença, por meio da formação de um discurso que diz a verdade. Para conhecer a verdade sobre a patologia, o doente deve ser abstraído e uma descrição dos sintomas deve ser feita, fazendo com que a medicina se torne classificatória (Foucault, 2011). O saber médico penetra no espaço social, exercendo em todos os lugares e tempo a vigilância sobre a região, as moradias, as pessoas, a qualidade do ar e da terra e a moralidade. A consciência médica torna-se difusa,

aberta e móvel, presente na existência individual e também na vida coletiva. Nesse sentido, para Guarido (2010, p. 30): “a medicalização foi então tomada como expressão da difusão do saber médico no tecido social, como difusão de um conjunto de conhecimentos científicos no discurso comum, como uma operação de práticas médicas num contexto não terapêutico, mas político- social”.

Gradativamente, além de curar as doenças, a medicina criará o saber sobre o saudável e “uma definição do homem modelo” que normatizará a sociedade (Foucault, 2011, p. 37). Esse saber influenciará as ciências do homem, que vão surgir no prolongamento das ciências da vida. Portanto, as ciências do homem estavam biologicamente e medicamente fundadas, usaram conceitos por transferência, além disso, seu objeto de estudo, o homem e a sociedade, estava caracterizado “pelo princípio do normal e do patológico” (Foucault, 2011, p. 39).

Esse processo histórico retrata a constituição do biopoder que se refere “a ideia do poder médico ao mesmo tempo individualizante e totalizante, que intervém sobre cada um e sobre a população” (Martins & Peixoto Júnior, 2009, p. 161). O biopoder é o poder sobre a vida, que se estrutura a partir da integração entre mecanismos disciplinares (anatomopolítica) e de segurança e desses com a biopolítica. A governabilidade se configura em relações de poder com inúmeras técnicas para modificar, controlar, conduzir a conduta do outro.

Dessa forma, a medicina, ancorada na Biologia, se torna soberana nas formulações discursivas que passam a constituir a existência humana, gerir a vida, a forma como o homem age para cuidar de sua saúde, bem-estar, representa a si mesmo. O biopoder provoca a moralização da conduta humana em relação à sua saúde. Esses discursos são veiculados pela mídia que divulgam como conhecimento científico, impessoal, técnico, universal e provocam a ilusão de controle técnico da vida (Guarido, 2010).

Todas essas mudanças citadas anteriormente que representam o crescimento da extensão da atuação da medicina na sociedade e de seu poder pode ser compreendido como um processo

de medicalização do Estado e do surgimento do biopoder num contexto capitalista. Nesse contexto histórico, político e econômico é importante considerar o papel da indústria farmacêutica. Para Guarido (2010):

A produção dos remédios (não somente os psiquiátricos) e seu uso não podem ser vistos apenas no campo científico e da prática médica, os remédios atualmente produzidos apresentam-se como novos bens a consumir, atrelados a condição de produção de bem- estar, felicidade, auto-realização (p. 33).

Para o Fórum sobre Medicalização da Educação e da Sociedade (2015b, p. 12), “ao invés de se fabricarem remédios para doenças, fabricam-se doenças para remédios, com vistas ao aquecimento de um mercado que se abre para a indústria farmacêutica com a criação de supostas doenças”. Esse processo é alimentado por pesquisas, muitas vezes financiadas pela indústria farmacêutica, que supostamente comprovam a descoberta de novas doenças, assim como do sucesso no tratamento medicamentoso.

Existe uma dinâmica política e institucional do setor da saúde, de um lado há um complexo de indústrias que produzem bens, dentre eles, os equipamentos médicos e insumos, as vacinas e a farmacêutica, do outro lado está quem consome todos esses bens e serviços. O que une esses dois lados é o saber profissional, ou seja, o médico. Se o profissional tiver uma visão interdisciplinar, será mais aberto a outros saberes e serviços, mas se a visão for biologicista, considerará apenas sua especialidade aumentando o consumo dos produtos a ela relacionados. Nesse processo, a mídia exerce um papel importante, pois as indústrias recorrem a estratégias de marketing que são direcionadas aos profissionais da saúde no geral e aos meios de comunicação (Temporão, 2013).

No Brasil, o debate sobre medicalização da sociedade teve início com a tese de doutorado da socióloga Cecília Donnangelo, que foi professora da Faculdade de Medicina da Universidade de São Paulo - USP. Em sua tese, a autora pesquisou a relação entre saúde e sociedade, com destaque para a crescente medicalização da segunda a partir da ampliação dos

serviços médicos e da normatividade relativa às concepções da primeira. Outra socióloga, Madel Luz, alerta para o papel político dessas instituições médicas que promete salvação e felicidade à população (Moysés & Collares, 2013a).

A medicalização atinge várias esferas da vida, dentre elas, a Educação, a partir da medicalização de crianças e adolescentes e da invenção das doenças do não-aprender para aquelas que não se encaixam em padrões uniformes e homogêneos de normalidade aplicados ao aprendizado (Moysés & Collares, 2010). Para compreender como esse fenômeno atinge a Educação será imprescindível aprofundar o resgate histórico das mudanças na sociedade, tendo em vista suas formas de produção, aspectos sociais, culturais e econômicos.

