• Nenhum resultado encontrado

D. Paz – Ai ! nem me fales em conferência de Yalta que daí para cá é que os meus sofrimentos se agravaram.

2.7. Isto é teatro…e do bom! 134 : O regresso ao Teatro do Povo (1952-1955)

2.7.6. Novos públicos, novos percursos

Nesta nova etapa do Teatro do Povo, o SNI congratulava-se com o facto de os espectáculos do Teatro do Povo interessarem a um público socialmente diversificado, embora se mantivesse uma preocupação especial com as classes mais desfavorecidas, tal como já notou Graça dos Santos (SANTOS 2004: 197-198) . A este propósito vale a pena citar a seguinte frase emanada do Secretariado que pode ser encontrada em várias publicações periódicas da época:

Depois dos espectáculos em Coimbra, aos quais assistiram alguns milhares de pessoas de todas as categorias sociais.151

Os jornalistas que cobriam os espectáculos reflectiam também nos seus artigos essa ideia público plural, realçando amiúde a frequência de grupos de extracção social mais elevada:

Estiveram também presentes as entidades oficiais, civis, militares bem como as mais elevadas famílias de Aveiro e arredores.

«Teatro do Povo» in Jornal de Notícias (10/09/52)

Entre os convidados, como entre o público, encontravam-se alguns dos mais ilustres nomes das letras e das artes, advogados, médicos, professores, além do elemento oficial e de muitas senhoras.

«Teatro do Povo» in Jornal de Notícias (11/09/52)

A verdade é que as alterações efectuadas haviam tornado os espectáculos do Teatro do Povo apetecíveis a toda a população, incluindo um sector mais intelectualizado. Mas a assistência das classes populares, olhadas ainda de forma paternalista por certa imprensa, continuava a ser maioritária e enaltecida:

Bem faz o Governo da Nação em levar, pela forma que o faz, até junto das classes humildes estas noites de arte.

«Teatro do Povo em Leiria» in O mensageiro (06/09/52)

Graça dos Santos chama também a atenção para a referência a «massas trabalhadoras» no programa do Teatro do Povo de 53 (SANTOS 2004 : 198). Deve recordar-se que esta iniciativa do SNI já na sua fase inicial se tinha dirigido a este público com intuitos políticos tal como ficou demonstrado. Mas é verdade também que, no período que agora interessa, as caravanas do Teatro do Povo rumaram a zonas de concentração operária na área de Lisboa (Ajuda, Benfica e Olivais) e no Entroncamento. A partir de 53 foram mesmo apresentados espectáculos dedicados

exclusivamente a trabalhadores de uma única instituição (a Carris em Santo Amaro – Lisboa). Deve sublinhar-se ainda que nesse ano foram propostas actuações na Sacor, no Arsenal do Alfeite e na CUF152 tendo sido levados à cena também espectáculos para os militares da GNR no quartel da Ajuda. Esta intenção de direccionar alguns espectáculos a «massas de trabalhadores» era claramente apresentada em ofícios emanados do SNI153, mas mais aliviados da carga política que os caracterizava nos primeiros tempos.

A ideia inicial de que o Teatro do Povo deveria chegar a pequenos aglomerados populacionais distantes havia sido então definitivamente abandonada. Antes se passaram a privilegia-se as apresentações sobretudo em sedes de Concelho154. A verdade é que, embora não fosse totalmente posta de parte a dimensão propagandística do projecto155, a definição das digressões parecia ter ficado mais aliviada da intencionalidade política de que se revestia nos primeiros anos.

2.7.7. O fim

Com a instituição definitiva do Fundo de Teatro, o SNI extinguiu o Teatro do Povo com o argumento de que o subsídio ao teatro itinerante e experimental e o apoio material e artístico ao teatro amador supririam as necessidades que o Teatro do Povo até então tinha tentado satisfazer156.

Em 55 as notícias veiculadas pelo SNI e os programas dos espectáculos apresentavam já o projecto em jeito de balanço :

152 Os espectáculos na Sacor não foram realizados por estarem a decorrer obras importantes na refinaria

Quanto ao Arsenal do Alfeite o espectáculo não se realizou por as residências do pessoal estarem numa localização que não permitia a «concentração depois das horas de serviço» (Carta do Presidente do Conselho de Administração do Arsenal do Alfeite ao chefe da 3ª repartição do Secretariado Nacional de Informação, datada de 1 de Setembro de 53 – PT/IAN/TT SNI CX 5192). Por seu lado, os espectáculos na CUF – Barreiro, não se realizaram também por questões logísticas, nomeadamente por, à data proposta para o espectáculo, estar a decorrer o campeonato de Futebol da 2ª divisão que ocupava o estádio da CUF, único espaço viável para o evento (carta do administrador gerente da CUF, dirigida ao Gabinete do Secretário Nacional datada de 4 de Setembro de 1953 – PT/IAN/TT SNI CX 5192) .

153 Por exemplo em carta do chefe da 3ª secção e dirigida ao Director Geral da Sacor datada de 8 de

Setembro de 53 informa-se o seguinte:

No plano de acção do Teatro do Povo deste Secretariado na presente temporada, está compreendida a realização de espectáculos do mesmo, destinados a grandes massas de trabalhadores pertencentes a organizações industriais e similares, com fins educativos, culturais e recreativos, a realizar em Lisboa ou cercanias […] (PT/IAN/TT SNI CX 547).

154 Ver quadros em anexo.

155 A continuidade de um desígnio programático para o Teatro do Povo, embora suavizado, pode ser

ilustrada pelo seguinte excerto de um ofício emanado do SNI dirigido a uma Câmara Municipal :

O Secretariado, que julga em nada ter faltado para dar aos referidos espectáculos um elevado nível artístico e cultural, espera que eles venham a ser belas jornadas de propaganda desta iniciativa do Governo (Ofício do Chefe da 3ª Repartição do SNI dirigido ao Presidente da Câmara de Tomar, datado de 17 de Setembro de 1955, esclarecendo alguns aspectos da actuação do Teatro do Povo em 27 e 28 do mesmo mês. (PT/MNT/TP 1955).

156 DL 40.229 publicado no Diário do Governo 6/7/55 1ª série e também Informação interna de José

Armando discretamente o seu palco de terra em terra, durante os meses de Verão, o Teatro do Povo do Secretariado pode apresentar, ao cabo de vinte anos de existência, um balanço bem significativo:

Montou 64 peças diferentes, das quais 57 são de autores portugueses, sendo apenas 7 traduzidas de outra língua, todas elas de autores consagrados : Shakespeare, Molière, Marivaux, Tchekov, Courteline, Maeterlinck…

Passaram pelo seu elenco 54 artistas teatrais, 23 actrizes e 31 actores, nomes consagrados ou jovens principiantes, muitos dos quais tiveram no Teatro do Povo a sua verdadeira escola.

Visitou desde 1936 a 1954, 220 terras diferentes, dando 1.134 espectáculos, quase sempre compostos por mais de uma peça. E esses espectáculos foram vistos, segundo o computo feito em cada um, por um total de 3 milhões de espectadores.

«Nova temporada do Teatro do Povo» in Novidades (14/08/55) [Este apontamento pode ser encontrado em diversos jornais]

O fim do Teatro do Povo foi lamentado em diversos periódicos157. Todavia, tal como será apontado adiante, do ponto de vista do público, a actividade do agrupamento do SNI, continuou nos três anos seguintes, praticamente inalterável através do Teatro Nacional Popular, dirigido por Francisco Ribeiro e subsidiado pelo Fundo de Teatro.