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O MERCADO EDUCACIONAL E AS ALTERAÇÕES NA NATUREZA JURÍDICA

No documento JOÃO RIBEIRO DOS SANTOS FILHO (páginas 111-115)

2 FINANCEIRIZAÇÃO DA EDUCAÇÃO SUPERIOR PRIVADO-MERCANTIL E A

3.3 O MERCADO EDUCACIONAL E AS ALTERAÇÕES NA NATUREZA JURÍDICA

JURÍDICA DAS INSTITUIÇÕES DE ENSINO SUPERIOR.

A expansão do setor privado-mercantil, em especial no período posterior a 1996 (após a aprovação da Lei de Diretrizes e Bases da Educação), tem sido marcada por alterações na natureza jurídica e na forma de atuação das instituições.

O grupo Estácio Participações S.A. exemplifica o conjunto de alterações, de natureza jurídica e operacional, a que as instituições privado-mercantis se submeteram, em face das mudanças no mercado educacional.

Como descreve Vale (2011), em análise da trajetória da Universidade Estácio de Sá, houve alteração em sua natureza jurídica, de modo repentino, de entidade filantrópica para entidade com fins lucrativos.

Como revela o próprio grupo Estácio, em suas demonstrações financeiras relativas a 2007 (publicadas em março de 2008), na descrição do histórico, a Estácio Participações S.A. (empresa de capital aberto) foi constituída, em 31 de março de 2007, pelo aporte do capital social das cotas majoritárias (99%) representativas do capital social de cinco empresas mantenedoras de ensino superior a saber: a Sociedade de Ensino Superior Estácio de Sá (Seses), a Sociedade Tecnopolitana da Bahia - STB, a Sociedade de Ensino Superior do Ceará (Sesce), a Sociedade de Ensino Superior de Pernambuco (Sespe) e a Sociedade de Ensino Superior do Pará (Sespa), instituições controladas por acionistas que formaram o quadro acionário controlador da holding Estácio (ESTÁCIO, 2008).

Todas essas empresas mantenedoras de ensino superior eram organizadas como sociedades limitadas (empresas com número limitado de sócios, com responsabilidade pessoal pelo aporte de capital social; em síntese, eram empresas familiares), tendo sido as

mantenedoras STB, Sesce, Sespe e Sespa, já em 2005, transformadas em sociedades empresariais, com fins lucrativos. A Seses, mantenedora da Universidade Estácio de Sá, foi transformada de sociedade de natureza filantrópica (natureza que detinha desde a década de 1970) também em sociedade empresarial limitada, com fins lucrativos, em fevereiro de 2007, ou seja, poucos meses antes de ingresso do grupo Estácio no mercado de ações.

Como revela o grupo Estácio (2008, p. 1), essa forma de constituição (agregando empresas mantenedoras de diversas regiões do Brasil – Sudeste, Nordeste e Norte) e de consolidação em uma holding, transformou a Estácio Participações em “um sólido conjunto empresarial no segmento do Ensino Superior”, e dessa maneira, a Estácio Participações “se preparou para o ingresso no Mercado de Capitais, o que se efetivou em julho de 2007, quando se tornou um Companhia de Capital Aberto”.

Já no ano de 2008, ou seja, no primeiro ano de ingresso do grupo Estácio no mercado de ações, foram captados do público investidor, por meio de emissão primária de ações, recursos líquidos da ordem de R$251 (duzentos e cinquenta e um) milhões, os quais foram “aplicados em investimentos, seja por abertura de novas unidades, manutenção e expansão das existentes, aquisições de outras instituições e no desenvolvimento de negócios correlatos.” (ESTÁCIO, 2008, p. 2).

Além disso, com base em padrões exigidos pelos agentes do mercado de capitais, a Companhia Estácio, seus administradores e controladores “celebraram contrato com a Bolsa de Valores de São Paulo – Bovespa, aderindo ao denominado Nível 2, desta forma comprometendo-se, em todas as suas atividades, com as práticas de excelência da governança” (ESTÁCIO, 2008, p. 2).