O processo de medicalização da Educação1 transforma questões sociais em biológicas, como consequência, as instâncias de poder responsáveis pelos problemas educacionais são isentas de responsabilidade. Há diversidade na forma das pessoas aprenderem, no entanto, parcela significativa daquelas que apresentam dificuldade é diagnosticada com doenças neurológicas, cujo tratamento muitas vezes também é medicamentoso. Como consequência, “a medicina afirma que os graves – e crônicos – problemas do sistema educacional seriam decorrentes de doenças que ela, medicina, seria capaz de resolver, cria, assim, a demanda por seus serviços, ampliando a medicalização” (Moysés & Collares, 2010, p. 73).

As explicações para o aluno que não aprende são, em sua maioria, centradas no sujeito, em suas condições sociais, reproduzindo a lógica excludente e medicalizante do sistema e constituindo uma cultura da repetência. A escola é uma “instituição medicalizada, adoecida e adoecedora desde seu início” (Collares & Moysés, 2014, p. 51). Portanto, para compreender

1 Quando eu usar a terminologia medicalização da Educação, estarei me referindo a questões

macroestruturais, como aspectos sociais, políticos, econômicos e culturais. Já o uso da terminologia medicalização na Educação irá se referir às práticas que acontecem no interior das instituições escolares que contribuem com a produção do referido fenômeno, que serão foco da presente pesquisa.

como o processo de medicalização da Educação se desenvolveu é importante resgatar as raízes históricas do modelo de escola dominante (Souza, 2014).

Para Bonadio (2013) é importante investigar a história da Educação e da escola, para isso ela parte das sociedades tribais até as tendências pedagógicas contemporâneas para compreender o fenômeno da medicalização da Educação. As sociedades possuem estruturas, funcionamento e necessidades diferentes, conforme a época, o que faz com que a Educação se modifique para dar respostas às necessidades. A autora destaca ainda que:

Recuperar a historicidade levar-nos-á ao desvelamento da educação contemporânea, da concepção de homem, de mundo, de sociedade e de cultura, determinados pelo capital e que refletem diretamente na escola e nas teorias pedagógicas de cada período histórico as quais se mesclam compondo a prática pedagógica do professor (Bonadio, 2013, p. 54).

A sociedade tribal, segundo a autora, compreende um longo período do desenvolvimento da humanidade, quando o homem descobriu o fogo, depois criou os primeiros instrumentos para caça, aprendeu a cultivar alimentos, preparação para a guerra, assim como o surgimento da linguagem e da consciência. Isso revela que gradativamente as sociedades criavam necessidades mais complexas relacionadas à Educação de seus integrantes. A linguagem foi compreendida como fundamental para a organização social. A Educação passou a ser mais rígida, com disciplinamento, se baseava na tradição oral e na imitação, era difusa e coletiva, pois não havia a figura do mestre. Posteriormente, houve a criação da agricultura e do comércio, o surgimento das classes, do Estado e da religião, o que gerou a necessidade da invenção da escrita (Bonadio, 2013).

Após analisar as sociedades tribais, Bonadio (2013) prossegue com informações acerca do período da Antiguidade, que tem início 4.000 anos a. C., quando surgiram as civilizações Oriental e Greco-Romana, com cidades e governos absolutos, Estado detentor de propriedade, classes sociais e centralização do poder. Tais mudanças provocaram alterações na Educação,

que deixou de ser difusa e igualitária para ser para poucos, houve a inserção da escrita, mas com permanência da aprendizagem por imitação e a criação da escola. A aprendizagem da leitura e da escrita, assim como a cultura, era destinada às classes dominantes, as que eram dominadas tinham, no máximo, acesso a aprendizagens de conteúdos técnicos, voltados para o trabalho, pois a “divisão do trabalho requeria um ensino diferenciado a classes diversas e afirmava o papel social que cada indivíduo devia ocupar na comunidade” (Manacorda, 2006 como citado por Bonadio, 2013, p. 63).

A Educação da Grécia recebeu influência das civilizações localizadas no Oriente, mas apesar disso, era menos rígida e mais democrática. A classe dominante era preparada para a política e guerra, já os escravos e a plebe eram educados para o trabalho (Bonadio, 2013).

Bonadio (2013, p. 67) relata que “no fim do período homérico e início do período arcaico, houve mudanças na organização dos grupos em decorrência das alterações nos modos de produção”, ocorrido por volta de 800 anos a. C., com a divisão das terras, propriedade privada, divisão do trabalho, entre artesãos e agricultores, criação da Cidade-Estado ou pólis. A educação ficava a cargo da família até os 7 anos, depois era responsabilidade do Estado, pois era pública e obrigatória, mas as meninas iam para uma casa destinada às mulheres para realizarem atividades domésticas e os meninos eram educados para alfabetização, música, dentre outros (Aranha, 2006 como citado por Bonadio, 2013).

