• Nenhum resultado encontrado

Utilização atual da abordagem geracional e suas limitações

No documento Importância e urgência de uma revisão na (páginas 37-47)

Apesar do estimulante embasamento conceitual da relevância da abordagem geracional ter sido quase completamente desenvolvido por pesquisadores europeus, foi nos Estados Unidos que seu potencial de utilização atual é mais desenvolvido – e ela ganha condição de conhecimento pop. Devido a seu enorme potencial midiático, referências às gerações começam a aparecer sem embasamento na pesquisa científica, e rapidamente são adotadas por empresas e grupos sociais, conforme exemplificado nas matérias de imprensa destacadas abaixo. Tanto Strauss e Howe (1991), quanto Tapscott (1998) – e praticamente todos os demais que atualmente abordam os temas -, são principalmente consultores corporativos e palestrantes, mais do que pesquisadores.

Como foram grandes rupturas em pouco tempo resultantes principalmente da popularização da tecnologia, naturalmente as instituições da sociedade enfrentaram dúvidas de como adaptar-se aos novos tempos após os primeiros conflitos e percepção de que poderia haver sinais de incompatibilidade entre as organizações e dinâmicas e uma nova geração com paradigmas diferentes (PRENSKY, 2001)

O mundo corporativo também foi um rápido receptor da terminologia, e passou a utilizá-la com objetivos mercadológicos de maneira explícita. Para se identificarem com um numeroso e cada vez mais influenciador mercado consumidor - e atraírem jovens mais talentosos pouco inclinados a propostas e projetos tradicionais, as empresas e agências iniciaram uma rápida imersão no tema da compreensão das gerações mais jovens, através de pesquisas e observações (CALLIARI; MOTTA, 2012).

Uma busca na maior livraria online do mundo registrou, apenas em inglês, mais de 74.000 obras com a palavra Generation no título (AMAZON.COM, 2017). Para esta vasta literatura disponível, a importância do tema se manifesta em uma infinidade de áreas da vida humana: através da tentativa de caracterização das gerações e suas dinâmicas, as publicações aplicam o conceito para o marketing, recursos humanos, política, educação, família, religião, sexualidade, tecnologia, entretenimento, entre outros. Aqui já temos a primeira limitação da utilização da abordagem geracional, já que a ausência de tratamento técnico a esse conhecimento faz com que ele seja pulverizado, desestruturado, menos robusto e menos resistente a críticas. Na Figura

1, alguns exemplos de tratamentos midiáticos, no Brasil, sobre o tema, com conteúdo muitas vezes superficiais sujeitos a generalizações e platitudes, ao mesmo tempo que materializa o interesse popular no tema.

Figura 1: Exemplos do uso midiático da abordagem geracional

Fonte: Colagem de diversos exemplos de matérias sobre a Geração Y, em publicações brasileiras, Desenvolvido pelo autor, 2017.

Nos EUA, a abordagem geracional utiliza sempre classificação das diferentes gerações, através das datas de nascimento para situar determinada geração no momento. Para Strauss e Howe (1991), “definimos barreiras geracionais pelo calendário anual – e, claro que algumas pessoas nascidas de um lado podem talvez pertencer ao outro”. É natural que, nesse contexto, haja discordâncias ou divergências entre a adoção das datas que demarcariam as gerações. Isso se dá não apenas pela falta de uniformidade de metodologia, mas também porque podem-se adotar critérios diferentes para caracterização, de acordo com o objetivo da pesquisa. Não é raro, portanto, encontrar-se uma “margem” de diferença entre os limites definidores geracionais (STRAUSS e HOWE, 1991) Como resumiu Bauman (2007) em conferência em Barcelona sobre a dificuldade (e necessidade) de limites geracionais artificialmente impostos, “as fronteiras que separam as gerações não são claramente definidas, não podem deixar de ser ambíguas e atravessadas e, definitivamente não podem ser ignoradas”.

Para essas definições dos limites, cabe ao pesquisador buscar entender o que acontece no ambiente em torno de uma geração através da percepção das influências

relevantes para o objetivo a ser analisado: fatos, marcos, acontecimentos históricos e sociais, com potencial de alterar valores, crenças e comportamentos de quem ao contexto foi submetido em seu desenvolvimento (MANNHEIM, 1952)

Uma tentativa de se observar eventos que justificariam esses limites foi feita pelos brasileiros Ikeda et al. (2008) no quadro da Figura 2:

Figura 2: Exemplos de momentos de Definições Globais (em ordem cronológica)

Acontecimentos Data

I Guerra Mundial 1914 – 1918

Grande Depressão Anos de 1920 e 1930

II Guerra Mundial 1941 – 1945

Guerra Fria e o Tratado de Guerra Nuclear 1946 – 1953 Advento da Televisão Anos de 1940 e 1950

Crise Energética Anos 70

Queda do Muro de Berlim 1989

Desenvolvimento da Internet Anos 90 Dissolução da União Soviética 1991

Guerra do Golfo 1991

Fonte: Ikeda et al, 2008.

