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Notas sobre a localidade

No documento MILENA BORGES DE MORAES (páginas 87-92)

CAPÍTULO I - CORPUS ESCRITO MEMORIA: CARACTERÍSTICAS CONSTITUTIVAS CONSTITUTIVAS

2.2 INSTRUMENTOS TEÓRICO-METODOLÓGICOS DA PESQUISA DE CAMPO -

2.2.2 Notas sobre a localidade

Em relação à definição da área/localidade submetida à investigação dialetal neste trabalho por meio de entrevista, optou-se pelo município de Cáceres, Mato Grosso, circunscrita à sua área urbana37, região que tem relação com o corpus escrito Memoria. De acordo com Cardoso (2010, p. 89), “pode-se estabelecer como lócus da pesquisa uma única localidade, um estado, uma região, um país, um continente [...]”. A definição por esse município também teve como norte Cardoso (2010), a qual pondera que a definição da área/localidade precisa ocorrer em detrimento do espaço ou das características linguísticas, bem como de considerar um conjunto de caracteres que a demarcam e a de outras áreas, como a situação geográfica; a história da área; o tipo de povoamento que nela se processou; a situação econômica; o grau de isolamento da área; dentre outros.

No que concerne aos aspectos a serem considerados na busca do conhecimento da área a ser pesquisada, já explicitados no Capítulo 1 deste trabalho, seguiu-se os apontamentos de Cardoso conforme segue abaixo:

a) a história da área, a começar de sua fundação e das diferentes etapas que caracterizam o seu desenvolvimento;

b) o grau de isolamento da área [...];

c) a antiguidade da região, que definirá a que estágio do processo de povoamento do território se prende;

d) a natureza do desenvolvimento econômico que fornecerá a posição da localidade na região, conceituando-a como mais destacadamente difusora ou receptora das mudanças, embora se saiba que toda área é, em parte, centro de produção e de recepção de transformações [...]. (CARDOSO, 2010, p. 90).

Em termos de localização, o município de Cáceres encontra-se no sudoeste do Estado de Mato Grosso, distante 210 Km de Cuiabá, capital do Estado, e a 90 Km da fronteira com a Bolívia. É banhado pelo Rio Paraguai e se localiza na cabeceira do Pantanal mato-grossense. Está na área de jurisdição da Amazônia Legal (Lei n. 5 .173 de 27/10/66). É constituído pelos seguintes distritos: Caramujo, Horizonte D'Oeste, Vila Aparecida e Vila Sadia; e seus municípios limítrofes são: ao Norte, Mirassol d'Oeste, Lambari, Barra do Bugres, e Porto Estrela; ao Nordeste, Nossa Senhora do Livramento; a seste e sudeste, Poconé; ao sul, Poconé

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Diante do deslocamento tardio da população cacerense do espaço rural para o urbano, conforme explicitado no Capítulo 1, optamos pelo urbano para verificar se essa questão influenciou/a na conservação do léxico.

e Corumbá-MS; a oeste, Porto Esperidião. A noroeste e a sudeste também faz limite com a República da Bolívia. Os habitantes naturais desse município são denominados cacerenses. A principal forma de acesso a esse município é a BR 070 (Cuiabá-Cáceres), a qual corta o perímetro urbano deste, e o rio Paraguai.

De acordo com os dados do censo realizado em 2010, pelo Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE, 2010), Cáceres possui 87.942 habitantes, sendo 44.098 homens e 43.840 mulheres, numa área territorial de 24.351,408 Km²; e a densidade demográfica é de 3,61 habitantes por quilômetro quadrado.

É nesse cenário, bem como o que foi explícitado no Capítulo 1 deste trabalho, seção 1.5, que habitam os indivíduos entrevistados da localidade demarcada para esta pesquisa, seguindo os princípios geolinguísticos em que o espaço geográfico exibe a singularidade de cada terra, demonstrando a variedade que a língua assume de uma região para outra, "como forma de responder à diversidade cultural, à natureza da formação demográfica da área, à própria base linguística preexistente e à interferência de outras línguas que se tenham feito presentes naquele espaço no curso de sua história" (CARDOSO, 2010, p. 15).

2.2.3 Questionário semântico-lexical

A presente pesquisa utilizou-se do instrumento da coleta in loco do corpus oral por meio de questionário, aplicado em uma entrevista semiestruturada para informantes pré-selecionados. Para isso, elaboramos um questionário linguístico previamente estabelecido, o qual teve como suporte teórico-metodológico a proposta apresentada pelo Comitê Nacional do Projeto ALiB em Atlas Linguístico do Brasil. Questionários (COMITÊ NACIONAL DO PROJETO ALIB, 2001).

