• Nenhum resultado encontrado

Mundialização do capital financeiro e sua incorporação à educação

No documento JOÃO RIBEIRO DOS SANTOS FILHO (páginas 77-80)

2 FINANCEIRIZAÇÃO DA EDUCAÇÃO SUPERIOR PRIVADO-MERCANTIL E A

2.3 O PROCESSO DE FINANCEIRIZAÇÃO DA EDUCAÇÃO SUPERIOR

2.3.1 Mundialização do capital financeiro e sua incorporação à educação

financeira do dinheiro excedente da produção na especulação de ativos financeiros (títulos, ações, empréstimos), no entendimento de Harvey (2011, p.33), surgiu, em 1973, como uma necessidade, oferecendo-se como uma forma de lidar com o problema da absorção do capital (dinheiro) excedente na produção.

De acordo com Chesnais (2005, p. 35), no mundo contemporâneo, apresenta-se uma “configuração especifica do capitalismo”, em que “o capital portador de juros está no centro das relações econômicas”. Nesse processo de forte presença do capitalismo financeiro, os grupos industriais transnacionais, que têm por encargo organizar a produção de bens e serviços, bem como “captar o valor e organizar de maneira direta a dominação política e social do capital em face dos assalariados”, ainda são as formas de organização capitalistas mais identificáveis. Entretanto, ao seu lado estão as instituições financeiras bancárias, e também as não bancárias, as quais são constitutivas de um capital com traços particulares.

O capital financeiro busca fazer dinheiro sem sair da esfera financeira, em especial sob a forma de juros de empréstimos, de dividendos e de outros pagamentos recebidos a título de posse de ações e, em geral, de lucros nascidos de especulação financeira bem sucedida (CHESNAIS, 2005).

O capital portador de juros (também denominado capital financeiro ou, mais simplificadamente, “finança”) tem como terreno de ação os mercados financeiros integrados entre si tanto no plano interno dos países como no plano internacional, estando esses planos interconectados (CHESNAIS, 2005). As operações do capital financeiro repousam, também, sobre as cadeias complexas de créditos e de dívidas, em especial entre bancos. Trata-se de uma forma fetichizada do capital, como já argumentava Marx (2008a), ao discutir o avanço do capital portador de juros.

Chesnais (2005) argumenta, também, que o capital financeiro não foi levado ao papel de protagonista em que se encontra atualmente por um movimento próprio, mas sua ascensão teve forte presença da atuação estatal em seu favor. Sobre esse aspecto, o autor acrescenta que, para que o capital financeiro desempenhasse um papel econômico e social em primeiro plano, foi preciso que os Estados mais poderosos liberassem o movimento de capitais e também desregulamentassem e desbloqueassem seus sistemas financeiros. Ademais, foi igualmente necessário que esses Estados recorressem a políticas de favorecimento e de facilitação da centralização dos fundos líquidos não reinvestidos das empresas e das poupanças das famílias, ou seja, de incentivo à acumulação financeira.

Cabe ressaltar, também, que a expansão do capital financeiro foi determinante na formação do sistema econômico imperialista, inclusive com o domínio de classes políticas de diversos países, gerando um sistema político-econômico com capacidade para proteger os interesses dessa forma especulativa de capital e para ampliar consideravelmente a capacidade de lucro, com altas taxas de juros e com privilégios normativos da dívida pública, por exemplo.

Para Borón (2001), a atual fase de supremacia do capital financeiro pode ser caracterizada sob os três principais aspectos. Primeiramente, essa supremacia do capital financeiro institui uma modalidade de acumulação na qual os superlucros do capital são independentes do crescimento geral da economia, reafirmando a tese de que é o capital que gera crescimento econômico. A supremacia do capital financeiro especulativo também tem impactos macroeconômicos que acentuam a pobreza, a desigualdade social e a iniquidade econômica, provocando desemprego em massa, pauperização e exclusão social tanto em escala nacional como internacional.