A partir desse levantamento de eventos considerados relevantes por quaisquer pesquisadores que se aventurem pelo tema, eles desenvolvem sua própria conceitualização das gerações, definem seus limites e buscam sua respectiva

caracterização e até mesmo propondo, muitas vezes, uma nomenclatura autoral própria (IKEDA et al., 2008).

Em um sumário da pesquisa de Strauss e Howe (1991), Ikeda et al (2008) descrevem a classificação geracional, em sua mais conhecida nomenclatura e caracterização:

Strauss e Howe (1991 [apud IKEDA et al., 2008]) identificaram cinco gerações de americanos nascidos no século XX. Essa classificação serviu de base e inspiração para vários trabalhos mais recentes, os quais não diferem de forma substancial da proposta original (IKEDA et al., 2008)

Figura 3: Gerações conforme Strauss e Howe

Gerações Ano de Nascimeto

Geração G.I 101-1924

Geração Silenciosa 1925-1945

Geração Baby Boomers 1946-1964

13ª Geração (ou X) 1965-1981

Millenials (ou Y) 1982 em diante

Fonte: Strauss; Howe, 1991, apud Ikeda et al., 2008.

Geração GI: segundo os autores, geração GI indica “general issue” ou “government issue”, isto é, roupas que se tornaram sinônimo dos soldados da I e II Guerra Mundial. Também se refere a uma atitude de comunidade e regularidade. Eles apreciam a padronização e homogeneidade. Foram os primeiros cunhados como “adolescentes”, os primeiros escoteiros (1910) e as primeiras bandeirantes (1912) e

beneficiários de playgrounds, de alimentos processados

“assegurados”, de vitaminas e de restrições de trabalho com menores de idade.

Geração Silenciosa: período que coincidiu com a taxa de nascimento mais baixa. Ganhou o rótulo de “silenciosa” nos idos dos anos de 1950, na era McCarthy. Uma geração crescida com pais super-protetores, durante a crise da II Guerra e Grande Depressão. Seus representantes tendem a ser retraídos, cautelosos, pouco criativos e não gostam de aventura. Por causa de bancos e empresas falidas, aprenderam a não acreditar em terceiros em prol de sua segurança. Auto-confiantes, cresceram acreditando que é bom e normal trabalhar duro. Tem sido

descrita como “geração da transição” ou “geração intermediária”. A primeira metade, nascida durante a Depressão, dedicam-se à caridade, tem uma sensível consciência social e acreditam mais em processos justos do que em resultados finais. A outra metade foi marcada pela II Guerra, na infância, muitos se juntaram ao Corpo de Paz para mostrar sua ligação com a geração. Muitos dos pesquisadores de demografia agruparam a Geração GI e Silenciosa, referindo-se a eles como Construtores (Builders).

Baby Boomers: talvez seja a geração mais conhecida e analisada na história. O termo foi cunhado por Landon Jones em seu livro “Great Expectations”, de 1980. Apesar da maioria dos demógrafos definirem os Boomers como os nascidos entre 1943 e 1960, Strauss e Howe descrevem essa geração como os nascidos entre 1944 e 1964. Nascidos numa era de otimismo e crescimento, foram caracterizados pela atitude “busca pelo eu” (ou quest for self). Essa fixação pela própria pessoa resultou numa forte consciência individual em vez de

dever à comunidade. Exibem atitudes de auto-interesse,

perfeccionismo e alto grau de auto-estima.

13ª Geração: também conhecida como Baby Busters e Geração X. Há controvérsia entre demógrafos e mídia em torno de seu início. Muitos colocam a data em 1957, outros em 1967, outros, a data de 1960. Esta última é significativa porque “pesquisas anuais nas escolas de segundo grau mostram que aqueles que nasceram depois de 1960 se tornaram muito mais temerosos de catástrofe nacionais do que aqueles nascidos um pouco antes” (STRAUSS; HOWE, 1993, p. 50[apud IKEDA et al., 2008]). Foi, também, em 1960 que a pílula anticoncepcional foi lançada e, assim, o crescimento populacional foi contido. Essa geração é caracterizada pela rebeldia contra o sistema, pelo divórcio, pobreza, síndrome de chave de trinco e por famílias não tradicionais. Mostra-se cética a respeito do futuro econômico e percebe que seus membros terão que trabalhar mais duro para alcançar os mesmos níveis de vida de seus pais. Não acredita no governo, mas que é responsável pelo seu próprio futuro.