O fato de ter um questionário previamente estabelecido imprimiu uma certa uniformidade ao conjunto da pesquisa. No entanto, conforme salienta Santos (2006, p. 83), "fatores contextuais e interacionais acabam modificando o padrão inicial" e isso não se configura como um problema, mas como possibilidade de exame da riqueza da variação diatópica, bem como alguns elementos da manifestação presentes na relação intersubjetiva.

Sobre o dado a ser recolhido na pesquisa, Cardoso (2010) pondera que há vários tipos de questionário linguístico que se organizam com vistas ao tipo de dado, a saber, fonético-fonológico, semântico-lexical, morfossintático, prosódico, pragmático discursivo, metalinguístico.

Considerando o objetivo da pesquisa em apurar dados de natureza semântico-lexical a respeito de unidades lexicais extraídas do manuscrito oitocentista e das respectivas acepções

delas registradas no referido documento, de modo a verificar o grau de manutenção, tendência à manutenção, desuso, tendência ao desuso e neologismo semântico no âmbito do léxico na região de Cáceres, Mato Grosso, na atualidade, optou-se pelo enfoque semasiológico38, afim de apreender os significados possíveis que possam ser trazidos pelo informante a um determinado significante.

Diante dessa conjuntura, e devido ao fato de o léxico só poder ser adequadamente interpretado quando inserido em um contexto de uso, o levantamento de dados orais ocorreu a partir de um questionário semântico-lexical que consiste em um conjunto de questões elaboradas para verificar se os informantes hoje reconhecem o léxico do documento datado de 1800 e em que contexto de uso, conforme explícito abaixo:

A questão número 1, você conhece a palavra...?, teve a função de apresentar ao informante a unidade lexical previamente selecionada para este estudo e conferir se ele conhecia-a;

• Se o informante conhecia a unidade, prosseguíamos com a questão número 2, a saber: você usa essa palavra? cujo propósito era o de verificar se a unidade lexical em questão é de uso comum do informante ou não;

Em seguida apresentávamos a questão número 3, qual sentido você atribui a essa

palavra quando a usa; e se o informante apresentasse dificuldade para atribuir

sentido à palavra, líamos um trecho em que a unidade lexical está empregada no manuscrito Memoria e perguntávamos: você conhece esse sentido? (questão número 4). As questões 3 e 4 tiveram a função de instigar o informante a usar a unidade lexical dentro de um contexto.

A questão número 5, já leu essa palavra em algum lugar ou ouviu de alguém?, foi utilizada na entrevista nos casos em que o informante dizia não conhecer a unidade em questão. O informante também foi instigado com a abonação no manuscrito Memoria da unidade lexical em questão. Buscou-se provocá-la com o objetivo de ratificar a condição da unidade lexical no que concerne à manutenção, tendência à manutenção, desuso, tendência ao desuso ou neologismo semântico.

38 Segundo Biderman (1984, p. 143), "A semasiologia é uma área da Semântica que estuda os significados e a

sua estruturação interna, a partir dos signos lingüísticos (das palavras). Divide-se assim o signo lingüístico nas suas duas faces - significante e significado. O método semasiológico considera os significantes para indagar sobre os significados, ou investigar o fenômeno da significação. O contrário da semasiologia é a onomasiologia, que parte da significação em busca da designação lingüística dos conceitos ou objetos considerados".

2.2.4 Informantes39

A metodologia adotada pelo Projeto ALiB, em consonância com a Geolinguística, a Dialetologia, apesar de continuar considerando a variação diatópica como primordial no exame do fenômeno linguístico, acresceu à variável geográfica as variáveis idade, sexo, escolaridade. Os procedimentos que utilizamos para a seleção dos informantes, indivíduos que responderam ao questionário e forneceram dados que constituíram o corpus oral deste estudo, lançam mão dessas variáveis de natureza social e geográfica de modo a ter uma representatividade entre os informantes da comunidade cacerense.

