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No decorrer de praticamente meio século, a Teoria do Apego tornou-se um importante modelo psicológico que, na atualidade, possibilita elucidar tanto o desenvolvimento normal quanto condições psicopatológicas. Nesse contexto de transformações paulatinas, a dimensão emocional presente nos vínculos de apego constitui, hoje, um componente fundamental de um quadro teórico bem mais extenso e diversificado. Isso, principalmente, em função dos esforços de Bowlby para incorporar os conhecimentos das Ciências Naturais a seu modelo, sem desconsiderar, contudo, conceitos psicanalíticos essenciais. Deste modo, o empreendimento teórico de Bowlby pôde promover uma integração interdisciplinar capaz de oferecer uma compreensão ampla e profunda da constituição da subjetividade humana (BUHL-NIELSEN, 2003).

Holmes (1993) explica, então, que, as décadas posteriores a de 60, no século XX, assistiram ao surgimento de novas gerações de pesquisadores que se dispuseram a trabalhar em prol da expansão conceitual e metodológica da Teoria do Apego. No entanto, ainda hoje, a pesquisa na área depara-se com importantes desafios que incluem: (a) ampliar as formulações teóricas de Bowlby para abordar tanto as mudanças desenvolvimentais, no contexto das relações de apego, posteriores à infância, quanto a influência convergente de múltiplos vínculos de apego e dos modelos funcionais internos; (b) validar, de forma sistemática, instrumentos para a avaliação do apego na idade adulta, incrementando, também, a compreensão teórica de como o apego muda com o passar do tempo; (c) criar novas abordagens metodológicas que possibilitem

o entendimento, a partir de dados empíricos, das regularidades e das transformações nos vínculos de apego na vida adulta, favorecendo, então, a predição de sequelas nesse processo e (d) elaborar conceitualizações mais complexas acerca das associações entre apego, risco contextual e comportamento na vida adulta (THOMPSON; RAIKES, 2003).

Para Schore (2002, 2005, 2010), o desenvolvimento de tecnologias não-invasivas para captação de imagens cerebrais favoreceu a conexão entre Psicologia e Ciências Biológicas, o que significa que, hoje, os desafios para a Teoria do Apego são mais de ordem conceitual do que técnica. A construção de novos modelos teóricos exigirá, pois, a colaboração recíproca entre Psicologia e Neurociência, visto que, apenas a partir de uma perspectiva interdisciplinar será possível interpretar os resultados de pesquisas.

Em virtude da dominância do hemisfério direito na infância, e de sua relação com o bem- estar psicológico, já que regula as emoções em todas as etapas do ciclo vital, Schore (2001, 2002, 2005, 2010) entende que o conhecimento aprofundado dessa porção do cérebro faz-se necessário para os avanços na compreensão de questões humanas fundamentais, que envolvem saúde mental e capacidade de amar. Além disso, o hemisfério direito é essencial para a competência comunicativa, pois modula a prosódia da fala e o comportamento gestual, decodifica significados conotativos de uma palavra, realiza inferências temáticas, processa metáforas, bem como relações lingüísticas complexas e expressões idiomáticas já consolidadas nas línguas.

Nesse sentido, Schore (1994, 2000, 2001, 2002, 2005) enfatiza, também, a necessidade de se desenvolver mais estudos que focalizem a dimensão não-verbal da comunicação, pelo fato de ela estar presente em todas as interações humanas, influenciando a constituição dos vínculos afetivos. Por esse motivo, ele critica veementemente a ênfase excessiva que, historicamente, a Psicologia sempre deu a questionários e a outros instrumentos que apenas avaliam o comportamento voluntário e a cognição verbal. Logo, esse autor entende que a Psicologia, como um todo, precisa repensar seu modo de fazer ciência e, por conseguinte, de gerar conhecimento.

Quanto à Teoria do Apego, embora, tradicionalmente, ela dê prioridade aos estudos do vínculo mãe-bebê, percebe-se, na atualidade, uma expansão nos temas de pesquisa, com a inclusão de discussões sobre o papel do pai (BRETERTHON, 2010; SCOLA, VAUCLAIR, 2010; NEWLAND, L. A., COYL, D. D., 2010), vínculos conjugais (COWAN, COWAN, 2009; JURIC, 2009), apego após a morte (ABEL, KRUGER, 2009; HAUSER, 2007), relação professor-aluno (REIO JR, MARCUS & SANDERS-REIO, 2009; ULUÇ, ÖKTEM, 2009), entre outros.

Um importante tema também vem sendo estudado por Sieratzki e Woll (2003, citado por SIERATZKI, WOLL, 2005, 2004). Trata-se da influência da deficiência sensorial nos vínculos

de apego. Em 2003, os autores divulgaram os resultados de uma pesquisa sobre a relação mãe- criança no contexto de deficiência visual materna, no Encontro Bienal da Sociedade de Pesquisa do Desenvolvimento Infantil, em Tampa, nos Estados Unidos. Até o presente momento, o estudo ainda não foi publicado em periódicos de circulação internacional. No entanto, é bem provável que, em um futuro breve, Sieratzki e Woll apresentem suas considerações acerca do assunto em publicações importantes no cenário acadêmico mundial.

Além da ampliação temática verificada nas pesquisas da área, Holmes (1993), Thompson e Raikes (2003) defendem, em acréscimo, que uma reflexão em profundidade sobre a Teoria do Apego, na atualidade, pode ser profícua, também, para o estudo da estrutura de base do corpo social, isto é, da família, o que não deixa de ser essencial em uma época marcada pela diversidade de agrupamentos familiares.

