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Outras possibilidades de enfrentamento do fenômeno da medicalização na educação

O Fórum sobre Medicalização da Educação e da Sociedade (2015b), discute a necessidade de se compreender o fenômeno da medicalização, o que envolve estudar aspectos teóricos e discutir casos de forma coletiva, interdisciplinar, incluindo os diferentes serviços envolvidos, ou seja, de forma intersetorial. No tocante à Educação, o texto destaca a urgência em valorizar o trabalho docente para que novas práticas pedagógicas possam ser elaboradas. Sugere-se que seja feito o resgate da trajetória escolar, identificar e respeitar o que os alunos sabem e querem aprender. Além das ações acima, o documento recomenda buscar estratégias diferenciadas para o trabalho com a leitura e a escrita, usar diferentes gêneros textuais, tendo como objetivo ampliar os usos sociais da escrita, ampliar a capacidade leitora e a interpretação. Tendo em vista uma proposta de atuação interdisciplinar e intersetorial, Braga, Leite, Bray e Souza (2013) relatam uma experiência de atendimento a uma criança. Segundo os

autores, é muito importante resgatar o processo de escolarização da criança diagnosticada com TDAH, a partir do relato da família e profissionais da escola, além de encontros com a equipe, para refletir acerca da importância da mediação e condições para desenvolver a atenção voluntária, tendo como base os pressupostos da Psicologia Histórico-Cultural. Isso possibilita a todos os envolvidos avaliar as condições concretas de ensino-aprendizagem e a desconstrução de pressupostos organicistas na origem da queixa escolar.

Souza (2007) apresenta a proposta de Orientação à Queixa Escolar – OQE desenvolvida no serviço-escola do Instituto de Psicologia da Universidade de São Paulo. Essa proposta de atendimento baseia-se na abordagem crítica em Psicologia escolar, que considera que a gênese da queixa escolar apresenta seu centro no processo de escolarização, por isso envolve a escola e seus personagens, como alunos, profissionais e familiares, que constituem uma rede de relações complexas. Além dessa rede de relações, há a compreensão de que o homem se constitui numa relação dialética com a sociedade, a partir de aspectos sociais, culturais, históricos e políticos. Dessa forma, a investigação da queixa, assim como a intervenção, leva em consideração todos esses elementos e personagens, não apenas o corpo do sujeito. O objetivo é propor ações reflexivas e que fortaleçam todos os envolvidos na direção da compreensão de forma mais complexa acerca do que levou a queixa e, a partir daí, que os participantes possam agir de forma a construir novas concepções e práticas e visem a transformação da situação.

A Psicologia pode contribuir com o enfrentamento do processo de medicalização na educação ao realizar a mediação entre familiares, criança, professores e coordenadores e os profissionais da unidade básica de saúde na busca de novas estratégias pedagógicas. Essa mediação pode ser feita a partir da realização de questionamentos e reflexão sobre outras possibilidades contrárias à culpabilização e medicalização (Souza & Silva, 2013). Outra possibilidade de contribuição da Psicologia é acolher o sofrimento dos profissionais da

educação, seus sentimentos e valorizar seu trabalho, assim como mediar a situação de conflito entre profissionais e alunos. Gradativamente a visão dos profissionais em relação aos alunos e aos problemas escolares se modifica e pode gerar práticas menos autoritárias de resolução de conflitos e discursos com conteúdo diferente das explicações organicistas.

Num artigo que publiquei anteriormente, relato uma experiência de supervisão de estágio em Psicologia realizado na instituição educacional em que o contato com os profissionais da escola favoreceu o acolhimento de seus sentimentos e sofrimento e a valorização de seu trabalho. Além disso, ao mediar a situação de conflito entre profissionais e alunos, gradativamente a visão dos profissionais em relação aos alunos e aos problemas escolares mudava, o que gerava práticas menos autoritárias de resolução de conflitos e discursos com conteúdo diferente das explicações organicistas (Calado, 2013).

Basso (1998) explica que as condições de trabalho do professor são precárias, com jornadas extensas, desvalorização profissional, baixos salários, sem tempo para preparar aulas, corrigir trabalhos, discutir os problemas e trabalhar em equipe. As atividades desenvolvidas caracterizam-se pela reprodução mecânica, resultando numa prática alienante e prejudicando a qualidade de ensino. As aulas são desinteressantes para o aluno e o professor deixa de crescer como profissional e ser humano. Como consequência, o professor passa a trabalhar para garantir sua sobrevivência, o que não corresponde ao significado social do seu trabalho e acaba por provocar a ruptura entre significado e sentido de seu trabalho.

