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O caminho do automóvel e a I Semana do Urbanismo de 1935: espaço de produção

2- A cidade e a cultura da modernidade na Era Vargas (1935-1945)

3.3 O caminho do automóvel e a I Semana do Urbanismo de 1935: espaço de produção

Como já salientamos, a Revolução de Trinta, ainda que tecnicamente não tenha sido uma revolução, no seu conceito clássico, modificou a ordem política brasileira e a sua organização econômica, tendo vários efeitos culturais, demográficos, políticos, sociais, educacionais e materiais sobre a cidade e esses efeitos, ao lado de um processo de inserção do Brasil na ordem burguesa modificou a configuração da cidade do Salvador.

O próprio poder político foi afetado na sua organização oligárquica e no rodízio dos coronéis no controle da máquina do Estado baiano. No primeiro momento, a ação dos interventores desequilibrou o frágil controle políticos das oligarquias.

A cidade foi afetada em 1930 com o monumental quebra-bondes que tornou a cidade rebelada. E, também, os seus intelectuais, empresários, homens do governo e a imprensa passaram a pensar a condição da cidade da Bahia. Essa reflexão sobre a urbanização da cidade do Salvador, no alvorecer da década de trinta, produziu dois momentos que são preciosos para a nossa avaliação do aguaceiro da modernidade.

O primeiro momento foi à demolição da Igreja da Sé em 1933. Desde o primeiro governo de Seabra (1912-1916), houve tentativas de demolição da Sé. Por falta de recursos e, o desenrolar das obras da própria avenida Sete de Setembro que não avançou para o lado norte da cidade, o projeto de demolição foi adiado. No governo de Vital

Soares, nova tentativa de demolição da antiga Igreja da Sé, mais protestos, entre eles, um precioso documento assinado por vários intelectuais que se opunham à destruição de uma das igrejas mais antigas do Brasil e finalmente, em 1933, em um quadro de mudança política e social as condições foram favoráveis à demolição da centenária Igreja.85

A demolição da Igreja da Sé foi marcado por simbolismo pois, traduz um momento juntamente com outros de desejo do poder político, dos agentes econômicos, dos intelectuais e de parte da população, como da própria Igreja, em por abaixo a antiga Sé.

Em 1935, na Semana de Urbanismo, o médico Heitor Praguer Fróes reclamava da atitude da cúria e do poder político de ter permitido a demolição da sagrada Igreja:

Monumento era a nossa velha Sé – negociada por trezentos dinheiros em meio ao clamor uníssono dos patriotas, à complacência injustificável dos principais responsáveis, e ao protesto reiterado dos verdadeiros defensores de nossos monumentos e de nossas tradições – tendo sido este mesmo Instituto, Bernardino à frente, o reduto de onde partiu a metralha da palavra candente e a maldição do verbo anatematizante contra a obra ingratíssima dos mal avisados demolidores86

O segundo momento foi à organização da Semana do Urbanismo entre 20 a 27 de outubro de 1935. Nesses dias de outubro, a cidade, produziu com seus intelectuais uma análise sobre o grau de urbanização de Salvador. Era um momento de reflexão e tentativa de ação do governo do Estado, da Prefeitura e, finalmente, dos intelectuais e notáveis em modernizar a cidade.

A Semana do Urbanismo em 1935 organizou um pensamento do poder público Estadual e municipal como também dos intelectuais sobre a necessidade de modernização da cidade e também da criação de uma cultura urbana que facilitasse a velocidade dos automóveis. Dessa forma, uma extensa programação foi realizada, para discutir a cidade na sua forma ideal e, sobretudo, constituir um pensamento urbanístico moderno e progressista com base na máquina.

A Comissão do Plano da Cidade do Salvador, dando à palavra Urbanismo o máximo de elasticidade que lhe cabe, considerando que a “vida é a única riqueza” e para manter esta riqueza são necessários: saúde, educação, alegria, trabalho, segurança, facilidade de locomoção, centros de diversões, etc87

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PERES, Fernando Rocha. Memória da Sé. p. 97-101

86

FRÓES,Heitor Praguer. Monumentos, Museus, Arquivos e Belas Artes – Índice de civismo, de cultura

e de progresso. p. 32 87

Com a presença do governador Juracy Magalhães (1931-1937) e do prefeito José Americano da Costa (1932-1937), a cidade da Bahia instalou a sua Primeira Semana de Urbanismo, iniciada no dia 20 de outubro, às 20 horas e trinta minutos. Essa sessão inaugural foi presidida pelo governador do Estado, no Instituto Geográfico e Histórico da Bahia, a Casa da Bahia, tendo como conferencista o engenheiro civil Milton da Rocha Oliveira que discorreu sobre “Urbanismo e sua aplicação à Cidade do Salvador”.

