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Modelos de reconhecimento de palavras escritas na leitura experiente

No documento UNIVERSIDADE FEDERAL DO PARANÁ (páginas 30-35)

29. Desempenho de Marcos nas provas aplicadas no pré-teste e pós-teste 1 e 2

2.1 MODELOS DE AQUISIÇÃO INICIAL E APERFEIÇOAMENTO DA LEITURA E

2.1.2 Modelos de reconhecimento de palavras escritas na leitura experiente

A pesquisa em psicologia cognitiva da leitura tem se dedicado, principalmente, à elaboração de modelos do funcionamento cognitivo do leitor competente. Esses modelos têm sido propostos, na tentativa de caracterizar alguns dos processos mentais que possibilitam ao leitor identificar, compreender e pronunciar as palavras escritas. (SOUSA, 2005, p. 7).

Para Alégria, Leybaert e Mousty (1997) e Sousa (2005) o ato de ler engloba, ao menos, dois processos importantes, a decodificação e a compreensão. De acordo com estes autores, o segundo processo depende do primeiro, pois para se compreender um texto é necessário identificar pelo menos algumas das palavras que o compõem. Assim, mesmo que a identificação visual das palavras não seja suficiente para a completa compreensão de um texto, ela é uma condição necessária para o desenvolvimento da leitura.

Na tentativa de conhecer melhor os mecanismos implicados na leitura os pesquisadores adeptos da psicologia cognitiva têm feito analogias entre as operações lógicas realizadas por computadores e as operações mentais. Assim, convictos de que os computadores poderiam ajudar a analisar como a cognição humana funciona, criaram programas de computador preparados especificamente para reconhecer sequências de letras e relacioná-las às suas respectivas pronúncias, utilizando princípios que determinam o desempenho em leitura de forma análoga aos seres humanos. (SOUZA, 2005; ROAZZI; JUSTI; JUSTI, 2008).

Na literatura estão disponíveis vários modelos de reconhecimento visual de palavras, porém, Roazzi, Justi e Justi (2008), Cardoso-Martins e Silva (2008) e Salles (2008) sugerem que os modelos que tem se destacado na literatura são os de Dupla Rota (ELLIS, 1995; COLTHEART et al., 2001) e os Conexionistas (SEIDENBERG; MCCLELLAND, 1989).

Na perspectiva do modelo da dupla-rota, duas vias podem ser utilizadas no reconhecimento de palavras, a lexical e a fonológica. A rota lexical permite que o leitor acesse a pronúncia da palavra como um todo diretamente no léxico ortográfico de duas formas: sem dar atenção ao seu significado (rota lexical não-semântica) ou atribuindo significado às palavras (rota lexical semântica). Pela rota fonológica ou sublexical o significado é acessado pela conversão das letras em sons que são combinados permitindo a leitura por decodificação. (GUIMARÃES, 2005).

Segundo Pinheiro (1994) e Guimarães (2005) o modelo da dupla-rota proposto inicialmente por John Morton em 1969 e sintetizado, anos mais tarde, por Ellis (1995) reúne

elementos de vários outros modelos e concentra informações que passaram a ser aceitas por vários pesquisadores.

No modelo de dupla-rota de reconhecimento de palavras concebido por Ellis (1995) o processamento (leitura) da palavra escrita pela rota lexical é iniciado com a apresentação da palavra escrita ao sistema de análise visual, que identifica, diferencia e codifica a posição de cada uma das letras. Em seguida, é acionado o léxico de input visual que compara a nova sequência de letras às palavras familiares (armazenadas). Os sistemas de análise e input visual mantêm relação bidirecional, assim, as informações sobre palavras conhecidas podem vir do sistema de análise visual e retornar a ele auxiliando no reconhecimento das letras. (ELLIS, 1995; GUIMARÃES, 2005).

Na sequência, pode ser acionado o sistema semântico, responsável pelo armazenamento de significados das palavras, este sistema também mantém relação bidirecional com o input visual, o que torna possível o “efeito de contexto” que facilita a identificação da palavra. Finalmente a informação é encaminhada ao léxico de produção da fala que se encarrega da pronúncia da palavra. Por último, o nível do fonema armazena os sons das palavras longas, que não são recuperados de uma vez no intervalo entre a produção da fala e a sua pronúncia.

