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Movimento Social em Política Social na concepção dos jovens

5. LIMITES, POTENCIALIDADES E DESAFIOS IDENTIFICADOS

5.1. Política social integral na concepção dos jovens

5.1.2. Movimento Social em Política Social na concepção dos jovens

A pergunta situou-se no eixo do trabalho que versa sobre a relação Movimento Social e Política Social, com um conjunto de respostas que indica a lúcida consciência acerca do tema. As palavras chave - participação política e protagonismo, entendidos como lideranças que lutam pelos direitos coletivos - adquirem conteúdo e sentido pela visão dos jovens, que as expressam no foco da busca pelos direitos sociais. Há neste sentido um reconhecimento de um “antes e depois do projeto, objeto deste estudo”, ou seja, a reconhecida contribuição do projeto aos movimentos sociais da região.

Adicionalmente, segundo os entrevistados, o Centro Santa Fé se destacou por trazer unidade nos Movimentos Sociais da região em torno de causas comuns, deu credibilidade e fortaleceu a legitimidade de tais movimentos, em razão foi o peso institucional do Projeto Santa Fé nos referidos Movimentos Sociais, sempre com a

militância permanente dos que participavam dos cursos e atividades do projeto. Atuar nos Movimentos era parte da essência da formação integral concebida no projeto, sendo a inserção em assentamentos e acampamentos dos sem-terra uma atividade que trabalhava diretamente este foco. Grupos de jovens acompanhados de educadores e gestores da época passavam dias acampados convivendo, trabalhando com os acampados e assentados, durante o dia e à noite participando de debates para conhecer, diretamente da fonte, as histórias de lutas em cada contexto. Ao voltarem dessa experiência promoviam diversas atividades para relatar aos demais o que tinham visto e experimentado, gerando debates e discussões entre todos.

Como conclusão desse enfoque, pode-se afirmar que a proposta de formação do projeto social, em estudo, respondia aos elementos de uma proposta de formação integral, contemplava “todas as dimensões da vida”. Na prática, esta proposta nos remete ao que foi analisado no marco teórico, isto é, contra a fragmentação das políticas sociais urge lutar pela política social integral, que também deve estar refletida em propostas de formação. Uma política social que responda, a partir do povo, à totalidade das demandas da vida do povo, contemple todas as dimensões individuais e coletivas, em vista da qualidade de vida que lhes é garantida constitucionalmente mas não na realidade concreta vivenciada pelos cidadãos. À luz do marco teórico, considerando a fragmentação das políticas sociais e a necessária política social integral, com a contribuição de diversos autores que analisam essa temática, se buscou, por um lado, explicitar as contradições e as consequências da política social neoliberal (funcionalista), construída desde os escritórios dos governos em aliança com empresas, ou organizações sociais que se enquadram na mesma prática e, de outro, a tensão existente com a perspectiva marxista que luta e trabalha pela participação das bases populares na construção das políticas sociais, como um processo de base para uma visão integral sobre a vida humana e suas demandas sociais.

Como lócus geográfico da discussão, se considerou o contexto concreto de Perus/SP, sujeito à lógica e dinâmica da política neoliberal mundial vigente. Considerando as características políticas contextuais dessa região, apresentadas no

capítulo 2, é necessário avaliar em qual medida um projeto social, como este em estudo, dentre outros, contribui como estratégia de contra ponto ao modelo neoliberal e ajuda a implementar uma prática de política social participativa, portanto, um exercício verdadeiramente democrático, indagação presente ao longo de todo o trabalho e mais diretamente abordada a seguir.

Castel (apud WANDERLEY, 2010, p. 21) traz uma definição de pobres e excluídos como sendo os “desempregados de longa duração, o jovem da periferia, o cidadão sem domicílio fixo, etc.”, situação acentuada pela “desfiliação social” - termo mais adequado para não cair nas armadilhas do discurso da “exclusão social” versus “inclusão social”. A definição de Castel (apud WANDERLEY, 2010, p.21) permite inferir que a camada social, e neste caso específico, os jovens da região em estudo foram “excluídos do vínculo com o sistema neoliberal, ainda que dele recebam migalhas pela distribuição de alguns recursos, muitas vezes usados politicamente para fins eleitoreiros”, na medida em que as camadas pobres são realmente lembradas pelas agendas de campanhas eleitorais, mas poucas das promessas realizadas são cumpridas.

