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Novos desafios para uma nova abordagem geracional

No documento Importância e urgência de uma revisão na (páginas 72-84)

Aboim e Vasconcelos (2014), em artigo sobre o problema das gerações a partir da problemática levantada por Mannheim (1952), teoriza que, como aplicada, a abordagem apresenta problemas de quatro ordens. A primeira se refere ao que os autores chamaram de “a compreensão do tempo subjacente não só no conceito de gerações, mas também a sua conceitualização completa da relação entre conhecimento e história”. Essa proposta teórica tentava resolver as anteriores discussões (que ressaltam radicalmente uma visão externa e objetivista do tempo), e produziu uma dualidade paradoxal em sua explicação causal do surgimento de gerações. Assim, deu preponderância ao tempo interno, ao considerar a questão de “atuação voluntária”. Os teóricos mais modernos, entretanto, atribuem influência marcante às condições externas, caracterizada pela história dos grandes eventos, como Strauss e Howe (1991), por exemplo.

Outro ponto relevante para a discussão também foi antes introduzido por Mannheim (1952) e está baseado justamente em sua definição conceitual de unidade geracional. Segundo ele, a única condição geracional verdadeira, e que se baseia em grupos pequenos que, comprovadamente tenham sido afetados pela história de maneira similar – nas palavras de Aboim e Vasconcelos (2014), “se a atuação for, na análise final, uma autoconsciência voluntária, então todas as formas de atuação que não sejam conscientes serão excluídas”, já que Mannheim (1952) considera as lutas ideológicas como a arena principal para a diferenciação geracional. O problema seguinte apresenta como desafio à concepção dos únicos agentes que de fato podem

produzir uma nova visão de mundo geracional, que seriam, na definição de Mannheim (1952), os jovens, organizados em unidades ideológicas. Por fim, como último desafio, os autores propõem o tema da consciência geracional: a centralidade dada ao tempo interno provoca uma “caracterização intelectualista de agência inovadora, mesmo que desencadeada por fatores externos que despertem uma consciência livre” (ABOIM; VASCONCELOS, 2014), o que pode gerar uma exaltação supervalorizada de visão autoconsciente das gerações e das ideias intelectuais vigentes.

Quaisquer novos esforços para empreender uma revisão da abordagem geracional, portanto, deverá considerar os problemas levantados a seguir.

i. Sobre o tempo

Segundo Aboim e Vasconcelos (2014), uma das principais fontes de confusão na análise geracional é a permutabilidade com a qual esses diferentes conceitos são usados na análise de mudanças sociais. Em Kertzer (1983, p.126, apud ABOIM; VASCONCELOS, 2014), pelo menos quatro temas relacionados ao tempo devem ser identificados.

Em primeiro lugar, uma geração denota uma posição em uma linhagem familiar, referindo-se assim ao ritmo biológico da sucessão geracional em uma linha de descendência de parentesco. Uma segunda maneira de ver as gerações é através de uma perspectiva de fase de vida ligada a grupos etários, que difere do uso da palavra como um conceito relacionado com a mudança histórica. O terceiro significado é relacionado a locais históricos ou gerações como coortes de nascimento. Finalmente, seguindo Mannheim (1952), uma geração também envolve um grau de participação histórica guiado pela autoconsciência, ou pelo menos algum tipo de subjetividade cultural coletiva (DOMINGUES 1995, apud ABOIM; VASCONCELOS, 2014). Como Alwin e McCammon (2007) observam, todas essas noções podem ser úteis e se relacionam em diversos níveis, mas as dificuldades de reconciliá-los são grandes e fundamentais em uma análise geracional, como propõe Ortega y Gasset (1933): Se a essência de cada geração é um tipo particular de sensibilidade, uma capacidade orgânica para determinadas orientações profundamente enraizadas no pensamento, isso significa que cada geração tem sua vocação especial, sua missão histórica. É a mais severa compulsão para desenvolver aquelas pequenas sementes e dar à

existência de seu ambiente uma forma correspondente ao padrão de sua própria espontaneidade (ORTEGA Y GASSET, 1933).