O sistema todo pode funcionar sem que seja acessado o sistema semântico, fato que possibilita a leitura automática sem atenção ao significado. (Figura–3).

Figura 3: Modelo de reconhecimento de palavras escritas de Ellis (1995). Fonte: Ellis, (1995, p. 31).

Para Ellis (1995) é pela rota fonológica ou sublexical que são identificadas as palavras que não estão armazenadas no léxico (baixa frequência ou não familiares e pseudopalavras), nesta rota a palavra escrita é processada pelo sistema de análise visual que converte os segmentos ortográficos em elementos fonológicos que são combinados, armazenados no nível do fonema e pronunciados. A via fonológica é eficiente na leitura de palavras e pseudopalavras de baixa frequência, porém dificulta a decodificação de palavras irregulares e homófonas.

Pinheiro (1994), Ellis (1995), Partz (1997) e Guimarães (2005) argumentam que vários fatores psicolinguísticos podem determinar a rota a ser utilizada e as dificuldades ou facilidades na leitura de palavras, sendo os principais a lexicalidade, o comprimento a frequência e a regularidade, conforme segue.

No que se refere à lexicalidade as palavras podem ser categorizadas em reais e pseudopalavras (sequências de letras que formam estruturas que pode ser pronunciadas mas que não são consideradas palavras). As palavras reais podem ser lidas pela rota lexical ou fonológica, porém, as pseudopalavras dependem do processamento fonológico (rota sublexical) para serem pronunciadas porque não possuem representação no léxico. (PINHEIRO, 1994; GUIMARÃES, 2005).

O comprimento está relacionado ao tamanho da palavra, ou seja, ao número de letras que a constitui. Foram encontrados indícios de que a rota sublexical é usada com mais eficiência na identificação de palavras curtas do que nas longas, porém a rota lexical não é afetada pelo comprimento da palavra. (GUIMARÃES, 2005).

Com relação à frequência, observou-se que as palavras familiares e as de alta frequência, são reconhecidas com mais facilidade pela rota lexical, enquanto as de baixa frequência estão mais propensas ao processamento fonológico tendo em vista quepodem não estar consolidadas no léxico ortográfico. (ELLIS, 1995).

De acordo com Pinheiro (1994) e Guimarães (2005) a regularidade está relacionada ao tipo de relação grafofonêmica estabelecida na estrutura das palavras:

• Quando as relações grafofonêmicas são biunívocas, cada som é representado por uma letra e cada letra representa apenas um determinado som, as palavras são consideradas regulares (ex. pirulito, festa, pato, macaco);

• Quando as relações grafofonêmicas são cruzadas, mas, obedecem a regras ortográficas as palavras são denominadas regra, pois apresentam relações grafo-fonêmicas previsíveis (ex. gato, casa, vaso, galinha);

• Porém quando as relações letra-som não estão sujeitas a nenhuma regra têm-se as palavras irregulares com relações grafofonêmicas cruzadas arbitrárias (ex. tigela, homem, vexame, exame).

Ainda com relação à regularidade das palavras, Alvarenga (1988), Pinheiro (1994) e Salles (2008) destacam que do ponto de vista da leitura as relações grafofonêmicas podem ser regulares ou irregulares. No caso das irregularidades, apenas três letras no português do Brasil mantém relações ambíguas, o ‘x’ que poderá representar os sons de /ʃ/, /s/, /ks/, /z/ (ex. xícara, experiência, tórax, exame) e as letras ‘e’ (ex. caneta – caneca) e ‘o’ (ex. pipoca – telefone) quando aparecerem em palavras paroxítonas na posição tônica.

Com base nas relações grafofonêmicas na escrita as palavras podem ser divididas em regulares (ex. tatu, macaco), irregulares (ex. girafa, jiboia) e também regra (ex. raposa, galinha) cujas correspondências são definidas por regras ortográficas, como por exemplo, o ‘s’ intervocálico em vaso, rosa e o dígrafo ‘nh’ na palavra galinha. (SALLES, 2008).