Milton Oliveira, na Comissão do Plano da Cidade do Salvador, era integrante da comissão central e também representante da prefeitura. O conferencista procurou apresentar as linhas gerais do plano urbanístico para a cidade e também evidenciou a influência da escola norte-americana sobre os urbanistas baianos. Milton de Oliveira, após lembrar que a iniciativa de organizar a Semana do Urbanismo tinha paralelo com a ação de sociedades americanas como: “Civic Associations”, “Civic Improvements”, “ City Planning Associations”, “ Chamberts of Civic Affairs”, declarava que:

...a Bahia pode se orgulhar de possuir não uma, mas duas destas beneméritas sociedades, às quais tenho a grande honra de presidir: A Comissão do Plano da Cidade do Salvador e o Núcleo Baiano da Sociedade dos Amigos de Alberto Torres...88

Para Milton Oliveira, o objetivo da Semana de Urbanismo era transformar a cidade da Bahia na “verdadeira Rainha do Norte” e a segunda cidade do país. Procurava chamar a sociedade para a discussão e organização da cidade e conjuntamente com a Sociedade Amigos de Alberto Torres:

é não só um “ amigo da cidade”, mas de todo o Estado; haja visto a sua organização interna com secções de educação, higiene, clubes agrícolas, urbanismos e arquitetura paisagista, publicidade, agricultura etc. Levando avante esta santa cruzada, com um pugilo de jovens abnegados, capitaneados por Oscar Carrascosa na Bahia e orientada pelo patriotismo invulgar de Raul de Paula, secretário geral da Sociedade dos Amigos de Alberto Torres, no Rio de Janeiro89

Milton Rocha Oliveira apresenta o urbanismo como uma interseção entre “ciência e arte” e “filosofia social”, recorda que só há alguns decênios o urbanismo passou a ser uma preocupação para engenheiros, arquitetos e sociólogos. E para o urbanismo teve inicio a partir de 1865 com a lei italiana sobre planos reguladores, essa iniciativa da Itália, ainda não unificada, foi seguida pela Suécia em 1874, Prússia em 1875, a Inglaterra, a lei Cornudet na França e finalmente os Estados Unidos da América.

88

Idem. p. 1

89

Modelo que serviu de inspiração para o primeiro conferencista da Semana de Urbanismo na Bahia e, declarou:“...onde devemos beber os ensinamentos para os nossos trabalhos, adaptando ao nosso meio As leis e métodos americanos do Norte, esses grandes fazedores de cidades”90

Há aqui um corte espacial e ideológico na concepção de cidade em relação ao modelo de Haussmann que caracterizou a ação do poder público na organização da cidade na Primeira República. O higienismo e o controle do doente, de influência marcadamente européia, eram os focos da organização do chamado urbanismo demolidor, enquanto o modelo de inspiração norte americana vem da necessidade de inserir a máquina na cidade e dessa forma modificar a funcionalidade da cidade. Assim, Milton Oliveira dá os contornos do receituário do urbanismo de matriz americana:

devemos considerar para o caso da Bahia os elementos de ordem moral e os ordem física; entre os primeiros contamos o preparo do ambiente público ou para dizermos com Lethaby “We have to bign with the formation of town psychology and civic desire” e é para formarmos esta psicologia, propicia aos ideais urbanísticos que, achamos perante vós; para que todos nós solicitemos ao poder competente a legislação apropriada, para que a obra projetada se realize sempre com primazia dos interesses coletivos. Os principais elementos de ordem física resumamo-los : 1) ruas, 2) transito; 3) transporte(aéreo, terrestre e marítimo) ; 4) divertimento públicos; 5) zoneamento; 6) arte cívica.91

Os elementos de ordem física estruturavam a cidade para a máquina, obrigando a um redesenho da cidade do Salvador. No terceiro capítulo, vamos evidenciar como o poder público, os intelectuais, a imprensa e poder econômico cuidaram para organizar os elementos de ordem física. A inovação das máquinas como: o cinema, automóveis, bondes, motocicletas, elevadores e fábricas passaram a exigir dos habitantes da cidade do Salvador entre 1935 e 1945, novos comportamentos sociais que, de certa forma, afetaram a antiga sociabilidade da Bahia.

