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3. MORFOLOGIA CONSTRUCIONAL: PRINCIPAIS IDEIAS

3.7 A HETEROSSEMIA

De acordo com Lichtenberk (1991), elementos polissêmicos possuem significados de certa forma relacionados. No entanto, isso leva a questões sobre qual seria a natureza dessa polissemia e também qual a relação existente entre os significados ou funções de um item polissêmico, por exemplo. O autor observa que esses significados podem se relacionar por meio de redes de similaridades ou famílias de semelhanças, ou seja, há graus na relação ente eles.

O termo polissemia é normalmente tomado como a relação significativa entre duas palavras que compartilham o mesmo lexema. No entanto, Lichtenberk (1991: 476) ressalta a importância do tratamento das distinções significativas de uma maneira mais detalhada e destaca o termo “heterossemia”:

“casos (dentro de uma mesma língua) em que dois ou mais significados ou funções que são historicamente relacionados, no sentido de que derivam de uma mesma fonte, são suportados por reflexos do elemento de origem comum que pertence a diferentes categorias morfossintáticas.”11 source element that belong in different morphosyntatic categories.”

elemento deixa de ser gramatical e se torna lexical12, sendo que este último, mesmo apresentando novas propriedades, preservará características da fonte.

Com relação às ideias de significado e conceptualização, Lichtenberk (1991) destaca que a realidade existe apesar dos seres humanos, ou seja, ela não pode ser modificada, alterada. No entanto, a maneira como ela é percebida pode variar. Em outras palavras, os indivíduos formatam a realidade de acordo com sua percepção do mundo, suas concepções do real. Dessa forma, os significados de elementos linguísticos, então, não são meros reflexos das propriedades do fenômeno; antes disso, eles refletem nossa conceptualização do fenômeno, e nesse sentido são subjetivos (LICHTENBERK, 1991: 477)13. Isso leva ao surgimento de novas categorias por meio da aplicação de novas experiências à língua e da relação de diferentes domínios cognitivos. Logo, as conexões que os indivíduos fazem entre os fenômenos são extremamente importantes para o desenvolvimento da heterossemia.

Dando continuidade à discussão a respeito de conceptualização e heterossemia, o referido autor aponta que, quando ocorre a mudança na designação de um fenômeno para outro, ambas as designações devem apresentar propriedades em comum, mesmo que essa compatibilidade não seja total. Os dois fenômenos serão conceptulizados pelos falantes em sua complexidade e compreendidos no sentido do compartilhamento de aspectos estruturais. O agente motivador da extensão significativa é a própria relação que o usuário da língua faz entre a designação anterior e a nova, o que mostra que essa extensão semântica não é totalmente arbitrária. O significado que normalmente é tomado da palavra corresponde, na verdade, à sua faceta significativa central; todos os

12 Nesse sentido, Lichtenberk (1991) ressalta que nem sempre é possível estabelecer uma perfeita distinção entre um item lexical e um gramatical.

13 “The meanings of linguistic elements, then, are not mere reflections of the properties of phenomena;

rather, they reflect our conceptualization of the phenomena, and in that sense they are subjective.”

aspectos envolvidos no significado central podem vir a revelar uma extensão semântica ou funcional. Quer dizer, um verbo como “voltar”, por exemplo, implica a execução de dois movimentos, um de abandonar um local e outro de retornar a ele; logo, existem distinções semânticas e funcionais que podem ser destacadas a partir das implicações presentes nas facetas significativas de uma palavra. Muitas vezes a metonímia será responsável por essa mudança, ao especificar significados em função de um anterior. No entanto, Lichtenberk (1991) destaca que a metáfora também vem sendo observada, já que tem se apresentado como o veículo mais frequente para uma extensão funcional.

Com relação à metáfora, ela pode ser vista como uma espécie de instrumento linguístico que age em favor de relacionar dois elementos de esferas conceptuais diferentes. Nas palavras de Lichtenberk (1991: 479), a metáfora é mais que um instrumento linguístico; é primariamente um instrumento cognitivo por meio do qual conceitos de um domínio de experiência são usados para conceptualizar outros domínios de experiência14. Com base nessa afirmação, uma questão importante deve ser analisada: como surgem as metáforas conceptuais? Ora, a resposta para essa pergunta está relacionada à percepção de mundo do falante. Primeiramente, é necessário que haja a percepção de que existem características em comum entre fenômenos de domínios conceptuais diferentes. Nesse caso, um domínio não é conceptualizado de acordo com outro, mas eles são percebidos como estruturalmente semelhantes (de uma maneira mais geral). Logo, uma metáfora como time is space resulta da extensão de um domínio espacial dentro de um temporal, de acordo com a observação de suas características comuns.

