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NOSSO OLHAR PARA OS CLS

No documento davivieiramedeiros (páginas 63-76)

Apresentamos, na seção anterior, no que se refere às línguas de sinais, a definição de CLs de Ferreira-Brito (1995), de McDonald (1982) e de Supalla (1978, 1982, 1986). De certa forma, vimos que, principalmente para os dois últimos autores, os CLs nas línguas de sinais se assemelham aos CLs nas línguas orais e possuem, de modo geral, a finalidade de evidenciar características específicas de determinada entidade, bem como de determinada ação. Vimos, ainda, que os CLs são muito importantes para as línguas de sinais, uma vez que, além de serem muito produtivos, compõem o léxico nativo dessas línguas, e que eles, de certo modo, possuem um caráter que se aproxima, significativamente, do imagético.

Encontramos em Supalla (1978, 1982, 1986) uma classificação acerca dos CLs que permite uma descrição mais detalhada desses elementos, o que, certamente, é bastante satisfatório. De modo geral, concordamos com as definições de CLs apresentadas por Ferreira-Brito (1995) e por McDonald (1982), no entanto, a classificação das autoras é restrita a apenas alguns tipos de construções classificadoras: aquelas com especificação do tipo de determinado objeto, do modo como se segura certo objeto e da maneira como determinada ação acontece, no caso da primeira autora, e aquelas com referência direta ou indireta a alguma entidade, no caso da segunda.

Com base em nossas observações empíricas, a classificação de Supalla (1978, 1982, 1986) nos parece adequada para a descrição e a análise dos dados com algum tipo de motivação, envolvendo a produção de CLs. No entanto, considerando a natureza dos dados analisados, percebemos a necessidade de reconsiderarmos, bem como de revermos, a classificação apresentada pelo autor para esses elementos,

detalhando-a, um pouco mais, em alguns pontos. Nas próximas subseções, detalharemos, portanto, a natureza desses CLs, a partir da nossa análise.

3.4.1 CLs Especificadores de Forma e Tamanho (SASSES)

CLs SASSes são CLs em que a CM de uma ou de ambas as mãos representa(m) o tamanho e/ou a forma do objeto referido (em alguns casos, como já foi apontado, não só a(s) mão(s) traz(em) essas informações, mas, também, o próprio antebraço).

Encontramos nos nossos dados dois tipos de CLs SASSes, os quais coincidem com a descrição proposta por Supalla (1978, 1982, 1986): (i) SASSes estáticos, aos quais atribuímos a forma SASS (E); e (ii) SASSes de traço, aos quais atribuímos a forma SASS (T). As Figuras 18 e 19 apresentam, respectivamente, um exemplo de um sinal contendo CL SASS (E) e um exemplo de um sinal contendo CL SASS (T).

Figura 18 – Sinal ARTES no Dic Brasil

Fonte: Capovilla et al. (2017, p. 276)

Figura 19 – Sinal ACENTO CIRCUNFLEXO (sinal diacrítico) no Dic Brasil

Fonte: Capovilla et al. (2017, p. 80)

Na Figura 18, podemos ver um sinal envolvendo dois CLs SASSes (E), um realizado pela mão esquerda e o outro realizado pela mão direita: na mão esquerda,

temos uma entidade20 plana, a qual pode ser interpretada como uma superfície sobre

a qual se pode pintar algo (por exemplo, um papel) e, na mão direita, temos uma entidade reta, a qual pode ser interpretada como um objeto usado para pintar determinada coisa (por exemplo, um pincel).

Na Figura 19, temos um sinal envolvendo um CL SASS (T), realizado apenas pela mão direita. No sinal em questão, a mão direita traça o formato do sinal circunflexo.

Há, nos nossos dados, casos em que ambos os tipos de CLs SASSes estão envolvidos na realização de um mesmo sinal. Podemos citar, por exemplo, os sinais que fazem referência a abóbora e a abrigo, que podem ser vistos, respectivamente, nas Figuras 20 e 21.

Figura 20 – Sinal ABÓBORA (1) (abóbora comum) (CL) no Dic Brasil

Fonte: Capovilla et al. (2017, p. 59)

Figura 21 – Sinal ABRIGO (cobertura, teto) no Dic Brasil

Fonte: Capovilla et al. (2017, p. 66)

20 Rodero-Takahira (2015) usa o termo ‘entidade’ com o intuito de trazer a propriedade geral

do CL. Dessa forma, torna-se possível esvaziá-lo de um significado específico, evitando-se, com isso, que o uso de uma palavra do português (como uma das possíveis interpretações de determinado CL) influencie, por exemplo, em análises morfossintáticas desse CL. Em relação ao sinal usado para fazer referência a artes (figura 18), a autora comenta o seguinte: “[ele] é frequentemente analisado como monomorfêmico, “desenhar’, possivelmente pela influência da glosa em português que, comumente, apresenta uma única palavra. No entanto, com um olhar mais atento percebemos que é possível depreender duas unidades, ambas envolvendo CLs” (RODERO-TAKAHIRA, 2015, p. 10). O conjunto dos tipos de entidade encontrados nos nossos dados pode ser visto no Apêndice B desta dissertação.

