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III.3 Estar aqui: escrita e “crise política”

2 REPRESENTAÇÃO E MOBILIZAÇÃO COLETIVA: A ASSOCIAÇÃO

2.2 A trajetória de um “amigo da América”

2.2.1 O “chefe do clã”

Embora a atuação junto ao Grêmio estudantil, e particularmente no jornal “A Roda”, tenha tido importância no sentido de uma iniciação nas atividades jornalística e política, o contato com o jornalismo e com o mundo político é ainda anterior ao que se estabeleceu no

seu ensino secundário, remetendo aos vínculos familiares. A família Calmon registra extensa atuação nos espaços político e jornalístico em diferentes momentos. Mais diretamente, Rosental Calmon Alves é sobrinho de João de Medeiros Calmon (ex-diretor-geral dos Diários Associados, ex-deputado federal e ex-senador da República pelo Espírito Santo) e de Wilson de Medeiros Calmon (ex-deputado federal pelo Amazonas).

A pessoa mais importante da família da minha mãe foi um senador da República, chamado João Calmon, que foi o braço direito de Chateaubriand e foi o grande diretor-geral dos Diários Associados durante o período que o Chateaubriand tava doente, e antes disso foi o czar dos Diários Associados no nordeste do Brasil. E depois virou político, foi deputado federal muitos anos e senador – e foi o “senador da educação”, que criou a “emenda Calmon”, que obrigava o governo a investir em educação. Ele só falava de educação. Mas antes disso teve uma carreira como diretor de meios de comunicação (da rede Tupi, dos Diários Associados). E ele, tanto como político como empresário, teve uma grande influência em mim, porque ele era como que o chefe do clã na minha família, o mais rico da família, etc. E dois filhos dele eram jornalistas, um era fotógrafo e outro era repórter. E foi mais ou menos inspirado por eles que eu comecei a ter a tentação de entrar no jornalismo, quando eu ainda tava no ginásio. O meu início de carreira é muito especial nesse sentido, muito diferente das outras pessoas (Entrevista com Rosental Calmon Alves, concedida em 15 jun. 2016).

Sendo o quarto mais velho em uma família de oito irmãos, João de Medeiros Calmon nasceu em Baunilha, localidade pertencente à cidade de Colatina (ES), em 7 de setembro de 1916. Era filho de um pequeno comerciante e de uma funcionária pública, agente dos Correios. Não descendia dos ramos mais prestigiosos da família Calmon79, embora existam indicações de que as relações com estes ramos tenham sido importantes na sua ascensão social, profissional e política.

O perfil de João de Medeiros Calmon pode ser pensado como uma trajetória “multinotável”, no sentido dado por Grill e Reis (2016, p.51-80). A sua biografia autorizada, escrita por David Nasser (1965), e publicada pela editora O Cruzeiro, se assemelha àquelas analisadas por Saint-Martin (1993, p.120), como uma empresa de “celebração da família”, com evocações sobre a história e origens longíquas do grupo familiar, com particular destaque para os feitos “gloriosos” e “ilustres”. Escrita “no calor dos acontecimentos” referentes ao final do governo de João Goulart e ao golpe de Estado de 1964, o livro apresenta de modo muito direto e solene o processo de ascensão social e política, concomitante e

79 “Augusto [pai de João Calmon] tinha ascendência. Nos seus ramos familiares, surgiram crachás e honrarias

vindas ora de um fidalgo, ora de um general, ora de políticos, ora de cultores da História. Mas a vida dera tantas voltas, e tudo ficara tão difícil para quem arcava com tantos compromissos familiares, que seria impossível remontar às posições desfrutadas por outras gerações de Calmons em condições mais fáceis de sobrevivência e prosperidade” (NASSER, 1965, p.22). “Em sua família destacou-se também Miguel Calmon du Pin e Almeida Sobrinho, que foi deputado federal na legislatura de 1959 a 1963 e ministro da Fazenda entre setembro de 1962 e janeiro de 1963” (DHBB, vol. 1, p.942).

inseparavelmente à acumulação de um amplo capital de relações sociais por parte do “chefe do clã” Calmon.

A biografia conta com prefácio da escritora cearense Rachel de Queiroz, que se dirige ao biografado como “velho companheiro”, além de “marquês de Pombal do reino chateaubriânico” e “Bismarck do império Associado” (QUEIROZ, 1965, p.7). Nele, a escritora lhe agradece pela luta política que empreendeu contra o “janguismo” e, principal e pessoalmente, contra Leonel Brizola, no início dos anos 1960.

