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Capítulo 2. Modelagem Mecânica

2.4. Modelo Mecânico Considerado

No presente trabalho, o modelo mecânico considera um escoamento isotérmico de uma mistura de três constituintes quimicamente não reagentes: um constituinte gasoso com densidade muito pequena (inserido para levar em conta a compressibilidade do constituinte líquido), um constituinte sólido fracamente deformável e um líquido newtoniano, que a partir de agora será denominado como constituinte fluido. É importante ressaltar que o comportamento do constituinte sólido não é considerado, por ser ele suposto fracamente deformável. Além disso, o componente gasoso é considerado um gás muito rarefeito, sendo incluído apenas para considerar a compressibilidade do constituinte fluido, não sendo necessário, portanto, resolver as equações de conservação para esse constituinte. Sob estas hipóteses basta resolver equações de conservação de massa (equação (2.4)) e Momentum Linear (equação (2.12)) para o constituinte fluido [60, 61]

ρF

t ∇⋅

ρFvF

=mF. (2.15)

ρFvF

t ∇⋅

ρFvFvF

=∇⋅TFmF jFρFfFpF (2.16)

sendo que ρF representa a densidade mássica do constituinte fluido (razão local entre a massa do constituinte fluido e o volume correspondente de mistura), vF é a velocidade do constituinte fluido na mistura, TF é o tensor parcial de tensões associado ao constituinte

fluido, pF é a fonte (fornecimento) de Momentum Linear que atua sobre o constituinte fluido devido à sua interação com os demais constituintes da mistura. O termo jF

representa o Momentum Linear fornecido ao constituinte fluido devido a reações químicas com outros constituintes e mF a produção de massa do constituinte fluido surgindo a

partir da reação com os outros constituintes.

Como no presente trabalho os constituintes da mistura são considerados como não reagentes, tem-se que mF=0. Além disso, será considerado que o efeito das forças externas é desprezível em relação às forças causadas pela pressão e pelo escoamento, assim

fF=0. A partir dessas simplificações, as equações (2.15) e (2.16) podem ser reescritas como

ρF

t + ∇⋅

(

ρFvF

)

=0 (2.17)

ρFvF

t + ∇⋅

(

ρFvFvF

)

=∇⋅TF+pF (2.18)

Além disso, no presente trabalho o tensor parcial de tensões é suposto simétrico, satisfazendo, assim, automaticamente o Balanço de Momentum Angular para cada constituinte e, consequentemente, para a mistura.

A fração de fluido φ é definida como a razão entre a densidade mássica real do fluido (de um ponto de vista de Mecânica do Contínuo) e a densidade mássica do constituinte fluido (de um ponto de vista de Teoria de Misturas), e a saturação ψ é

definida como a razão entre a fração de fluido e a porosidade da matriz porosa ε, portanto, tem-se: φ=ρρF f (2.19) ψ=φε =ρρF fε (2.20)

sendo ρf a densidade mássica real do fluido (de um ponto de vista de Mecânica do Contínuo), enquanto ρF representa a densidade mássica do constituinte fluido (de um

ponto de vista de Teoria de Misturas, que é a razão local entre a massa constituinte fluido e o volume correspondente de mistura). É importante notar que se o constituinte sólido, que representa a matriz porosa fosse suposto indeformável (rígido), então 0<ψ⩽1. Como é admitido que a matriz porosa seja fracamente deformável, não é necessário satisfazer a restrição ψ⩽1. Observa-se que ψ não é ilimitado. Ou seja, ele apenas ultrapassa

discretamente a unidade. Assim ψ=1+δ , sendo δ≪1.

O Modelo Mecânico é obtido combinando-se as equações de conservação de Massa e Momentum Linear para o constituinte fluido (equações (2.17) e (2.18) respectivamente) com relações constitutivas para o tensor parcial de tensões (T) e o termo de fonte de momentum ( pF).