Na Figura 20, podemos ver um sinal envolvendo dois CLs SASSes (E) (no caso, o mesmo CL realizado tanto pela mão esquerda quanto pela mão direita, por meio de uma entidade semicircular), os quais podem ser interpretados como a superfície da abóbora; temos, ainda, nesse sinal, realizado pela mão direita, um CL SASS (T), que traz informação sobre o tamanho (extensão) da abóbora.

Na Figura 21, temos um sinal envolvendo dois CLs SASSes (E) (novamente, o mesmo CL realizado por ambas as mãos, simultaneamente, nesse caso por meio de uma entidade plana), os quais podem ser interpretados como a superfície da cobertura desse abrigo, e temos dois CLs SASSes (T) (também realizados por ambas as mãos), os quais trazem informação acerca do tamanho (extensão) dessa cobertura.

3.4.2 CLs Semânticos

CLs semânticos são CLs nos quais a(s) mão(s) que articula(m) o sinal representa(m) a categoria semântica do referente, de maneira mais abstrata, em relação ao que ocorre nos SASSes, por exemplo.

Supalla (1978, 1982, 1986) divide esses CLs em dois subgrupos: um contendo sinais que fazem referência a entidades com pernas e o outro abrangendo três outros tipos de CLs, no que diz respeito às suas funções e/ou às suas orientações. Neste trabalho, optamos por não organizar esse tipo de CL nos dois subgrupos propostos pelo autor, por entendermos que, de modo geral, ambos os subgrupos contêm sinais que, na realidade, representam a categoria semântica do referente, e não que trazem informações relacionadas ao tamanho e/ou ao formato do objeto referido, especificamente, como fazem os CLs SASSes21.

Encontramos nos dados, basicamente, dois tipos de CL semântico: (i) aqueles formados a partir de CLs SASSes (E) e/ou SASSes (T), que, de certa forma, perdem a função principal destes (isto é, especificar tamanho e/ou forma de um referente) e (ii) aqueles formados a partir de CLs instrumentais. Em relação a (i), podemos citar,

21 Rodero-Takahira (2015), aparentemente, também prefere não manter essa organização

proposta por Supalla, escolhendo a forma ‘ENTIDADE-RETA’, em vez de ‘ENTIDADE-COM- PERNAS’, objetivando caminhar em direção a sistematizações na descrição dos CLs. “ENTIDADE-COM-PERNAS parece remeter apenas a entidades humanas. No entanto, há exemplos que fazem uso desse mesmo CL, mas não remetem a “pernas”, como o sinal BARATA (no qual o CL remete as antenas) ou BODE (no qual o CL remete ao chifre)” (RODERO-TAKAHIRA, 2015, p. 9).

como exemplo, os sinais que fazem referência a abelha e a altar (Figuras 22 e 23, respectivamente). Em relação a (ii), podemos citar o sinal que faz referência a automóvel (Figura 24).

Figura 22 – Sinal ABELHA (2) no Dic Brasil

Fonte: Capovilla et al. (2017, p. 56)

Figura 23 – Sinal ALTAR (2) (CL) no Dic Brasil

Fonte: Capovilla et al. (2017, p. 168)

Figura 24 – Sinal AUTOMÓVEL no Dic Brasil

Fonte: Capovilla et al. (2017, p. 324)

Na Figura 22, podemos ver um sinal composto por duas partes: na primeira, temos um CL semântico que, abstratamente, faz referência à categoria de insetos; na segunda, temos a realização da datilologia/soletração manual completa da palavra ‘abelha’. Especificamente, na primeira parte desse sinal, temos um CL semântico formado por um CL SASS (E), no caso, uma entidade reta que especifica o tamanho e o formato de um par de antenas. Entretanto, parece que a parte do sinal em questão

perde essa função primeira de especificação do tamanho e do formato de um par de antenas e, por sua vez, de referenciação às antenas de um inseto, e assume a função de fazer referência, na verdade, a uma categoria mais geral, mais abstrata (insetos), o que justifica, aparentemente, a segunda parte do sinal, composta por datilologia/soletração manual, explicitando e restringindo o inseto referido.

