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Em relação à natureza jurídica do bem ambiental, devemos observar que ao determinarmos o mesmo como um direito expressamente consagrado em nosso ordenamento jurídico na CF/88 em seu artigo 225, consideramos o fato de estar o mesmo enraizado em valores próprios, que, não obstante, encontraremos tais valores na própria Constituição Federal e, assim, ao descobrirmos a natureza do bem ambiental, estaremos descobrindo a própria amplitude da conceituação de meio ambiente.

Em nosso artigo 225 da CF/88 temos que o meio ambiente ecologicamente equilibrado é bem de uso comum do povo e essencial à qualidade de vida, e por considerar como essencial à qualidade de vida, o referido artigo recepciona o conceito de meio ambiente devidamente estabelecida na Lei nº 6.938/91 quando a mesma define em seu artigo 3º, I, como “o conjunto de condições, leis, influências e interações de ordem física, química e biológica, que permite, abriga e rege a vida em todas as suas formas”, estabelecendo assim uma correta ligação entre tutela do meio ambiente e a defesa da pessoa humana.

Podemos afirmar que a expressão sadia qualidade de vida remete-nos a idéia de direito a vida e vida com saúde, sem prejuízo da garantia dos demais direitos inerentes ao denominado piso vital mínimo que vem insculpido no artigo 6º da CF/88, considerando-se a tutela imediata do meio ambiente em que se busca algo mais que apenas um meio ambiente para simples sobrevivência, tendo em vista

que é estabelecido um parâmetro entre o direito a vida e desta com saúde e qualidade.

Conforme descreve Fiorillo e Rodrigues (1997, p. 88):

A divisão do meio ambiente em cultural, artificial, do trabalho e natural, não possui outra função senão a de delimitar o espectro do meio ambiente a que está se referindo. Todavia, deve ficar claro que tal dissociação é meramente expletiva, vez que o conceito de meio ambiente, por tudo visto, indissocia-se da inexorável lição de direito à vida.

Dizemos então que o meio ambiente configura-se pelas relações e alterações observadas entre todos os seres vivos, incluindo-se neste contexto o próprio homem, e destes com o seu meio, motivo pelo qual concluímos que o direito do ambiente seja deste modo, um direito interativo com tendência a incidir em todos os flancos do direito para assim introduzir a idéia de ambiente.

Com estas considerações em relação ao meio ambiente, podemos agora definir a conceituação sobre a natureza jurídica do meio ambiente, onde principalmente a partir da segunda metade do século XX com o surgimento dos fenômenos de massa, em razão ao movimento social que dá origem a chamada sociedade de massa, os bens de natureza difusa passam a ser objeto de uma maior preocupação do cientista, legislador e aplicador do direito, conforme conclui Fiorillo e Rodrigues (1997, p. 89) ao afirmarem que:

Emergiram os denominados bens de natureza difusa, de modo inversamente proporcional à quebra da dicotomia público/privado, na medida em que, acentuou Mauro Capelletti, entre o público e o privado criou-se um abismo preenchido pelos direitos metaindividuais.

Ainda podemos afirmar, em concordância com Capelletti (1977, p.131), que:

[...] as situações de vida que o Direito deve regular, são tornadas sempre mais complexas, enquanto que por sua vez, a tutela jurisdicional - a “Justiça” - será invocada não mais somente contra violações de caráter individual, mas sempre mais freqüente contra violações de caráter essencialmente coletivo, enquanto envolvem grupos, classes e coletividades. Trata-se, em outras palavras, de violação de massa.

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Vale dizer que a titularidade do bem difuso difere da titularidade do bem público, pois são inconfundíveis, uma vez que o bem de natureza difusa pertence a toda coletividade cuja tutela é de responsabilidade tanto do Poder Público quanto da coletividade, e o bem de natureza público tem como titular o Estado.

Com relação à proteção a estes conjuntos de bens de caráter difuso, não podemos mais valer-nos da tutela simplesmente individualista liberal, tendo vista a natureza dos bens jurídicos, inerentes à coletividade, em que devemos utilizar um sistema processual coletivo que nos permita tutelar um direito coletivo latu sensu, conforme observa Fiorillo e Rodrigues quando afirmam que:

[...] face da existência de três diferentes categorias de bens no nosso ordenamento jurídico: público, privado e difuso, já não é mais possível usar do aparato de processo individual-liberal para tutelar os bens difusos, principalmente, pelo fato de que já existe no nosso ordenamento processual civil uma regra determinante que obriga a utilização de um sistema processual coletivo, quando se tratar de um direito coletivo latu sensu.

Com a evolução industrial e o desenvolvimento econômico em larga escala, surge na sociedade moderna problemas que acarretaram vários prejuízos de ordem coletiva, sendo até então desconhecidos na sociedade quando analisados sob um prisma meramente individual, como bem observado por Capelletti, 1977, p. 131) ao afirmar que:

Na realidade, a complexidade da sociedade moderna, com intrincado desenvolvimento das relações econômicas, dá lugar a situações das quais determinadas atividades podem trazer prejuízos aos interesses de um grande número de pessoas, trazendo problemas desconhecidos às lides meramente individuais.

Consideramos assim que o Direito não se apresenta mais com conotação individual, mas de cunho individual, meta-individual e coletivo, podemos destacar que:

Os direitos e os deveres não se apresentam mais, como nos Códigos tradicionais, de inspiração individualista liberal, como direitos e deveres essencialmente individuais, mas meta-individuais e coletivos (CAPELLETTI, 1977, p. 131).