Inicialmente a relação entre a fonte de Momentum Linear é considerada [26, 60, 75]. Esse termo usualmente é escrito como um termo relacionado com a velocidade do constituinte fluido e um termo relacionado com o gradiente da fração de fluido. De acordo com [76], as equações clássicas de Darcy consideram as forças de arrasto que surgem a

partir da velocidade relativa entre os constituintes de uma mistura. Assim, o termo relacionado com a velocidade do constituinte fluido é usualmente chamado termo darciano. O termo relacionado com o gradiente da fração de fluido representa o efeito das forças capilares que surgem devido a distribuição não-uniforme do fluido na matriz porosa não- saturada. Dessa forma o termo pF é dado por [1]

pF=−μf

K φ

2

vF−μfD

K ∇ φ (2.21)

sendo μf a viscosidade do fluido, K a porosidade específica do meio poroso (ambas medidas sob um ponto de vista de Mecânica do Contínuo), e D é um coeficiente de difusão (análogo ao coeficiente de difusão de massa). Neste trabalho o termo darciano é desprezado, portanto pF depende apenas do gradiente de concentração.

A seguinte relação é assumida para o tensor parcial de tensões [1, 2, 26]

TF=−φ ^p I +2 λ φfDF (2.22)

sendo ^p a pressão, I o tensor identidade, μf a viscosidade do fluido, λ é um parâmetro sempre positivo que depende da microestrutura da matriz porosa [9] e DF é a parte simétrica do gradiente da velocidade do constituinte fluido.

De acordo com [77] as tensões normais são dominantes em relação às cisalhantes e às trações interfaciais, permitindo que o tensor parcial de tensões (2.22) seja escrito como

TF=−φ ^p I . (2.23)

Substituindo as equações (2.20), (2.21) e (2.23) nas equações (2.17) e (2.18), tem-se ∂φ ∂t+ ∇⋅

(

φvF

)

= 0 (2.24) ρf

[

∂φvFt + ∇⋅(φvFvF)

]

=−∇ ( φ ^p)− μfD K ∇ φ. (2.25)

Nesse ponto será considerado que o escoamento ocorre em uma matriz porosa que apresenta uma dimensão muito maior que as demais, como ilustrado na Figura 2.1, a seguir. Nessa figura, o escoamento ocorrerá na direção x e as equações poderão ser modificadas para contemplar apenas as variações nessa direção. Destaca-se que o modelo da Figura 2.1 pode representar um escoamento em um reservatório de petróleo, ou mesmo a dispersão de poluentes no solo.

Redefinindo a pressão ¯p=¯p(φ) como ¯p=ρp^

f φ+

μfD

K ρf φ, supondo que todas as

quantidades dependem apenas da posição x e do tempo t, e que a única componente não nula da velocidade do constituinte fluido vF seja v, pode-se reescrever o sistema não-

linear formado pelas equações (2.24) e (2.25) como

∂φ

t+ ∂∂xv)= 0 (2.26)

tv)+ ∂∂x

(

φv

2+ ¯p)=0 . (2.27)

Nesse ponto uma relação constitutiva contínua e convexa para a pressão é proposta. A seguinte relação assegura que o problema permaneça hiperbólico para escoamentos insaturados e saturados ¯p=

{

¯c ² φ , φ<ε ¯ c ² ε+¯cW 2 (φ−ε), φ⩾ε

}

(2.28)

sendo que ¯cW>¯c>0 e ε>0 são constantes.

A definição da pressão em (2.28) garante que os autovalores da matriz jacobiana do sistema associado sejam sempre reais e distintos, o que caracteriza um sistema hiperbólico. Isso será melhor explicado no capítulo 3. Além disso, a pressão como definida em (2.28) é função apenas de uma variável, assim sua derivada será denotada por ¯p' .

A figura 2.2 mostra a pressão em função da fração de fluido. Se a matriz porosa fosse considerada rígida, a pressão deixaria de ser uma variável constitutiva para φ⩾ε , pois o valor máximo da fração de fluido para um meio poroso rígido seria φ=ε [69], correspondendo a um meio poroso saturado, quando a pressão seria representada por uma linha vertical ( ¯p⩾¯c2

ε para φ=ε ). Como a supersaturação admitida é muito pequena a

inclinação da parcela na qual φ⩾ε , está muito exagerada.

Figura 2.2. Pressão versus fração do fluido em um escoamento supersaturado através de uma matriz porosa.

