• Nenhum resultado encontrado

2.3 As abordagens de trade-off

2.3.2 Modelos baseados nos custos de falência

Os modelos propostos inicialmente por Modigliani e Miller (1958; 1963) consideravam que o capital próprio da empresa se tornava mais arriscado, e por isso mais caro, à medida que a empresa utilizasse mais dívidas. No entanto, possuíam uma suposição de que a dívida emitida pelas empresas (títulos de dívida) era livre de risco, não havendo a menor chance de ocorrência de inadimplência.

Sem dúvida, esse pressuposto é bastante questionável. Entretanto, Ross, Westerfield e Jaffe (2002, p. 346) destacam que “a possibilidade de falência exerce um efeito negativo sobre o valor da empresa. Entretanto, não é o risco de falência em si que reduz o valor. Na verdade, são os custos associados à falência que reduzem o valor”. Assim sendo, nos modelos de MM deve ser questionado, então, o fato de o uso excessivo da dívida não gerar os

chamados “custos de falência”, ou seja, aqueles que surgem com o evento da falência em si ou com a possibilidade de que ela ocorra.

Um dos trabalhos pioneiros nesse sentido foi o desenvolvido por Baxter (1967). A partir de um exemplo numérico, o autor demonstra que tanto os acionistas quanto os credores teriam uma tolerância ao endividamento até certo limite, depois do qual veriam suas perspectivas de obtenção de fluxos de caixa diminuírem.

Com esse raciocínio, Baxter (1967) conclui que não seria possível considerar realista o pressuposto de MM de que os lucros operacionais não são influenciados pelo nível de endividamento utilizado, o que, por sua vez, prova que os custos de ambas as fontes de financiamento deveriam se elevar em situações de alto grau de alavancagem financeira.

Umas das dificuldades, porém, apontada pelo autor foi a mensuração do impacto que os custos de falência teriam no valor da empresa. Em trabalho posterior, Warner (1977) considera essa questão de maneira mais explícita. O autor examina um conjunto de empresas do setor ferroviário americano que estavam em processos de recuperação judicial, considerando o intervalo de tempo entre 1933 e 1955. Uma das principais evidências apontadas é uma proporção média de 5% entre os custos de falência e o valor de mercado dos ativos das empresas avaliadas.

Tanto Baxter (1967) como Warner (1977), porém, ressaltam a dificuldade de se medir o valor dos custos de falência, em especial, algumas de suas partes. De fato, dois tipos desses custos podem ser caracterizados (BRIGHAM e HOUSTON, 1999, p.475): (a) os custos diretos de falência (ruptura financeira), relacionados ao evento da falência em si, como as despesas legais e contábeis, o levantamento do patrimônio da massa falida e a dificuldade de vender ativos pouco líquidos; e (b) os custos indiretos de falência (dificuldades financeiras), que ocorreriam antes da caracterização da falência, pela simples ameaça de que ela viesse a ocorrer, refletindo-se em situações como: perda de clientes e fornecedores, dificuldade de

reter funcionários na empresa, perda de flexibilidade financeira e desvalorização das ações da empresa.

Para todos esses autores, o primeiro tipo de custo é de mensuração razoavelmente simples, mas o último não é. Isso talvez possa ser apontado como uma das principais dificuldades ao se trabalhar com os modelos de trade-off entre benefícios fiscais e custos de falência, pois tende a haver uma subestimação destes, pela dificuldade em sua mensuração.

Nessa linha de raciocínio, Kim (1978) formulou um modelo que pode ser considerado a base dos modelos de trade-off entre benefícios fiscais e custos de falência. A noção básica deste modelo está na idéia de uma estrutura ótima, cuja escolha se dará em função de um balanceamento entre os benefícios e os custos do endividamento. Dentre os primeiros, o mais relevante seria o benefício fiscal decorrente da utilização da dívida (consideração dos impostos corporativos) para financiar os projetos da empresa. Já o custo mais relevante de financiamento seria aquele associado à probabilidade ou à ocorrência de falência, cada vez maior à medida que aumentasse o endividamento.

Uma das conseqüências mais interessantes do modelo de Kim (1978) é que o custo do capital de terceiros tenderá a também ser crescente, visando cobrir os riscos de default gerados pela maior utilização de dívida. Como desde o modelo de Modigliani e Miller (1958) considera-se que o custo do capital próprio será crescente, ter-se-á uma situação em que os custos de ambas as fontes de financiamento se comportarão de maneira crescente, refletindo o maior risco da utilização de endividamento. Isso é coerente com a teoria financeira que prega que a maioria dos agentes do mercado será adversa ao risco, exigindo retornos esperados maiores para correr riscos maiores (ROSS, WESTERFIELD e JAFFE, 2002)

Para concluir, cabe destacar que os modelos de trade-off entre benefícios fiscais e custos de falência estabelecem algumas relações teóricas importantes, passíveis de avaliação do ponto de vista empírico. As principais são:

a) Empresas com maior risco de negócio, medido por uma maior volatilidade dos seus resultados operacionais, tendem a se endividar menos, para não sofrer uma desvalorização mais forte de seu valor (BAXTER, 1967; BRADLEY, JARREL e KIM, 1984).

b) Empresas com maior lucratividade operacional tenderiam a se endividar mais, como forma de aumentar o volume de deduções para o cálculo do seu imposto de renda (KIM, 1978; FRANK e GOYAL, 2003b).

c) Empresas com maior tamanho tendem a se endividar mais, pois têm negócios mais diversificados e estão menos sujeitas aos possíveis efeitos de custos de falência, diretos ou indiretos. Com isso, seriam empresas menos arriscadas (WARNER, 1977; ANG, CHUA e McCONNELL, 1982).

d) Empresas com características de maior singularidade (por exemplo, produtos, processos de produção ou know-how muito específicos) tenderiam a se endividar menos, pois sofreriam maior depreciação no seu valor em uma situação de falência, possuindo, assim, maiores custos de falência (TITMAN, 1984).