De p o is d e to d a s a s c rític a s à instituiç ã o a rtístic a , a s inúme ra s p ro c la ma ç õ e s so b re a fusã o d a a rte e vid a p a re c e m nã o te r sup rimid o o muse u, ma s a nte s, e ste nd id o sua s fro nte ira s. Evid e nte me nte , c o m e sta s a ç õ e s
115 nã o se sup rimiu a instituiç ã o d a a rte , ma s a ind a a ssim ta is a ç õ e s p ro mo ve ra m um imp o rta nte d e slo c a me nto d e sua s funç õ e s tra d ic io na is. Assim, a lé m d e sua s no va s p o ssib ilid a d e s d e d ivulg a ç ã o , ta mb é m p o ssib ilita ra m uma a mp lia ç ã o d a instituiç ã o muse o ló g ic a . O muse u, c o mo já a p o nto u Huysse n, o b via me nte nã o a c a b o u, ma s a c o mp a nha nd o a s mud a nç a s d a a rte na s última s d é c a d a s, tra nsfo rmo u se us p ro c e d ime nto s o p e rístic o s. Assim, se g und o Huysse n, te nta nd o a sup e ra ç ã o d a d ic o to mia a lta c ultura / c ultura d e ma ssa ,
O p a p e l d o muse u c o mo um lo c a l c o nse rva d o r e litista o u c o mo um b a stiã o d a tra d iç ã o d a a lta c ultura d á lug a r a o muse u d a c ultura d e ma ssa , c o mo um lug a r d e uma ” mis-e n-sc e nse ” e sp e ta c ula r e d e e xub e râ nc ia o p e rístic a p a ra o c e ná rio a tua l, q ue r e nte rro u o muse u c o mo o te mp lo p a ra a s musa s, d e mo d o a c itá -lo c o mo e sp a ç o híb rid o e m a lg um lug a r e ntre uma fe ira e uma lo ja d e d e p a rta me nto s (HUYSSEN, 1997, p .135).
De um a ntig o mo d e lo d e “ ma uso lé u d e re líq uia s” , o no vo muse u p a sso u a e sta r ma is p ró ximo a um p a lc o d e e nc e na ç õ e s. Um p a lc o q ue e xtra p o la a s p a re d e s a rq uite tô nic a s d o s a ntig o s muse us e se e ste nd e , na s ma is d ive rsa s fo rma s mid iá tic a s d a ind ústria d a c ultura , e m sua s múltip la s fo rma s na so c ie d a d e c a p ita lista . Aind a se g und o Huysse n:
O muse u, ne ste se ntid o ma is a mp lo e a mo rfo , se to rno u p a ra d ig ma c ha ve d a s a tivid a d e s c ultura is c o nte mp o râ ne a s. O muse u q ue e ra c o nsid e ra d o um b a stiã o d e c ultura , a g o ra surg e c o mo ma nd a -c huva d a ind ústria c ultura l (HUYSSEN, 1997, p .223).
Tra ta mo s a q ui d a s re la ç õ e s d e p o d e r q ue p e rme ia m e c ria m o s o b je to s d e c o nhe c ime nto q ue sã o ma ntid o s p e la s instituiç õ e s a rtístic a s. O b je to s fo rma d o s a p a rtir d e re la ç õ e s e sta b e le c id a s e m instituiç õ e s, muse us e a tra vé s d e d e te rmina ç õ e s d isc ip lina re s q ue c o nfig ura m o s o b je to s d e sa b e r. As instituiç õ e s a rtístic a s e sta b e le c e m ma ne ira s, re q uisito s q ue imp le me nta m a s c a te g o riza ç õ e s d o s o b je to s d o c o nhe c ime nto . Tra ta mo s d e ssa s re la ç õ e s d e p o d e r d e ntro d a instituiç ã o a rte e se us c o rre la to s c o mo o s muse us e g a le ria s, q ue p e rp e tua m e xtra to s d e e xc lusã o e c o mp a rtime nta rã o , b e m c o mo
le g itima m e suste nta m a rq uivo s d isc ip lina re s.
