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CAPÍTULO 1: DETERMINANTES DA ESTRUTURA DE CAPITAL DAS EMPRESAS:

1.1 Abordagens teóricas sobre fontes de financiamento e estrutura de capital das empresas

1.1.5 Modelos baseados na competição sobre o controle corporativo

O crescimento, em termos de volume e quantidade, das práticas takeover no início da década de 1980 estimulou a análise da relação entre a estrutura de capital e o mercado para controle corporativo. Especificamente, questionou-se como o conflito em torno do controle da gestão poderia explicar, em parte, a estrutura de capital das companhias. A busca pelo controle corporativo levaria os gestores a eleger determinadas opções de financiamento que, ao influenciar o processo de takeover (sua probabilidade de ocorrência e valor pago pelo licitante) impactaria, por fim, o valor da empesa.

Para Harris e Raviv (1988), assim como para Stulz (1988), a estrutura de capital, por alterar a distribuição de votos entre gestores e investidores externos, afeta a probabilidade de concretização de uma oferta de takeover. Israel (1991) acrescenta que a estrutura de capital influencia também a distribuição do fluxo de caixa entre os agentes conforme esses detenham títulos com ou sem direito a voto, sendo este o principal fator determinante do resultado de uma aquisição. Em todos os casos, porém, a estrutura de capital – seja por determinar a participação acionária do gestor, seja por alterar a participação dos reclamantes com ou sem direito a voto no fluxo de caixa – influenciaria diretamente o processo de aquisição. Portanto, a probabilidade de que esta última ocorra, o valor pago pelo licitante vencedor e, por fim, o próprio valor da empresa, estariam indiretamente atrelados à estrutura de capital estabelecida.

O modelo proposto por Harris e Raviv (1988) se baseia na hipótese de que a estrutura de capital da empresa determina a participação acionária do gestor da empresa alvo. Esta última, por sua vez, influencia o resultado da aquisição e, consequentemente, a capacidade de controle da gestão – seja da empresa adquirida ou da adquirente.

De acordo com os autores, se a aquisição ocorrer, a participação acionária do gestor resulta em um entre três resultados possíveis: i) o gestor da empresa alvo, por possuir uma

26 porcentagem inexpressiva das ações da empresa, é substituído – ou seja, o gestor rival, mesmo que menos capacitado, assume o controle, sendo tal caso uma oferta bem sucedida (os benefícios do controle são perdidos); ii) o gestor titular detém uma parcela significativa das ações da empresa e permanece no comando independentemente da sua capacidade de gestão, resultando, assim, em um caso de oferta de compra mal sucedida (os benefícios do controle são certamente mantidos); iii) o montante detido pelo titular é tal que ele somente exerce o controle da empresa adquirida se for o mais habilitado para a função. Esse caso intermediário é chamado de proxy

fight, a identidade do vencedor é incerta até que os votos sejam recolhidos.

O modelo concentra-se na capacidade do gestor de manipular o método e a probabilidade de sucesso de uma tentativa de aquisição, alterando sua participação no patrimônio líquido da empresa. A participação acionária ideal seria determinada pelo titular a partir do trade-

off entre os ganhos de capital da sua participação e a perda de quaisquer benefícios pessoais

derivados do exercício do controle. Assume-se que o titular pode aumentar sua participação no capital da empresa por meio da recompra das ações dos investidores passivos, financiada por emissão de dívida. A dívida, por sua vez, diminui o patrimônio líquido, o que lhe permite obter uma fração ainda maior do patrimônio, mantida constante sua riqueza inicial.

Por conseguinte, a maximização do retorno do gestor será atingida por meio da escolha do nível de endividamento que determina a fração ótima do capital acionário a ser detida. Uma vez que se assume que os benefícios esperados do controle decrescem com o nível de endividamento11, dentro de qualquer um dos três processos acima descritos, seria ótimo escolher o menor nível de endividamento possível12 de acordo com o cenário com o qual o gestor se defronta. Os autores concluem que os alvos de ofertas não efetivadas muito provavelmente terminam com um nível de endividamento superior aos alvos do tipo proxy fight. Soma-se, ao que

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A razão apontada pelos autores para que o benefício do controle se reduza conforme se eleva o nível de endividamento são: o aumento da probabilidade de falência e, portanto, de os benefícios serem absolutamente perdidos, o maior monitoramento dos credores e/ou a redução do fluxo de caixa livre administrado pelo gestor.