Ortega (1933) assim define uma geração pelo seu tempo interno, embora, ao invés de diminuir essa "sensibilidade" para grupos ou unidades particulares, as gerações recebem um caráter social mais transversal – ao contrário de Mannheim (1952), que enclausura a sensibilidade a grupos ideologicamente homogêneos. Ainda assim, Ortega (1933) não hesita em definir de maneira bastante linear cada ciclo, onde, segundo ele, a atuação dos grupos se encontra. No entanto, em outro ponto, Ortega (1933) procura tornar esta noção mais operativa e, em última instância, cai em uma definição bastante arbitrária de grupos etários: transmite uma visão linear da vida em ciclos, onde a agência está particularmente ligada à participação política, que ocorreria apenas em certos períodos de vida dos indivíduos (especificamente, a partir de 40 e 45 anos). Mesmo um de seus principais discípulos, Julián Marías (1947), condena a simplificação, e introduz um “tipo de reflexiva clarividência” (ABOIM; VASCONCELOS, 2014), adotada por um pequeno grupo de indivíduos para traduzir o espírito de seu tempo.

Naturalmente, nossa discussão está focada no conceito de geração social, e não na sucessão genealógica ou grupos de idade. Assim, a principal busca conceitual é a distinção entre o conceito de coorte e o conceito de geração, já que cada um provoca uma perspectiva diferente do tempo.

a resposta de Mannheim, finalmente, foi de alguma forma acentuar a importância do tempo interno. (...). De certa forma, podemos considerar isso uma solução subjetivista, embora não individualista (...). No entanto, ao contrário, a definição estrutural de Marx do autoconhecimento das classes e das gerações não é uma questão de negociação, a realização de um destino predeterminado histórico, objetivista e unitário, mas uma resposta criativa que resulta em múltiplos significados (ou posições ideológicas) em face de as mesmas condições estruturais desestabilizadas. Dado os problemas decorrentes de tal posição, em particular, o salto em uma autoconsciência quase clarividente, que era uma condição prévia para uma geração existir, outros tentaram voltar para uma noção mais objetivista, como a conceito de coorte (ABOIM; VASCONCELOS, 2014).

O principal problema com a abordagem de coorte é que o reconhecimento simples de efeitos de coorte não implica automaticamente na existência das gerações sociais como construção histórica e cultural. Como White (1992) ressaltou, coortes só devem

ser interpretados como gerações quando apresentam subjetivamente coerência e podem, portanto, tornar-se atores em seu próprio tempo. Da mesma forma, como Cavalli (2004) observa: "É impossível estabelecer a priori quanto tempo uma geração vai durar ou quantos coortes inclui". Isso resulta do fato de que as gerações, na perspectiva de Mannheim (1952), são sempre a consequência de grandes descontinuidades históricas cujo ritmo e sequência podem ser bastante variável. Em suma, como Alwin e McCammon (2003) salientam: "Ao contrário das coortes, as gerações não gozam de uma métrica fixa que se presta facilmente à análise estatística" e, como um resultado, as diferenças intergeracionais não são apenas mais qualitativas (uma histórica subjetividade) do que quantitativas (nascendo em uma determinada data), mas também suas fronteiras não são identificáveis fora de um contexto específico ou uma perspectiva analítica específica. Gerações dependem do domínio particular da realidade social que está sendo examinada, e variam com ele, enquanto as "coortes" podem ser facilmente aplicadas a quase todos os diferentes contextos sociais, embora com risco da descontextualizarão dos fenômenos sociais (ABOIM; VASCONCELOS, 2014).

Segundo Mannheim (1952), as gerações podem ser episódios quase esporádicos na história, porque eles são dependentes de mudanças sociais maciças. Quando há estabilidade, nós só temos coortes. Em segundo lugar, esses locais geracionais só se tornam realidade geracional quando a mudança social é impactante o bastante para criar uma alteração em termos de consciência. De fato, embora Mannheim (1952) atribua menos relevância ao tempo externo do que o tempo interno, ainda são fatores externos que desencadeiam a possibilidade real de participar de um destino comum. Através disso, surge uma sensação de pertencimento geracional autoconsciente, que podem então produzir as unidades de geração (ABOIM; VASCONCELOS, 2014). Considerando a dualidade do tempo em Mannheim (1952), e a prevalência causal final do tempo interno (já que os eventos externos devem ser filtrados e interpretados pela consciência), a construção ideológica e reflexiva do significado só pode vir por aquele grupo capaz de provocar novas respostas ao mundo, os jovens. Estes tornam-se então os únicos ativos da mudança social, na medida em que traduzem unidades potenciais com novas agendas claras.