O aspecto relevante nesta discussão é que existe uma grande parcela da população que se encontra sem oportunidade, sem acesso, desvinculados e sem participação nos recursos que, por direito, são para que toda a sociedade viva bem, no escopo de esmolas recebidas em pobres e fragmentadas políticas sociais, concebidas como “políticas pobres para os pobres” (DEMO, 2006, p. 32), que caracterizam a pobreza da política social concebida no sistema neoliberal brasileiro.

Marshall (1967, p. 17) ressalta a realidade própria do capitalismo e contribui para o processo de reflexão ao afirmar que a “universalidade das políticas sociais e a ampliação dos direitos se deram no confronto de forças sociais em disputa de entre uma determinada perspectiva social democrática se deu pela classe trabalhadora”. O fator de interesse nesta discussão é de um lado, elucidar a política que Castel denomina como pronto-socorro social que faz reparos, com fragmentos de política como soluções e, do outro, uma política social que contemple a integralidade do ser humano e as demandas da sociedade como um todo. Certamente, neste horizonte

desponta a necessidade de mudanças estruturais para deixar de verter fragmentos de política social sobre os empobrecidos, na medida em que a distribuição de renda dos últimos anos não responde a uma política mais ousada para transformar estruturalmente a realidade social; embora válida, é curta e não realiza a transformação social.

Nesse contexto, faz sentido voltar a elucidar o tema da exclusão e provocar a discussão a partir da reflexão de Wanderley (2010, p. 63): ao abordar a questão social, sublinha as “mudanças profundas que estão acontecendo nas relações entre capital e trabalho, nos processos produtivos, na gestão do Estado e nas políticas sociais”. Wanderley (2009, p. 54) também ressalta o problema das periferias urbanas no contexto das megacidades, que “concentram o melhor e o pior”, destacando as enormes aglomerações como a cidade de São Paulo. Simultaneamente há o controle do poder pelos dirigentes e gestores públicos e a segregação da pobreza urbana nas periferias, com todas as mazelas que convivem nesse contexto.

Perus é parte da megacidade de São Paulo e, segregada como periferia, tem sido receptora da maior quantidade de lixo produzido pela metrópole; o Aterro Bandeirantes é uma amostra do que se destina à população de Perus. As políticas públicas, conforme descrito no capítulo 3, quando chegam são algumas migalhas, diante do contexto socioambiental da região; além de receber o lixo das áreas mais abastadas da cidade, ficou ilhada pelo Rodoanel e para se locomoverem às demais regiões do município pelo caminho mais natural os habitantes são obrigados a pagar pedágio. Nenhum benefício do lixão foi obtido ou do Rodoanel, pois o crédito de carbono foi canalizado para outras áreas; inexistem equipamentos públicos de saúde, embora decorridos muitos anos de promessas; as escolas parecem ruínas, sucateadas e os CEUs31 construídos na região são “pequenas ilhas” de atividades educacionais e culturais que funcionam como uma espécie de biombo, que escondem o restante do cenário local, marcado por desigualdade e ausência de políticas públicas efetivas para o atendimento das necessidades da população, embora previstas na Constituição e alardeadas pelos representantes públicos e políticos.

Portanto, na ausência de políticas públicas efetivas para suprir as necessidades locais, é pertinente realizar um projeto social como o dos jesuítas como uma ação estratégia para possibilitar no curto prazo o acesso ao ensino superior e trabalho e no médio e longo prazo, fortalecer o movimento social por novas políticas sociais integrais. É preciso destacar que desenvolver um projeto social diferenciado no atual contexto dominado pelo capitalismo é opção corajosa, pois há uma clara aposta em outra concepção de sociedade sabendo dos enfrentamentos que isso acarreta.