12 O menor nível de endividamento possível tendo em vista o requerido para assegurar ao gestor uma porcentagem tal das ações

da empresa que, sendo ela vendida, ele obtenha o máximo retorno pela sua participação e não seja substituído pelo rival, mas desfrute dos benefícios privados do controle.

27 foi observado, que nas empresas envolvidas em casos deste último tipo, a alavancagem é, em média, menor quando o titular permanecer no controle13.

O modelo desenvolvido por Stulz (1988) parte de premissas semelhantes às do modelo anterior, ou seja, que o gestor, ao alterar sua participação acionária na empresa alvo, pode influenciar o resultado do processo de takeover. A diferença deste modelo está na consideração do efeito do endividamento sobre a probabilidade de haver uma oferta de aquisição. A depender da participação acionária prévia do gestor, o aumento do seu poder de controle pode influenciar tanto positiva quanto negativamente a riqueza dos acionistas14, seja por maximizar o valor esperado da empresa alvo, seja por reduzir a probabilidade de o takeover ocorrer tendo em vista o maior poder de barganha da gestão15.

O trade-off com o qual o gestor da empresa ofertante se defronta consiste na ponderação entre o prêmio a ser pago pela aquisição e os benefícios associados à detenção do controle. Isto é, o prêmio oferecido em uma oferta será positivamente relacionado à parcela do capital apropriada pelo gestor titular, mas o benefício associado ao controle deve superar o valor a ser pago para que a aquisição se concretize.

São várias as proposições advindas desse modelo. Em primeiro lugar, esperar-se-ia um maior nível de endividamento naquelas empresas que são alvo de aquisições, o que, por sua vez, implicaria a elevação do preço de suas ações. Conforme Stulz (1988), a possibilidade de um

takeover é considerada uma boa notícia no mercado de capitais e, por esta razão, o decréscimo da

relação dívida/capital que acompanha um evento como este é justificada pelo aumento dos preços

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A decisão dos investidores passivos a favor da permanência do gestor titular no controle depende das informações que eles detêm sobre os dois candidatos. Se a probabilidade dos investidores votarem pelo titular for previamente alta, ou seja, se for de conhecimento geral que o titular possui uma capacidade maior, é de se esperar um nível de endividamento e, portanto, uma participação do titular no patrimônio, menor. Ou seja, uma vez que a vitória do gestor titular num evento do tipo proxy fight está positivamente relacionada com a sua capacidade, o nível de endividamento requerido para permanecer no controle é menor.

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O autor sublinha que, para simplificação da análise empírica, considera o aumento da fração de ações com direito a voto controladas pelo gestor a única forma possível de ampliação do poder de barganha. Além disso, pressupõe a ausência de informação assimétrica, dos efeitos incentivo gerados pelo maior endividamento e de um maior disciplinamento da gestão em virtude do mercado para controle corporativo. São considerados somente os custos de agência oriundos exclusivamente do fato de uma oferta bem sucedida afetar acionistas e administradores de forma distinta, representando sempre um benefício para os acionistas – o que não necessariamente se aplica aos gestores. Por essa razão, a única motivação para os gerentes desejarem controlar um maior número de ações com direito a voto seria tornarem-se capazes de afetar o resultado das potenciais ofertas de

takeover tendo em vista reduzir a probabilidade de perda do controle. 15

Bradley e Kim (1985) demonstram que para empresas nas quais a porcentagem de ações com direito a voto controlada por gestores é superior a 20%, ofertas de aquisição são raras (apud Stulz, 1988).