O nosso conferencista, Milton da Rocha Oliveira, depois de discorrer de cada elemento de ordem física, conclama os baianos para o engajamento no projeto urbanístico da cidade com as seguintes palavras:

Meus senhores, estou abusando por demais da vossa paciência e vou terminar; não quero porém fazer, sem primeiramente dirigir um caloroso apelo ao vosso civismo e ao vosso patriotismo: auxilie, com vossa sugestão valiosas a Comissão do Plano da Cidade e ajude-a a

90

Idem. p. 3

91

organizar a “Caixa de Urbanização” , pois, a remodelação de nossa capital depende dos governos do Estado e do Município, mas depende sobretudo de todos nós; sigamos o exemplo dos povos anglo-saxões e, ainda para a atual geração a apoteose de uma Bahia Maior e Melhor92

A conferência de Milton da Rocha Oliveira revela um sentimento que estará presente em todo o período de estudo, o sentimento de inferioridade da cidade do Salvador em relação a outros centros do país. Nesse sentimento, a cosmética urbana era fundamental para resgatar um orgulho há muito perdido. A forma da cidade e grau de desenvolvimento da urbanização era um incômodo constante aos intelectuais que pensavam a cidade. “A cidade de uma só rua” era um embaraço aos que queriam livrar Salvador do estigma de uma cidade provinciana.

A mentalidade de uma parcela da intelectualidade era de um mal-estar com a cidade diante do desenvolvimento urbano de outras cidades brasileiras. Chama atenção, nas palestras da I Semana de Urbanismo, e mesmo na literatura sobre a cidade, a exaltação constante de dizer que a Bahia (Salvador), em algum momento da sua história, tinha sido a maior e melhor. Esse aspecto também será analisado no próximo capítulo quando discutiremos as reformas sofridas pela cidade durante o período.

A segunda conferência foi realizada na segunda feira dia 21 de outubro de 1935, na sede da Associação Universitária da Bahia pelo dr. Nelson de Almeida Pinto cujo tema foi “ Segurança Pública e os Incêndios”. É importante recordar que Salvador, desde o século XIX, contava com a Faculdade de Medicina, Engenharia e Direito, não possuía uma Universidade e, sim, faculdades. No ano de 1941, fora criada a Faculdade de Filosofia, além dessas faculdades, havia o Instituto Normal e de Música. Jorge Amado, em Bahia de Todos os Santos, descreve muito da vida urbana da cidade inclusive o mundo estudantil que, para ele, os estudantes baianos eram “mais

vigilantemente democráticos do Brasil”93.

É importante, ao discutir a influência da Semana de Urbanismo de 1935 sobre a modernidade da Cidade do Salvador, levar em conta que essa Semana que produziu instrumentos de modernidade na concepção da organização do espaço urbano soteropolitano favorável à máquina. Essa ação não foi uma ação concebida em um centro universitário e, sim, na atividade de abnegados intelectuais, alguns desses professores de faculdades, mas, sobretudo na ação do Governo do Estado e da Prefeitura

92

Idem. p. 21.

93

da Cidade do Salvador, auxiliada pela Sociedade Amigos de Alberto Torres núcleo da Bahia.

A conferência de Nelson de Almeida Pinto que tinha como tema “Segurança Pública e Incêndios” fez uma descrição da cidade do Salvador quanto ao grau de desenvolvimento urbano e suas múltiplas vicissitudes em relação ao problema de segurança pública e comparou com outras cidades brasileiras. Pouco discutiu com relação aos incêndios que eram freqüentes na cidade, porém procurou demonstrar como a urbanização era um instrumento do poder e de controle social.