Segundo Bourdieu (2006, p.162), os prefácios podem ser entendidos como uma estratégia eufemizada de transferência de capital simbólico. Neste caso, representa também, e mais ainda, a explicitação de um vínculo pessoal de reciprocidade bastante intenso entre a escritora e João Calmon. Queiroz (1965, p.7) faz questão de deixar claro: “(...) o lembrete mais importante nesta biografia é o lembrete de uma dívida”. Mais especificamente, de duas “dívidas”: a primeira delas foi o protagonismo assumido por João Calmon na luta contra a “onda subversiva”, na “desmoralização do mito Brizola, o centauro fantasma ou mula-sem- cabeça que assombrava os democratas durante o entremez varguista” e na “derrubada da oligarquia varguista”. Calmon teria entrado em cena nessa contenda, apresentada como uma “guerra”, numa “hora perigosa e desmoralizante”, quando veio então a “desafiar o famanaz, o espalha-brasas” Leonel Brizola. Na imprensa, ainda segundo Queiroz (1965, p.9-10), poucos até então vinham empreendendo o embate político contra os “herdeiros” do Getúlio Vargas. Entre eles, estava o próprio David Nasser, na condição de “atirador solitário, montado com a sua terrível bazooka ao ombro, nas colunas de ‘O Cruzeiro’”. De “aparência tímida”, “fala branda” e “propósito cortês”, a vangloriada vitória “espetacular” de Calmon sobre Brizola teria surpreendido a muitos, exceto os que lhe eram próximos, como a própria escritora cearense, que sabiam “que o capixaba traz uma mão de ferro debaixo daquela luva de veludo”. A segunda dívida, menos “ideológica” e mais instrumental, aparece ao final do prefácio, em tom de deferência e gratidão. Rachel de Queiroz aproveita a ocasião para agradecer ao “cearense honorário” pela iniciativa que levou à construção de uma maternidade em Fortaleza, “à qual ele deu o nome do nosso velho cacique Assis Chateaubriand” (QUEIROZ, 1965, p.10).

Na sua residência em Baunilha, um dos cômodos era destinado ao recebimento do Correio da localidade. Naquele recinto, Calmon adquiriu precocemente o hábito da leitura, por meio dos jornais que vinham do Rio do Janeiro com destino aos seus assinantes em Baunilha. Este foi o seu primeiro contato com a imprensa, “a que êle serviria depois, e para sempre” (NASSER, 1965, p.24). Embora sua biografia não seja clara quanto a isso, é possível

depreender que o seu contato com a imprensa também tenha contado com o incentivo do seu pai, que, além das atividades ligadas ao comércio, se dedicava a vender assinaturas de O Jornal, do Rio de Janeiro, “montado num burreco (...), parando de porta em porta, ou de sítio em sítio, ou de fazenda em fazenda” (NASSER, 1965, p.22). Lia todas as seções dos jornais “insaciavelmente”. Como resultado do investimento, “aos 9 anos, já lia e escrevia fluente e desembaraçadamente” (NASSER, 1965, p.23). Além disso, os conhecimentos adquiridos por meio da leitura dos jornais “dava-lhe êsse conhecimento suficiente base para se intrometer com êxito na conversa dos maiores que se esforçavam para salvar o Brasil, já então ‘à beira do abismo’” (NASSER, 1965, p.24).

Durante sua infância em Baunilha, ocasionalmente ajudava a mãe no seu trabalho nos Correios, devido às suas “habilitações e prestimosidade”. Chegou mesmo a substituí-la de modo interino em alguns momentos, de modo que “muita correspondência partiu de Baunilha, naquele tempo, sob o carimbo retumbante e a pose solene daquela assinatura ainda indecisa e sem forma definitiva: ‘João Calmon, agente postal interino’” (NASSER, 1965, p.23-24). Para ajudar nas despesas domésticas, ajudava seu pai na “pequena bodega” que tinha e vendia vidros de pimenta pela região.

Depois de concluir o ensino primário em Baunilha, onde foi “bom aluno”, se deslocou para a capital do seu estado natal, Vitória, para fazer o ensino médio. Devido ao agravamento das condições financeiras da sua família, e “acostumado às dificuldades”, trabalhava no mercado municipal vendo mercadorias que seu pai lhe enviada de Baunilha. Por volta dos seus 15 anos, quase mudou de colégio, devido a uma controvérsia “intelectual”. No Ginásio São Vicente de Paulo, onde iniciou seus estudos em Vitória, João Calmon, “já avançado no curso de humanidades”, leitor de Schopenhauer, Spencer e do “terrível iconoclasta português Albino Forjaz de Sampaio” (NASSER, p.1965, p.30), fundou um jornal escolar, chamado “A Voz”, juntamente a outros colegas. Nele, escreveu um artigo intitulado “Apóstrofe atrevida à hipocrisia do século XX”, que ganhou repercussão para além do âmbito do colégio e “foi lido por quase tôda Vitória” (NASSER, 1965, p.30). O arcebispo da cidade, ao ter contato com o texto, encaminhou “enérgico protesto” ao diretor do Ginásio, “estranhando que num colégio com o nome de São Vicente houvesse um jovem articulista tão insolente...” (NASSER, p.1965, p.30). O diretor se sentiu então instado a replicar, por meio da imprensa, o “insulto” do jovem aluno. Publicou um artigo contrapondo o texto de Calmon, no jornal Diário da Manhã. No dia seguinte, no colégio, o diretor reuniu os alunos e professores e, publicamente, o repreendeu. Após o ocorrido, solicitou ao pai a mudança de colégio, “para não sofrer outras humilhações” por parte do diretor. Dada a impossibilidade burocrática da migração para outra

