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Migração Partidária

No documento Disserta Everaldo C de Moraes (páginas 81-84)

PROJETO AUTOR POSIÇÃO DO PARLAMENTAR

3.3.1 Migração Partidária

A questão da fidelidade partidária passa pelo alto índice de migração partidária no Brasil. Alguns trabalhos têm relativizado a influência dessa migração sobre o desempenho das representações no Parlamento e da governabilidade como um todo. Lima Júnior (1993), num estudo onde procurava entender a maneira pela qual se dava a composição partidária no Congresso brasileiro após o regime militar, encontrou algo interessante. Segundo o autor, os partidos políticos que surgiram com a redemocratização são fruto de quatro processos:

1- transformação dos partidos anteriormente vigentes (o MDB transformou-se no PMDB e a ARENA no PDS);

2- confiança e credibilidade na mudança do regime (com o fim do bipartidarismo surgiram o PT, PDT, PTB e, logo após, o PSB, PCB, PC do B, PDC e P..);

3- cisões intrapartidárias – alguns parlamentares oriundos do PMDB uniram-se na formação do PP, que após um curto período reintegrou-se novamente ao PMDB; o PFL, que foi uma dissidência do PDS e o PSDB, dissidência do PMDB;

4- razões de oportunidade política individual: surgimento de pequenos partidos, especialmente na legislatura 1986-1990, que não disputaram sequer uma eleição legislativa federal.81

O autor ainda promove, com base nos seus estudos, um número considerável de conseqüências políticas resultantes de um sistema político sem base partidária: a) afastamento do sistema partidário parlamentar do sistema partidário eleitoral; b) migração individual dos

81 LIMA JÚNIOR, O. B. A representação política e a composição partidária do Legislativo. In:_____.

parlamentares entre os partidos; c) enfraquecimento dos partidos, em virtude da introdução, ou do reforço, de uma perspectiva essencialmente individualista no processo político- parlamentar; d) conseqüências institucionais relacionadas com as dificuldades crescentes para a obtenção de consenso e para a formação de maiorias com um mínimo de estabilidade82. No Brasil, a migração partidária tem sido explicada por alguns especialistas como Lamounier, Meneguello, Mainwaring e Lima Júnior, como fruto de nossa legislação permissiva, enquanto para outros, como Figueiredo, Limongi e Schmitt, o problema parece estar na organização dos trabalhos legislativos. Independentemente da teoria a ser adotada, a migração partidária parece seguir uma lógica voltada para o interesse individual do parlamentar, que procura sobreestimar seu capital político deslocando-se para partidos políticos que lhe ofereçam maiores oportunidades de ascensão na carreira. Neste caso, um dos motivos para a mudança de partido pode estar na busca pelo apoio do Executivo.

Argumentos à parte, o fato é que pesquisas recentes demonstram que a porcentagem de congressistas que migraram de partido ao menos uma vez na Câmara Federal esteve entre 1987 e 1998 em constantes 30%.83 Outras pesquisas também tiram conclusões importantes em relação à migração partidária.

No que diz respeito aos partidos e aos blocos ideológicos, a migração partidária tem algumas características importantes: a) os deputados de direita tendem a migrar de forma mais acentuada do que aqueles eleitos pela esquerda; b) os eleitos pela esquerda migraram com menor intensidade, porém mais de um terço dos que o fizeram foram para a direita do espectro. Por sua vez, os deputados eleitos pela direita foram mais coerentes ao migrar permanecendo, mais de dois terços dos migrantes, dentro de seu campo ideológico; c) a maior parte das migrações dá-se dentro de bloco ideológico, em que o grau de liberdade para trocar de siglas não é absoluto, sendo que as “fronteiras” entre os blocos parlamentares parecem ser

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LIMA JÚNIOR, O. B. A representação política e a composição partidária do Legislativo. In:_____.

Democracia e instituições políticas no Brasil dos anos 80. São Paulo. Ed. Loyola. 1993.

83 MELO, C. R. F. Retirando as cadeiras do lugar: migração partidária na Câmara dos Deputados (1985-1998).

mais claras do que as existentes entre os partidos84; d) as migrações que ocorrem fora do mesmo bloco ideológico foram registradas no bloco de esquerda, e este comportamento atípico pode ser explicado por meio da observação da bancada do PDT, que não só foi o partido de origem da maioria dos migrantes de esquerda como da quase totalidade dos que cruzaram o espectro ideológico85.

