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Capítulo 2 – As transform(ações) fantásticas

IV. “O caminho do Poço Verde”

O conto “O caminho do Poço Verde” trata da busca incansável de Diana pelo lugar que, supostamente, encontrava-se o Poço Verde. Ao que parece, a personagem foi influenciada pelo imaginário popular e pelas histórias que ela ouvia quando criança, as quais cercavam o local com certa áurea mística.

A história, em verdade, inicia-se com a dificuldade de saúde que a personagem está passando em virtude de o todo percurso. De certa forma, o narrador em terceira pessoa inicia o conto pelo desfecho para introduzir a trama do texto e já aportar as

consequências da personagem em se dirigir até o poço.

Nesse sentido, instiga-se o leitor a manter a leitura porque apresenta, desde o início, uma problemática. Evidencia-se essa ação, mediante a construção sintática do texto como quando o narrador no segundo parágrafo afirma que: “no entanto, tudo

ainda ocorria bem quando ela pela primeira vez ela ouviu falar de Poço Verde.”13 (FIGUEIREDO, 2009, p. 103.)

Sintaticamente, já se apresenta um problema por meio de uma oração coordenada adversativa seguida dos adjuntos adnominais “ainda” e “bem”, que geram um efeito de sentido riquíssimo para a estrutura fantástica, já que o leitor atento compreende que em algum momento do texto haverá uma situação adversa.

A ação do enredo começa quando a garota completa a maioridade, ou seja, 18 anos. É nesse momento que ela se sente pronta para desbravar o mundo ao seu redor. Fato que, aparentemente, não ocorria, uma vez que os pais, em especial a sua mãe, não gostavam de que ela saísse sozinha.

Com efeito, a personagem precisou:

[...] brigar muito com a mãe para sair de férias sozinha naquele ano. O pai já havia desistido de interferir nas brigas das duas, achava que era coisa pessoal e que o melhor era ficar afastado. No confronto com a mãe, Diana guardara para o final o argumento: já era maior de idade e ninguém podia impedir que fosse aonde bem entendesse. (FIGUEIREDO, 2009, p. 105).

Depois de muitas brigas, e a aprovação forçada dos pais graças ao argumento de maioridade da filha, Diana consegue realizar o sonho de fazer uma viagem de férias sozinha. É Interessante observar que, de inúmeros locais que a garota poderia escolher para a sua viagem, opta pelo Poço Verde, já que “descreveram o lugar de tal modo, povoaram-no de tantas histórias” (FIGUEIREDO, 2009, p. 103).

O início da viagem de Diana mostra-se tranquilo e seguro, uma vez que, embora viajasse sozinha, sempre estava acompanhada de mochileiros: “a viagem começara numa região de turismo rústico, onde Diana encontrava viajantes de mochila como ela.” (FIGUEIREDO, 2009, p. 105). Entretanto, no desenrolar da viagem, algumas adversidades já se mostram a Diana como “as estradas de asfalto haviam ficado para trás já fazia alguns dias [...], à proporção que se embrenhava na serra, os

hoteizinhos e as pensões foram escasseando, até desaparecerem” (FIGUEIREDO, 2009, p. 105).

Além disso, os transportes regulares como trens e ônibus já haviam se esgotado e, agora, a personagem dependia de caronas e de transportes especiais para seguir sua viagem, pois “já havia alcançado uma etapa da estrada onde automóveis normais só se aventuravam sob grande risco” (FIGUEIREDO, 2009, p. 106).

À medida que Diana ia se distanciando da cidade, da sua vida cotidiana e de seus pais, sentia-se cada vez mais orgulhosa por conseguir ir tão longe sozinha, “contemplava com orgulho suas botas de lona e couro completamente enlameadas” (FIGUEIREDO, 2009, p. 105).

A protagonista se distanciou tanto da cidade que, a partir daquele momento, foi necessário seguir a viagem em um caminhão especial, já que tinha um motor mais reforçado e dessa forma conseguiria vencer os obstáculos da estrada.

A certa altura, o único meio de acesso era um caminhão que descia de manhã e subia de volta à tarde. Um caminhão pequeno, no qual o motorista havia instalado um motor de jamanta. A vantagem era que a potência do motor sustentava a subida, de outro modo quase impossível. [...] (FIGUEIREDO, 2009. p. 106-107).

