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1.1.3. Condução eléctrica

1.1.3.2. Modelos de Seto e Bacaranni

Foi Seto que, em 1975, propôs o primeiro modelo realístico para descrever o comportamento eléctrico do silício policristalino [40]. De modo a explicar o mínimo na mobilidade no ponto crítico de dopagem e a dependência da resistividade em função da temperatura (activação térmica) por si observados, Seto baseou-se na teoria do armadilhamento de portadores de Kamins. Estabelecendo alguns pressupostos, como a presença apenas de um tipo de impurezas dopantes, totalmente ionizadas e uniformemente distribuídas, e tamanho de grão uniforme, concluiu que o valor da barreira de potencial associada às fronteiras de grão é função da concentração de dopante.

Seto estabeleceu que abaixo de uma concentração crítica (N*), ocorre apenas a ionização parcial dos estados armadilha nas fronteiras de grão, por captura de portadores livres, levando à formação de uma região de depleção por todo o grão, ficando o nível de Fermi deslocado para o interior do hiato energético. À medida que a concentração de impurezas dopantes aumenta, mais estados armadilha são ionizados, diminuindo a depleção no interior do grão. Contudo, isto faz com que a barreira de potencial aumente, sendo também função do tamanho de grão. Para uma densidade de estados armadilha fixa, o valor da barreira de potencial é dado por:

0 2 2 8εrε G B NL q E = (1.1)

onde εr e ε0 são respectivamente a permitividade do silício e do vazio.

Acima da concentração crítica, dada pela razão entre a densidade de estados armadilha e o tamanho de grão, os primeiros ficam totalmente ionizados, deixando os grãos de estar totalmente depletidos. A barreira de potencial começa então a diminuir, sendo dada por:

N Q q E r t B 0 2 2 8ε ε = (1.2)

Neste caso, a barreira de potencial é independente do tamanho de grão e, se a concentração de impurezas dopantes for muito elevada, tende a desaparecer. Isto explica a razão pela qual a resistividade do silício policristalino aproxima-se do valor observado no silício cristalino para altos níveis de dopagem.

A posição dos estados armadilha no hiato energético (Et) não tem influência no valor

da barreira de potencial, pois consideram-se totalmente ionizados. Neste modelo, os estados armadilha são considerados sempre abaixo do nível de Fermi, como mostra a representação da estrutura de bandas na Figura 1.10.

Figura 1.10 – Diagrama de bandas para uma concentração de impurezas dopantes a) maior que a concentração crítica e b) menor que a concentração crítica, segundo o modelo de Seto [40].

A Figura 1.11 a) ilustra a variação da barreira de potencial em função da concentração de impurezas dopantes, obtida recorrendo às equações (1.1) e (1.2). Esta aumenta linearmente até atingir um máximo para a concentração crítica de impurezas dopantes. A partir desse ponto, decresce rapidamente, em função de 1/N, independentemente do tamanho de grão.

a) b)

Figura 1.11 – Dependência da barreira de potencial em função da concentração de impurezas dopantes e tamanho de grão: a) segundo o modelo de Seto e b) alteração introduzida por Bacaranni

[41].

O modelo de Seto apresenta uma grande limitação, como pode ser observado na Figura 1.11 a). À medida que o tamanho de grão aumenta, a barreira de potencial torna-se demasiado elevada para ser realista, podendo mesmo apresentar uma descontinuidade na região da concentração crítica. Isto resulta de um incompleto tratamento da densidade efectiva de estados armadilha quando a região de depleção se estende apenas parcialmente no grão, como sugeriu Baccarani [41]. Foi exactamente Baccarani que melhorou o modelo de Seto e incluiu a possibilidade dos estados armadilha estarem parcialmente preenchidos, quando os grãos estão parcialmente depletidos, tendo em conta a ionização progressiva das armadilhas em função da posição do nível de Fermi. Esta alteração ao modelo de Seto, permitiu descrever

Introdução

melhor o comportamento eléctrico do silício policristalino para concentrações intermédias de impurezas dopantes.

Comparando resultados experimentais com o modelo de Bacaranni, podem retirar-se duas conclusões. Em primeiro lugar, no silício policristalino ocorre tanto a segregação de impurezas dopantes como o armadilhamento de portadores nas fronteiras de grão (pelo menos no caso do fósforo). Isto significa que as duas principais teorias propostas para explicar o comportamento eléctrico do silício policristalino são complementares. Os átomos segregados tornam-se inactivos nas fronteiras de grão, ocupando, contudo, estados diferentes daqueles que servem de armadilha aos portadores livres. Assim, a referência passou a ser o número efectivo de portadores em vez da concentração de átomos dopantes.

A segunda grande conclusão que resulta do trabalho de Bacaranni, corresponde à descoberta do cariz predominantemente monovalente dos estados armadilha nas fronteiras de grão, confirmando que se situam aproximadamente a meio do hiato energético. Isto resultou da comparação de dois modelos de distribuição dos estados armadilha: centrados no hiato ou associados a uma distribuição contínua ao longo deste. O primeiro adaptou-se melhor a valores experimentalmente obtidos para a energia de activação para a condução eléctrica (EA)

em amostras com diferentes graus de dopagem de fósforo.

Segundo o modelo de Bacaranni, o valor de EA no silício policristalino apresenta dois

regimes, como representado na Figura 1.12, existindo uma queda abrupta no seu valor no limite da depleção total dos grãos. Para uma concentração de impurezas dopantes abaixo desse limite, e tomando o meio do hiato como referência, a condutividade eléctrica (σ) apresenta a seguinte dependência:

⎟ ⎟ ⎠ ⎞ ⎜ ⎜ ⎝ ⎛ − ∝ T k E E B t G 2 1 exp σ (1.3)

onde kB é a constante de Boltzmann e T a temperatura. Significa isto que a energia de

activação não depende do grau de dopagem, sendo apenas função da posição relativa dos estados armadilha. Uma vez que estes se encontram localizados sensivelmente a meio do hiato, Et será aproximadamente zero, sendo a energia de activação cerca de metade do valor

do hiato energético. Este será o caso do silício policristalino intrínseco.

Acima do limite da depleção total dos grãos, a condutividade e a energia de activação dependem da barreira de potencial nas fronteiras de grão.

⎟⎟ ⎠ ⎞ ⎜⎜ ⎝ ⎛ − ∝ T k E B B exp σ (1.4)

Figura 1.12 – Energia de activação para a condução eléctrica em função da concentração de impurezas dopantes e densidade de estados armadilha, segundo o modelo de Bacaranni [41].

Na realidade, o tamanho de grão não é constante, tendo uma distribuição em torno de um valor médio. Por outro lado, os estados armadilha podem apresentar uma distribuição Gaussiana, com um desvio padrão muito pequeno, centrada em Et, além de que Et pode

encontrar-seligeiramente descentrado no hiato, dependendo das condições de processamento do filme [42]. Estas flutuações estatísticas tendem a tornar a transição no valor da energia de activação menos abrupta com o aumento do nível de dopagem, como observado por Seto [40] e Kamins [43].