Assim, no que se refere ao número e ao perfil dos informantes, adotou-se os seguintes critérios:

1. Estabeleceu-se o número de entrevistados em dezesseis, sendo oito homens e oito mulheres; distribuição equitativa entre duas faixas etárias (faixa 1: 18-30 e faixa 2: 50-65 anos ou acima), contemplando ambos os sexos masculino e feminino;

2. no que concerne à escolaridade, optou-se investigar informantes com diferentes níveis de escolaridade (completos ou incompletos), contemplando desde as primeiras e últimas séries do ensino fundamental, definidas como "primeiras séries: 1ª a 4ª" e "últimas séries: 5ª a 8ª", ensino médio e ensino superior;

3. a questão da naturalidade dos informantes, optou-se por aqueles que nasceram na localidade em questão, e, preferencialmente, eram filhos de pais também nascidos na região pesquisada; se casado, o cônjuge deveria ser também da localidade;

4. no quesito profissão, aquela que não requeria do profissional constante deslocamento para outras localidades.

No Quadro 5, a seguir, pode-se visualizar uma amostragem de como ficaram definidos os dezesseis entrevistados a partir das variáveis sociais: sexo, escolaridade e faixa etária.

Escolaridade Primeiras Séries (1ª a 4ª) do Ensino Fundamental Ensino Fundamental últimas séries (5ª a 8ª)

Ensino Médio Ensino Superior Sexo M F M F M F M F Faixa etária dos informantes F1 18 - 30 (dois informantes) 18 - 30 (dois informantes) 18 - 30 (dois informantes) 18 - 30 (dois informantes) F2 50 - 65 (dois informantes) 50 - 65 (dois informantes) 50 - 65 (dois informantes) 50 - 65 (dois informantes) Total de informantes: 16

Quadro 5 - Variáveis: escolaridade, sexo e faixa etária

Em termos de convenções, adotaram-se as seguintes: para manter sigilo sobre a verdadeira identificação dos sujeitos entrevistados, optou-se por substituir o nome por siglas. Para tanto, valeu-se das iniciais do nome, prenome e sobrenome e acresceu M para a entrevistada do sexo feminino, e H, para o entrevistado do sexo masculino. E mais, adotou-se

F1 e F2 para as faixas etárias 1 e 2 respectivamente; e EP (primeiras séries - 1ª a 4ª - do

ensino fundamental), EF (ensino fundamental últimas séries - 5ª a 8ª), EM (ensino médio),

ES (ensino superior), C (completo), I (incompleto).

Faixa Etária Nome Sexo Escolaridade Idade Informante

F1 C.R.G. Masculino EE..Primário||II 18 F1-H-EP

F1 C.F.P.C. Feminino EE..Primário||II 21 F1-M-EP

F1 J.L.R. Masculino E. Fundamental|I 30 F1-H-EF

F1 H.G.G. Feminino E. Fundamental|I 30 F1-M-EF

F1 M.S.M.S.L. Masculino E. Médio|I 18 F1-H-EM

F1 F.S. Feminino E. Médio|C 24 F1-M-EM

F1 V.E.L. Masculino E. Superior|C 22 F1-H-ES

F1 E.F.M.M. Feminino E. Superior|C 27 F1-M-ES

F2 J.B.P.M. Masculino E. Primário|C 53 F2-H-EP

F2 L.M.A. Feminino E. Primário|I 50 F2-M-EP

F2 G.R.O. Masculino E. Fundamental|C 50 F2-H-EF

F2 M.A.C. Feminino E. Fundamental|I 58 F2-M-EF

F2 B.A.S. Masculino E. Médio|C 62 F2-H-EM

F2 A.P.S.M. Feminino E. Médio|C 50 F2-M-EM

F2 J.A.G. Masculino E. Superior|C 50 F2-H-ES

F2 Z.S.B. feminino E. Superior|C 57 F2-M-ES

Quadro 6 - Perfil dos informantes entrevistados

Cabe ainda informar que para a seleção desses informantes contamos com a colaboração de pessoas da comunidade local que exerceram o papel de intermediários, identificando possíveis informantes e sobretudo funcionando como elo de aproximação entre

esses e a pesquisadora, fato esse de extrema relevância para a realização da pesquisa. Também tivemos a colaboração significativa de uma diretora de escola pública em Cáceres, a qual autorizou fazermos uma triagem do perfil dos informantes que precisávamos junto aos professores, e a realização da entrevista no interior da escola.

No que concerne ao registro dos dados dos informantes, seguiu-se o modelo de ficha adotado pelo Projeto ALiB (Anexo A), cujo objetivo foi o de documentar as informações pessoais do informante.

No documento MILENA BORGES DE MORAES (páginas 87-92)