Diana vê-se, pela primeira vez, diante de uma situação totalmente nova, pois nunca havia saído de férias sem os pais e estava muito longe de casa, distante da vida que estava acostumada na cidade.

No distanciamento da cidade, do caos urbano, Diana descobre uma outra realidade. Os costumes do campo e a maneira como as pessoas vivem nos vilarejos pelos quais ela passa deixam-na surpresa com tamanha simplicidade e, às vezes, até assustada como tais pessoas conseguiam sobreviver em determinadas condições.

Nesse sentido, a personagem precisou se adaptar a certos hábitos que lhe eram desconhecidos e até mesmo improváveis se estivesse junto aos seus, como o fato de precisar beber com os passageiros do caminhão em um bar. Havia percebido que isso era um costume de todos os passageiros que viajavam naquele caminhão.

Ela mesma se sentiu obrigada a beber com os outros uma vez, quando as mulheres acompanharam os homens até o bar. Diana já havia entendido que a aguardente era um rito de camaradagem e não beber significaria um desrespeito. Riram quando ela se engasgou e tossiu com a bebida, que lhe pareceu forte. Retrucaram que na verdade aquela era bem fraquinha. Na estrada, Diana iria provar coisa melhor.

(FIGUEIREDO, 2009, p. 107).

A promessa dos passageiros à Diana é que mais adiante ela provaria coisa melhor. Em verdade, melhor para eles, pois que já estavam habituados à aguardente, mas não para ela que não bebia.

De certa forma, por causa do orgulho e do sonho de ir cada vez mais longe, a personagem parecia não ligar para as consequências de suas atitudes, talvez pelo fato de não haver ninguém para avaliar as suas ações. Diana estava aproveitando ao máximo seu momento de liberdade, estava “despreocupada, satisfeita com sua coragem de ir tão longe de casa” (FIGUEIREDO, 2009, p. 108).

Ao longo da viagem, ouviu falar do Poço Verde e, encantada com as descrições de um lugar tão inacessível, decidiu que não voltará para casa antes de conhecê-lo. Para realizar seu sonho, Diana passou por algumas situações difíceis, como viajar na caçamba de um caminhão, lotada de passageiros. Apesar do desconforto, ela acreditava que valia a pena já que “sua satisfação mais íntima, na verdade, dependia de uma dose de desconforto” (FIGUEIREDO, 2009, p. 108).

A personagem acreditava que o desconforto e as provações que teria durante a viagem eram necessários para atingir o seu objetivo, o de conhecer o Poço Verde.

Rindo, se empurrando, se apertando, os passageiros sentiam e escutavam o ruído da brita solta que corria por baixo de seus corpos. Diana se agarrava a uma escora de madeira, espremida no mesmo ângulo da carroceria onde começara a viagem. [...] (FIGUEIREDO, 2009, p. 109).

É nesse momento, entre os passageiros do caminhão, os quais eram muito diferentes dos mochileiros do início da viagem, que Diana se deu conta o quão longe estava de casa. Sua maior preocupação, ao observar o caminho tortuoso da estrada, era o de como voltaria para casa.

A floresta corria toda para o lado direito da estrada e do lado esquerdo, bem rente, a serra abria precipícios de centenas de metros. No fundo, nos intervalos da mata, quase sempre se via um rio escuro que espumava nas pedras. Diana começou a desconfiar que o risco de partir o eixo não era o mais grave, se fosse o caso de temer alguma coisa. (FIGUEIREDO, 2009, p. 109).

Foi nesse instante de reflexão da protagonista que o narrador estabeleceu uma relação descritiva de pessoas que estavam sobre a carroceria do caminhão. Uma delas

era um senhor idoso, que se encontrava a sua frente, segundo o olhar do narrador, um homem de “pele cor de carne defumada, todas as rugas de uma fruta murcha” (FIGUEIREDO, 2009, p. 110).

Do lado oposto da personagem, ainda no caminhão, havia um sujeito que esbravejava nos intervalos de silêncio na caçamba. Algumas de suas palavras, Diana não conseguia entendê-las, mas parecia que o sujeito estava muito bravo com alguma coisa. Logo percebeu que:

[...] a ladainha do velho na verdade eram palavras dirigidas a ela e tratavam do homem que gritava voltado para a estrada. O povo dizia que ele era louco e que tinha matado pelo menos dois sujeitos, balbuciou o velho perto de Diana. Dizem que ficou preso um tempo na capital por ter matado um homem lá também, e na prisão acabou maluco. [...] (FIGUEIREDO, 2009, p. 110).