instituição, uma vez que o ano letivo já se encontrava em data avaçanda, “suportou a guerra psicológica, e foi aprovado, concluindo o curso ainda com brilhantismo. A firmeza e o controle de nervos que demonstrou nesse período seriam repetidos durante o desenrolar de sua vida” (NASSER, 1965, p.30-31).

Migrou para o Rio de Janeiro entre 1932 e 1933, para seguir estudos superiores em Direito, na Faculdade Nacional de Direito (UFRJ). Quando foi à cidade prestar o vestibular, se surpreendeu com o elevado número de candidatos, entre os quais observava “caras muito mais inteligentes e buliçosas do que amorfas, opacas ou tímidas” (NASSER, 1965, p.33). A todo momento, “cortavam o ar (...) nomes de família que êle identificava nos galarins da história, da política, das letras ou da riqueza do País80” (NASSER, 1965, p.33).

De início, dispunha de pouco dinheiro e recursos materiais em geral no então Distrito Federal. Chegou à cidade com cerca de 500 mil-réis, que seus pais obtiveram de empréstimo junto a um genro. Seguia portanto os estudos na faculdade sem as mesmas condições dos seus colegas, em geral oriundos de famílias com recursos mais abundantes. A chegada ao Rio de Janeiro e a convivência com “netos de estátuas da nossa História” (NASSER, p.33) fizeram com que Calmon estabelecesse uma relação ambivalente com a sua própria “herança” familiar. Em relação aos colegas, “para se consolar, às vezes chegava a pensar: mas também sou um Calmon. Tem Calmon por aí, espalhado em alguns pontos da nossa História” (NASSER, 1965, p.33). Avançava então o nome de família como trunfo para se afirmar no âmbito da faculdade, sendo razoável supor que o tenha feito em outros espaços e momentos da sua vida. Chegou a ficar animado quando, durante os exames do vestibular, conheceu um “árabezinho da Zona da Mata de Minas”, que, curioso com o seu sobrenome, lhe perguntou “Você é Calmon. Calmon do que foi Ministro da Agricultura? Miguel Calmon era seu avô?... Puxa vida!”. Calmon desmentiu a primeira impressão apenas anos depois, após o mesmo colega lhe repetir a pergunta, dizendo: “Não (...). Apenas meu trisavô era baiano” (NASSER, 1965, p.33). Com efeito, é do estado da Bahia que provém os maiores “vultos” da família Calmon, que remetem ao período imperial.

Ao mesmo tempo em que se esforçava para se inserir simbolicamente na “linhagem”, posteriormente, já afirmado profissional e politicamente, por vezes tentava esboçar algum distanciamento, visando destacar “sua formação eminentemente popular”: “Espiritualmente, eu me sinto menos Calmon, menos Medeiros do que João. Sou principalmente João. Sou um

80 Sobre as relações entre a formação em direito e carreiras políticas, ver, entre outros, Dogan (1999), Coradini

homem comum que deseja valer o que é, e não o que seus antepassados foram” (NASSER, p.165, p.24).

No início da faculdade, Calmon se mantinha com uma mesada de 50 mil-réis enviada, “com sacrífico”, por seu pai. Suas despesas básicas eram, além do bonde para a faculdade, a aquisição diária dos jornais Diário Carioca (onde gostava de ler os escritos de Humberto de Campos), e O Globo. Precisou então conciliar os estudos com a busca de obtenção de renda complementar. Depois de um “bico” como vigia noturno numa feira de amostras, ficou por volta de um ano desempregado, até que, por interferência de seus tios, conseguiu um emprego público, como auxiliar de escrita da prefeitura, em 1935.

Nas horas vagas, escrevia contos que, com o tempo, começaram a ser publicados nas revistas O Malho, criada em 1902, e Fon-Fon, criada em 1907, periódicos ilustrados e satíricos de destaque no período (ROMANCINI e LAGO, 2007, p.81). A aptidão para as letras está entre os elementos mais destacados na sua biografia: passava horas-extras na biblioteca da Faculdade de Direito para ler livros da área, mas também literaturas diversas.