Na Figura 23, vemos um sinal também composto por duas partes: na primeira, temos um CL semântico formado por dois CLs SASSes (E) (duas entidades planas, uma em cada mão), que especificam a superfície da mobília, e por dois CLs SASSes (T) (também realizados por ambas as mãos), que especificam o tamanho e o formato dessa mobília. Novamente, não parece haver aqui a função primeira de um CL SASS, nesse caso, a de especificar o tamanho e/ou a forma de uma mesa (ou, especificamente, de um altar), mas, sim, a de fazer referência à categoria mobília (mesa, escrivaninha, balcão, bancada etc.), abstratamente.

Finalmente, na Figura 24, observamos um sinal que apresenta CL semântico formado por dois CLs instrumentais (cuja natureza será detalhada mais a frente), um em cada mão, que, categoricamente, faz referência a carros. Em outras palavras, o CL semântico, nesse caso, se refere à categoria mais geral de automóveis (carros), sem especificar características particulares em relação à forma como manipulamos o volante do automóvel referido.

A perda da função principal dos CLs SASSes formadores de CLs semânticos, conforme vimos nos exemplos acima, fica evidente quando comparamos possíveis proposições em Libras, ora especificando o tamanho e/ou a forma do objeto referido (nesses casos, quando o CL não é interpretado (ou, pelo menos, não o é principalmente) como um CL semântico, mas, sim, apenas como um CL SASS), ora fazendo referência à categoria semântica desse objeto (nesse caso, quando ele é interpretado como um CL SASS, por apresentar, ainda que indiretamente, características particulares do referente, mas, também, quiçá principalmente, como um CL semântico). Se observarmos a primeira parte da Figura 23 (que faz referência a altar), veremos que, mesmo indiretamente, os CLs SASSes (E) e (T) que compõem o sinal fazem referência ao contorno e à superfície retangular de uma mesa. Entretanto, se consideramos a proposição “Eu comprei uma mesa”, em Libras, muito provavelmente, o mesmo CL seria usado, independentemente das características específicas da mesa comprada (redonda, triangular, retangular, de jantar, de escritório, de quatro cadeiras, de seis cadeiras etc.), já que, nesse caso, a proposição

indica um tipo específico de mobília (mesa), e não as particularidades dessa mobília em questão22.

3.4.3 CLs Corporais

CLs corporais, na definição de Supalla (1978, 1982, 1986) são CLs em que todo o corpo do sinalizador é usado para representar uma entidade, devendo essa entidade ser [+ animada]. Na presente dissertação, revemos e reconsideramos a definição do autor, em relação a dois fatores. Em primeiro lugar, entendemos que não se torna obrigatoriamente necessário o uso de todo o corpo do sinalizador para representar determinada entidade: movimentos significativos envolvendo o corpo, como encolhimento dos ombros, abaixamento do corpo e inclinação da cabeça e/ou do corpo (para frente ou para trás ou para o lado), por exemplo, foram analisados por nós, neste trabalho, como sendo CLs desse tipo. Em segundo lugar, entendemos que essa entidade não precisa ser, obrigatoriamente, do tipo [+ animada], conforme apontado na seção 3.2 deste capítulo.23

Vale ressaltar que, embora, em nossa concepção, não seja necessária, obrigatoriamente, a movimentação de todo o corpo do sinalizador, a fim de que o sinal seja considerado um CL corporal, e/ou a presença de articuladores manuais envolvidos na realização do sinal, faz-se necessária a presença de movimentos minimamente significativos. Por exemplo, no sinal referente a avental (Figura 25), as mãos fechadas do sinalizador simulam a pantomima envolvida na ação de vestir um avental e, em seguida, de dar um laço nas costas, no entanto, não há nenhum movimento significativo, além dos movimentos realizados pelas mãos, na execução do sinal em questão, que justifique analisá-lo como um CL corporal. As Figuras 26 e 27, pois, trazem exemplos de sinais com CLs corporais.

22 Veja que o mesmo acontece no sinal que faz referência à casa (Figura 2). Tal sinal é

composto por dois CLs SASSes estáticos, um na mão esquerda e o outro na mão direita, que especificam o tamanho e o formato do telhado de uma casa, e por um CL semântico, que faz referência, abstratamente, à categoria de casa (moradia, lar). Dificilmente, esse sinal apareceria em uma proposição do tipo “Está vendo aquele apartamento?”. Entretanto, em uma proposição do tipo “Estou muito cansado, quero ir embora para casa”, naturalmente, o sinal em questão apareceria, ainda que o sinalizador morasse, na realidade, em um apartamento.