Para Basso (1998, paginação irregular):

No caso dos professores, o significado de seu trabalho é formado pela finalidade da ação de ensinar, isto é, pelo seu objetivo e pelo conteúdo concreto efetivado através das operações realizadas conscientemente pelo professor, considerando as condições reais e objetivas na condução do processo de apropriação do conhecimento pelo aluno. Para compreender-se, de modo efetivo, o significado do trabalho docente, é preciso destacar a ação mediadora realizada por outro ou outros indivíduos no processo de apropriação dos resultados da prática social.

Basso (1998) considera que a Educação formal possibilita a apropriação da cultura, o entendimento da realidade social de forma crítica e o desenvolvimento dos sujeitos participantes, quando a mediação realizada pelo professor em sua atividade pedagógica é consciente e intencional. A autora também ressalta a importância de propor uma formação inicial e continuada ao docente que possibilite a compreensão, a reflexão e a aquisição da consciência acerca do significado social de seu trabalho, o que facilitará o encontro com o sentido pessoal de sua atividade docente, proporcionando condições para que o profissional, mesmo sob condições de trabalho objetivas, não desenvolva atividades fragmentadas e alienadas.

Asbahr (2005), tendo como base aos fundamentos da Psicologia Histórico-Cultural, realizou uma pesquisa para analisar a relação entre as condições de trabalho do professor em um contexto capitalista e as dificuldades para que estes se humanizem na realização da atividade pedagógica, visto que tais condições provocam alienação e prejudicam sua consciência. Por outro lado, o contato com os docentes no decorrer da pesquisa desvelou possibilidades de superar tal alienação que podem ser encontradas nas tentativas cotidianas e em que os professores discordam das visões e das teorias que buscam culpabilizar o aluno e sua família pelo fracasso escolar. A equipe, ao recusar tais concepções, busca tentativas de trabalhar em equipe, planejar suas aulas e conduzir suas atividades de forma mais humanizadora e é nesse processo contraditório que o sentido e o significado da atividade docente se encontram. Nessa direção, a autora propõe insistir na formação docente e nos momentos coletivos de trabalho para a construção do projeto político-pedagógico da escola, pois esse documento representa um projeto-atividade que ajuda a enfrentar a fragmentação do trabalho do professor.

Para Bernardes (2012), quando o docente desenvolve a consciência do lugar que ocupa na sociedade, em relação à função social da escola e às possibilidades reais de ensino, é possível que a atividade pedagógica favoreça a consciência dos alunos. A consciência dos alunos, por

sua vez, implica no entendimento do lugar social que ocupam, da apropriação da produção humana construída historicamente e da necessidade de realizarem a atividade de estudo. Dessa forma, a constituição da consciência de professores e de alunos poderá ocorrer de forma dialética.

Trata-se de um posicionamento de caráter dialético que possibilita a análise da transformação na consciência dos sujeitos da atividade pedagógica, estudantes e professor, que se estende à análise da transformação da práxis como atividade prática que produz mudanças no próprio objeto da atividade, a organização do ensino e o desenvolvimento dos sujeitos, por meio da atividade pedagógica (Bernardes, 2012, p. 216).

Quando o professor transforma sua consciência, sua prática pedagógica também de modifica. Essa transformação está relacionada com o lugar social que o professor tem, suas condições de ensino, se o profissional possui estudos acerca da constituição do desenvolvimento humano a partir da Psicologia Histórico-Cultural, pois isso permitirá que compreenda as consequências das práticas sociais alienadas. Dito de outra forma, quando o docente se apropria em sua formação determinados conhecimentos teórico-científicos, ele entende a realidade escolar de forma mais complexa e se torna capaz de elaborar práticas para intervir nessa realidade. Nas palavras da autora “Considera-se, portanto, que a apropriação de conhecimento nos campos ontológico, gnosiológico, epistemológico e lógico sobre a constituição e desenvolvimento das funções psicológicas superiores como elemento essencial para a formação de professores” (Bernardes, 2012, p. 217).