Operacionalmente, o grupo Estácio também sofreu significativas mudanças. Uma delas diz respeito à necessidade de vinculação da companhia à arbitragem perante a Câmara de Arbitragem do Mercado, conforme estipulado em seu Estatuto Social (ESTÁCIO, 2008, p. 2).

Embora não seja objeto específico do presente estudo discutir as mudanças na gestão da Estácio, cabe ressaltar afirmação da própria holding educacional, nas demonstrações relativas ao exercício financeiro de 2007, publicadas em marco de 2008, acerca da racionalização (não somente sob aspectos operacionais, mas também sob o aspecto acadêmico), como abaixo se transcreve:

Dentro da racionalização acadêmica e operacional em curso, ocorreram mudanças na estrutura de toda a organização, dessa forma captando as economias que a escala da operação permite, com progressivos aumentos da margem financeira, ocasionados primordialmente pelas melhorias de produtividade e racionalização das políticas comerciais. (ESTÁCIO, 2008, p. 2).

O grupo Estácio acrescenta que, com base nesses “mesmos objetivos econômicos e voltada para a atratividade dos programas acadêmicos”, houve revisão das grades curriculares de 43 (quarenta e três) cursos de graduação (bacharelado e licenciatura) e de 56 (cinquenta e seis) cursos de graduação tecnológica (ESTÁCIO, 2008, p. 2).

Também, merece destaque a declaração da Estácio, nas demonstrações financeiras de 2008, publicadas em 2009, que corrobora a afirmação de Vale (2011), de que a referida empresa já se tornou entidade com fins lucrativos numa perspectiva de lucratividade e disposta a se consolidar em um grande grupo educacional, sem prestar contas ao Estado dos benefícios recebidos como entidade beneficente.

Com sólida situação financeira, consistindo em confortável disponibilidade de recursos e sem endividamento, a Companhia planeja ampliar sua posição de

liderança no setor de ensino superior. Neste sentido, concretizou a aquisição

da IREP, empresa mantenedora da UniRadial, instituição com 10 mil alunos e que servirá de base para a penetração mercadológica em São Paulo (ESTÁCIO, 2009, p. 2, sem grifos no original.).

Nesse sentido, no início de 2008, a Estácio

[...] concluiu a aquisição de mais três empresas mantenedoras de ensino superior em São Paulo, agregando mais cerca de quatro mil alunos. Importantes passos estão sendo dados na criação de uma Unidade voltada ao Ensino a Distância, suprindo necessidades na formação superior de brasileiros que, por razões de moradia, renda ou outros motivos, poderão realizar seus estudos e qualificações em suas residências ou ambientes de trabalho, modelo este de ensino que se universaliza. Foi iniciado um projeto de integração

nacional, com extensão dos sistemas de gestão empresarial e acadêmica a todas as unidades, com expectativa de conclusão em 2008. (ESTÁCIO,

2009, sem grifos no original).

Após amplo processo de expansão física, em especial com aquisições e fusões, a rede Estácio praticamente atua em todo o Brasil. Conforme se observa na Figura 1, extraída do site da instituição e atualizada até 12 de agosto de 2016, com o mapa de atuação presencial da Estácio Participações, o referido grupo educacional tem uma participação relevante na educação superior, com presença física em 22 (vinte e dois) estados da federação. Apenas quatro estados brasileiros (Acre, Mato Grosso, Rondônia e Tocantins) não contam com a rede presencial da Estácio.

FIGURA 1 – Mapa de atuação – Estácio (2015)

Fonte: Estácio Participações S.A. (ESTÁCIO, 2016b)

Trata-se de um processo de expansão voltado para o lucro, utilizando-se de incentivos governamentais, com alteração na natureza jurídica, sem a correspondente prestação de contas e marcado por um contexto de disputas, inclusive com inserção na legislação nacional de instrumentos em defesa do setor privado-mercantil, ante as limitações no processo de regulação do setor, como se verá na subseção seguinte.

3.4 AS DISPUTAS DO SETOR PRIVADO-MERCANTIL NAS DISCUSSÕES DO

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