Nesse trabalho, a supersaturação φ>ε é permitida, presente na relação constitutiva proposta, equação (2.28). O parâmetro ¯cW é uma constante convenientemente escolhida

de tal forma que, quando ¯cW→∞ a matriz porosa tende a ser rígida e a pressão tende a

por uma linha reta, será suposto que δ>φ−ε⩾0 , sendo δ um número muito pequeno, assim, o parâmetro ¯cW não depende da fração de fluido. De fato, considerar δ muito

pequeno corresponde a considerar o parâmetro ¯cW muito grande, que é o procedimento

adotado no presente trabalho.

O parâmetro ¯cW pode ser escolhido livremente, desde que não seja menor que 1.

Quanto maior o valor desse parâmetro, mais próximo do problema real. No entanto, para as simulações numéricas, esse parâmetro fica limitado, uma vez que, valores elevados para ¯cW geram valores pequenos para φ−ε , sendo esses limitados pela precisão do

computador (que normalmente é em torno de 1 x 10−8

).

A hipótese da supersaturação busca preservar a hiperbolicidade das equações diferenciais parciais, enquanto não descarta qualquer variação não desprezível na permeabilidade e na porosidade. Tal hipótese é válida apenas para pequenas deformações na matriz porosa e dá origem a velocidades de propagação muito altas, quando a fração de fluido é maior ou igual à porosidade. Esse ponto de vista foi baseado nas considerações clássicas de elasticidade infinitesimal (na qual as configurações de referência e deformada são praticamente coincidentes).

Observa-se que, se fosse adotado uma curva parabólica para a pressão, que aproximasse a curva da Figura 2.2, a solução analítica do Problema de Riemann associado seria muito mais complexa, devido à álgebra associada.

ω=v ¯c, p= ¯ p ε¯c2, τ=¯c t , e cW= ¯ cW ¯ c (2.29)

as quais, combinadas com a definição de saturação (equação (2.20)), originam o problema

∂ ψ ∂τ + ∂x(ψω)=0 (2.30) ∂ ∂τ ( ψ ω)+x(p+ψ ω 2 )=0 (2.31) p=

{

ψ, se ψ<1 1+cw2(ψ−1), se ψ⩾1

}

, cw 2 >1 (2.32)

A pressão dada pela equação (2.32) fica da forma apresentada na Figura 2.3, a seguir.

Figura 2.3. Pressão versus saturação em um escoamento supersaturado através de uma matriz porosa.

Capítulo 3

Solução Completa do Problema de Riemann

3.1. Introdução

O Problema de Riemann trata da um sistema hiperbólico de equações diferenciais sujeito a um tipo particular de condições iniciais. O sistema em questão é representado por

u

t +

f (u)

x =0, x∈ℝ , t>0 (3.1)

sendo que:

u é um vetor de dimensão m x 1, cujas componentes são as variáveis do

f(u) representa o fluxo de u.

Se o sistema definido em (3.1) estiver sujeito a uma condição inicial do tipo degrau, então esse é um problema de Riemann. A condição inicial do tipo degrau é definida como

u(x ,0)=

{

uE=const , para x <0

uD=const , para x>0

}

(3.2)

Um sistema de equações diferenciais é dito estritamente hiperbólico se a matriz Jacobiana de f(u) possui apenas autovalores reais e distintos [79]. Para encontrar a matriz Jacobiana do sistema dado por (3.1) aplica-se a regra da cadeia, da seguinte forma

ut + ∂f (u)x = ∂ut + ∂f (u)uux= ∂ut +A(u)ux=0 (3.3)

sendo A(u) a matriz Jacobiana de f(u), definida por

A(u)=f (u)u =

[

f1/∂u1f1/∂u2 ⋯ ∂f1/∂umf2/∂u1f2/∂u2 ⋯ ∂f2/∂um ⋯ ⋯ ⋱ ⋯ ∂fm/∂u1fm/∂u2 ⋯ ∂fm/∂um

]

(3.4)

Se a matriz A(u) definida em (3.4) é uma matriz constante, o sistema (3.1) é um sistema linear. Caso contrário, esse sistema é não-linear.

