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2.6 Novas abordagens para a escolha da estrutura de capital

2.6.3 Modelos Dinâmicos de Trade-Off

Nos modelos estáticos de trade-off assumia-se que a empresa tinha uma estrutura de capital ótima fixa, definida quando do início de suas atividades. A determinação de tal estrutura, basicamente, derivaria do melhor balanceamento entre os benefícios do endividamento (como benefício fiscal, redução dos custos de agência do capital próprio, etc) e os seus custos (como custo de falência e custos de agência do capital de terceiros). Posteriormente, quaisquer desvios que viessem a ocorrer na estrutura real em relação ao nível ótimo de endividamento deveriam ser corrigidos pela empresa no curto prazo.

Contudo, evidências empíricas como as apresentadas por Baker e Wurgler (2002), Welch (2004) e Famá e Da Silva (2005) fornecem indícios contrários a essa idéia, apontando que as empresas não fazem os reajustes pregados pelos modelos estáticos de trade-off, mesmo em um prazo mais longo.

Os defensores das abordagens de trade-off utilizam dois argumentos principais para justificar, no contexto desses modelos, o porquê dos resultados empíricos supracitados:

1º) A grande maioria dos modelos de static trade-off se baseia na ausência de custos de transação, tanto na emissão quanto na retirada de dívida e capital próprio. Contudo, em uma situação na qual tais custos existissem, poderia ser interessante para a

empresa postergar os reajustes na estrutura de capital, uma vez que o custo de efetuá- los poderia ser maior que os seus benefícios. Especialmente, se esse custo for alto, as empresas poderiam se manter fora da sua estrutura-alvo por muito tempo (LEARY e ROBERTS, 2005).

2º) Diante do dinamismo dos mercados contemporâneos, não se justifica pensar em uma estrutura de capital ótima estática, não-variável ao longo do tempo. Se os fatores que determinam esta estrutura ótima variam, naturalmente ela também tenderá a mudar ao longo do tempo. Além disso, em termos práticos, nem sempre é interessante que uma empresa utilize a sua máxima capacidade de endividamento logo no início de suas atividades. Em um contexto de estrutura dinâmica, a empresa poderia começar com mais capital próprio e alterar isso no futuro, se desejasse (TITMAN e TSYPLAKOV, 2005).

Essas duas questões levaram diversos autores a formular o que se denominou de “modelos dinâmicos de trade-off” (dynamic trade-off). De maneira geral, a essência desses modelos está no balanceamento entre custos e benefícios do endividamento, em busca de uma estrutura ótima de capital que varia ao longo do tempo. Assim, freqüentemente, as empresas avaliariam suas atuais condições, as situações almejadas e as condições do mercado externo (especialmente as dos mercados de dívida e ações), fazendo os devidos ajustes em seu endividamento, de maneira a obter a estrutura de capital de melhor relação custo-benefício. Alguns exemplos desse tipo de abordagem são os modelos desenvolvidos por Fischer, Heinkel e Zechner (1989) e Goldstein, Ju e Leland (2001).

Alguns modelos, como Brennan e Schwartz (1984) e Titman e Tsyplakov (2005), consideram que a empresa avalia simultaneamente as suas escolhas de investimento e financiamento. Assim, freqüentemente elas reavaliam as duas decisões simultaneamente, não

somente escolhendo a melhor estrutura de capital, mas também o nível ótimo de investimentos. Em alguns casos, como no modelo de Hennessey e Whited (2005), é incorporada ainda a decisão de política de dividendos, permitindo que a empresa avalie as três questões em conjunto.

Apesar do nível de desenvolvimento teórico atingido por esses modelos, eles ainda possuem poucas evidências empíricas que possam suportar ou refutar as suas proposições. A maioria das conclusões obtidas por eles baseia-se em procedimentos de simulação, nem sempre bem representativos de dados de empresas reais. Além disso, eles têm a maioria de suas formulações teóricas baseadas em decisões de tempo contínuo e infinito, ao passo que a disponibilidade de dados para a análise dos determinantes de estrutura de capital é normalmente anual ou trimestral. Assim, o teste empírico de suas proposições não é muito simples de ser realizado, razão pela qual se optou aqui pelo não aprofundamento destes modelos.

No contexto dos modelos dinâmicos de trade-off, um conjunto de formulações empíricas bastante interessantes é apresentado por Flannery e Rangan (2006). Basicamente, o seu modelo envolve a existência de uma estrutura ótima de capital, variável de acordo com a empresa e o período considerado, e um fator de ajustamento parcial da estrutura atual em direção a essa estrutura ótima, conforme a equação [12].

1 , , * 1 , , 1 ,t+

it

=

(

it+

it

)+

it+

i

ETM

ETM

ETM

ETM

λ

ε

[12]

Em que:

ETMi,t+1 = nível de endividamento a valores de mercado da empresa i no momento

t+1;

ETMi,t = nível de endividamento a valores de mercado da empresa i no momento t;

λ = fator de ajustamento entre o nível ótimo e o nível atual de endividamento; e

ε

i,t = termo de erro da empresa i no momento t+1.