Posteriormente, Bonadio (2013) cita o declínio do Império Romano e aponta o surgimento da sociedade feudal e o crescimento da Igreja Católica, que passa a controlar a política, a moral e a Educação durante a Idade Média (período que engloba os séculos V e XV d.C.). Tais mudanças sociais provocaram a eliminação das escolas, abolição do direito romano, incentivo à economia de troca, oposição entre campo e cidade, surgimento dos países e escravidão. A escola era restrita aos clérigos e à nobreza e “servia como instrumento de poder” (Bonadio, 2013, p. 79). No século XIII a Escolástica surgiu, tendo São Tomás de Aquino como

um dos maiores divulgadores, que se baseia em princípios filosóficos de Platão e Aristóteles e os adequa à Igreja. O conhecimento não era inato, cada indivíduo tinha sua potencialidade que deveria ser transformada pela educação, ou seja, ele defendeu maior ênfase nas características e diferenças individuais. Apesar dessa defesa, Bonadio (2013, p. 77) sublinha que:

Por muito tempo e não só na Idade Média, como também em boa parte da Idade Moderna, o povo permaneceu analfabeto, o conhecimento adquirido pelas pessoas estava atrelado ao senso comum, às suas experiências, às tradições e aos costumes. A perspectiva cultural estava limitada à fé, e a visão de mundo era alcançada por eles raramente pela escrita e frequentemente pela oralidade e por imagens carregadas de mensagens e de simbolismos cristãos.

Apenas parte da população tinha acesso à escola, que se resumia às classes altas e aos monges, sendo que esses grupos tinham o poder de elaborar textos para difundir ideias e a cultura. Dessa forma, a partir da restrição do acesso à informação e o controle imposto à população, essa última enfrentava grandes obstáculos para se opor à essa situação. No entanto, entre os séculos XI e XIV, aconteceram as Cruzadas, que favoreceram o surgimento do comércio e da burguesia como nova classe, a Igreja não tinha mais o controle do poder e da Educação. Tais transformações sociais possibilitaram que a população não estivesse mais controlada pela religião. Inicia-se um novo período “que questionava as tradições cristãs e a autoridade da Igreja, caminhando para a superação da explicação divina dos fatos e para uma nova concepção de Educação em uma perspectiva humanista não mais escolástica” (Bonadio, 2013, p. 81). O final das Cruzadas culmina com o início do Renascimento (entre os séculos XIV e XVI), com mais alterações na Educação:

A mudança no modo de produção e o surgimento da classe burguesa, impulsionada pela expansão do comércio, pelo uso do dinheiro e pela mais valia, alteraram a concepção de homem, de sociedade e, consequentemente, de educação. Para atender às necessidades e aos interesses deste período, era necessária uma formação voltada à preocupação de uma classe em ascensão, fugindo dos preceitos religiosos impostos pela Igreja na Idade Média (Bonadio, 2013, p. 82).

Escolas sem caráter religioso foram criadas com o objetivo de instruir a burguesia para poder cuidar de seus negócios. A produção manufatureira dividiu o trabalho, retirando dos artesãos o domínio de todo o processo do trabalho, em função disso, o trabalhador deveria ser especializado. Inicialmente não havia necessidade de instruir o trabalhador. Nesse contexto, a Educação deveria ser diferenciada conforme a classe social e funcionava como instrumento de poder das classes dominantes:

Entretanto, ressalta Aranha (2006), havia a diferenciação entre a educação da alta nobreza, da pequena nobreza, da burguesia e das classes populares, cada educação deveria atingir um objetivo específico. A alta nobreza era educada nos castelos, por preceptores, sua formação era voltada à manutenção do domínio dos feudos e à garantia do poder, enquanto que a pequena nobreza e os burgueses, interessados na educação de seus filhos, buscavam uma escola capaz de os formar para a liderança, para a administração dos negócios e para a política. Não havia qualquer preocupação com a educação das pessoas que faziam parte dos segmentos populares, a elas seria destinada apenas a aprendizagem dos ofícios, nada mais (Bonadio, 2013, p. 87).

A preocupação com a infância começou a ser discutida e a Educação foi organizada por faixa etária a partir da Idade Moderna. No entanto, a educação tinha como missão disciplinar e moralizar, sendo que a Igreja quem era responsável pela maioria das escolas (Ariès, 2006 como citado por Bonadio, 2013). Apenas com a Revolução Francesa que houve exigência para que a escola transmitisse conhecimento, pois a burguesia defendeu a Educação laica e obrigatória para diminuir o ensino religioso nas escolas e conquistar votos (Bonadio, 2013).

O foco apenas na dimensão racional surgiu no século XVIII, que foi uma época de grandes mudanças da Europa, como por exemplo, o desenvolvimento das forças produtivas e a Revolução Industrial na Inglaterra (1780), as unificações entre reinos que constituíram Estados Nacionais, a Revolução Francesa (1789-1792) e o surgimento da ciência e sua valorização da racionalidade, com o advento do Iluminismo (Souza, 2014).