Consideremos inicialmente o caso de sistemas lineares. Definindo-se a matriz D como a matriz diagonal, cujos componentes são os autovalores

λ

i de A(u), e a matriz R, cujas colunas são os autovetores R(i )

à direita de A(u), pode-se escrever

A=RDR−1 ou

D=R−1AR . (3.5)

A existência da matriz inversa R−1 permite definir um novo conjunto de variáveis

dependentes V =(v1, v2, ... , vm)T, chamadas variáveis características, dadas pela seguinte

transformação

V =R−1u ou u=RV (3.6)

Substituindo (3.5) e (3.6) em (3.3), tem-se que

RVt +RD R −1∂RVx =RVt +RD R −1 RVx=R

(

Vt +DVx

)

= ∂Vt +DVx =0 (3.7)

Escrevendo (3.7) em forma matricial, tem-se

∂ ∂t

[

v1 v2vm

]

+

[

λ1 0 ... 0 0 λ2 ... 0 ⋮ ⋮ ⋱ ⋮ 0 0 ... λm

]

∂ ∂x

[

v1 v2vm

]

=

[

0 0 ⋮ 0

]

(3.8)

A equação (3.8) pode ser desacoplada em m equações diferenciais da seguinte forma

vi

ti

vi

x=0, i=1, ..., m (3.9)

Observa-se que a equação (3.9) é análoga à equação da advecção linear, cuja solução é uma onda que se desloca com velocidade λi. Ou seja, o seguinte problema de

valor inicial ∂Vt +DVx =0 V (x , t=0)=V0(x)

é formado por m equações escalares da forma de (3.9), cujas soluções são

vi(x , t)=vi(x−λit ,0).

Dessa forma, a solução do sistema (3.3)-(3.2) é dada por

u(x , t)=RV (x , t)=

p=1 m vp(x , t) Rp=

p =1 m vp(x−λpt ,0)Rp.

Assim, a solução para u pode ser vista como a superposição de m ondas, que se propagam sem que suas formas sofram qualquer deformação. Logo, a i-ésima onda tem a forma vi(x , t=0) e se propaga com velocidade λi.

Para sistemas não-lineares, ou seja, aqueles cuja matriz A(u) definida em (3.4) não é constante, a velocidade característica λi é função da própria solução u, o que provoca distorções na forma de propagação das ondas.

Embora possam existir soluções generalizadas para todo o tempo para sistemas não lineares, elas podem deixar de ser diferenciáveis a partir de um certo instante. Para equações lineares, as singularidades na condição inicial são propagadas ao longo das características (que são curvas no plano x-t). No caso não linear isto em geral não ocorre, uma vez que as singularidades (no caso de serem choques) são propagadas ao longo das curvas do espaço-tempo que não são necessariamente características.

Algumas vezes, ao invés da singularidade na condição inicial ser propagada ao longo das características, ela é suavizada instantaneamente, de modo que no instante imediatamente posterior, ou seja, para qualquer t > 0, a solução já é contínua.

Exigir que uma solução u, para um sistema não linear, seja C1 (classe das funções

continuamente diferenciáveis) é uma condição muito forte. Logo, para aumentar o conjunto que contemple tais soluções é preciso diminuir as restrições sobre a regularidade das mesmas. Tal procedimento dá origem às chamadas soluções fracas para (3.1)-(3.2).

Definição: A função u0 é uma solução fraca de (3.1)-(3.2) se

0 ∞

−∞ ∞ [φtu0+ φxf (u0)]dx dt+

−∞∞ φ(x ,0)⋅u0(x ,0)dx=0 (3.10)

para toda função teste φ∈C1 0

[79]. Observa-se que φ é uma função vetorial. Assim, escolhendo-se φ=(0,0,…,0 , φi,0 , …,0 ,0) com φiC10 e i = 1, …, m, a equação (3.10)

define uma solução fraca para a i-ésima componente do problema de Riemann (3.1)-(3.2). As soluções fracas podem ser suaves. No caso de não serem suaves, isto ocorrerá para um número finito de conjuntos. No entanto, existe uma restrição que deve ser satisfeita pelas soluções fracas. Tal condição é chamada de condição de salto ou condição de Rankine- Hugoniot.

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