No decorrer da viagem, Diana deparou-se com situações inusitadas, e isso fez com que ela ficasse mais atenta às pessoas que a cercavam. Esse estado de atenção parecia demonstrar que ela sentia medo, receio de estar ali com aquelas pessoas. Percebe-se que um ambiente insólito ia se apresentando à personagem, uma vez que se deparava com pessoas estranhas e até mesmo desequilibradas no seu percurso. Entretanto, sua determinação em continuar a viagem para encontrar o Poço Verde era mais forte do que fugir daquele ambiente e retornar para casa.

Em determinado trecho do texto, quando o caminhão parecia estar bem distante, fez mais uma parada para que os passageiros descansassem. Diana, novamente, foi levada sem perceber ao interior de outra venda:

[...]. Quando ela reparou, já segurava um copo na mão, cheio até a metade de uma aguardente cristalina demais para não inspirar alguma dúvida. Aquilo ia fazer bem, diziam a sua volta. Ia esquentar. Essa era a melhor do que a lá de baixo. (FIGUEIREDO, 2009, p. 111).

Depois de ingerir a bebida, produzida de maneira artesanal pelos moradores da região, Diana sentiu uma espécie de mal-estar, porém, não revelou aos demais passageiros que viajavam com ela. O narrador coloca em dúvida a questão desse mal-estar, apontado duas possibilidades:

Talvez tenha sido a roupa molhada. Ou a aguardente, que agarrava e corroía por dentro. Aconteceu que um arrepio ondulou do fundo do estômago até a cabeça, e se repetiu, subiu e desceu, cada vez mais fraco, mas não se dissipou completamente. Deixou dentro de Diana

um mal-estar que, dali por diante, e aos poucos, iria crescer. [...] (FIGUEIREDO, 2009, p. 111-112).

É interessante observar que a instauração do insólito no conto se dá por intermédio de um narrador em terceira pessoa, onisciente. Nos principais textos fantásticos, sobretudo nos séculos XVIII e XIX, era frequente a utilização do narrador em primeira pessoa ou narrador-testemunha, uma vez que ele propicia maior aproximação com o leitor, e confiabilidade diante dos fatos narrados, como observado no primeiro capítulo deste trabalho a partir dos teóricos citados a respeito dessa questão. Essa confiança no narrador-testemunha causa efeitos determinantes para o texto fantástico como a aproximação da realidade, a hesitação e até mesmo o medo. Nesse sentido, o receptor acaba participando da construção de sentidos que são suscitados no texto, mesmo que não possa fazer de maneira poética ou metafórica, como aponta Todorov (2012, p. 38-39).

Rubens Figueiredo, por outro lado, constrói toda problemática de dúvida e hesitação por um narrador em terceira pessoa. Percebe-se, pois, que a modalidade fantástica não é rígida, nem inflexível quanto à construção narrativa, assim como defendeu Todorov. Mostra-se, aliás, flexível e versátil, estilo próprio de Rubens Figueiredo, já apontado na introdução deste trabalho.

De fato, a narrativa construída em primeira pessoa aproxima e marca certa veracidade ao enredo, o que é muito importante para a instauração do insólito. Porém, mesmo por intermédio de um narrador impessoal, Rubens Figueiredo mostra-se capaz de apresentar a hesitação e a dúvida.

O questionamento, que causará a dúvida no leitor, está situado no campo da enunciação. Nesse sentido, embora não esteja em primeira pessoa como vemos no conto “O caminho do Poço Verde”, a voz narrativa é capaz de instaurar uma breve hesitação. Por exemplo, o trecho que afirma que Diana sente certo mal-estar é apresentado por um adjunto adverbial de dúvida “talvez tenha sido a roupa molhada” (FIGUEIREDO, 2009, p. 111-112).

Além disso, há ainda a utilização do campo sintático para enfatizar tal fato, uma vez que o uso da conjunção alternativa enfatiza a dúvida no leitor “ou a aguardente, que agarrava e corroía por dentro” (FIGUEIREDO, 2009, p. 111-112). No desenvolver do conto, o efeito de dúvida gerado pela enunciação em terceira pessoa mostra-se eficiente quando Diana, ao sair da venda com os passageiros e voltar ao caminhão,

viu, mesmo a distância, uma mulher na fresta de um portão, que lhe causou uma certa inquietação.