Figura 25 – Sinal AVENTAL (CL) no Dic Brasil

Fonte: Capovilla et al. (2017, p. 331)

Figura 26 – Sinal AFOGAR-SE (CL) no Dic Brasil

Fonte: Capovilla et al. (2017, p. 120)

Figura 27 – Sinal AGITAR, AGITAR-SE, AGITAÇÃO, AGITADO no Dic Brasil

Fonte: Capovilla et al. (2017, p. 126)

Em relação à primeira (Figura 26), nesse dado, que faz referência à ação de se afogar, o corpo do sinalizador, na primeira parte do sinal, é usado com o intuito de representar uma pessoa se afogando; em relação à segunda (Figura 27), nesse dado, que faz referência a uma pessoa agitada, os ombros do sinalizador se movimentam, alternadamente, para frente e para trás.

Vale ressaltar que, por questões evidentes, os movimentos significativos envolvendo o corpo, como os exemplificados acima, envolvem ENMs, ao passo que são realizados por elementos não manuais. Nesse sentido, em todas as ocorrências em que aparece a indicação desse tipo de CL (corporal), aparece, também, a indicação de ENM. Aliás, torna-se, de certa forma, significativamente complexo separar, nesses tipos de sinais, os elementos que estão associados estritamente à produção do CL corporal dos que estão associados estritamente à realização da(s) ENM(s).

3.4.4 CLs de Partes do Corpo

CLs de partes do corpo, na definição de Supalla (1978, 1982, 1986) são CLs nos quais o corpo do sinalizador é usado com a intenção de fazer referência a uma parte do corpo específica (olhos, nariz, boca, por exemplo) e/ou para marcar tais atributos de um referente. Essa referência, segundo o autor, pode ser feita quando o sinalizador aponta para uma parte específica de seu corpo ou, ainda, quando traça o contorno desse local para fazer referência ao corpo do referente.

Observando os dados analisados neste trabalho, revemos e reconsideramos a definição do autor para esse tipo de CL. Encontramos outras formas de se fazer referência a partes do corpo, seja do próprio sinalizador, seja de outro referente do tipo [+ animado], como um ser-humano ou um animal. Nesse sentido, categorizamos esses CLs em três grupos:

(i) o primeiro formado por sinais em que a parte do corpo usada pelo sinalizador (olhos, braços, mãos etc.) coincide, exatamente, com a parte do corpo do indivíduo envolvida na(s) noção(ões) expressa(s) pelo CL, ao qual atribuímos a forma PC (C) – parte do corpo (corpo);

(ii) o segundo formado por sinais em que a parte do corpo usada pelo sinalizador (boca, nariz, olhos, orelhas etc.) representa o local do corpo do referente envolvido (direta, indireta ou metaforicamente) na(s) noção(ões) expressa(s) pelo CL, ao qual atribuímos a forma PC (L) – parte do corpo (locação/localização); e

(iii) o terceiro formado por sinais em que a(s) mão(s) do sinalizador é(são) usada(s) para fazer referência a parte(s) do corpo do referente, ao qual atribuímos a forma PC (R) – parte do corpo (referência).

Os tipos (i), (ii) e (iii) são exemplificados nas Figuras 28, 29 e 30, respectivamente.

Figura 28 – Sinal ACENAR no Dic Brasil

Fonte: Capovilla et al. (2017, p. 79)

Figura 29 – Sinal AMAR (1), AMAR-SE (1) no Dic Brasil

Fonte: Capovilla et al. (2017, p. 177)

Figura 30 – Sinal ABAIXAR O RABO (com o rabo entre as pernas) no Dic Brasil

Na Figura 28, a mão usada pelo sinalizador se trata, exatamente, da mão envolvida na ação de acenar (em outras palavras, a mesma parte do corpo usada pelo sinalizador é a parte do corpo usada na realização da ação expressa por esse sinal). Na Figura 29, o local do corpo do referente representa, metaforicamente, o local envolvido na(s) noção(ões) expressa(s) por esse sinal (em outras palavras, o lado esquerdo do peito está relacionado, cultural e metaforicamente, ao(s) significado(s) atribuído(s) ao sinal em questão.

Por fim, na Figura 30, um CL SASS (E) realizado pela mão direita do sinalizador é usado para fazer referência a uma parte do corpo de um animal, mais especificamente, à cauda.

