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Mudança climática no Jornalismo

No documento Ebook Rio20 (páginas 69-72)

Os dados — como no estudo sobre a mudança climática na imprensa brasi- leira, promovido pela Agência de Notícias dos Direitos da Infância (Andi) que monitorou 50 jornais diários entre 2005 e 2008 e apontou maior espaço ao efeito estufa, fontes energéticas e outras alterações climáticas (VIVARTA, 2010) — com- provam que a ecologia é hoje mais frequentemente abordada que há 30 anos. O fato real do aquecimento global, no sentido da construção de uma agenda global, é uma explicação para os temas relacionados à agenda da mudança climática na imprensa brasileira.

Em relação aos estudos sobre a mudança climática na imprensa podemos afir- mar que os mesmos ainda são poucos no Brasil.

Carneiro (2008), na dissertação de mestrado Caos no clima? sensacionalismo, comunicação da ciência e a narrativa de O Globo sobre o aquecimento global, ob- servou o discurso da imprensa sobre o aquecimento global, a partir do lançamen- to do 4º Relatório de Avaliação do IPCC. Analisou o jornal O Globo e identificou abordagem sensacionalista, concluindo que esta contribuiu para multiplicar a atenção pública dispensada à mudança climática e às informações providas pela comunidade científica.

A tese de doutorado Jornalismo e Meio Ambiente na Amazônia: a cobertura de eventos ambientais extremos pela imprensa escrita de Manaus analisou a cober- tura das secas na Amazônia entre 2005 e 2010. Para Rodrigues (2013), a imprensa local pouco auxiliou os moradores da capital amazonense nas decisões sobre a mudança climática. O autor aponta que há falta de qualidade de informação nos dois principais jornais impressos de Manaus, a partir da ótica e dos princípios do Jornalismo científico e ambiental.

Artaxo Netto (2013), em sua tese O futuro da terra: discursos inconvenientes, analisou o discurso sobre meio ambiente na imprensa brasileira, dando ênfase ao aquecimento global por ocasião da divulgação do 4º Relatório do IPCC. Identi- ficou o viés sensacionalista em relação às conclusões do IPCC, com formulações como “apocalipse”, “caos”, “catástrofe” e outras expressões relacionadas. Além disso o IPCC foi alvo de descrédito em função do Climagate. A tese discute ainda o lugar da ciência nos enunciados e sua legitimação pelo discurso. A análise con- cluiu que a discussão sobre o aquecimento é econômica, baseada no confronto entre países desenvolvidos e países em desenvolvimento. Nesta pesquisa, foram

analisados textos de mídia impressa, publicados em jornais de referência (Folha de S. Paulo e O Globo, e O Estado de S. Paulo), além da revista Veja.

O discurso jornalístico se coloca como mediador desse embate entre cien- tistas do IPCC e “céticos”. Mediador num duplo sentido: no sentido de pro- mover a interlocução com a sociedade mediante a publicização da ciência e no sentido de situar-se entre ambos os discursos, adquirindo um certo sta- tus de “isenção”, mas que não pode prescindir da legitimidade do científico para a sua própria legitimidade (ARTAXO NETTO, 2013, p.221).

Na observação da cobertura das COP15 e COP16, o discurso analisado indi- cou que as revistas dão preferência aos campos econômico e político. As conferên- cias do clima são tomadas como espaço de disputa de poder e de reconhecimento. Nesta perspectiva, as ações práticas de combate à mudança do clima não apare- cem e o discurso dominante é econômico, voltado às inovações da tecnologia para suprir as demandas da crise climática (MORAES & GIRARDI, 2012; GIRARDI et al, 2011).

Na Europa, podemos dar destaque ao principal trabalho de investigação em Portugal que observa peculiaridades do discurso sobre a mudança climática (Car- valho, 2011). A partir da análise realizada nos jornais e revistas portuguesas,

[...] foi identificada a prevalência do campo político e do Estado no discurso sobre alterações climáticas através de diferentes indicadores: o volume de cobertura mediática em diferentes períodos históricos; o peso de diferen- tes temas nos artigos jornalísticos; a proporção de referências a diferentes actores sociais; e o tipo de factores que estiveram na origem dos artigos (CARVALHO, 2011, p.227).

Num estudo sobre a irrupção do tema na agenda midiática espanhola, Fer- nández (2010b) assinala que a representação ideológica está “[...] bastante definida: o liberalismo se coloca no extremo de não reconhecer ou minimizar a mudança climática; a social-democracia e o conservadorismo reconhecem a mudança cli- mática e propõem uma postura reformista no momento de abordá-lo; e o ecolo- gismo, com um discurso com voz de alarme, propõe uma mudança de sistema (FERNANDEZ, 2010b).

Assim, podemos verificar que existe uma demanda social pelas informações a respeito do tema, o que impõe maior compromisso da área jornalística no seu papel de reverberar e questionar os discursos colocados em torno da questão. As- sim, Sorhuet (2013) indica que é um momento especial para que o Jornalismo Ambiental ganhe terreno:

Para o jornalismo ambiental a instalação das mudanças climáticas como um tema de primeiro nível na agenda mundial, é o melhor exemplo de como a realidade se encarrega de confirmar esta nova percepção. Ao mes- mo tempo seu elevado status atual, ganhando o terreno político, econômi- co e científico, demonstrou (como nenhum tema conseguiu antes) o acerto do jornalismo ambiental conquistado há várias décadas, ao incluí-lo en- tre os assuntos de abordagem habitual, pela urgência e preocupação que gera pensando no futuro dos povos. Hoje quase nada questiona ou igno- ra as mudanças climáticas. É um tema incorporado à agenda dos gover- nos, das agências das Nações Unidas, dos organismos internacionais, do setor empresarial, do acadêmico e de amplos estratos da sociedade civil (SORHUET, 2013, p.136).

A partir deste levantamento, compreendemos que o Jornalismo praticado pe- los veículos tradicionais simplesmente incorpora a temática ambiental na lógica midiática e a questão ambiental é um tema como outro qualquer (MORAES & CORREA, 2008; GAVIRATI, 2013).

As notícias sobre meio ambiente normalmente se encontram no limite do Jor- nalismo enquanto um processo midiático, influenciado pela própria instituciona- lização do Jornalismo, entendida aqui como a legitimação das rotinas produtivas e dos valores a estas associados, em interação com outros atores sociais. Há, por- tanto, uma mobilização de diferentes esferas, de saber e de poder, aumentando a complexidade e disputas que são travadas e dirigidas ao Jornalismo.

Dentro desta perspectiva, reafirmamos que o Jornalismo tradicional, quando trata da temática ambiental sem compromisso com a defesa do meio ambiente e/ ou da vida em todas as suas dimensões, é simplesmente “Jornalismo de meio am- biente”. Sua prática se dá dentro dos limites da institucionalização do campo, le- gitimado e reconhecido por sua intervenção social através do produto notícia. Por entendermos a essencial contribuição do Jornalismo na constituição de crenças e

visões de mundo e vislumbrando o campo discursivo implicado neste processo, pensamos que o Jornalismo Ambiental ainda está em construção, assim como uma sociedade sustentável. Esta, mesmo com iniciativas nos mais diversos recan- tos do planeta, ainda é um projeto para o futuro.

No documento Ebook Rio20 (páginas 69-72)