Também podem ser esclarecidas algumas relações existentes entre as migrações partidárias, a ocupação de postos institucionais e o tempo de mandato dos parlamentares: a) deputados que não têm acesso aos postos institucionais da Câmara dos Deputados, tais como Mesa Diretora, presidente de Comissão Permanente, líder partidário com assento no Colégio de Líderes, migram mais do que aqueles que têm acesso; b) não existe nenhuma correlação entre o número de mandatos e migração partidária86.

A migração partidária a partir do desempenho eleitoral traz algumas confirmações interessantes: a) deputados que mudam de partido apresentam desempenho eleitoral inferior aos demais87; b) a possibilidade de um deputado federal conseguir sua reeleição diminui caso se tenha transferido para outro partido88; c) as mudanças de partido não melhoram as chances de sucesso do deputado, podendo piorá-las quando o deputado abandona um partido de esquerda ou um partido governista em direção à oposição; d) estudos demonstram não existir correlação entre a magnitude do distrito eleitoral e migração partidária89; e) a probabilidade de mudança de legenda é maior entre parlamentares eleitos por partidos pequenos90.

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MELO, C. R. F. Retirando as cadeiras do lugar: migração partidária na Câmara dos Deputados (1985-1998). Belo Horizonte. Tese (Doutorado em Sociologia e Política). Universidade Federal de Minas Gerais, 1999.

85ARAÚJO, M. Mudanças partidárias; A evolução das migrações partidárias na Câmara dos Deputados –

1979/1999. Dissertação (Mestrado em Ciência Política). Universidade de São Paulo, 2000.

86 MELO, C. R. F. Retirando as cadeiras do lugar: migração partidária na Câmara dos Deputados (1985-1998).

Belo Horizonte. Tese (Doutorado em Sociologia e Política). Universidade Federal de Minas Gerais, 1999

87 MELO, C. R. F. Retirando as cadeiras do lugar: migração partidária na Câmara dos Deputados (1985-

1998). Belo Horizonte. Tese (Doutorado em Sociologia e Política). Universidade Federal de Minas Gerais, 1999.

88 SCHMITT, R. Migração partidária e reeleição na Câmara dos Deputados. São Paulo: Ed. Novos Estudos,

CEBRAP, n. 54, p. 127-146, jul. 1999.

89MELLO, C. R. F. op. cit.

90ARAÚJO, M. Mudanças partidárias; A evolução das migrações partidárias na Câmara dos Deputados –

Estes estudos referentes à migração partidária podem nos levar à afirmação de que a fidelidade partidária não está diretamente relacionada a problemas concernentes à governabilidade. Mesmo assim, não se pode deixar de dizer que a migração partidária é fruto de um estelionato eleitoral. Como foi visto, o partido político tem uma importância decisiva na eleição de determinado parlamentar, e a mudança de legenda após o pleito retira dessa organização a sua força eleitoral, diminuindo os recursos provenientes do fundo partidário e o tempo do horário eleitoral gratuito de suas campanhas no rádio e na tv. A fidelidade partidária está associada à idéia de que os eleitores optaram por candidatos dentro de uma determinada legenda, baseados não em critérios pessoais, mas ideológicos e programáticos. Desta forma, a migração partidária implicaria uma traição ao programa do partido pelo qual foi eleito. Soma- se a isto o fato de que teoricamente as cadeiras no parlamento são pertencentes aos partidos políticos e não aos candidatos eleitos91.

Por isso, pode-se afirmar que a instituição da fidelidade partidária está em harmonia com a vontade do eleitor, mesmo que não haja subsídios para afirmar que nossa instabilidade política seja conseqüência das constantes migrações. Ao contrário, alguns autores até mesmo acreditam que infidelidade partidária ajuda na formação de governos de coalizão como o nosso. Alguns estudos demonstram que, com a mudança do sistema eleitoral para o sistema misto (proporcional e majoritário), ou mesmo com o simples fechar das listas, as migrações tenderiam a diminuir ou mesmo cessar, sem que a instituição de uma lei específica sobre a fidelidade partidária fosse necessária. Outros acreditam que é possível alcançar estes objetivos simplesmente alterando o regimento interno da Câmara dos Deputados e do Senado Federal, retirando os benefícios que alguns partidos políticos e parlamentares extraem da migração partidária.

No documento Disserta Everaldo C de Moraes (páginas 81-84)