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I nfluências de ocupação do território

No que diz respeito às dinâmicas de ocupação e uso do solo que configura o concelho de Ponte de Lima, regista-se o processo de ocupação territorial extensivo, que evolui de forma difusa, suportado pelas principais infra-estruturas viárias, assumindo-se como elemento estruturante da urbanização em crescimento. As dinâmicas de urbanização1 assentam num somatório de peças soltas, de forma espontânea e em pequenas parcelas, geralmente de natureza rural, desenvolvidas maioritariamente na linha das estradas nacionais e dos caminhos municipais e públicos, por melhor servir o anseio da população e por estarem próximo dos acessos e das redes de eletricidade e telecomunicações.

Na sequência da apropriação extremamente rápida e diversificada, evidenciada ao longo das últimas quatro décadas, deriva um conjunto de fatores que contribuíram para alterar de forma radical a organização do território face ao que antes se conhecia. Associa-se a esses fatores a mudança de vida da população após o 25 de Abril de 19742, que coincide com o regresso definitivo dos ex colonos a Portugal, com a intensidade industrial e as novas oportunidades de criação e fixação de emprego, a par das evoluções tecnológicas e por força da evolução política da União Europeia, que contribuem para mobilizar e articular dinâmicas de ordem económica e social, influenciadoras de motivar novas aglomerações.

Vivia-se num período em que o Estado tudo regulava (sociedade, mercado e território), com o poder local centrado no Presidente de câmara no que diz respeito ao poder municipal de organização territorial, que contava com o acompanhamento técnico de engenheiros e urbanistas (Domingues, 2011, p.26). Fernandes (2005) descreve um conjunto de documentos implementados entre 1852 e 1926, de iniciativa

1 “Idefonso Cerdà cunhou a palavra urbanização para designar os assentamentos humanos e as ações de transformação/construção desses assentamentos.” (Domingues, 2011, p.21).

2 “Revolução de 25 de Abril, também conhecida como Revolução dos Cravos, refere-se a um evento da

história de Portugal resultante do movimento político e social, ocorrido a 25 de Abril de 1974, que depôs o regime ditatorial do Estado Novo, vigente desde 1933, e que iniciou um processo que viria a terminar com a implantação de um regime democrático e com a entrada em vigor da nova Constituição a 25 de Abril de 1976.” (Wikipédia).

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Estatal, com a intuito de organizar o ordenamento do território (Fernandes, 2005, p.100) que, de uma forma geral, deixa antever que o conjunto de planos e projetos elaborados em grande parte dos municípios do Norte de Portugal, são direcionados para a “resolução das enormes carências” concentradas na questão infra-estrutural, nomeadamente na “distribuição de água ou de construção dos pisos de arruamentos existentes” (Fernandes, 2005, p.110), mas com larga margem de prioridade para as obras a realizar nas cidades de Lisboa e Porto.

Do ponto de vista institucional, no que diz respeito à intenção de constituição de um quadro legal que visa controlar a qualidade do processo de expansão urbana, verifica- se que apesar de Portugal se apresentar na linha da frente no contexto Europeu, consequência do Decreto-lei nº 10 de 19 de Janeiro de 1865, que criava os Planos Gerais de Melhoramento (Amado, 2009, p.19), apenas os centros de relevância distrital tinham o privilégio de ver realizados e concretizados, de forma restrita, algumas propostas traçadas pelos planos, com os municípios de menor dimensão a sobreviveram durante longas décadas a meras intenções, onde se incluí a área urbana de Ponte de Lima.

A regulamentação que estabelece os níveis de ocupação do território no final do século XIX, não correspondeu ao rápido processo de transformação que decorreu na transição para o século XX. O crescimento para além do tecido confinado começa a evidenciar-se de forma indefinida, dando azo ao início de uma urbanização holista, com o Estado a revelar incapacidade para controlar a dimensão física dos principais centros urbanos, agravado pelo registo da intensidade de alargamento sobre o território rural.

A formal afirmação ao alargamento das ações de planeamento a todo o território continental surge na década de trinta, com a entrada de Duarte Pacheco3, impulsionador do desenvolvimento de importantes infra-estruturas e do lançamento de diversos planos de ordenamento e melhoramentos urbanos necessários (Lôbo,

3 Figura marcante da transformação do território da década de trinta. Em 5 de Julho 1932 assume a

pasta de Ministro das Obras Públicas e Comunicações até 18 de Janeiro de 1936, altura em que abandona as funções. Impulsiona o desenvolvimento de grandes infra-estruturas, com a construção de estradas, pontes, de barragens e o ordenamento de cidades e vilas, com a realização de planos e de um extenso programa de melhoramentos necessários (Lôbo, 1995, p.36).