A este respeito, Pinheiro e Rothe-Neves (2001, p. 404) explicam que “a implicação dessa diferença é que, enquanto uma palavra pode ser regular do ponto de vista da leitura (ex.: criança, feliz, harpa), ela pode ser irregular para a escrita.”.

Coltheart (1987) e Castles e Coltheart (1993) argumentam que no modelo de reconhecimento de palavras isoladas de dupla-rota o leitor acessa as palavras frequentes ou familiares (regulares e irregulares) pelo acesso direto ao léxico ortográfico, comparando a palavra a ser reconhecida com outras anteriormente armazenadas na memória. E faz uso das relações grafofonêmicas para identificar as palavras regulares desconhecidas e pseudopalavras que não estejam armazenadas no léxico. Dito de outra forma, o leitor experiente pode tanto utilizar a via lexical para reconhecer visualmente palavras que já estejam armazenadas no léxico como converter a palavra em um código acústico procedendo a decodificação para identificar a palavra pela via sublexical.

Conforme Gombert (2003) e Roazzi, Justi e Justi (2008) em oposição aos modelos de reconhecimento de palavras de Dupla-Rota em Cascata (DRC) surgem os de Processamento Paralelo Distribuído (PPD) de abordagem conexionista. Enquanto no primeiro modelo a criança utiliza a rota lexical, ou de acesso direto, para ler palavras regulares e irregulares de alta frequência, e a análise fonológica, ou acesso indireto, para ler palavras pouco frequentes e pseudopalavras, no segundo a leitura resulta de uma conexão em rede entre as unidades ortográfica, fonológicas e semânticas, onde, cada unidade influencia e é influenciada pelas demais.

Para Gombert (2003, p. 26) nos modelos conexionistas “o reconhecimento de palavras é o produto de uma distribuição de ativação no sistema de tratamento das letras e das informações fonológicas e semânticas associadas a essas letras”. Desta forma, não há um léxico mental onde as palavras conhecidas ficam armazenadas e são comparadas a outras no momento da leitura como nos modelos de dupla rota, mas, configurações de ativações distribuídas que reúnem a ação de diferentes redes neurais.

Gombert (2003) argumenta que no modelo conexionista de identificação de palavras proposto por Seidenberg e McClelland (1989) durante a leitura são ativados os processadores: ortográfico, fonológico, semântico e contextual. Assim, no momento em que o sistema recebe o input visual (letras impressas) as unidades ortográficas são ativadas e enviam sinais ativadores para as unidades fonológicas e semânticas simultaneamente. Quando são acessadas as representações fonológicas e o significado, estas unidades reenviam sinais ativadores para as letras que são compatíveis. O processador contextual exerce influência sobre as unidades semânticas que segundo Gombert (2003, p. 28) “desempenham indiretamente um papel na ativação das unidades fonológicas e ortográficas”. (Figura-4).

Fig. 4: Modelo conexionista de Seidenberg e McClelland (1989). Fonte: Gombert, (2003, p. 27).

Quando uma configuração de letras é ativada por repetidas vezes ela se torna familiar e as conexões estabelecidas entre as informações ortográficas, fonológicas e semânticas se fortalecem e se automatizam permitindo o reconhecimento da palavra inteira. A mesma via

seria utilizada para reconhecer as palavras não frequentes, porém, sem contar com ativações anteriores. (GOMBERT, 2003).

Apesar dos modelos de reconhecimentos de palavras apresentarem explicações importantes sobre a capacidade de leitura automática, Gombert (2003, p. 29) destaca que os pesquisadores precisam empreender grandes esforços no sentido de conhecer melhor este processo, tendo em vista que, o reconhecimento rápido e eficiente das palavras é um pré- requisito para a compreensão da mensagem escrita. E pondera, que “o reconhecimento das palavras deve ocorre sem que o leitor se dê conta de que ele efetua um trabalha intelectual.” Ou seja, é preciso mobilizar e direcionar os esforços para que o objetivo principal da leitura, a compreensão da mensagem, seja alcançado.

No documento UNIVERSIDADE FEDERAL DO PARANÁ (páginas 30-35)