14 “metaphor is more than just a linguistic device; it is primarily a cognitive instrument whereby concepts from one domain of experience are used to conceptualize another domains of experience.”

A partir dessas observações, Lichtenberk (1991) trata de casos de gramaticalização que envolvem um processo de mudança semântica em verbos que expressam a ideia de movimento, como go (ir), come (vir) ou return (retornar). Esses casos podem ser chamados de heterossêmicos. Para tanto, é necessário, antes de tudo, demonstrar de que forma as extensões funcionais envolvidas no processo são motivadas por meio da análise de sua origem significativa e funcional, assim como das conceptualizações feitas por meio de metáfora e/ou metonímia.

Além disso, conceitos como centro dêitico, movimento, direção, origem e destino são frequentemente explorados nas análises tomadas como exemplo para heterossemia pelo referido autor. O conceito de “centro dêitico” é, geralmente, orientado pela perspectiva do falante (EGO), ou seja, faz referência à localização do falante ou ao tempo do ato de fala, mas, em alguns casos, também pode estar relacionado a outro referente. Note que, no diagrama, abaixo pode-se observar as estruturas básicas dos verbos go (ir), come (vir) e return (retornar). Nos três casos fica claro o fato de que, dado o centro dêitico, movimento, direção, origem e destino são relevados diferentemente pelos verbos.

(37)

Assim, ficam claros os três princípios apontados por Lichtenberk (1991:480) nos quais se baseia a análise dos verbos (go, come, return) tomados como exemplo:

(1) Significados são complexos internamente; eles têm estrutura;

Apesar de o significado ser complexo, apenas um de seus componentes significativos pode figurar como base para as extensões funcionais, ou seja, apesar de suas especificidades, o componente de deslocamento em relação ao EGO é comum aos três verbos.

(2) Significados são subjetivos e abertos;

Além do significado primário, um termo pode apresentar aspectos periféricos relacionados às situações de uso, isto é, go (ir) implica deslocamento de distanciamento do EGO; come (vir), deslocamento em direção ao EGO; return (retornar) é ambidirecionado.

(3) Apesar de que todos os significados/funções derivam de uma mesma fonte em heterossemia, sincronicamente não há necessidade de que nenhuma propriedade seja exclusivamente partilhada por eles.

Logo, a base histórica é que necessita ser a mesma; as unidades lexicais devem ter a origem em comum. Tal fato é verdade na medida em que se observa que, se se acresce à sentença “estou indo” a expressão “de volta”, a sentença resultante “estou indo de volta” tem o mesmo sentido de “retornar”.

Os casos de heterossemia discutidos pelo autor mostram que é muito comum historicamente um verbo tornar-se elemento gramatical, enquanto o caminho inverso é bem menos frequente.

Segundo Enfield (2006), a heterossemia é um caso especial de polissemia no qual um dado elemento morfológico apresenta significados diferentes, porém relacionados, que se distinguem a depender do contexto gramatical em que são aplicados. Exemplos de heterossemia são palavras como father, walk, stone, talk, entre outras, que possuem significados relacionados a nome e verbo. Nesse sentido, a

heterossemia é dividida em dois tipos: (a) as classes abertas ou (b) as fechadas. Quando os significados da palavra heterossêmica pertencem a classes abertas, como, por exemplo, a palavra fly do inglês, será chamada de heterossemia de classe aberta; quando o mesmo ocorre com classes fechadas, como a palavra to do inglês, será chamada de heterossemia de classe fechada.

Ainda, vale lembrar que, de acordo com Rio-Torto (2012), o prefixo inter no português é um caso ilustrativo do fenômeno da heterossemia, já que, além da dualidade semântica apresentada, também pode combinar-se a:

(a) bases verbais

A ponte interliga Lisboa e Alameda.

(b) bases nominais

O comboio intercidades chega em cinco minutos.

(c) bases adjetivais

Posição intermuscular ‘entre os músculos’

Dessa forma, a heterossemia pode ser caracterizada como um processo por meio do qual um elemento sofre não apenas mudança semântica, mas também morfossintática em seu percurso evolutivo. Esse conceito será aplicado, no próximo capítulo, aos casos de reduplicação de base verbal em português.