O bem jurídico meio ambiente deve ser considerado como um todo, mesmo que formado por vários bens jurídicos. Por esta razão, o bem ambiental encontra tutela tanto por instrumentos de Direito público, quanto por instrumentos de Direito privado e que, se for encarado de forma a considerar um conglomerado de bens individualizados entre si, perde sua identidade na ordem jurídica.

Podemos assim considerar o bem ambiental, enquanto analisado sob sua natureza jurídica, tratar-se de um bem difuso lato sensu, por ser um bem de interesse transindividual e meta-individual de titularidade de toda a coletividade, como bem define Piva (2000, p. 114): “trata-se de um bem difuso, um bem protegido por um direito que visa assegurar um interesse transindividual, de natureza indivisível, de que sejam titulares pessoas indeterminadas e ligadas por uma circunstância de fato”.

Assim, em nosso ordenamento jurídico a tutela jurídica do bem ambiental teve como primeiro instrumento a Lei 4.734/65, que é a Lei da Ação Popular, apesar de que naquele momento evolutivo da chancela jurídica dos bens de natureza difusa, ainda se dava de forma pouco clara, em razão de que não havia ainda uma noção clara e definição legal sobre os direitos difusos e coletivos, como também, ainda não se percebia uma aceitação efetiva dos mesmos.

Contudo, o referido instrumento, perfez um importe marco normativo para o deslinde do entendimento atual sobre os direitos difusos e coletivos e sobre o surgimento dos denominados bens ambientais.

Nesta linha, mais importante ainda se fez no campo jurídico para institucionalizar o denominado bem ambiental, cuja natureza jurídica é difusa lato sensu, a edição da Lei 6.938/81, que trata da Política Nacional do Meio Ambiente, instrumento normativo de ordem material, que serviu, como de fato ainda serve, para evidenciar que o meio ambiente necessita de diretrizes protetivas específicas, tendo em vista sua esgotabilidade e importância para todos os seres do globo.

Por fim, destacamos a edição da Lei 7.347/85, que é a Lei da Ação Civil Pública, que apesar de também ser uma legislação procedimental, trouxe, enquanto projeto de lei, em seu artigo 1º, inciso IV, a possibilidade da sua utilização para tutelar direitos ou interesses difusos e coletivos, em que, num primeiro plano, ou seja, no momento de sua edição, recebeu o veto presidencial pela justificativa de

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que não existia positivado em nosso ordenamento jurídico a definição daquilo que caracteriza e define os direitos difusos e coletivos.

Contudo, com a instituição da Constituição Federal de 1988, e, logo após, com o advento da Lei 8.078/90, a Lei que introduz o Código de Defesa do Consumidor, trouxe em seu artigo 81, parágrafo único, incisos I, II e III a definição dos direitos difusos stricto sensu, coletivos stricto sensu e individuais homogêneos, dando assim escopo aos direitos difusos e coletivos, possibilitando com isto a recepção, por determinação da própria Lei em comento, do dispositivo outrora rechaçado de nossa ordem legal em razão da Lei da Ação Civil Pública.

Portanto, podemos concluir que nosso ordenamento jurídico atualmente comporta três categorias de bens, sendo o público, o privado e o difuso, inserindo-se o bem ambiental no contexto deste último pelo fato de ser um bem que pertence a toda a coletividade, considerado bem de uso comum de todos e essencial a sadia qualidade de vida, e, devido a sua importância, e por ser fator preponderante para o desenvolvimento da atividade do Ecoturismo, é que percebemos a necessidade de se preservar os bens ambientais enquanto objeto do direito ambiental, visando assim, atingir o objetivo proposto de desenvolvimento sustentável.

3 FAUNA

Conforme descrito pelos doutrinadores pátrios, o estudo da fauna redunda um tanto complexo, haja vista que possuem uma atávica concepção privatística, influenciada, principalmente, pelo pensamento civilista do começo do século XX, que por tal prisma, considerava a fauna como objeto que poderia ser passivo de apropriação, sendo considerada como res nullius ou res derelictae. (FIORILLO, 2005, p. 86).

Entretanto, como a evolução em nosso ordenamento jurídico, esta concepção ultrapassada foi revista e modificada, uma vez que é inegável a importância da fauna ao equilíbrio ecológico, sendo imprescindível para a sobrevivência de todo o conjunto de espécies, incluindo-se dentre elas o próprio homem.

Deste modo, decai a concepção de que a fauna seria considerada res nullius ou res derelictae, passando a integrar o conceito de res communes omnium, haja vista que a mesma possui natureza difusa por ser um bem ambiental, detendo através de sua função ecológica o papel de resguardar as espécies de forma a velar pelo equilíbrio dos ecossistemas, sendo esta função indispensável à sadia qualidade de vida.

Neste capítulo abordaremos os aspectos gerais sobre a fauna, considerando sua importância para o meio ambiente enquanto possuidora de imprescindível função ecológica, a qual também será abordada. E, como não poderíamos deixar de comentar, remeteremos nosso interesse sobre a fauna para suas finalidades que, dentre as existentes, destacaremos aquelas que guardam estrita relação com à atividade do Ecoturismo, principalmente porque tal atividade pode coibir uma prática das mais perversas e que será objeto de comento, tratando-se do tráfico de animais

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silvestres, ressaltando, porém, que deixaremos de abordar a questão da caça por considerarmos ser de pouca relevância ao tema proposto.