As no va s c o nd iç õ e s d e re c e p ç ã o se p ro p a g a m a p a rtir d a s e stra té g ia s e re la ç õ e s d e p o d e r q ue se insta ura m no s muse us. O muse u, a p a rtir d e c o nd iç õ e s o p e rístic a s, c o lo c a tra ç o s p e rc e p tivo s re d e finind o o p a p e l d o le ito r, d a o b ra e re c o nfig ura nd o o a uto r. O p a p e l d o a uto r d o e sp e c ta d o r e o e sta tuto d a o b ra sã o re d ime nsio na d o s na o b ra q ue p ro p õ e a p a rtic ip a ç ã o c o mo no s tra b a lho s d o s a no s 1950 ne o c o nc re to s e d a a rte d o s a no s 1960. Esse p a p e l é mo d ific a d o q ua nd o e sse s tra b a lho s sã o re -e xib id o s a tua lme nte .
Evid e nc ia m-se , a q ui, p o r me io d o s te ó ric o s e te xto s e stud a d o s, o s te xto s q ue re g e m a s re la ç õ e s e ntre a s o b ra s, c o mo a s d e Hé lio O itic ic a , e a instituiç õ e s d o siste ma d e a rte . C a ra c te riza m-se e sta s re la ç õ e s a p a rtir d a tra nsfo rma ç ã o d o muse u a ssina la d a a p a rtir d a q uilo q ue Huysse n c ha mo u d e muse a liza ç ã o , o u se ja , a c o nstruç ã o d e uma se nsib ilid a d e muse a l q ue p e rme ia e o c up a e sp a ç o s ma io re s d a e xp e riê nc ia c o tid ia na (HUYSSEN, 1997, p . 223).
Huysse n c o lo c a o d e b a te só b ria s va ng ua rd a s e m íntima re la ç ã o a o s muse us. No e nta nto re ite ra q ue a c rític a instituc io na l a o muse u c o mo re fo rç a d o r d a o rd e m simb ó lic a nã o e sg o ta o s se us múltip lo s e fe ito s (HUYSSEN, 1996, p . 226). C o lo c a nd o e sse d e b a te d e ntro d a q ue stã o d o p ó s-mo d e rnismo , re ite ra q ue a e vo luç ã o d e sse último d e sd e o s a no s 1960 nã o é c o mp re e nsíve l se m um c o nhe c ime nto p ré vio d e c o mo e ste re vita lizo u o ímp e to d a s va ng ua rd a s histó ric a s e sub se q ue nte me nte la nç o u o e tho s va ng ua rd ista a uma c rític a fulmina nte . Huysse n:
O d e b a te so b re a va ng ua rd a e stá intima me nte lig a d o a o d e b a te so b re o muse u, e a mb o s e stã o no c e ntro d o q ue c ha ma mo s d e p ó s-mo d e rno . Fo i a p ó s to d o o mo vime nto d a s va ng ua rd a s histó ric a s – futurismo , d a d a , surre a lismo , c o nstrutivismo e o s g rup o s d e va ng ua rd a d a re c é m insta la d a Uniã o So vié tic a – q ue se c o me ç o u uma luta ra d ic a l e imp la c á ve l c o ntra o s muse us (HUYSSEN, 1986, p . 228).