Como defendem Mancebo, Silva Júnior e Catani (2013, p. 86-87), no modelo de crescimento econômico, em que o objetivo é a “imposição do amálgama entre o capital industrial e o financeiro”, o papel que cabe aos “países emergentes ou que se encontram na periferia de economias centrais é o de se conformarem como plataforma de produção de valor para o capital fictício17 no mercado mundial de títulos”.

17 De acordo com Chesnais (1996, p. 77), a expressão “capital fictício” se refere a um tipo de capital

financeiro que se constitui com base no crescimento de ativos com valor fictício. Guttmann (2008, p. 22), acrescenta que o capitalismo financeiro “tem dado prioridade ao capital fictício, cujos novos condutos, como derivativos ou valores mobiliários lastreados em ativos, estão a vários níveis de distância de qualquer atividade econômica real de criação de valor”. E destaca que o capital fictício tem por objetivo principal “negociar ativos

Outro aspecto importante é o fato de que a supremacia do capital financeiro distorce o processo econômico, ao submeter todo o sistema a estratégias do segmento “especulativo e parasitário”18.

A dimensão assumida pelo capitalismo, mediante a lógica de especulação financeira, corrobora o que Marx (2008) afirma quanto ao movimento insaciável do capital. Esse processo de insaciabilidade do capital também tem efeitos na atual crise do capital em escala mundial, mediante o intercâmbio universal das operações financeiras, ou seja, os grandes investidores financeiros reeditaram a histórica operação do capital, a de privatizarem os ganhos e de socializarem as perdas.

Esse capital financeiro, atuando a serviço da burguesia nacional e internacional, conta com privilégios concedidos pela classe política que é por ele comandada, e também é protegido por intervenções estatais em caso de eventuais falências de suas empresas, como exemplifica o socorro do Estado ao sistema bancário.

Outra importante intervenção estatal em favor da especulação financeira se refere aos privilégios da dívida pública, que têm respaldo constitucional, como, por exemplo, o estabelecido no art. 166, §3º, da Constituição Federal de 1988: exige-se que as emendas aos projetos de lei do orçamento somente podem ser aprovadas caso sejam indicados os recursos necessários, mediante anulação de despesas (corte de gastos previstos no orçamento), mas excluem dessa hipótese de anulação de despesas os gastos com os serviços da dívida (juros e encargos da dívida), como se observa na PEC 241/2016 (55/2016), em tramitação no Senado Federal.

Essas intervenções estatais serão sempre justificadas pelo Estado sob o argumento de defesa dos interesses da nação, mas, na verdade, favorecem a acumulação financeira de detentores de capital especulativo.

A acumulação financeira, para Chesnais (2005, p. 37), é compreendida como “a centralização em instituições especializadas de lucros industriais não reinvestidos e de rendas não consumidas”, sendo que estas instituições “têm por encargo” valorizar estes

em papel de forma lucrativa para obter ganhos de capital, uma atividade mais bem definida como especulação”.

18 Expressão usada por Carcanholo e Nakatani (1999, p. 285), para se referir ao capital portador de juros

(Marx, 2008), sob a modalidade de capital fictício (derivativos ou valores mobiliários lastreados em ativos, mas que não decorrem de atividades econômicas reais de criação de valor).

lucros “sob a forma de aplicação em ativos financeiros – divisas, obrigações e ações – mantendo-os fora da produção de bens e serviços”.

Esse regime de acumulação com predominância financeira, entretanto, não pode existir sem o apoio de um grande processo de mudanças tecnológicas e organizacionais (CHESNAIS, 2005). Essas mudanças tecnológicas, que incluem o uso de recursos da informática, com cursos a distância, redução de turmas presenciais, contratação de tutores e conteudistas para o desenvolvimento de conteúdos de ensino na plataforma EAD, bem como mudanças organizacionais, com concentração de atividades administrativas, em decorrência dos processos de fusões/aquisições têm impactos em diversos aspectos, inclusive no trabalho docente.

Além disso, a produção de conhecimento e de tecnologia passou a ser atravessada por demandas que exigem a reforma dos sistemas educacionais, em especial, em relação à

No documento JOÃO RIBEIRO DOS SANTOS FILHO (páginas 77-80)