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2.3 As abordagens de trade-off

2.3.3 Modelos baseados nos impostos e outros incentivos fiscais

Pelo apresentado até então, os modelos de trade-off entre o benefício fiscal da dívida e os custos de falência parecem representar de maneira bastante intuitiva a decisão de estrutura de capital tomada pelas empresas. Contudo, existem diversas evidências empíricas que contradizem as proposições desses modelos. Em artigo posterior, mas desta vez sem a presença de Modigliani, Miller (1977) discute profundamente as falhas deste tipo de abordagem, apresentando novos argumentos para explicar a escolha da estrutura de capital.

Para isso, duas reflexões principais são efetuadas sobre o trade-off supracitado. Em primeiro lugar, o artigo discute se os efeitos dos custos de falência realmente chegam a superar os ganhos obtidos com o benefício fiscal. Miller (1977) conclui que este valor tenderia a ser ínfimo diante dos ganhos obtidos com o benefício fiscal. Por outro lado, o autor destaca que os níveis médios de endividamento das empresas americanas durante as décadas de 1950, 1960 e 1970 eram semelhantes aos das décadas de 1920 e 1930, momento em que a tributação era bem menor. Assim, os dois fatores seriam considerados insuficientes para explicar a escolha da estrutura de capital.

Para Miller (1977), a principal questão desconsiderada até então eram os impostos pagos pela pessoa física sobre recebimento de dividendos de ações e sobre juros de títulos de dívida. Partindo-se então do Modelo de MM com impostos (1963) e incluindo estes dois novos fatores, conclui-se que será a interação entre as três alíquotas de imposto de renda que determinará o tipo de relação entre o valor de uma empresa alavancada e o valor de uma empresa não alavancada.

Considerando o mercado americano, no qual existem diversos níveis de alíquotas marginais de imposto de renda, tanto para a pessoa física quanto para a pessoa jurídica, e ainda, no qual a alíquota sobre dividendos é quase sempre inferior à incidente sobre juros de dívida, Miller (1977) argumentou em favor da ocorrência de níveis de equilíbrio entre os interesses das empresas e dos acionistas. Se isso fosse verdadeiro, desapareceria o ganho do benefício fiscal, e a estrutura de capital escolhida seria indiferente, pois qualquer opção conduziria a empresa ao mesmo valor.

Aplicando idêntico raciocínio ao caso brasileiro, torna-se mais difícil obter o equilíbrio pregado por Miller (1977), uma vez que a variedade de alíquotas marginais de imposto de renda é muito pequena.

Há que se destacar ainda a existência no Brasil da figura dos juros sobre o capital próprio, forma alternativa de remuneração dos recursos aplicados na empresa por acionistas e que é tributada na fonte, de maneira geral, em 15% do valor. Conforme demonstrado por Sirihal e Melo (1999), esses juros tendem a estabelecer uma espécie de contrabenefício fiscal do endividamento; ou seja, incentivam a empresa a usar menos recursos de terceiros. Contudo, os próprios autores ressaltam que o tamanho desse efeito dependerá muito da variação dos lucros e do patrimônio líquido da empresa e, ainda, das variações na taxa de juros de longo prazo (TJLP) usada como base para que se estabeleçam os limites de pagamento dos juros sobre o capital próprio. Seguindo a mesma linha de raciocínio, Abreu (2002) demonstra que, de maneira geral, pelo fato de estes juros serem dedutíveis na legislação tributária brasileira, eles fazem com que o valor da empresa seja maior do que se não existisse essa dedução. Porém, o ganho decorrente do benefício fiscal é menor.

Em termos dos modelos de trade-offs envolvendo benefícios fiscais, ainda cabe destacar o trabalho de DeAngelo e Masulis (1980). Tomando como base a abordagem de Miller (1977), estes dois autores desenvolveram um modelo de escolha da estrutura de capital no qual, além das três alíquotas de imposto de renda (corporativo, da pessoa física sobre dividendos e da pessoa física sobre juros de dívidas), foi considerada a existência de diversas outras deduções fiscais (tax shields) que abateriam a base de cálculo do imposto de renda da pessoa jurídica.

Para melhor entendimento dessa questão, deve-se lembrar que grande parte das despesas reduz o lucro tributável da empresa. No entanto, algumas delas o fazem sem afetar diretamente o fluxo de caixa obtido; ou seja, conseguem fazer com que a empresa pague menos impostos sem que ela tenha que desembolsar mais para isso. Alguns exemplos são: depreciação, amortização (de bens intangíveis, como os do ativo diferido), exaustão (de

recursos naturais), provisões, equivalência patrimonial e créditos tributários a serem compensados (DEANGELO e MASULIS, 1980; PEROBELLI e FAMÁ, 2003).

O volume dessas deduções fiscais não desembolsáveis varia de empresa para empresa, de acordo com uma série de aspectos, dentre eles o volume dos investimentos fixos nos processos operacionais. Com isso, a necessidade de recorrer ao endividamento como forma de obter benefícios fiscais se torna variável de caso para caso. Em equilíbrio, não haverá mais um nível de endividamento único para todas as empresas, como pregado no modelo de Miller (1977). Ao contrário, haverá uma estrutura de capital ótima para cada empresa. Além disso, essa estrutura não estará baseada nem no uso máximo do endividamento nem na sua ausência, conforme demonstra o modelo de DeAngelo e Masulis (1980). Ao contrário, ela será, normalmente, uma estrutura intermediária.

A avaliação dos modelos de trade-off envolvendo benefícios fiscais leva a uma relação teórica adicional a ser testada empiricamente:

• Empresas com maior volume de benefícios fiscais obtidos por despesas não desembolsáveis tendem a se endividar menos, pois necessitam de menos despesas de juros para abater a sua base de cálculo do imposto de renda corporativo (DEANGELO e MASULIS, 1980).