A Segurança Pública pela ordem e vigia toda a cidade de modo a ser prestada imediata garantia a quem dela necessitar. Mas, se os seus representantes exercitam-se numa cidade de difíceis comunicações, cujas pessoas carentes dos seus serviços, ou cujos logradouros envolvidos, de momento, na desordem, distam muito longe da central em que permanecem as suas reservas de prontidão, não se pode esperar a eficácia recomendável e completo êxito na intervenção da autoridade, salvo se os cofres públicos estivessem nadando em ouro e um Governo, perdulário, quisesse manter cortejos enormes de profissionais hábeis, incumbidos de tais serviços, em flagrantes contrastes com o bom senso que está a indicar que se melhorem as condições de aproximação ao centro urbano 94

Nessa conferência, estão presentes certos aspectos da cultura da modernidade, definida na introdução desse trabalho, que acreditamos ser importante salientar. O primeiro deles, não necessariamente na ordem de importância, é o controle social por meio de instrumentos da racionalidade. As ruas e avenidas, quando livres e desimpedidas, produziam uma rápida ação da polícia nas possíveis ações delituosas e, assim, constituiriam os meios de repressão a desordem urbana. Era necessário não embaraçar o trânsito também com o objetivo de garantir a “segurança pública”. O segundo aspecto também próprio da cultura da modernidade era a funcionalidade e eficiência da cidade. As vias urbanas desobstruídas garantiriam ao poder público a redução das despesas e a manutenção da vigilância urbana.

A conferência de Nelson Pinto não deixa dúvida sobre o temor de embaraço dos órgãos de segurança em razão do sistema viário da cidade e a dificuldade da polícia em conter qualquer distúrbio social e, até mesmo, um simples jogo de bolo que a molecada insistia em praticar nas ruas da cidade para o desespero dos moradores:

E a polícia impossibilitada de imediata repressão a esse vício, porque a dita rua é de difícil acesso, metida num recanto do arrabalde, e

94

PINTO, Nelson de Almeida. “Segurança Pública e Incêndios”. p. 69.

constitui um perigo para a existência de um policiador sem cobertura95.

Para Nelson Pinto, a solução para uma efetiva vigilância sobre a cidade estava na produção de um plano urbano para a cidade da Bahia. A racionalidade na organização das casas, praças, mercados, feiras, atividades religiosas, comerciais, industriais e de ensino eram imperiosas para garantir a segurança pública na cidade.96

A compreensão urbanística da cidade vinha da observação de que outras cidades brasileiras lançavam mão do planejamento urbano para garantir, também, a vigilância sobre os habitantes já que “urbanizar é civilizar”97.

A solução para a vigilância ao menor “vagido de distúrbio” era garantir a boa fluidez do trânsito e, nesse sentido, indagava o conferencista de 1935. “ Não terá a

Bahia outros meios possíveis de corrigir a circulação do seu tráfego? Sim. Falta tão somente, iniciativa.”98.

O plano urbanístico zoneando a cidade, rasgando largas avenidas e ruas e, dessa forma, destruindo gargalos do trânsito, além da construção de túneis para unir a cidade Alta e Baixa, era a receita de civilizar a cidade para a segurança pública. Deveria estar na memória, do nosso conferencista, o quebra-bonde dos primeiros dias de outubro de 1930 que paralisou a cidade por várias semanas e os movimentos da luta política contra a interventoria de Juracy Magalhães (1931-1935), experiências que poderiam ser evitadas com o salvador plano urbanístico.

A receita de que urbanizar é civilizar outras variáveis da modernidade estarão presentes como a velocidade e o tempo. Não há tempo a perder porque tempo é dinheiro e, para que essas condições se materializassem, era fundamental mais uma vez o trânsito livre e sem obstáculos.

Somos do século da velocidade. Ei-lo, ai, visível em tudo, sua presença é universal. Velocidade coletiva, velocidade de conjunto e do povo. As companhias de transporte atraem as clientelas pelos anúncios das velocidades realizadas sobre certas linhas, quer em terra, quer em mar ou metamorfoseado os céus com as poderosas naves, mais pesados que o ar. Repetem-se os triunfos pelo maior velocidade adquirida em reduzindo a quase zero o tempo das comunicações99

95 Idem. p. 69. 96 Idem. p. 68. 97 Idem. p. 68. 98 Idem. p.71 99 Idem. p. 72.

É indissociável a cidade para a máquina que garantisse a organização da cultura capitalista na ordem urbana e a mudança do comportamento social dado pelas próprias máquinas que exigiam ruas largas e avenidas desimpedidas para poupar tempo e dinheiro. No terceiro capítulo, vamos avançar nessa explicitação de como as reformas urbanas na cidade da Bahia tiveram como inspiração a velocidade e o tempo em função das máquinas automotivas.