Geração do Milênio: ganhou esse nome porque eles se graduaram no novo milênio. Também têm sido chamados de Geração de Ligação (Bridger Generation) (RAINER, 1998 [apud IKEDA et al., 2008]), Geração Net (TAPSCOTT, 1998 [apud IKEDA et al., 2008]), Geração Y (CODRINGTON, 1998 [apud IKEDA et al., 2008]), Geração Nintendo (CODRINGTON, 1999 [apud IKEDA et al., 2008]) e muitos outros nomes. O conceito de coortes nos Estados Unidos é, relativamente, bem disseminado, sendo amplamente discutido há muitas décadas, inclusive com a publicação de livros e artigos em revistas acadêmicas; não-acadêmicas e jornais (IKEDA et al., 2008).

A título de exemplo, Calliari e Motta (2012) levantaram alguns nomes utilizados para o que hoje mais popularmente se chama Geração Y por diversas fontes, sendo alguns deles: Millenials, Geração Now, Digital, Geração Me, Echo Boomers, Geração Peter Pan, Geração Boomerang, Geração Canguru, Trophy Generation, BuY Gen, Geração NET, Re-silent Generation e até mesmo um escalafobético Geração T.E.E.N. —

Transei E Esqueci o Nome —, entre muitos, muitos outros, que já foram propostos por essa curiosa fauna que são os autores que tentam emplacar um jargão.

Naturalmente, alguns nomes se tornaram mais populares, gerando massa crítica para sua adoção, o que, eventualmente, o tornam a definição mais ‘oficial` para determinada época. Utilizando-se desses nomes mais aceitos, é possível considerar as gerações em uma linha do tempo, considerando a flexibilidade e arbitrariedade inerente ao tema dos limites geracionais (CALLIARI; MOTTA, 2012)

Mesmo fontes razoavelmente populares, como o Wikipedia, por exemplo, consideram as peculiaridades que essa indefinição pode proporcionar. Na Figura 3, uma impressão do verbete Gerações do Wikipedia, onde as diferenças utilizadas por alguns autores nos seus limites propostos ficam explícitas:

Figura 3: Gráfico descritivo no verbete “Geração, com datas diversas de início e término de diversas gerações.

Fonte: Wikipedia, 2016.

Aparece aqui então uma nova limitação à utilização do conceito, claramente visível nas gerações de Strauss e Howe (1991) reproduzidas acima: apesar de se propor a compreensão e análise de um contexto sócio-histórico geracional, a abordagem não se propõe a apresentar uma abertura zodiacal cabalística que defina diferenças radicais entre os membros das diversas gerações ou semelhanças siamesas entre as pessoas de um mesmo período de nascimento. As generalizações, portanto, e falta de clareza e entendimento do significado das possibilidades desses estudos representam, uma vez mais, um obstáculo a sua plena aceitação e utilização (CALLIARI; MOTTA, 2012).

Fica claro pelas considerações até aqui realizadas que, mais uma vez, a nomenclatura e grandes marcos divisórios mais aceitos na abordagem geracional são baseadas primordialmente em contextos (e pesquisadores) estrangeiros, em especial, norte-americanos. Segundo Rumblesperger (2011 apud IKEDA et al., 2008), o mercado brasileiro segue as considerações internacionais, usando as mesmas referências para as gerações e para seus indivíduos. De fato, em análises de bancos de trabalhos científicos, nota-se a ausência de trabalhos que analisem a pertinência da abordagem geracional ’importada’. Domingues (2002, apud IKEDA et al., 2008), lembra que não é possível compreender uma geração, como ela se vê e como vê o mundo, sem que se olhe para o contexto social do país e dos indivíduos.