VERBAL EM PORTUGUÊS

No presente capítulo, o fenômeno da reduplicação de base verbal será analisado em suas perspectivas semântica e formal. Em seguida, será demonstrado como essas duas perspectivas, o polo semântico e o formal, unem-se em uma única análise do fenômeno, formando redes construcionais.

4.1 – POLO SEMÂNTICO

De acordo com Langacker (1987), as classes semânticas nome e verbo podem representar modos de processamento cognitivo distintos. Os verbos estão relacionados a um escaneamento sequencial, o que envolve a transformação de uma configuração em outra ou uma sequência de transformações contínuas. Langacker exemplifica tal processamento por meio da representação do verbo cair dada a seguir, em (01):

(01)

Por outro lado, segundo ele, os nomes possuem um processamento cognitivo diferente, definido como escaneamento resumitivo (summary), no qual “(...) cada grupo de eventos contribui com algo para uma única configuração, cujos aspectos são todos concebidos como coexistentes e simultaneamente disponíveis”15 (p. 145). Logo, o nome queda tem a seguinte representação:

(02)

Em outras palavras, a diferença fundamental entre escaneamento sequencial e resumitivo repousa no fato de que o primeiro representa um evento processado sequencialmente, por meio de uma sucessão; já no segundo não há sequência ou sucessão: a contribuição de cada grupo de eventos é tomada simultaneamente. Essa mesma ideia é representada por Langacker (1987) por meio do “modelo da bola de bilhar”. O autor afirma que os objetos que existem no mundo podem se deslocar e até mesmo interagir quando mantêm contato. O deslocamento da bola de bilhar pode ser tomado de maneira sequencial, no qual cada trecho do evento é tomado por sua vez dentro de uma sucessão, ou de maneira estática, quando o evento é apreendido holisticamente na representação da cena.

15 “(...) each set of events contributing something to a single configuration all facets of which are conceived as coexistent and simultaneously available”.

Langacker (2008a) acrescenta que a ideia de escaneamento diz respeito à maneira como os aspectos da cena são percebidos, isto é, como se dá a percepção que funda a representação conceptual. Nesse caso, os trechos que constituem a cena são associados em uma interpretação do real.

Langacker (2008a) retoma o exemplo da bola rolando por um declive e aponta que, se essa cena for tomada como uma sequência de imagens, a trajetória da bola passa a ser apreendida pelo observador e esse processo é identificado como dinâmico em um escaneamento da realidade. A figura a seguir foi retirada de Langacker (2008: 110) (03)

Na ilustração em (03), o evento da bola de rolar é concebido no tempo ti, representado dentro de cada retângulo, enquanto a conceptualização é concebida no tempo Ti. Nem sempre haverá correspondência entre esses tempos. Por exemplo, podemos conceptualizar no presente um evento que de fato ocorreu no passado. No caso ilustrado, o movimento da bola é escaneado sequencialmente, ou seja, no instante Ti, o único evento apreendido é ti, e isso dá uma boa ideia do desenrolar da cena. Logo, o escaneamento descrito é sequencial.

Dessa forma, de acordo com Langacker (2008a), os diferentes tipos de escaneamento correspondem a diferentes categorias gramaticais, como nome e verbo.

Nesse sentido, o escaneamento sequencial está diretamente relacionado à ideia de

perfilamento16 verbal, já que o escaneamento é resultado da apreensão sequencial dos elementos na cena. Por outro lado, os nomes são categorias que não perfilam relações.

A próxima figura, retirada de Langacker (2008a:112), representa um escaneamento resumitivo:

(04)

Como se pode perceber em (04), no escaneamento resumitivo, cada trecho da cena é tomado de forma cumulativa, ou seja, no instante Ti, são apreendidas todas as configurações presentes nos trechos anteriores. Ocorre, portanto, uma síntese dos eventos que se desenrolaram em ti para cada Ti, e isso faz com que a percepção e a representação dessa cena sejam feitas de maneira holística.