ii. Sobre a atuação

A percepção de unidade geracional, como em Mannheim (1952), esvazia a aplicação do conceito de geração e alterações geracionais, principalmente por dois motivos: exclui quase todos da agência, e implica um grau de autoconsciência que ultrapassa a reflexividade e as estruturas de significado dessa maioria. Ainda assim, vários autores (BRAUNGART, 1976, DUNHAM, 1998) provaram a utilidade relativa do conceito de análise, grupos mais ou menos organizados e movimentos sociais que, no entanto, sempre representam uma minoria da população. Por outro lado, várias dificuldades podem surgir com este conceito, já que essa noção é também estreita para explicar fenômenos geracionais mais amplos. E, se uma geração é uma unidade (ou mesmo várias delas), então o resto representaria uma categoria vazia. Um bom exemplo desse problema pode ser encontrado no estudo realizado por Whalen e Flacks (1989), para acessar a identificação de toda uma coorte temporalmente qualificada com os ideais preconizados pelo movimento hippie. A conclusão foi que nem todos os membros da coorte dos anos sessenta sentiram-se identificados com o ideário revolucionário político e ícones culturais da década. Essas referências foram, em maior ou menor grau, incorporadas como marcadores do tempo. Isso é, para dizer se aqueles que viveram nos anos sessenta formam uma certa realidade - no sentido de que, na maioria dos casos, as pessoas não estão familiarizadas com esses marcadores, construídos a posteriori, como ícones da era. A questão adicional, portanto, diz respeito ao fato de que, na maioria dos casos, o retrato de uma geração é construído, apenas a posteriori, sobre as lembranças dos poucos, e projeta seletivamente certos marcadores para o detrimento de outros (ABOIM; VASCONCELOS, 2014). Por exemplo, a importância dada à libertação estudantil de 1968: o movimento (rotulado por Kriegel e Hirsch (1978) como a geração de 1968) tende a ignorar o conservadorismo da maioria, mesmo entre os alunos.

Outro ponto relativo ao pertencimento geracional advindo do restritivo conceito de unidade geracional, é a estreiteza do conceito e a pequena parcela de realidade coberta; são problemas importantes quando nós operamos com gerações. Podemos recordar que os rótulos mais comuns usados para identificar gerações - a geração pós-guerra, a geração do baby-boom, a geração dos sessenta, a Geração do 11 de setembro - vão muito além da perspectiva de Mannheim (1952) e muitas vezes são muito amplas para tomar conta das visões de mundo em conflito, de diferentes

unidades ou de toda a geração realidade de uma população maior. Em muitos casos, é necessário ver como determinados eventos inovadores - ou movimentos políticos catalisados por esses eventos - provocam a cristalização de disposições de atitudes já existentes que tendem a durar além desse momento específico da história. Tomando como exemplo os tumultos de Stonewall em 1969, que muitos consideram o momento em que o movimento LGBT (lésbicas, gays, bissexuais, transexuais / transgêneros) nasceu (CARTER, 2004). Embora um evento como esse possa ser transformado em um marco geracional na construção da identidade, não só representa um momento histórico de ruptura, mas também um processo dinâmico baseado no que Braudel (1958) chama de "longa duração". Como muitos outros eventos, os tumultos de Stonewall desencadearam uma nova dinâmica sociocultural, embora tenha sido apenas depois que essa ruptura inicial se refletiu em várias unidades ideológicas opostas e foi, portanto, impresso na memória coletiva (ALEXANDER, 2004).

O exemplo acima sobre o movimento LGBT pode servir como um exemplo para um novo desafio que precisa ser superado na abordagem geracional: muitos dos grupos que poderiam se qualificar como unidade geracional são, na verdade, intergeracionais (ABOIM; VASCONCELLOS, 2014). Se Mannheim (1952) construiu sua teoria da estratificação da experiência, apontando a importância da agência da juventude, hoje, segundo Aboim e Vasconcelos (2014), pode haver uma "contemporaneidade do não-contemporâneo", na medida em que indivíduos de idades muito diferentes podem se envolver na mesmo luta política e ideológica e, assim, compartilhar uma visão de mundo bastante similar. Para Mannheim (1952), a estratificação da experiência das gerações mais antigas não pode ser a mesma que das gerações mais novas, embora compartilhem o mesmo ambiente histórico. É, portanto, o compartilhamento dos mesmos anos formativos em um determinado ambiente histórico que forma uma consciência geracional. A transmissão do patrimônio cultural é sempre uma reflexão e processo interativo, mas o sentimento de identidade de causas e destinos só pode surgir entre aqueles que viveram as mesmas experiências formativas.