Temos então uma nova e fundamental limitação a abordagem geracional no país: os conceitos criados e desenvolvidos nos Estados Unidos ou Europa Ocidental não se aplicam totalmente em outras realidades e contextos. Como ressaltado por Mentré, em Marías (1949), o fenômeno de gerações deve passar pela concepção nacional, por unidade consistente em que o indivíduo existe. É importante notar que a imprecisão dos limites geracionais e a crescente globalização na cultura, no comportamento e no consumo faz com que os modelos continuem tendo significativa utilidade em outros contextos, por exemplo, aplicando os quadros característicos no Brasil. Entretanto, é inevitável que haja perda de relevância, efetividade, energia e aplicabilidade quando isso acontece (MARÍAS, 1949)

São muitas as razões pelas quais a adaptação dos conceitos não é livremente aplicável. Relacionando as palavras de Ikeda et al. (2008), que advogam pela relevância do termo coortes como mais apropriado que o genérico geração. Maurer (2013) aponta que,

(...) segundo Oliveira, Piccinini e Bitencourt (2011[apud MAURER, 2013]), dois aspectos importantes requerem uma análise que respeite

as particularidades do Brasil quanto às teorias norte-americanas: a

educação, principalmente o ensino superior, que é um privilégio para poucos, e a inclusão digital, que é um desafio em termos de infraestrutura, acessibilidade e usabilidade. Portanto, não se aceita fielmente as descrições e caracterizações baseadas em pesquisas estrangeiras, mas também não é possível negá-las piamente, pois segundo Veloso (2012 [apud MAURER, 2013]), existem sim, no Brasil, peculiaridades entre os jovens de hoje que são diferentes dos jovens de outros períodos, sendo que tais peculiaridades permitem que se faça uma análise que vise separar ou distinguir comportamentos e atitudes na sociedade. Assim, os marcos históricos e sociais do Brasil

e da formação de cada uma das gerações são diferentes dos marcos históricos e sociais da Europa ou dos Estados Unidos da América, como mostra o quadro abaixo (MAURER, 2013)

Figura 4: Coortes Brasileiras.

Coorte Anos Marcos Históricos / Sociais

1a 1930 - 1945 Era Vargas

2a 1945 - 1954 Pós-Guerra

3a 1955 - 1967 Otimismo / Industrialização

4a 1968 - 1979 Anos de Ferro – Regime Militar

5a 1980 - 1991 Década Perdida / AIDS, Violência, Cultura de massa...

6a Pós 1992 O Ser por Si Só - Plano Real / Consumismo / Incertezas / Mundo globalizado / Tecnologia (iniciante)

Fonte: adaptado de Ikeda et al., 2008 apud Maurer, 2013.

Nesse válido exercício, mesmo quando as realidades das grandes potências ocidentais se aplicam, podem não ser necessariamente as mais relevantes como formadoras de tendências para um país como o Brasil. Muitas vezes, identifica-se a própria inversão de grandes tendências comportamentais – a título de exemplo, a crise energética global foi contemporânea de um período de desenvolvimento local, ou o movimento das liberdades civis nos EUA coincidiu com o golpe militar (MAURER, 2013).

Além disso, sob a ótica dos autores citados, praticamente todos os limites geracionais e caracterizações são dadas por grandes acontecimentos histórico-políticos, e econômicos (MAURER, 2013, IKEDA et al., 2008). Mesmo nas raras tentativas de tropicalização da metodologia, não há novas métricas, variáveis ou abordagens que alterem significativamente as mesmas configurações definidas nos estudos já existentes. Isso não configuraria um problema, caso não houvesse indicações de que novas condições sociais, culturais, familiares e individuais, entre outras, tenham se

imposto como importantes fatores potenciais de alteração de comportamento. Mas é nossa intensa crença que, em função de de diversas alterações no contexto de vida, novas e fundamentais rupturas vêm sendo constantemente introduzidas, e ineficientemente cobertas pelas pesquisas e estudos realizados até agora (ABOIM; VASCONCELOS, 2014)

Como exemplo de maior amplitude e consequências, o item que proporciona possivelmente, maior ruptura é a tecnologia e seus inúmeros e fascinantes desenrolares. Como descrevem os educadores radicados no Rio de Janeiro, Moreira e Kramer (2007),

diversas teorias sobre o mundo contemporâneo assumem posições mais ou menos radicais referentes à tecnologia”, “Os pós-modernos enfatizam a fragmentação, o pluralismo, a multiplicidade e a ausência de força centralizadora ou totalizadora (MOREIRA; KRAMER, 2007). O nível de análise potencial transcende a mera adoção ou existência da tecnologia, e precisa ser abordado através de suas consequências e manifestações. E continuam:

Democracia, por exemplo, em vez de se basear em uma idéia essencialista de um agente racional, unitário e universal, passa a incorporar perspectivas plurais e identidades individuais diferenciadas, o que a torna um conceito atraente para políticas da diferença e da identidade (MOREIRA; KRAMER, 2007).