28 das ações. No entanto, apesar do prêmio atribuído a uma aquisição ser positivamente relacionado com o nível de endividamento, a probabilidade de uma aquisição se efetivar é negativamente relacionada com o mesmo. Para o autor, há um nível de alavancagem ótimo que maximiza o valor das ações dos investidores externos e, portanto, o prêmio pago aos acionistas da empresa alvo.

Tendo observado um incremento no nível de alavancagem das empresas norte- americanas coetâneo ao desaquecimento das transações no mercado para controle corporativo, Israel (1991) propôs nova explicação para a relação entre este mercado e a estrutura de capital das empresas. Esta abordagem se aproxima da de Stulz (1988) no que tange ao efeito ambíguo do endividamento sobre o valor potencial da empresa alvo. No entanto, a razão pela qual um maior nível de alavancagem aumenta o retorno líquido dos acionistas com a aquisição e diminui sua probabilidade de ocorrência, é outra. Segundo o autor, a estrutura de capital afeta o resultado de disputas sobre o controle corporativo por meio do seu efeito na distribuição do fluxo de caixa entre proprietários de ações com direito a voto e detentores de outros ativos sem direito a voto16.

Pressupondo a ausência de custos de agência, o autor argumenta que o gestor, tendo em vista maximizar a riqueza do acionista, aumentará o nível de alavancagem da empresa para a qual trabalha assim que reconhecê-la como um potencial alvo de takeover17. Com um maior endividamento, o retorno líquido obtido via aquisição se reduz, tendo em vista que a avaliação dos ganhos considera a parcela do ativo comprometida com o pagamento dos credores. Como os acionistas da empresa alvo captam parcela dos ganhos dos credores quando da emissão dos títulos da dívida – lhes cabe toda a valorização esperada ex ante no valor da dívida –, parte dos lucros inicialmente previstos pelos novos acionistas é transferida para os primeiros, num montante equivalente à parcela do ganho comprometida com o pagamento do débito contraído antes da aquisição se concretizar. Para Israel (1991), esse resultado consiste no efeito benéfico da dívida sobre a riqueza dos acionistas da empresa alvo.

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Neste modelo, a definição de ativos sem direito a voto não se limita a títulos da dívida. O autor, ao empreender sua análise empírica sobre a determinação da estrutura de capital, distingue ações com direito a voto de todo o tipo de ativo sem direito a voto. Sendo o último grupo composto por títulos da dívida, ações preferenciais e ações ordinárias sem direito a voto.

17 A dívida é emitida em mercados competitivos ao valor presente do seu retorno esperado, rendendo um valor presente líquido

zero para os credores. Como resultado, ex ante, o nível de endividamento que maximiza o valor empresa, maximiza o valor do patrimônio (ISRAEL, 1991).

29 Em contrapartida, as perdas em termos de payoff dos acionistas da empresa licitante podem tornar a oferta de aquisição uma opção desvantajosa. Para Israel (1991), um elevado endividamento requer um adquirente mais habilitado, capaz de saldar os custos da aquisição e ainda alcançar resultados lucrativos com o aumento previsto no valor da empresa. Neste cenário, a probabilidade de que a aquisição ocorra e resulte em elevados ganhos para os acionistas da empresa alvo é reduzida, o que Israel (1991) nomeia como os efeitos negativos do endividamento.

A estrutura de capital ótima seria determinada pelo equilíbrio entre o efeito positivo e o efeito negativo do endividamento sobre o ganho dos acionistas da empresa adquirida. O trade-

off é obter um maior ganho líquido caso a aquisição venha de fato a se concretizar, mas ter

reduzida a probabilidade de que isso ocorra devido à redução do retorno líquido captado pelos acionistas adquirentes por meio da aquisição. Conclui-se que quando há disputa pelo controle corporativo o valor das ações, das dívidas e da própria companhia se elevam. Além disso, o endividamento deve ser maior para aquelas empresas com maiores chances de serem adquiridas o que, por um lado, torna-as mais baratas de adquirir, mas, por outro, eleva o prêmio pago pela sua aquisição. Em contrapartida, um aumento do nível de alavancagem reduz a probabilidade de que a firma venha a ser alvo de uma oferta de aquisição.