[...]. Antes que o caminhão completasse a curva e tudo sumisse atrás das árvores, notou de relance que uma mulher olhava para eles pela fresta de um portão entreaberto. Dava a impressão de ter ficado o tempo todo escondida ali, observando, enquanto os passageiros bebiam na vendinha. Só agora, talvez num gesto de despedida, a mulher teve coragem de se mostrar um pouco mais. De mostrar o rosto tumultuado em que Diana viu a senha da loucura. (FIGUEIREDO, 2009, p. 113).

Percebe-se que há um estranhamento em relação a essa visão da personagem, que gera ainda mais dúvida no leitor. O que significaria “um rosto tumultuado”? Sinais visíveis de perturbação mental? Ou apenas uma senha, um indício de loucura?

A trama narrativa vai ser tornando mais dúbia no decorrer do conto. Diana distancia-se cada vez mais da realidade urbana que conhecia. Parece adentrar em um território de seres que lhe são totalmente desconhecidos. Até a comunicação com os moradores do vilarejo, onde o caminhão havia parado, torna-se muito difícil, como se depreende no fragmento a seguir:

[...] mergulhada na escuridão daquela vendinha, o cabelo ensopado grudando na testa e na nuca, Diana se deu conta do esforço necessário para entender e ser entendida. Pelo visto, tinha ido bem longe. Mesmo assim, Poço Verde ainda não passava de uma direção incerta. Uma dúvida por trás de um morro, um lugar que a serra insistia em ocultar. (FIGUEIREDO, 2009, p. 112-113).

A incomunicabilidade e as incertezas para atingir o seu objetivo tornam o seu percurso cada vez mais difícil. Seu plano parece estar fadado ao fracasso. A personagem mostra-se distante, procurando por onde passa algum sinal de vida “humana”, de alguém que lhe possa ajudar, efetivamente. Mas não havia ninguém.

Por mais que procurasse nas redondezas algum sinal de presença humana – uma trilha, uma cerca, uma porteira –, Diana não encontrou nada. Talvez excitada pelo que ocorrera na última parada, sua imaginação não pôde evitar a ideia de criaturas tão isoladas que não quisessem mais se mostrar diante de ninguém. E imaginou as razões que poderia haver para isso. (FIGUEIREDO, 2009, p. 114).

Diana estava distante, não mais apenas fisicamente do contexto que estava habituada, mas agora se mostrava distante também no seu pensamento, o qual, segundo o narrador, “ameaçava-se desviar por caminhos estranhos” (FIGUEIREDO, 2009, p. 114).

A única distração que havia para ela, em sua busca pelo Poço Verde, era escutar as histórias dos passageiros. Quando parou para ouvir, nem percebeu que era uma história de maldição, que o homem idoso ao seu lado contara com tanta veemência porque havia sido primeiramente narrada pelo pai dele:

[...], foi com satisfação que ouviu a história do cemitério e se viu de volta ao pitoresco ao inofensivo [...]. Diana mal se deu conta de que, afinal, se tratava de uma história de morte, maldição e defuntos. (FIGUEIREDO, 2009, p. 114).

Diana parece ouvir com atenção a história. Entretanto, em que medida seu estado físico ou emocional não subverte a sua percepção do real? Além disso, constata-se que, ao chegar a outro vilarejo, a personagem percebeu que não estava se sentido bem. Tenta encontrar uma causa plausível: “Talvez a viagem, talvez a chuva.” (FIGUEIREDO, 2009, p. 114.) Ocorreu-lhe, ainda, que qualquer tipo de ajuda era muito improvável. Dependeria mais da sua força de vontade para continuar a jornada. Até mesmo no único lugar que vendia alguns tipos de medicamentos, o atendente do balcão “sugeriu que ela procurasse uma certa mulher que talvez pudesse ajudar, e foi até a porta para indicar o caminho para a casa da sra. Balduína” (FIGUEIREDO, 2009, p. 115).

É interessante verificar que, novamente, a enunciação do narrador enfatiza a dúvida diante de uma situação concreta, criando mais um momento de tensão para a personagem: “talvez pudesse ajudar.” Nesse diapasão, percebe-se que há uma modalização do discurso do narrador com a finalidade de causar, também, no receptor, certa hesitação. Como salientamos alhures, para os autores mais contemporâneos da modalidade fantástica, a hesitação é uma das suas principais características, uma vez que gera no leitor efeitos de sentido necessários à narrativa fantástica.