3.4.5 CLs Instrumentais

CLs instrumentais são CLs em que a(s) mão(s) do sinalizador é(são) usada(s) para fazer referência ao tipo de instrumento que manipula um objeto. Nesse sentido, a partir da definição de Supalla (1978, 1982, 1986), observamos, logicamente, (i) a necessidade de haver um objeto envolvido na(s) noção(ões) expressa(s) pelo sinal que contém esse tipo de CL e (ii) o fato de esse objeto ser referido, apenas, indiretamente, visto que, nesse tipo de CL, conhecemos apenas algumas informações relacionadas a características bem gerais desse objeto (às vezes o tamanho, às vezes a profundidade, às vezes o formato).

Na Figura 31, por exemplo, a mão direita do sinalizador manipula um objeto usado para assinar um abaixo-assinado, que, nesse caso (e, é claro, considerando a natureza desse tipo de documento), pode ser interpretado como uma caneta. Ressaltamos, contudo, que o objeto em questão é representado apenas indiretamente: não temos, pois, um CL SASS (E) realizado pela mão direita especificando o tamanho e/ou o formato desse objeto, possivelmente interpretado como caneta; na realidade, temos, apenas, uma CM que nos indica, por exemplo, que se trata de um objeto fino (como um lápis, uma caneta, um palito, uma haste etc.), considerando o modo como ele está sendo manipulado.

Figura 31 – Sinal ABAIXO-ASSINADO no Dic Brasil

Fonte: Capovilla et al. (2017, p. 51)

Considerando os dados analisados neste trabalho, observamos que o instrumento manipulador do objeto representado pela(s) mão(s) do sinalizador é, na maioria dos casos, sua(s) própria(s) mão(s). Entretanto, encontramos sinais nos quais o objeto referenciado é manipulado pelos pés, estes, pois, referidos a partir de um CL PC (R), como pode ser visto na Figura 32. Nela, a mão direita do sinalizador, a partir de um SASS (E), faz referência ao pé do indivíduo, que manipula o pedal de aceleração do veículo, pisando-o.

Figura 32 – Sinal ACELERAR (2) veículos no Dic Brasil

Fonte: Capovilla et al. (2017, p. 79)

3.5 CONSIDERAÇÕES FINAIS DO CAPÍTULO

No presente capítulo, trouxemos diferentes definições de CLs presentes na literatura, as quais deixaram evidente o caráter complexo e produtivo que esses elementos apresentam tanto nas línguas orais quanto nas línguas de sinais, com um destaque significativo para estas últimas. Os CLs, portanto, são elementos linguísticos que seguem processos morfológica e sintaticamente complexos, e seu uso é bastante sistemático.

No que diz respeito às línguas orais, vimos que os CLs têm sido compreendidos como morfemas afixados a itens lexicais que apresentam características semânticas da entidade à qual esses itens fazem referência (ALLAN, 1977).

Em relação às línguas de sinais, vimos que os CLs são responsáveis pela composição do léxico nativo dessas línguas, nas quais são, portanto, muito produtivos (BRENTARI; PADDEN, 2001; QUADROS; KARNOPP, 2004). Não obstante, vimos que a definição e até mesmo a noção do que sejam CLs ainda é muito discutida, tanto na comunidade acadêmica quanto na comunidade não acadêmica. Especificamente, apresentamos a definição, bem como a classificação de CLs de Ferreira-Brito (1995), de McDonald (1982) e de Supalla (1978, 1982, 1986). Neste último autor, encontramos uma classificação para a descrição dos CLs mais detalhada, o que nos levou a assumi-la, de modo geral (uma vez que, em alguns casos, observamos a necessidade de revisá-la), na presente dissertação.

Em sua relação com a iconicidade, observamos que, dada a modalidade das línguas de sinais, os CLs, de fato, apresentam um caráter que se aproxima, significativamente, do imagético, na medida em que eles são altamente icônicos e passíveis de serem desmembrados em morfemas composicionais, envolvendo diferentes partes do corpo, simultaneamente.

4 ASPECTOS METODOLÓGICOS

No presente capítulo, apresentamos os aspectos metodológicos que nortearam a nossa pesquisa. Inicialmente, apresentamos o material que serviu de base para a coleta dos dados, o Dicionário da Língua de Sinais do Brasil: A Libras em suas mãos, ou Dic Brasil (forma como o dicionário em questão é citado pelos autores) (CAPOVILLA et al., 2017). Em seguida, detalharemos algumas questões referentes ao registro, à interpretação e à natureza dos dados presentes no Apêndice A desta dissertação.

4.1 COLETA DOS DADOS – DICIONÁRIO DA LÍNGUA DE SINAIS DO BRASIL: A

No documento davivieiramedeiros (páginas 63-76)