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2 FUNDAMENTOS E MÉTODOS

2.3 Caracterização teórica da estrutura, reatividade e espectroscopia de íons

2.3.6 Níveis de teoria

Apesar de termos descritos os cálculos realizados e como estes podem ser interpretados à luz das teorias disponíveis, temos que discutir os níveis de teoria utilizados para os cálculos de estrutura eletrônica.

De forma geral existem dois tipos metodologias que podem ser utilizadas, as semi-

empíricas e as ab-initio. Como não é o escopo deste trabalho discutir as características

detalhadas dessas duas abordagens, basta dizer que a semi-empírica utiliza dados experimentais para parametrizar os cálculos, evitando que diversos elementos tenham de ser calculados e acelerando demasiadamente os cálculos. Por serem parametrizados, tais cálculos são capazes de nos fornecer bons resultados a um custo computacional baixo, assumindo que uma parametrização correta para o sistema de interesse tenha sido escolhida.[32]

Nos resultados aqui descritos, esta metodologia só foi utilizada para os cálculos de dinâmica molecular das estruturas de íons altamente solvatados, como por exemplo os agregados de 300 moléculas de solvente descritos na seção 3.2.1. Dado que estes sistemas possuem aproximadamente 2700 graus de liberdade vibracional, o uso de métodos ab-intio seria impraticável.

Já os métodos ab-initio não utilizam, a princípio, parametrizações e costumam fornecer uma descrição mais acurada do sistema, com a desvantagem de serem custosos computacionalmente. Nesses métodos, a estrutura atômica do sistema é descrita por funções base e, através destas, a função de onda do sistema, ou a funcional de densidade, no caso de se utilizar a teoria do funcional da densidade (DFT), é obtida. É a partir dessas funcionais ou funções de onda, e operadores convenientes, que as propriedades de interesse do sistema são obtidas.

O método ab-initio mais simples é o método de Hartree-Fock (HF). Nesse método a função de onda do sistema é separada em diversas funções base. As forças sentidas por cada elétron separadamente são simplificadas e consideradas como se cada um dos elétrons estivesse sujeito a uma interação média gerada pelo conjunto de todos os outros elétrons do sistema.[32] Essas considerações são necessárias para facilitar a resolução do método e torna- lo eficiente, mas não considera o que se chama de correlação eletrônica, que pode ser entendida como a interação entre os elétrons do sistema. Essa falta de correlação gera desvios consideráveis desses cálculos em relação aos resultados experimentais.

Para corrigir esse comportamento, muitas vezes, se recorre a métodos de perturbação que utilizam um Hamiltoniano total composto pelo Hamiltoniano do método HF, como uma primeira aproximação, e um Hamiltoniano de perturbação, que considera as repulsões entre elétrons, como é o caso dos métodos de perturbação de Møller–Plesset, formulados como perturbações de múltiplas ordens n (MPN, n=2 a 5).[35]–[38] Desses métodos, o mais

corriqueiro é o uso da perturbação de segunda ordem (MP2), que, com um custo computacional acessível, inclui os efeitos de correlação eletrônica em uma extensão capaz de fornecer resultados teóricos precisos e compatíveis com os dados experimentais, pelo menos no nível de precisão que necessitamos em nossos tratamentos.

No que tange aos métodos DFT, temos que a formalidade desta metodologia é semelhante ao descrito para o método HF, com a diferença de que, ao invés de se utilizarem funções de onda de um elétron para o cálculo de uma função de onda geral, são utilizados funcionais, ou seja, funções de um elétron, para descrever a densidade eletrônica total do sistema.[32]

Dessa forma o problema é reduzido a elétrons que não interagem entre si se movendo em uma região de potencial efetivo definida pela densidade eletrônica total, que é um problema de simples solução do ponto de vista matemático.

Apesar dos métodos DFT serem aqui considerados métodos ab-initio, porque pela metodologia em si não existe a necessidade de se utilizar parâmetros empíricos, muitos dos funcionais utilizados para esse tipo de cálculo são parametrizados, entre eles o famoso funcional B3LYP.[35],[36] Dessa forma, muitos não consideram cálculos DFT como não parametrizados, mas na realidade isto depende das funcionais utilizadas.

Não obstante, a parametrização induzida por vários funcionais é capaz de considerar, de maneira indireta, a correlação eletrônica que não é considerada em métodos HF, fornecendo resultados aceitáveis a um custo computacional, muitas vezes, menor quando comparados a cálculos MP2.

Dentre as funcionais existentes, utilizamos para a maioria dos estudos aqui realizados, o método DFT/B3LYP por sua comprovada capacidade de gerar resultados aceitáveis para reações íon-molécula.[41]–[43] Entretanto, existem duas características conhecidas dessa metodologia que são dignas de nota.

Primeiro, já é conhecido que o método B3LYP subestima as barreiras de reação, apesar de representá-las de forma qualitativamente correta.[40],[41] Isto posto, quando realizamos cálculos que dependem desse parâmetro, como é o caso de cálculos RRKM, tendemos a utilizar o método MP2, apesar de seu elevado custo computacional.

Segundo, o método B3LYP também apresenta dificuldades de representar interações difusas e de longo alcance, presente comumente em estados de transição e complexos não covalentes.[46] Isso se deve, principalmente, a sua parametrização, realizada para espécies estáveis e não para sistemas com baixo caráter de ligação covalente. Por este fato, normalmente utilizamos o método HF como método para determinação das estruturas iniciais submetidas a posteriori aos cálculos B3LYP. Para os casos nos quais os estados de transição almejados não foram encontrados, mesmo através dessa abordagem, o método MP2 foi utilizado, sendo normalmente capaz de encontrar os estados de transição negligenciados pelo método B3LYP.

Por fim, temos que comentar o papel do conjunto de bases utilizado. É bem sabido que os resultados obtidos tendem a melhorar com o incremento das funções base, mas isto é acompanhado de um aumento no tempo de cálculo. Desta forma, é necessário achar um compromisso entre qualidade do conjunto de bases utilizado e custo computacional.

Quando trabalhando com íons, especialmente ânions, é necessário considerar que as interações entre estes ânions e moléculas neutras é de longo alcance, e um conjunto de funções base pouco estendido não representará bem o sistema. Portanto, é considerada boa prática a inclusão não só de funções difusas, como também, funções de polarização, tanto nos átomos leves quanto pesados.[47] Uma base que encontramos boa relação custo benefício foi a 6-311+G(3df,2p), usada na maioria dos cálculos realizados na presente tese, além da base aug-cc-pVTZ.