Ainda refletindo a questão dos agentes e sua atuação, uma perspectiva fundamental vem através da teoria do curso da vida, em que o tempo é considerado a partir de três ângulos analíticos: primeiro, o tempo histórico das gerações como um local estrutural; em segundo lugar, a singularidade biográfica da trajetória de cada indivíduo; em

terceiro lugar, as ligações entre vidas, com um exame das formas em que diferentes biografias individuais estão interligadas e influenciam-se mutuamente (HEINZ; KRUGER, 2001, apud ABOIM; VASCONCELOS, 2014; ELDER et al., 2003; apud ABOIM; VASCONCELOS, 2014). Esta abordagem nos permite recorrer à vida real dos indivíduos e, dessa forma, entender como diferentes padrões de atuação e significado podem surgir em uma geração específica, sem necessariamente ser correspondente ou liderado por diversas unidades de geração que operam nos diversos campos institucionais.

iii. Sobre os agentes

Algumas das visões acima levam o tema de agentes atuantes para além da categoria dos jovens. Para Mannheim (1952), esse grupo foi praticamente o único detentor de mudanças em função da importância concedida à estratificação de experiência, em que os anos formativos representaram o auge de socialização. Como resultado, apenas os jovens podem realmente incorporar a essência de uma mudança social potencial.

Não há como discordar que a juventude e a entrada na idade adulta são momentos de transição em que se formam modelos centrais de atuação, e por isso representam um conjunto privilegiado para observar a interação de diferentes tempos analíticos (históricos, relacionais, Individual). Muitos argumentaram a partir de Mannheim (1943), que a passagem da adolescência para a idade adulta, ainda que seja cada vez mais mediado pelo estágio de vida prolongado da juventude, seja um fator relevante para a definição de identidade mais estável. Isso não significa que a transição para a idade adulta esgota o potencial de alteração na estrutura individual. No entanto, ao acentuar o papel da ruptura histórica na formação de gerações, Mannheim, em última análise, dá uma importância excessiva às respostas dos jovens, como se a juventude, ou mesmo uma pequena parte dela, tenha sido a única fonte de atuação possível.

A ênfase na juventude ainda está bem refletida nos debates contemporâneos, mas o problema da juventude certamente não é novo. Em 1943, Mannheim escreveu sobre o problema da juventude em sociedades modernas, expressando sua preocupação com o papel dos jovens como motor de mudança.

em contraste com as sociedades estáticas ou com mudanças lentas, as sociedades dinâmicas que desejam fazer um novo começo, independentemente das possibilidades de sua dimensão social ou filosofia, dependerão principalmente da cooperação da juventude (MANNHEIM, 1943, p.36).

Tema levantado também por Parsons (1999) ou Eisenstadt (1956), enfocando a análise em mudança ou integração, a juventude tornou-se progressivamente, até o presente, o mais prolífico campo para análise geracional.

A ênfase pioneira de Mannheim (1952) levanta alguns problemas críticos, embora ele estivesse bem consciente da crescente complexidade dos processos sociais (MANNHEIM, 2001, p. 4). De acordo com Aboim e Vasconcelos (2014), antes de mais nada, a visão de Mannheim (2001) de socialização era muito simplista, especialmente quando comparada com abordagens mais recentes, como a de Lahire (2011) ao discutir Bourdieu (1990), que argumenta a favor da pluralidade e do impacto contínuo das experiências de vida na reformulação do indivíduo. Em qualquer momento, novas disposições podem surgir do ciclo de novas experiências, de fato, levar os indivíduos a fazer mudanças em suas vidas e identidades. De outro ponto de vista, a ênfase na importância dos eventos e das sequências de eventos ao longo do tempo sublinhou o papel vital de análise biográfica (ABBOTT, 2001, apud ABOIM; VASCONCELOS, 2014), se realmente quisermos um exame minucioso da dimensão do tempo inerente aos processos sociais. Restringindo o foco analítico ao início da vida à socialização, embora obviamente mais relevante em termos relativos, também pode ofuscar o peso mais tardio de experiências na formação das visões de mundo e da agência potencial que eles podem desencadear.