117 o nd e se e nc e rra m o b je to s mumific a d o s q ua nto um lug a r o nd e se to rna p o ssíve l a s re ssurre iç õ e s c ultura is. A q ue re la e ntre a va ng ua rd a e o muse u é me d ia d a p o r re -e xib iç õ e s e p e lo ine vitá ve l p ro c e sso d e muse a liza ç ã o d a q ua l e la s nã o c o nse g ue m e sc a p a r:
Fund a me nta lme nte d ia lé tic o , o muse u se rve ta nto c o mo uma c â ma ra mo rtuá ria d o p a ssa d o – c o m tud o q ue a c a rre ta e m te rmo s d e d e c a d ê nc ia , e ro sã o e e sq ue c ime nto – q ua nto c o mo um lug a r d e p o ssíve is re ssurre iç õ e s, e mb o ra me d ia d a s e c o nta mina d a s p e lo s o lho s d o e sp e c ta d o r. Nã o imp o rta o q ua nto o muse u, c o nsc ie nte o u inc o nsc ie nte me nte , p ro d uz e a firma a o rd e m simb ó lic a , p o is se mp re ha ve rá uma so b ra d e sig nific a d o s q ue e xc e d e m o c o njunto d a s fro nte ira s id e o ló g ic a s, a b rind o a ssim um e sp a ç o p a ra a re fle xã o e a me mó ria c o ntra -he g e mô nic a (HUYSSEN, 1996, p . 225)
Um p a ra d o xo e me rg e d e sse d e b a te : o muse u a o me smo te mp o e m q ue é c o nte sta d o , é ne c e ssá rio c o mo lug a r d e e xib iç ã o . A ló g ic a muse o ló g ic a imp rime uma le g itima ç ã o instituc io na l q ue p a ssa p e la situa ç ã o d e e xib iç ã o . A le g itimid a d e d a o b ra é c o nfirma d a p e la e xistê nc ia d o c a tá lo g o a sse g ura nd o sua me mó ria , sua p o ste rid a d e (FREIRE, 1999, p . 36)
Wa lte r Be nja min d isc utiu muito b e m e sse va lo r d e e xib iç ã o no se u c lá ssic o e nsa io A O b ra de Arte na Ép o c a de sua Re p ro dutib ilida de Té c nic a , e sc rito e m 1936 e p o p ula riza d o d ura nte o s a no s 1960. Be nja min c o lo c a q ue o va lo r d e e xib iç ã o a o se r a g re g a d o à s c o isa s a s to rna o b ra d e a rte :
(...) se ria p o ssíve l re c o nstituir a histó ria d a a rte a p a rtir d o c o nfro nto d e d o is p ó lo s no inte rio r d a p ró p ria o b ra d e a rte e ve r o c o nte úd o d e ssa histó ria no p e so c o nfe rid o se ja a um p ó lo se ja a o utro . O s d o is p ó lo s sã o o va lo r d e c ulto d a o b ra e se u va lo r d e e xp o siç ã o (...) A e xp o nib ilid a d e d e uma o b ra d e a rte c re sc e u e m ta l e sc a la , c o m o s vá rio s mé to d o s d e sua re p ro d utib ilid a d e té c nic a , q ue a mud a nç a d e ê nfa se d e um p ó lo p a ra o utro c o rre sp o nd e a uma mud a nç a q ua lita tiva c o mp a rá ve l a q ue o c o rre u na p ré -histó ria . C o m e fe ito , a ssim c o mo na p ré -histó ria a p re p o nd e râ nc ia a b so luta d o va lo r d e c ulto c o nfe rid o à o b ra le vo u-a se r c o nc e b id a e m p rime iro lug a r c o mo instrume nto má g ic o e só ma is ta rd e c o mo o b ra d e a rte , d o me smo mo d o a p re p o nd e râ nc ia a b so luta c o nfe rid a ho je a o se u va lo r d e e xp o siç ã o a trib ui-lhe funç õ e s inte ira me nte no va s, e ntre a s q ua is a “ a rtístic a ” , a únic a d e q ue te mo s c o nsc iê nc ia e q ue ta lve z se
re ve le , ma is ta rd e c o mo se c und á ria (BENJAMIN, P. 173).
O muse u é uma instituiç ã o p ra g má tic a q ue a rra nc a o s o b je to s d o se u c o nte xto e o s e xib e fo ra d e se us c o nte xto s histó ric o s o rig ina is c o m o o b je tivo d e c ria r o c o nhe c ime nto histó ric o unive rsa l (C RIMP, 2005, p . 181). Ele tra ta o s o b je to s ind e p e nd e nte me nte , ta nto d a s c o nd iç õ e s ma te ria is d a é p o c a e m q ue fo ra m c ria d o s q ua nto à s d o p re se nte .
As c rític a s tra d ic io na is a o s muse us p a re c e m ind e fe sa s e à s ve ze s ing ê nua s, já q ue ho uve uma e xp lo sã o d o muse u d o s a no s 1980 p a ra c á . Ho uve uma ve rd a d e ira e xp a nsã o d a me mó ria q ue a c o mp a nha e sse fe nô me no d a muse a liza ç ã o . A mo rte d o s muse us a nunc ia d a no s a no s 1960 nã o se c o nfirmo u. Ante s d isso , a ssistimo s à uma ve rd a d e ira c o rrid a d a s ma ssa s a o s muse us e g ra nd e s re tro sp e c tiva s.