Nesse contexto as escolas que possibilitam maior participação, reflexão crítica acerca da prática pedagógica desenvolvida, como as que apresentam gestão democrática, pode contribuir com o enfrentamento do fenômeno da medicalização na Educação. Segundo Souza (2014), é frequente o relato de superação de sofrimento e dificuldade de aprendizagem de crianças anteriormente diagnosticadas com distúrbios neurológicos ou com suspeitas, ao estudarem em escolas que funcionam diferentemente do modelo hegemônico.

Observa-se que os autores citados acima, em sua maioria, apontam para a importância de desenvolver propostas de intervenção com o professor em formação inicial e continuada. Além dessas ações é necessário propor políticas públicas que enfrentem o fenômeno da medicalização. Nesse sentido, o Fórum sobre Medicalização da Educação e da Sociedade3 tem realizado articulações com órgãos públicos de controle social, assim como ministérios, secretarias, vereadores, deputados e senadores com o objetivo de elaborar programas e políticas de enfrentamento ao fenômeno da medicalização.

No ano de 2015, o Conselho do Mercado Comum do Sul - Mercosul publicou um documento com recomendações para combater a medicalização de crianças e adolescentes que incluem: criar diretrizes para prevenir a medicalização por meio de protocolos nacionais que controlem o consumo de medicamentos, de forma coerente com a garantia dos direitos das crianças e dos adolescentes (Mercosul, 2015).

No mesmo ano, em função do documento do Mercosul e de reuniões com o Fórum sobre Medicalização da Educação e da Sociedade, o Ministério da Saúde publicou o documento “Recomendações do Ministério da Saúde para adoção de práticas não medicalizantes e para a publicação de protocolos municipais e estaduais de dispensação de metilfenidato para prevenir a excessiva medicalização de crianças e adolescentes”. A decisão se baseou em pesquisas que revelam o alto índice de venda de medicamentos para crianças, com uma preocupação voltada para a Ritalina. A elaboração de protocolos para a dispensação do metilfenidato é compreendida como uma prática desmedicalizante, no entanto, além dessa medida, o documento sugere como práticas a garantia da educação de qualidade e o atendimento multidisciplinar em serviços de saúde (Ministério da Saúde, 2015).

3 No site www.medicalizacao.org.br é possível ter acesso a todos os documentos, publicações e projetos de leis aprovados.

Após a publicação do Ministério da Saúde, o Conselho Nacional de Saúde envia para os conselhos e secretarias estaduais e municipais de saúde, em outubro de 2015, recomendações para “a promoção de práticas não medicalizantes por profissionais e serviços de saúde e a publicação de protocolos clínicos e diretrizes terapêuticas para prescrição de metilfenidato, de modo a prevenir a excessiva medicalização de crianças e adolescentes” (Conselho Nacional de Saúde, 2015).

Pouco tempo depois o Conselho Nacional dos Direitos das Crianças e do Adolescentes – CONANDA lança a Resolução nº 177, de 11 de dezembro de 2015, que “dispõe sobre o direito da criança e do adolescente de não serem submetidos à excessiva medicalização”. O Conanda compreende que a excessiva medicalização se trata de violação dos direitos das crianças e dos adolescentes, de forma que é papel da rede de proteção realizar medidas que combatam esse fenômeno, buscando a qualidade do atendimento na educação e na saúde. O documento também ressalta a importância de se realizar medidas para combater a medicalização de adolescentes em conflito com a lei (CONANDA, 2015).

No ano seguinte, a Secretaria de Educação Básica – SEB e Secretaria de Educação Continuada, Alfabetização, Diversidade e Inclusão – SECADI/MEC – enviam ofício para as secretarias municipais e estaduais com as Recomendações do Ministério da Saúde (2015), solicitando medidas que garantam a educação de qualidade (Ministério da Educação, 2016).

No ano de 2016 a Subcomissão de Medicalização da Vida Cotidiana no Campo da Saúde e Sociedade, que constitui a Comissão de Saúde, Promoção Social, Trabalho e Mulher da Câmara dos Vereadores do Município de São Paulo, publicou um relatório que mostra a redução na prescrição de do Metilfenidato para crianças e adolescentes após a aprovação de um protocolo clínico que controle a prescrição desse medicamento e institui uma diretriz terapêutica com avaliação psicossocial, atendimento multidisciplinar e avaliação da situação educacional. Esse protocolo foi aprovado pela Portaria Nº 986/2014, da Secretaria Municipal

da Saúde de São Paulo, nesse ano. O relatório destaca a importância da adoção de abordagens não farmacológicas, além da participação da família e da escola.