Além disso, ainda que haja um papel crescente na flexibilização dos papeis relacionados a idade e pluralização de comportamento, a padronização analítica continua sendo um problema, o que levou Bourdieu (1990) a afirmar que "a juventude é apenas uma palavra", isto é, uma categoria construída e institucionalizada que muitas vezes esconde a diversidade existente dentro dela. Se a noção de juventude, juntamente com todas as categorias, mudou ao longo do tempo, nas sociedades ocidentais de hoje, esta é uma questão ainda mais desafiadora, já que existe erosão visível das fronteiras anteriormente mais lineares entre os diferentes estágios da vida ciclo, como já foi apontado tão bem pelos teóricos do curso de vida.

(...) um dos processos centrais das sociedades contemporâneas tem sido o crescimento flexibilização de biografias e identidades individuais, um tópico que empurrou a discussão no tempo, gerações e mudanças sociais na linha de frente dos desenvolvimentos teóricos. A transição de uma fase de "modernidade organizada", como Peter Wagner (1994 [apud ABOIM; VASCONCELOS, 2014]) o chama, para um novo período marcado pela destradicionalização (HEELAS, 1996 [apud ABOIM; VASCONCELOS, 2014]) dos velhos ciclos de vida lineares tem sem dúvida, alimentou o debate em torno da pluralização dos cursos de vida atual (GIDDENS, 1991, BECK; BECK-GERNSHEIM, 2002, BAUMAN, 2001 [apud ABOIM; VASCONCELOS, 2014]). O forte regime de vida institucionalizados prevalecentes sob modernidade industrializada (HAREVEN, 1982 [apud ABOIM; VASCONCELOS, 2014]), que estavam intimamente ligados a identidades quase predeterminadas, deram lugar à crescente individualização dos caminhos da vida (ABOIM; VASCONCELOS, 2014).

Mesmo que a juventude continue tendo seus papeis sugestivos de estágio como grupo etário especifico, um número crescente de autores chama nossa atenção para a fluidez que as identidades geracionais passam a ter. Se no passado, as identidades geracionais poderiam ser retratadas em perspectiva mais homogênea ou fragmentada por fatores objetivos de diferenciação - como classe socioeconômica, gênero ou etnia - as gerações mais recentes tendem a ser percebidas como reflexo de uma multiplicidade de referências muito mais diversas do que as linhas divisórias anteriores.

Portanto,

(...) a idéia de que, na modernidade, uma transição identidades mais simples a mais complexas está ocorrendo (como resultado da diferenciação social e processos de individualização), como podemos explicar a crescente diversidade de modelos, normas e cursos de vida, não só entre os mais jovens, mas também dentro de outros grupos etários não deve ser negligenciado e, ao mesmo tempo, provar a importância de estudar os jovens como portadores de culturas específicas em contraste com as gerações anteriores? (ABOIM; VASCONCELOS, 2014).

Isto posto, fica claro o desafio de se abordar um ponto posterior, a possibilidade de falar das gerações em geral, e dos jovens em particular, como grupo marcado por pontos culturais comuns. Se em Mannheim (1952) a resposta vem através do surgimento da consciência comum, qualquer proposta de abordagem deve levar em consideração o que Aboim e Vasconcelos (2014) chamam de “visões de mundo e agências em jogo”, uma perspectiva mais ampla e diversa para identificação

adequada das marcações e diversas perspectivas. Ainda assim, torna-se essencial entender a formação da consciência entre as unidades geracionais analisadas.

iv. Sobre a consciência

A consideração de uma geração, como localização no tempo histórico, ou comunidades ligadas à história, na conceituação de Mannheim (1952), apresenta-se, segundo Aboim e Vasconcelos (2014), analogamente ao materialismo histórico de Marx. Embora o primeiro tenha sido tenha sido bastante crítico com o legado marxista e anexado maior valor para a cultura e sua pluralidade de ideologias (KETTLER et al., 2008), “gerações, como sociais classes, podem formar unidades organizadas através da partilha não apenas de experiências comuns, mas também, o mais importante, uma reflexividade comum”. nesse contexto, a unidade geracional aparece como a última fase de um processo em que sujeitos e histórias coletivas interagem em um contexto histórico comum (MANNHEIM, 1952, p. 291). Diferentemente de Marx, para Mannheim, uma geração pode então ser constituída por distintas "unidades de geração", de acordo com sua experiência particular de tempo histórico e, acima de

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