Do mesmo modo, ocorrem os casos de reduplicação de base verbal em português. Nesse processo, os vocábulos passam de verbo a nome, deixando de ser processados de forma dinâmica para serem escaneados resumidamente nos moldes de Langacker (1987). Um nome que carrega o significado de evento pode ser visto como um processo de escaneamento mais sequencial, tal qual o caso de puxa-puxa, a brincadeira que envolve puxar repetidas vezes, enquanto o escaneamento resumitivo seria o processo que envolve puxa-puxa com o significado de doce. Ainda ao ratificar o

16 A noção de perfilamento (LANGACKER, 1987) diz respeito à capacidade de focar uma subestrutura dentro de uma unidade de conhecimento, que é tomada como base. Tome o exemplo da hipotenusa, que é o maior lado de um triângulo-retângulo. Então, sem a base o conceito de hipotenusa não teria sentido.

modo de conceptualização como sequencial ou resumitivo, Langacker (2008b) retoma a questão, respondendo a críticas e reiterando sua proposição.

Nesse sentido, é importante observar que

(a) Segundo Fillmore (1968), o significado é relativizado a cenas;

(b) De acordo com Fauconnier & Turner (1994), palavras são pistas para ativar significados.

Dessa forma, se, no caso da reduplicação de base verbal, o nome metonimicamente tomado ativa objetos e não eventos, então, o escaneamento é resumitivo. Em outras palavras, não se pode confundir a informação meramente linguística de motivação da formação do nome com o objeto que ela acessa na mente do falante.

Outra importante observação para o tratamento semântico da reduplicação de base verbal diz respeito à repetição. A estratégia da repetição (de palavras, de afixos) é frequentemente utilizada em língua portuguesa com o objetivo de expressar intensificação; logo, existe um esquema de repetição em português que pode ser instanciado de diferentes maneiras, a depender do processo em questão. Em (05), são listados alguns exemplos, extraídos do discurso oral, desse tipo de repetição em afixos;

em (06), exemplificamos repetição de palavras:

(05) E foi um tremendo golaçoaço!!

O seu visual está chiquerézimoézimo!!

Marcela é mesmo supersuperlegal!!

(06) Ele acorda cedo, cedo, mas dorme tão tarde!!

O professor fala, fala fala, mas ninguém entende nada O telefone chama chama chama e ninguém atende.

De acordo com Marcuschi (2002:107), a repetição consiste na “produção de segmentos discursivos idênticos ou semelhantes duas ou mais vezes no âmbito de um mesmo evento comunicativo” e pode exercer diversas funções na língua oral ou escrita.

Ela pode funcionar de modo a contribuir para a organização discursiva e auxiliar a coerência e coesão textuais, assim como nas atividades interativas. O referido autor observa que a presença desse tipo de recurso é muito mais frequente no âmbito da fala, já que, muitas vezes, a atividade discursiva da repetição faz parte da própria formulação do texto falado.

Marcuschi (2002) separa as estruturas de repetição em cinco tipos:

 repetição fonológica Ele mora tão loooonge daqui!

 repetição de morfemas Ele fez um golaçoaço!

 repetição de itens lexicais

A menina é linda, linda que ninguém para de olhar!

 repetição de construções suboracionais Bem, a lição a lição mesmo eu não fiz...

 repetição de orações

A mãe gritou, a mãe gritou, mas nada dele aparecer!

Ademais, de acordo com Koch & Silva (1996), apesar da repetição interferir consideravelmente na densidade informacional do enunciado, isso não representa prejuízo, pois a reiteração pode agir em favor de facilitar a compreensão do interlocutor. Observa-se, ainda, que a repetição de segmentos funciona como estratégia de intensificação, pois obedece a uma espécie de princípio de iconicidade, em que uma cadeia de linguagem idêntica, posta em posição idêntica, é concernente a um maior volume informacional (FIORIN, 2008: 549). A sentença em (07) exemplifica essa afirmação:

(07)

[...] atualmente se tu não ficas em cima do aluno ele não faz absolutamente nada, nada, nada mesmo.

Com relação à reduplicação de base verbal, a ideia de intensificação também é latente e igualmente se realiza por meio da estratégia de repetição (esbarra-esbarrra, mexe-mexe, tosse-tosse, pisca-pisca). Ora, a repetição revela-se, portanto, um importante veículo linguístico no discurso, e isso respalda a existência de uma construção de repetição em língua portuguesa (de acordo com a ideia de que a língua é um conjunto de CGs e itens potencialmente significativos – GOLDBERG, 1995). Esse esquema geral de repetição será adaptado, por meio de mescla (FAUCONNIER &

TURNER, 2002), ao esquema de composição do português (tema da próxima seção),

instanciando a construção de reduplicação de base verbal. O modelo desse esquema geral de repetição será representado por meio da repetição da variável X:

(08) [[X]xi[X]xi]xj  [reiteração da SEMx]

Nesse ponto, é importante relembrar do tratamento dado por Fauconnier &

Turner (1996) e Mandelblit (1997) para a mescla construcional. De acordo com Fauconnier & Turner (2002), na teoria da mescla, os falantes constroem blocos conceptuais que correspondem a sua formatação da realidade. Essas conceptualizações (inputs) podem ser mescladas e resultam numa estrutura emergente chamada blend. O quadro (09) foi retirado de Fauconnier & Turner (1994) e ilustra um modelo de blending conceptual:

(09)

De acordo com Fauconnier & Turner (2002), os espaços ilustrados no quadro podem ser relacionados da seguinte forma:

Inputs  espaços conceptuais, conceptualizações da realidade feitas pelo falante;

Espaço genérico espaço que deverá conter as propriedades em comum entre os inputs;

Blend estrutura emergente específica do espaço mescla, decorrente dos espaços relevados nos inputs:

 Composição. Os elementos presentes nos espaços de input compõem o blend.

No entanto, as relações entre eles não podiam ser observadas nos inputs separados.

 Completamento. Os elementos que constituem o blend são estruturas adicionais, no sentido de que podem representar um conhecimento compartilhado, frames.

 Elaboração. Ocorre a apresentação de novas etapas cognitivas na mescla, uma reinterpretação com base em uma nova lógica.17

Portanto, a criação do blend se dá, em sua configuração mais simples, por meio do mapeamento de dois domínios conceptuais: os espaços de input. O espaço genérico é responsável por refletir as estruturas compartilhadas por esses espaços. Nesse processo ocorre, portanto, a relação das contrapartes dos elementos que compõem os inputs, que, por sua vez, combinam-se em uma nova conceptualização. A estrutura emergente de blend herda propriedades das estruturas presentes nos espaços de input, combinando papeis, frames e esquemas, mas também apresenta novas propriedades e uma estrutura organizacional particular.

17 O espaço mescla será o resultado desses processos cognitivos.

Segundo Fauconnier & Turner (1996), por meio do processo de blending, sequências de estruturas simples podem servir para expressar sequências complexas de eventos, desde que haja correspondência entre o evento e o significado veiculado pela construção gramatical. apontam que alguns verbos, como throw (arremessar), já apresentam em seu escopo a ideia de movimento causado e são prototipicamente associados à construção sintática proposta por Goldberg (1995). Esse é o caso do exemplo (10), retirado de Fauconnier &

Turner (1996: 6)18: (10)

Jack threw the ball into the basket.

Jack arremessou a bola para dentro da cesta.

No entanto, os autores ressaltam que não é apenas esse tipo de verbo que pode se adequar à construção de movimento causado. Eles observam que mesmo um verbo que apenas expressa o significado de ação do agente pode também servir à construção e passar a expressar a ideia de movimento causado por meio da mescla. Esse é o caso do verbo sneeze (espirrar):

18 Os casos exemplificados podem não possuir uma perfeita tradução para o português.

(11)

Gogol sneezed the napkin off the table.

Gogol espirrou o guardanapo para fora da mesa.

Já o verbo trot (trotar) expressa a maneira como se move um determinado objeto. Fauconnier & Turner (1996: 11) ressaltam que esse tipo de verbo também pode aparecer na construção como em

(12)

The trainer trotted the horse into the stable.

O treinador trotou o cavalo para dentro do estábulo.

Outro caso de verbo que não pode ser considerado prototípico para a construção de movimento causado e que, ainda assim, pode perfeitamente se encaixar nesse caso é let (levar), que dá ideia de causalidade, como no caso:

(13)

Sarge let the tank into the compound.

Sarge levou o tanque para dentro do garagem.

Com base nessa revisão, Fauconnier & Turner (1996) propõem o seguinte modelo de mescla construcional:

(14)

Nesse modelo de mescla, os referidos autores propõem, portanto, que o blending deve ser feito entre uma instância prototípica da construção de movimento causado (input 1), como Jack threw the ball into the basket, e uma sequência de eventos (input 2).

Entretanto, com base nos estudos de Fauconnier & Turner (1996), Mandelblit (1997) observa que as operações de mescla construcional são, na verdade, casos nos

quais ocorre uma mescla entre a representação abstrata da construção de movimento

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