A figura quatro apresenta os dados publicados no relatório, com indicação de um crescimento vertiginoso entre 2008 e 2012, uma queda em 2013 em função de problemas na importação do medicamento, retomada do consumo em 2014, mas com a aprovação da referida portaria, o ano de 2015 apresenta uma significativa redução, passando de 444.057 unidades consumidas para 356.490. O documento justifica a queda porque as equipes multidisciplinares realizaram outras práticas que não as medicamentosas para cuidar dos casos atendidos. Além disso, há a observação de que a redução não foi maior porque o tratamento com remédio não pode ser interrompido abruptamente. De qualquer forma, será necessário acompanhar o consumo por mais tempo para avaliar o impacto da portaria (Câmara Municipal de São Paulo, 2016).

Figura 4. Consumo de caixas de Metilfenidato em São Paulo entre 2008 e 2015

Nota. Câmara Municipal de São Paulo (2016).

Conforme dito anteriormente, o Ministério da Saúde publicou em 2017 o documento “Assistência Farmacêutica em Pediatria no Brasil: recomendações e estratégias para a

ampliação da oferta, do acesso e do Uso racional de Medicamentos em crianças” (Ministério da Saúde, 2017). Após análise da realidade brasileira, diversas recomendações são propostas, assim como estratégias para que elas sejam realizadas. Dentre elas, algumas se referem explicitamente à medicalização de crianças e adolescentes, conforme abaixo:

Recomendação 18: Garantir informações sobre acesso a medicamentos para crianças nas diretrizes do Ministério da saúde.

Estratégia 18.1: revisar diretrizes para inclusão de informações sobre acesso a medicamentos para a população pediátrica nos protocolos do Ministério da saúde, especialmente: (i) Protocolos Clínicos e diretrizes terapêuticas e (ii) diretrizes diagnósticas e terapêuticas em oncologia (p. 45)

Recomendação 22: elaborar protocolos para a assistência pediátrica no âmbito do SUS. Estratégia 22.2: elaborar protocolo de atenção à saúde mental pediátrica, com foco em ações não medicamentosas e, sempre que possível, desmedicalizantes, como no caso do transtorno do déficit de atenção com Hiperatividade (TDAH) (p. 55)

Recomendação 24: Promover atividades sobre o Uso Racional de Medicamentos em Pediatria, direcionadas aos cidadãos, especialmente pais, cuidadores e educadores. Estratégia 24.2: incluir o tema “URM em Pediatria” nas atividades do Programa saúde

na escola, política intersetorial da saúde e da educação.

Estratégia 24.3: identificar as oportunidades de utilização das práticas integrativas e complementares visando à redução do uso abusivo de medicamentos em crianças (ex.: psicofármacos, antibióticos, broncodilatadores, analgésicos, entre outras classes) (p. 60)

Todos esses documentos destacam a importância de realizar ações que garantam os direitos das crianças e dos adolescentes de terem acesso à serviços e políticas de Educação e à Saúde com qualidade, por isso, responsabiliza os gestores e as políticas públicas, os órgãos de controle social, a rede de proteção, assim como os profissionais e familiares. É necessário realizar pesquisas científicas e com qualidade sobre os medicamentos, controlar a prescrição dos mesmos, garantir a realização de uma avaliação amplia e multidisciplinar, assim como o tratamento com diferentes abordagens terapêuticas. É importante também pensar em ações intersetoriais que envolvam a Assistência Social, a Saúde e a Educação.

Além disso, o resgate histórico das relações entre transformações sociais, políticas, econômicas, culturais e educacionais revelou a profunda identificação das ações voltadas ao campo educacional com o projeto capitalista que engendraram o fenômeno da medicalização da vida. Dentre essas ações é possível encontrar mudanças na produção do conhecimento que atingiram a Medicina, a Psicologia, as Ciências Sociais e a Educação, ancoradas em supostos padrões de normalidade e anormalidade que se voltavam para a classificação dos escolares e exclusão dos considerados não aptos. Teorias e práticas foram elaboradas para justificar que os problemas tinham origem biológica, precisavam ser diagnosticados e tratados pelos profissionais da saúde.