2005, p.37), que se arrastaram por longos períodos por falta de informação cartográfica que permitisse a elaboração do plano de urbanização.

A primeira tentativa de realização de um Plano de Urbanização em Ponte de Lima, decorreu em 1947, pela mão do Arquiteto Januário Godinho de Almeida4 (Guerreiro, 2007, p.224), tornando-se inconclusiva precisamente pela inexistência de elementos cartográficos suficientes. Desde então iniciou-se o processo de atualização cartográfica do concelho, que viria a ser concluída na década de sessenta.

Procedeu-se a um período de impasse, com origem a processos informais de organização e crescimento urbano registado em todo o concelho, consequência de uma ausência de programação estruturada do uso do território e da débil ação da administração pública, com resultado no aparecimento de atuações de grande indefinição.

A expansão sobre a envolvente rural desenvolveu-se a ritmos e intensidades difíceis de controlar, conferindo ao território novos contornos e nova imagem, que marcam a transformação das paisagens e o seu uso, numa sequência temporal alargada e contínua, acompanhada pela evolução social e económica da população.

A relação da vila com a sua envolvente, anteriormente estabelecida de forma clara, com as duas realidades, a urbana e a rural, que eram bem definidas, resultou na metamorfose territorial. Como referem Portas e Travassos (2001), perdeu-se a lógica que dava sentido a priori às diferentes partes e ao modo como se organizavam (Portas, Travassos, 2011, p.168), reduzindo-se os processos de ocupação do território de Ponte de Lima a um urbano descontínuo e fragmentado, necessariamente extensivo e sem um limite definido. Esta leitura não se resume ao concelho de Ponte de Lima, é extensivo a grande parte do território do Noroeste de Portugal e em particular o

4 Arquiteto Português (1910-1990). Estudou na Escola de Belas Artes do Porto (1925-1932). A sua

actividade profissional atinge a maturidade num período crucial do desenvolvimento da arquitectura moderna em Portugal. Durante a sua carreira distanciou-se de alguns dos modelos mais recorrentes na Europa Central, optando por uma arquitetura que conciliava o moderno e o contemporâneo, a tradição e o sítio e que prenunciava o regionalismo crítico. Trabalhou um pouco por todo o país em diversificadas obras de arquitetura e urbanismo. Das muitas obras que criou destacam-se as construções para a Hidroelétrica do Cávado (anos 40 e 60), as pousadas no Norte, blocos residenciais, palácios de justiça, como o de Vila do Conde (1953), mercados como o de Ovar (1950), a Câmara Municipal e o Tribunal de Vila Nova de Famalicão (1961), a Estação da União Elétrica Portuguesa, no Porto (anos 50 e 60) e os planos de urbanização para a Baixa de Amarante (1965) e de Coimbra (1968) (Wikipédia).

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distrito de Viana do Castelo, generalizada como uma região tradicionalmente de ocupação dispersa, que se desenvolveu sobretudo a partir da segunda metade do século XX, determinada por diferentes contextos de ordem social, económica, politica e cultural, mas também pelas caraterísticas geográficas e capacidade de aglomeração de cada lugar.

Figura 4. Imagem aérea de um trecho do território de Ponte de Lima

A abertura de novas redes viárias sobre o território em análise, que estabelecem lógicas de maior e melhor proximidade física, vieram alterar os modos de organização social que, como descreve Fadigas (2010), “têm consequências na forma como se estabelecem e mantêm as relações humanas e na forma como se processa a organização espacial dos territórios” (Fadigas, 2010, p.10). A pressão demográfica sobre as cidades e vilas mais próximas aumenta o valor do mercado imobiliário,

afastando as pessoas dos seus locais de emprego, forçando o uso do transporte individual e coletivo nas deslocações residência emprego, fomentando a pressão residencial sobre a periferia urbana.

A introdução das novas infra-estruturas de mobilidade impulsiona os níveis de crescimento urbano, funcionando como uma das chaves fundamentais para dinamizar a nova organização do território.

A pressão sobre o território, de que resulta um conjunto de transformações e processos de continuidade sobre as propriedades rurais, reduz a “agricultura familiar para uma importância residual” (Domingues, 2011, p.118), atividade que durante largos períodos serviu de base fundamental à economia, rendimento e emprego do concelho. A agricultura deixou de se revelar como base fundamental para a economia, sendo ultrapassada pelas atividades secundárias e serviços decorrente de um inevitável declínio, resultante da alteração das classes sociais e da concorrência externa e das políticas da União Europeia.

A transformação da paisagem rural em urbana, que configura a atual forma física e morfológica do território de Ponte de Lima, correspondente ao processo de urbanização que resulta de uma sucessão de atos, decisões pontuais e de uma organização utilitária do espaço que, por acumulação, lhe conferem uma expressão territorial e paisagística própria.