É perceptível, ao longo do conto, a modalização linguística na voz narrativa em terceira pessoa. No caso de uma narrativa em primeira pessoa, a modalização é mais sútil até mesmo porque é a própria personagem que narra os fatos.

Retomando a cena do atendente e a ida de Diana até a casa da sra. Balduína, o narrador nos revela os sentimentos e pensamentos da protagonista, nesse pequeno percurso:

[...]. Diana não foi ali pensando que ia realmente se curar. Havia uma curiosidade rotineira de turista, um impulso tolo. No fundo, reconhecia a bobagem daquilo: uma certa satisfação por se mostrar livre de preceitos, por ser capaz de admitir um tratamento que só valia naquele local, para aquelas pessoas, mas que para os outros, lá embaixo, seria ridículo. (FIGUEIREDO, 2009, p. 115).

A distinção dos espaços – serra (“aqui”) versus cidade (“lá embaixo”) – colocam em xeque a percepção da protagonista. Crendices seriam apenas bobagens, mas a curiosidade de “turista” conduziu os seus passos em direção à casa de Balduína. A incredulidade de um tratamento eficaz, “que só valia naquele local”, poderia induzir o leitor a aceitar a sua inviabilidade.

Além da distinção geográfica, o espaço em que Diana se encontrava no momento e o espaço urbano em que sempre viveu, há também uma divergência cultural e social. A distinção marcada pelos adjuntos adverbiais “lá” e “aqui” não permite, contudo, precisar os espaços do ponto de vista geográfico. Essa imprecisão espacial é também uma maneira de instaurar dúvida no leitor, pois é um elemento constitutivo da narrativa fantástica.

Naquela serra, era normal outro método para tratamento de doenças. A consulta a uma moradora do local que conhecia o remédio para doenças atípicas. O fato de Diana estar distante da sua realidade, leva-a por curiosidade a formas de tratamento oferecidas ali. Dessa maneira, sente-se orgulhosa por não estar presa à convencionalidade de ir a um médico, por poder escolher um tratamento duvidoso.

Quando chegou à casa da sra. Balduína, Diana ficou impressionada com a simplicidade do local. Não havia na casa “nem tábua, nem palha, o chão da casa era a mesma rocha viva sobre a qual a construção foi erguida” (FIGUEIREDO, 2009, p. 115).

No local, havia a senhora e uma menina, a qual Diana acreditava ser sua neta ou sobrinha. Ambas andavam descalças já que não havia barro dentro de casa. Diana explicou o que sentia à sra. Balduína, mas sem deixar de reparar na sua aparência estranha. A senhora lhe ofereceu um caldo que Diana bebeu mesmo sem saber exatamente o que era:

Diana bebeu um caldo quente, arroxeado, no pote de barro que a mulher pôs na sua mão. Alguns flocos afundavam e emergiam na espessura do caldo e se desmanchavam assim que tocavam a língua. Diana julgou reconhecer o contato de raízes e plantas desfeitas. A aderência de algum tipo de gordura animal. O sabor não era repulsivo, e de fato Diana se sentiu um pouco melhor, a princípio. Mas notou uma diferença em si mesma. Uma novidade no tipo de interesse com que ouvia as explicações de Balduína sobre Poço Verde. Percebeu um ritmo novo na sua atenção, uma espécie de moleza, um langor da memória. Rarefeito, o passado quase já não pesava. (FIGUEIREDO, 2009, p. 116-117).

Diana parecia ir desconstruindo a sua memória afetiva, a vida que tinha na cidade, em busca de um futuro almejado: o Poço Verde. Subindo a serra, a protagonista encontrou pessoas diferentes como caminhoneiros, passageiros, curandeiras, cozinheiras, etc. Quanto mais Diana subia em direção ao Poço Verde, mais incomuns ficavam os indivíduos com as quais se relacionava. Entrou em contato com uma primitividade, que até então desconhecia. Quem eram realmente os habitantes daqueles pequenos povoados?

A viagem da personagem é um ato de resistência e de formação de sua personalidade como uma mulher adulta. O percurso, contudo, é uma experiência traumática que a protagonista acredita fazer parte de sua formação adulta.

A suposição de Diana em relação ao caminho do Poço parecia equivocada. Nem mesmo a sra. Balduína sabia onde ficava o lugar. Porém, para tentar auxiliá-la

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