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Um dos grandes momentos de embate no campo educacional se deu em função do movimento escola-novista que se expandiu a partir do início do século XX e que nasceu, no plano teórico, das idéias de Rousseau:

A educação nova inscreve-se numa tradição verdadeiramente francesa que é o esforço constante para adaptar a educação às novas possibilidades e necessidades e para fazê-la progredir incessantemente no plano humano, tanto no interesse do indivíduo como da sociedade. É esse movimento, nascido no plano teórico com J. J. Rosseau – reconhecidamente, o primeiro teórico dessas concepções e que se desenvolveu, em princípio, pela acção meritória de processos isolados e corajosos, difundindo posteriormente na prática escolar e até nas normas familiares, que se denomina Educação Nova. (Mialaret, 1971, p.10)

Num contexto onde passam a predominar os valores do liberalismo, do capitalismo, da industrialização e urbanização, passa-se a exigir uma nova Educação, por se entender que a Educação que se tinha era voltada para as elites tradicionais, para a preservação dos seus privilégios, valores e costumes.

Denomina-se, então, escola tradicional, à escola considerada elitista a qual o movimento reformador viria combater. No Brasil, tradicionais eram as escolas moldadas no modelo católico, que foram aqui predominantes desde o descobrimento. Na França, eram as escolas de moldes católicos, que ressurgiram algum tempo depois da Revolução.

Num contexto onde a nova burguesia enriquecida passa a ser dominante, esse movimento renovador encontra grande ressonância.

Surge a proposta de uma escola que deveria se preocupar em preparar o aluno para o mercado de trabalho a partir do seu interesse:

O individualismo, finalmente, marca o nascimento da Liga Internacional de Educação Nova desde os seus princípios ... Daí se extrair imediatamente uma das conseqüências que deu brado no início da Educação Nova e que se exprime no terceiro princípio d a Reunião: os estudos e, de uma maneira geral, a aprendizagem da vida, devem dar livre curso aos interesses inatos da criança, quer dizer, àquelas que nela despertam espontaneamente e que se encontram a sua expressão nas variadas atividades de ordem manual, intelectual, estética, social e outras. (Mialaret, 1971, pp. 22-23)

Dentro desse embate, podemos perceber no Brasil o debate que se deu em torno do ensino de Matemática. Carvalho et al apresentam um exemplo das discussões travadas opondo os defensores de uma revolução no ensino de Matemática aos defensores do ensino tradicional, discussões que se estenderam do final dos anos 20 ao início dos anos 40 do século passado, onde o Estado procura exercer um papel conciliador.

O artigo apresenta o confronto entre defensores de duas propostas de ensino: Ensino nos moldes de Escola Nova, representado pelo professor Euclides Roxo, diretor do colégio Pedro II de 1925 a 1935, e vigoroso defensor das reformas de ensino de matemática divulgadas na Europa,

principalmente na Alemanha, a partir do início do século, lideradas por Felix Klein; e o ensino particular católico, representado pelo padre Arlindo Vieira, reitor e professor do colégio Santo Inácio e militante fervoroso da Educação católica tradicional. (Carvalho et al, 1996, p.50)

Quanto aos resultados desse embate:

Percebemos como um dos resultados desta discussão a permanência do “caráter enciclopédico” nos programas de ensino de matemática da Reforma de 1942, visto que não há diferenças substanciais entre eles e os anteriores. Em particular, Euclides Roxo conseguiu manter nestes novos programas a presença do ensino do conceito de função e do cálculo infinitesimal no ensino secundário. Contudo, houve ganhos por parte da facção tradicional católica. Os grupos tradicionalistas, principalmente os católicos, conseguiram reconquistar parte do espaço perdido no processo de laicização do ensino iniciado em meados do século passado. Como exemplo, as aulas opcionais de formação religiosa, e a liberação de verbas para incentivar a criação e a manutenção de instituições religiosas de ensino. (Carvalho et al, 1996, p. 53)

No Brasil, embora não prevalecesse enquanto uma prática duradoura ou abrangente, no embate travado naquela época, a Escola Nova, em certo sentido, foi considerada vitoriosa:

Embora a Reforma Capanema buscasse a acomodação de posições contrárias relativas ao ensino, aponta-se como vitoriosa a Escola Nova, pelo menos, em termos ideológicos e políticos, pois ela consegue se afirmar como dominante no discurso e nas representações a respeito da Educação brasileira que se farão dali por diante. (Cordeiro, 1999, p.50)

Mas a Escola Nova não ficará imune a críticas e surgem correntes que se colocam como alternativas a ela, embora não dissociadas da discussão do novo ×

A corrente da pedagogia histórico-crítica ou pedagogia (progressista) crítico- social dos conteúdos, da qual fizeram parte Dermeval Saviani e José Carlos Libâneo, tem como um dos seus princípios uma busca de síntese entre a pedagogia tradicional e a escolanovista:

A pedagogia progressista “dos conteúdos” pretende ser uma síntese do tradicional e do renovado no sentido de atribuir importância à transmissão dos conteúdos, embora sem perder de vista a atividade e a participação do aluno. (Libâneo, apud Cordeiro, 1999, p.104)

Pedagogia tradicional aqui é entendida como aquela que:

Põe a tônica do processo pedagógico na transmissão da cultura acumulada. Os conteúdos expressam verdades que estão acima da sociedade e dos indivíduos. A ação educativa é sempre externa, unidirecional. O professor é apenas um intérprete de conteúdos previamente organizados; através de métodos também já consagrados. A esfera do saber é independente da realidade separada da prática material e histórica dos homens. O caminho do saber é um só para todos, mas sua conquista depende de dotes naturais. Alguns (ou muitos) ficarão pelo meio do caminho; mas isto é considerado regra natural. Já a pedagogia nova (na vertente que chamamos de “progressivista”) quer escapar dos conteúdos clássicos e mesmo de sua organização prévia e estruturada. Interessa-lhe (sic) os processos pelos quais o aluno vai construindo e enriquecendo sua experiência pessoal e social. (Libaneo, apud Cordeiro, 1999, pp. 111-112)

Mas essa corrente se coloca criticamente em relação à Escola Nova, por entender que esta confere privilégios a uma minoria excluindo as camadas populares do acesso às escolas:

Saviani afirma que, historicamente, a Escola Nova instituiu, contra a chamada escola tradicional, uma pedagogia que terminou por legitimar as desigualdades, a partir do reconhecimento das diferenças individuais dos educandos. De acordo com o autor, o aparecimento desse tipo de pedagogia corresponde ao momento em que a burguesia

já se encontra instalada no poder e deixa de ser classe revolucionária. (Cordeiro, 1999, p.106)

Nestes contextos que apresentei, a discussão sobre o ensino tradicional de Matemática não ganhou muita visibilidade, pois ela estava embutida nas discussões sobre o ensino tradicional.

Um contexto onde se permitiu um olhar privilegiado ao ensino tradicional de Matemática foi quando do advento da Matemática Moderna, que se inicia no final dos anos 50.