Era a cidade que estava errada porque dificultava o livre fluir dos bondes, ônibus, caminhões, motocicletas, automóveis. Assim:

Não nos surpreende o cidadão mais pacato e pacífico da cidade a praquejar contra o menor atraso em seus trajetos, um bonde da “Circular” fora do horário; contra as morosidades dos condutores de “marinettis” que “amarram” os bondes; contra as interrupções na circulação, com a mudança nos trilhos de São Bento às Mercês que, parece, não acaba nunca!100

Exagero do nosso urbanista conferencista? É possível. O tempo matematizado do relógio mecânico não tinha tomado conta da cidade. A ausência de grandes empresas capitalistas, disciplinando o trabalho e regulando a vida social, não era uma constante na cidade do Salvador. O horário passava pelas relações pessoais tanto dos chefes de família e das empresas, como das repartições públicas e dos serviços comerciais. O que tinha horário na cidade da Bahia?

Uma cidade na qual o comércio parava para o almoço e boa parte do funcionamento dos serviços públicos era organizada com base na semana inglesa, ou seja, tinha nos horários da repartição de sete horas da manhã a 12 horas e trinta minutos da tarde, inclusive aos sábados. O horário de funcionamento da principal atividade econômica da cidade, a atividade comercial, era bastante elástico e atendia os interesses do poder econômico e das relações pessoais.

Havendo o governo do Estado baixado o decreto número 7.690, de 13 de outubro, determinando o encerramento do expediente nas repartições públicas, às 12 ½ horas, nos sábados, e com tal medida prejudicam o comércio exportador, esta Associação Comercial patrocinou uma reclamação conjunta dos exportadores e agentes de Companhia de Navegação, pleiteando com êxito a prorrogação o expediente na Recebedoria das Rendas, naquele dia, de modo a não entravar a atividade dos reclamantes101

Voltando à Semana de Urbanismo e à terceira conferência que foi ministrada pelo engenheiro civil, Jayme Gama e Abreu, na terça feira, às 15 horas, na Escola

100

Idem. p. 72

101

Politécnica, com o tema “Zoneamento das Cidades”. Era membro da comissão central da Comissão do Plano da Cidade do Salvador que juntamente com a Sociedade Amigos de Alberto Torres foi promotora da I Semana de Urbanismo de 1935. Gama Abreu, na comissão central representava a Associação dos Engenheiros Civis. É comumente citado pelos outros palestrantes e tem, no seu tema, uma discussão de grande impacto sobre o tecido urbano da cidade do Salvador, já que zoneamento era:

Eis uma palavra nova para muita gente. Zoneamento é base do plano duma cidade e consiste em dividida numa série de zonas ou áreas regulamentadas de forma que numa dada área possam ter lugar atividades comerciais, noutras, só atividades fabris e noutras ainda só possam ser construídas residências. Consiste ainda em regular as alturas dos edifícios conforme o local.102

O zoneamento no urbanismo moderno era importante porque estabelecia a funcionalidade e a racionalidade da cidade. Dessa forma, a conferência de Jayme Gama e Abreu prometia um verdadeiro redesenho da cidade da Bahia.

É importante lembrar que Salvador foi concebida antes do capitalismo e da modernidade e essa cidade portuguesa tinha, em primeiro lugar, o papel de ser uma cidade baluarte e garantir a defesa do capital mercantil português. De 1549 para 1930, a cidade se expandiu, tendo como base a escarpa e o centro da cidade continuou a ser a freguesia da Sé. Era na Sé que estava estabelecido o poder público estadual e municipal. Era na Sé que estava presente à imprensa oficial e a biblioteca pública e forçosamente era o local de convergência entre a cidade alta e baixa quer seja pelos meios mecânicos (Elevador Lacerda, Plano Inclinado Gonçalves) quer pelos meios físicos (a Ladeira da Montanha, Conceição e Preguiça). Ainda que tenha ocorrido uma certa espacialização da cidade o centro se manteve na Sé. A própria rua Chile que era a vitrine social e cultural da cidade estava localizada nessa freguesia, como se dizia no século XIX.

A cidade do Salvador, na década de trinta, era ainda uma cidade não medicalizada ou zoneada. Havia uma verdadeira confusão entre as áreas mantendo o caráter comercial, a função pública e residencial. O zoneamento era exatamente a proposta de medicalizar a cidade e definir a organização do espaço. A questão não era