Na verdade, modelos como esse, de ajuste parcial para uma estrutura ótima, já haviam sido estimados anteriormente, como em Shyam-Sunder e Myers (1999) e Fama e French (2002). Contudo, existem algumas diferenças. Em primeiro lugar, eles consideravam em geral o endividamento contábil, e não o de mercado. Além disso, a determinação da estrutura ótima alvo usualmente era feita por meio de critérios mais simples, tais como a média simples de todos os dados de cada empresa (SHYAM-SUNDER e MYERS, 1999) ou, mesmo, uma média móvel.

Em alguns casos, a estrutura ótima de cada empresa em cada período era determinada por um conjunto de fatores (FAMA e FRENCH, 2002), como lucratividade, tamanho e expectativa de crescimento, ou seja, os mesmos fatores utilizados nos trabalhos sobre fatores influenciadores da estrutura de capital. A grande diferença é que, na maioria dos trabalhos, a estrutura ótima é determinada primeiro e o resultado obtido é então inserido na regressão. Já Flannery e Rangan (2006) sugerem que a sua determinação se dê dentro do próprio modelo. Para estes autores, a estrutura ótima seria dada por:

t i t i

X

ETM

*,+1

, [13] Em que:

Xi,t = vetor de características da firma que influenciam a escolha da estrutura ótima de

capital.

Substituindo [13] em [12] e reorganizando os termos, tem-se:

1 , , , 1 ,t+

=(

)

it

+(1−

)

it

+

it+ i

X

ETM

ETM

λβ

λ

ε

[14]

A proposta de Flannery e Rangan (2006) com essa especificação era testar o nível de explicação fornecido por um modelo geral de trade-off dinâmico, com ajustamento parcial em direção a uma estrutura ótima. Segundo os autores, em trabalhos anteriores o fator (1-λ) apontava para um ajustamento de cerca de 5% a 15% da diferença entre a estrutura atual e o

nível ótimo, o que é muito baixo para fortalecer os modelos de trade-off, uma vez que implicaria em uma demora de vários anos para uma empresa retornar à sua estrutura ótima.

Usando uma amostra de 12.919 firmas americanas entre 1965 e 2001 no modelo acima especificado, os autores obtiveram índices bem superiores a esse, em torno de 35% a 40%, apontando que em poucos anos as empresas tenderiam a retornar às suas estruturas ótimas. As estimações foram efetuadas utilizando diversos métodos, como o de Fama e MacBeth (1973), a regressão em painel com efeitos fixos e o uso de Dynamic Panel Data. De maneira geral, a reversão ao endividamento ótimo se mostrou um fator muito mais significativo na explicação da escolha de estrutura de capital do que as demais variáveis, usadas para fins de controle.

Posteriormente, Flannery e Rangan (2006) testaram a inclusão em seu modelo das variáveis usualmente utilizadas para avaliar a eficácia dos modelos de pecking order (MYERS, 1984), market timing (BAKER e WURGLER, 2002) e inércia gerencial (WELCH, 2004). São elas, respectivamente: déficit de financiamento (DEF), média ponderada do financiamento externo (M/BEFWA) e efeito do preço da ação (SPE), todas conforme definições

anteriores. A idéia foi avaliar se alguma dessas variáveis influenciaria mais a decisão de estrutura de capital do que o ajuste parcial para uma estrutura ótima.

Em relação às duas primeiras teorias (pecking order e market timing), as variáveis se mostraram significativas, porém com influência muito pequena sobre o nível atual de endividamento. Tal conclusão suporta a hipótese, já levantada por Frank e Goyal (2003a), de que essas duas abordagens poderiam se constituir apenas em aspectos adicionais em um modelo geral de trade-off.

Com relação à abordagem da inércia gerencial de Welch (2004), os autores encontraram evidências da influência do desempenho acionário no endividamento no primeiro ano. Entretanto, ela não perdurou no longo prazo, com as empresas promovendo rápidos ajustes em suas estruturas de capital.

As conclusões obtidas por Flannery e Rangan (2006) se mostram coerentes com os estudos de Frank e Goyal (2003b) para o mercado americano. Ambos os trabalhos apontam, de maneira geral, para uma superioridade dos modelos de trade-off sobre as demais abordagens. Deve-se observar, porém, que tal conclusão advém da flexibilização de restrições impostas nos modelos estáticos (como ausência de custos de transação e estrutura-alvo estática). Para fortalecer ou não essas evidências, torna-se necessário realizar mais estudos empíricos, em outros contextos.

No Anexo I, apresenta-se uma síntese dos principais trabalhos internacionais sobre estrutura de capital. No Anexo II, faz-se o mesmo para os trabalhos nacionais recentes.