O que vem sendo considerado como grande marco geracional – a tecnologia, neste exemplo -, clama por maior profundidade na análise de suas consequências, que, aí sim, afetarão o comportamento dos sujeitos e sociedades (MOREIRA; KRAMER, 2007).

Numa linha otimista, Lévy (1993, 1999 [apud MOREIRA; KRAMER, 2007]) entende a informática como tecnologia intelectual que engendra novo modo de pensar o mundo, de entender a aprendizagem e as relações com esse mundo). Bauman (1999b, 2001 [apud MOREIRA; KRAMER, 2007]) é um dos autores para os quais a pós-modernidade tem potencial libertador e promove a desconstrução da modernidade. Em sua análise crítica, a pós-modernidade significa uma situação em que se pode examinar a modernidade com espelho retrovisor e refletir sobre ela. Para além do pessimismo ou do otimismo, o que parece mais perigoso é a renúncia ao reconhecimento de que há mudanças e novos aparatos tecnológicos que formam e informam uma geração. A exclusão educacional se articula com mecanismos de discriminação social, racial, sexual e regional, o que constitui ponto de partida para um debate consequente sobre a tecnologia (RAMAL, 2002 [apud MOREIRA; KRAMER, 2007]). Ou seja, ao lado da incorporação da tecnologia, cabe questionar o modelo de sociedade que se quer construir (MOREIRA; KRAMER, 2007)

Essa é apenas uma observação, dentre as mais visíveis e de maior potencial de alteração, que deve ser considerada para uma abordagem geracional mais eficiente, mas certamente não é a única nova variável potencialmente rica que não vem sendo considerada nas abordagens correntes. Existem outras de diversas ordens, como consumo, acesso a educação, exposição internacional, relacionamento com a mídia, composições familiares, índices de violência, consumo cultural, entre diversas outras alternativas que possivelmente ainda nem temos condições de identificar - mas que podem apresentar impacto significativo na formação dos sujeitos, suas atuações e interesses sociais e profissionais e, portanto, alterar a dinâmica social – e que atualmente são subestimadas como marcadores analíticos para as abordagens geracionais (ABOIM; VASCONCELOS, 2014)

Com isso, chegamos na limitação final para a utilização da abordagem geracional pretendida por esse capítulo: dadas as condições e contextos impostos pela contemporaneidade, os marcos históricos tradicionais, mais populares na definição dos limites e perfis geracionais aplicados pelos estudos até hoje, não mais são suficientes, nem para uma coisa, nem para outra. Variáveis que antes poderiam parecer mundanas e/ou superficiais, adquirem profundidade na influência do comportamento dos sujeitos e dos grupos sociais protagonistas. Ignorá-las acrescenta um importante e fundamental ponto para reduzir ainda mais a relevância e utilização desse tipo de análise (BURKE, 1997).

Assim, o tratamento atual sobre abordagem geracional, materializado pelos populares trabalhos de Strauss e Howe (1991) podem tornar-se contra-produtivos para a profundidade na utilização das teorias geracionais. Como dizem Aboim e Vasconcelos (2014),

(...) nós apresentamos objeção sobre a métrica demográfica das coortes sem identidade cultural significativa. As teorias de Howe and Strauss (1991[apud ABOIM; VASCONCELOS, 2014]) sobre a natureza cíclica de gerações arquetípicas que podem ser identificadas pela história podem ser mencionadas como exemplo de uso reducionista do conceito de gerações. As teorias de Mannheim, citado inclusive na obra, são destorcidas a limites inaceitáveis ao aleatoriamente consolidar coortes demográficas (no caso, pessoas nascidas em faixas de aproximadamente 20 anos) com pretenso significado histórico e cultural. O resultado do exercício dos autores é a produção de uma pletora de rótulos geração X, millenial, e assim por diante) sem significado específico ou, com frequência, precidas localizações temporais. Essa falta de precisão foi subitamente

transformada em discussões acaloradas de pesquisadores sobre as datas exatas de nascimento de determinadas gerações. Em resumo, se há precedência dada sobre o tempo externo, o conceito de geração se torna uma categoria vazia, ainda que aparentemente universal, pretensamente homogeneizadora ou mesmo objetivante, efeito que os grandes autores como Mannheim sempre rejeitaram (ABOIM; VASCONCELOS, 2014).

No documento Importância e urgência de uma revisão na (páginas 37-47)