Mas, que preocupações específicas mobilizam efetivamente os pesquisadores neste início de século? Quais são os temas mais discutidos pelos estudiosos de Bowlby? Em quais países a pesquisa fundamentada na Teoria do Apego está mais ativa e avançada? Existem instrumentos novos para o estudo de comportamentos de apego na atualidade? Para que campos do saber esta teoria tem fornecido mais contribuições?

Objetivando responder estas questões, este trabalho almeja traçar o estado do conhecimento da produção científica gerada a partir da Teoria do Apego no Brasil e em outros países. Acredita-se, pois, que ele possa ser útil para tornar os conhecimentos produzidos, nos cinco últimos anos da primeira década do século XXI, mais acessíveis aos interessados no assunto, favorecendo, consequentemente, o desenvolvimento de investigações futuras e promovendo, também, o aumento de publicações especializadas sobre a temática pesquisada.

Assim sendo, o objetivo geral desta dissertação de Mestrado é identificar os avanços da Teoria do Apego na Psicologia contemporânea, por meio de análise de material bibliográfico publicado no período de 2005 a 2010, na modalidade de resumos de artigos científicos e no formato de textos completos indexados nas bases de dados PsycInfo, Eric, Lilacs e Scielo.

Seus objetivos específicos são:

a) identificar a frequência de trabalhos encontrados nas bases pesquisadas e sua distribuição por ano de publicação;

b) investigar os autores com maior volume de publicação e os idiomas utilizados na redação dos artigos;

c) verificar os países dos autores dos trabalhos, bem como os periódicos com maior volume de publicações;

d) averiguar a natureza dos trabalhos, a metodologia empregada em cada um deles, os instrumentos de avaliação psicológica mais utilizados nas investigações e a caracterização da população-alvo das pesquisas empíricas em termos de gênero e faixa etária;

e) destacar os temas mais discutidos, as áreas de conhecimento, nas quais a Teoria do Apego vem sendo utilizada e as abordagens teóricas mais associadas ao legado de Bowlby;

MÉTODO

Esse é um estudo de revisão sistemática de literatura, no qual foi adotado o enfoque misto ou multimodal, que integra as modalidades quantitativa e qualitativa de pesquisa. A aplicação dessas duas modalidades de produção de conhecimento, em um mesmo estudo, possibilitou conciliar suas principais vantagens, a saber, a objetividade na apresentação das informações e a profundidade na sua discussão. Assim, o enfoque quantitativo permitiu um maior controle no tratamento dos dados obtidos, por meio de sua transformação em valores numéricos, enquanto o enfoque qualitativo possibilitou sua interpretação (SAMPIERI, COLLADO, LUCIO, 2006).

Material

Foram analisados textos completos e resumos de artigos nas bases PsycInfo, Eric, Scielo e Lilacs escritos nos seguintes idiomas: português, espanhol, italiano, francês, inglês e alemão. Não foram considerados teses, comentários de artigos, dissertações, capítulos e resenhas de livros. É importante ressaltar que a análise de trabalhos em formato de resumo possibilitou a inclusão, na presente pesquisa, de artigos redigidos em outros idiomas, tais como esloveno, turco, servo-croata e dinamarquês. Assim sendo, este recorte metodológico favoreceu a obtenção de um material de análise mais rico e diversificado.

A seleção das bases PsycInfo, Eric, Scielo e Lilacs justificou-se pelo fato de disporem de um corpo consistente de trabalhos, apresentando o mérito de incorporar as pesquisas mais relevantes na área. Pelo reconhecimento indiscutível que a comunidade científica lhes concede e, também, pela credibilidade de que desfrutam no cenário acadêmico, estas bases foram adotadas como fonte de coleta de resumos de trabalhos e de artigos na íntegra.

Em específico, a base PsycInfo, organizada por membros da American Psychological

Association – APA, reúne documentos oriundos de praticamente todas as partes do planeta que

constituem a literatura psicológica mundial. Trata-se de uma base de dados que não apresenta todos os textos integralmente, mas que disponibiliza, em cada trabalho indexado, um link por meio do qual o pesquisador pode vir a localizá-los em suas respectivas fontes. Por este motivo, todo material bibliográfico que se encontra na PsycInfo possui um resumo escrito em inglês, o qual pode ser consultado apenas nas instituições de ensino e de pesquisa conveniadas com a APA.

A base Eric, organizada por membros do Instituto de Ciências da Educação do governo norte-americano, colige material bibliográfico escrito exclusivamente em inglês e publicado em

periódicos científicos da área de Educação. Trata-se de uma base de dados que não apresenta todos os textos integralmente, mas que, em contrapartida, disponibiliza resumos que podem ser consultados livremente, ou seja, sem a necessidade de pagamento de assinaturas por parte das instituições ou de particulares.

A base Scielo é fruto da cooperação entre a Fundação de Amparo à Pesquisa do Estado de São Paulo – FAPESP, o Centro Latino-Americano e do Caribe de Informação em Ciências da Saúde – BIREME e o Conselho Nacional de Desenvolvimento Científico e Tecnológico – CNPq, contando, também, como o apoio de instituições nacionais e internacionais, relacionadas com a comunicação científica, e de editores científicos. Ela foi desenvolvida para responder às necessidades da comunicação científica nos países em desenvolvimento e, particularmente, na América Latina e Caribe. Favorecendo a obtenção de textos integrais e permitindo livre acesso ao material bibliográfico indexado, a base Scielo reune periódicos de praticamente todas as áreas do conhecimento.

Por fim, a base Lilacs, coordenada pela BIREME, consiste no mais importante banco de dados da literatura científica e técnica sobre saúde da América Latina e Caribe. Coligindo material bibliográfico publicado em periódicos científicos oriundos de países dessa região, essa base disponibiliza textos completos e resumos dos trabalhos nela indexados.