No entanto, novos referenciais teóricos críticos foram elaborados e permitiram compreender que o processo de escolarização era determinado pelos processos sociais e históricos mais amplos, de modo que as práticas pedagógicas, a formação docente, os materiais didáticos, a infraestrutura das escolas, as teorias pedagógicas, as políticas educacionais expressavam tais determinantes, da mesma forma como favoreciam os altos índices de fracasso escolar. A nova compreensão permitia analisar as queixas escolares para além das categorias doente e saudável, normal ou anormal, de modo a contribuir para a elaboração de práticas escolares mais coerentes com a realidade dos estudantes, mais horizontais, no sentido da relação professor-aluno, e mais dinâmicas, na perspectiva da relação mediada. Por seu intermédio se tornou possível desmistificar os supostos transtornos associados ao processo ensino- aprendizagem, bem como contribuir para o efetivo desenvolvimento dos estudantes (Tada et al., 2017).

Infelizmente, os dados acerca de consumo de medicamentos desvelam que apenas alterações de ordem teórica não foram e nem serão suficientes para mudar substancialmente as concepções e as práticas relativas ao processo educacional, notadamente porque a escola encontra-se diretamente relacionada com a dinâmica social mais ampla e, portanto, com os

significados ideológicos que conformam a lógica dessa dinâmica. As pesquisas citadas indicam possibilidades de enfrentamento ao fenômeno da medicalização, que se tornam possíveis a partir do momento em que a compreensão de sua gênese foi possível, por meio da concreticidade.

As ações de enfrentamento precisam ser realizadas em várias direções, tendo em vista a formação de profissionais, conscientização acerca do fenômeno da medicalização e do consumo de medicamentos, elaboração de políticas públicas e de práticas desmedicalizantes. É nesse sentido que a presente pesquisa se insere. Observa-se que o conhecimento dos estudantes, futuros professores, acerca da medicalização, é incipiente, da mesma forma como não compreendem seu papel no processo de enfrentamento ao fenômeno.

Para Libâneo (2015), a formação de professores é uma área de estudos que inclui questões externas e internas. As questões externas se relacionam com as políticas educacionais, legislação, estrutura curricular, saberes docentes. Já as questões internas se referem à atividade docente, como “saberes requeridos para o trabalho com alunos, participação na organização e gestão da escola, práticas de avaliação do currículo, dentre outros temas” (p. 12). Para a realização dessa pesquisa, elegi a atividade docente como foco, mas sem ignorar a relação dialética com as demais questões externas citadas por Libâneo (2015).

Tendo em vista a relevância de dedicar essa tese à formação inicial, o foco foi delinear uma pesquisa que envolvesse alunos de pedagogia no contexto de formação inicial que possibilitasse a aprendizagem de conceitos científicos sobre medicalização da e na Educação na perspectiva da teoria da Psicologia Histórico-Cultural e a diretriz filosófica do materialismo histórico-dialético. Antes de abordar a teoria, foi necessário abordar os pressupostos referentes ao materialismo histórico-dialético.

3 Método

Diferente de metodologia, que se trata das ferramentas usadas para levantar os dados da pesquisa e que são muitas, cuja escolha depende do objeto e do objetivo do estudo, o método indica a diretriz filosófica que norteia a produção de conhecimento que se efetiva por meio da pesquisa. Assim, método é a diretriz filosófica que preside todo o estudo em questão (Tonet, 2013).

No caso da produção de conhecimento que toma por referencial teórico a Psicologia Histórico-Cultural, a partir da vertente desenvolvida por Vigotski, a diretriz filosófica, o método que norteia os estudos é o materialismo histórico-dialético. Os princípios do materialismo foram adotados pelo estudioso russo e incorporados à Psicologia, a partir do entendimento de que o ser humano é constituído socialmente, na interação com a natureza e com outras pessoas. Vigotski elaborou sua teoria “com base na tese da constituição histórica do homem, do sujeito”, ou seja, a partir do contexto histórico-social, das relações estabelecidas, do modelo de sociedade, da classe a que pertence (Facci, Barroco & Leonardo, 2009, p. 109).