Ainda estudante de Direito, se associou ao Clube de Regatas Guanabara, que lhe favoreceu o estabelecimento de relações decisivas para a sua trajetória posterior. Por volta de 1937, se encontrava no clube de remo quando foi abordado por um encarregado dos barcos, que lhe perguntou se não podia fazer dupla com um dono de barco que precisava de alguém para poder praticar o esporte: tratava-se de Francisco de Assis Chateaubriand Bandeira de Mello81, algo que o jovem Calmon saberia apenas depois.

Durante a prática esportiva nas águas da Baía de Guanabara, Chateaubriand “despejou interrogatório cerrado” ao seu companheiro de remadas. Entre outros assuntos conversados, Calmon deu sua opinião sobre a política nacional e internacional da época. Divergiram politicamente, pois Chateaubriand era partidário da candidatura de Armando de Sales Oliveira à sucessão de Getúlio Vargas, enquanto João Calmon se inclinava por José Américo de Almeida. Do primeiro contato, resultou um convite de “Chatô” para visitá-lo em São Paulo e ficar na sua casa, quando, por algum motivo, fosse à cidade.

Os encontros entre os dois no Clube de Regatas viraram rotina, e a prática conjunta do esporte, idem: “(...) sempre que o famoso jornalista chegava ao clube, mandava logo chamar

81 “Revolucionário de primeira hora”, Chateaubriand era uma “figura controvertida, que marcaria o jornalismo

brasileiro” (ROMANCINI e LAGO, 2007). Iniciou a construção do seu “império das comunicações” com a compra de O Jornal, em 1924. Quatro anos mais tarde, lançou O Cruzeiro que, devido ao grande sucesso, “foi a primeira grande revista nacional do Brasil” (ROMANCINI e LAGO, 2007, p.85). É considerado ainda um pioneiro ao introduzir a televisão no país. Com a sua morte e posterior dissolução do seu “império”, “cinco famílias passam a dominar a imprensa brasileira: em São Paulo, os Mesquitas, proprietários do grupo OESP, e os Frias, donos da empresa Folha da Manhã; no Rio de Janeiro, as famílias Marinho, d’O Globo, e Nascimento Brito, do Jornal do Brasil; no Sul, a família Caldas Júnior” (KUCINSKI, 1991, p.11).

pelo rapazinho petulante, que discutia política e problemas brasileiros com êle, enquanto espadanavam as águas com suas remadas experientes e vigorosas” (NASSER, 1965, p.40). Num desses encontros, em setembro de 1937, o magnata das comunicações fez um convite a João Calmon, sondando seu interesse de entrar para o jornalismo e para o “império Associado”. De início, Calmon recusou o convite, pois tinha um cargo como promotor “arranjado” no Espírito Santo, que assumiria logo que formasse. No final desse mesmo ano, a promessa de emprego não se concretizou, e Calmon resolveu aceitar a um novo convite de Chateaubriand, entrando então como “foca82” no Diário da Noite, com a recomendação do

dono do jornal83. Lá, encontrou colegas de faculdade, e conheceu, entre outros, David Nasser, seu futuro biógrafo, e Victor Nunes Leal.

Chateaubriand acompanhava os escritos de Calmon no Diário da Noite, e procurou saber com os superiores hierárquicos dele no jornal como o novato estava se saindo. Os elogios tecidos fizeram com que ele mandasse incluir Calmon na folha de pagamento, e transferi-lo para o matutino O Jornal, líder da cadeia Associada. É o mesmo jornal que seu pai vendia assinaturas em Baunilha, e em que Rosental Alves trabalhará posteriormente. A intenção era que lá ele tomasse algumas “lições de autoridade” para depois ser transferido para Fortaleza, no Ceará, onde assumiria a direção do jornal Correio do Ceará.

Após dois meses em O Jornal, o interesse de Calmon pelo direito havia se tornado secundário em relação ao jornalismo, que “o atraía pelas suas amplas implicações públicas e sociais” (NASSER, 1965, p.5). Cumprindo o planejado pelo seu mentor, seguiu para o Ceará, onde assumiu a direção do Correiro do Ceará, aos 21 anos de idade. Desde os seus primeiros tempos naquelas terras, fez grande amizade com Rachel de Queiroz e seu marido, que o recebiam em sua casa frequentemente.

Começou como diretor de redação e passou em seguida para a função de diretor-geral. Outra função que começou a assumir nos Diários Associados foi a da compra de novos veículos para a cadeia, e começou pelo jornal Unitário, um matutino então bastante tradicional no Ceará. Em janeiro de 1943, Chateaubriand designou Calmon para a compra do Jornal do Commercio de Manaus, e assim, progressivamente, ele se tornou o “comprador oficial dos

82 Dá-se o nome de “foca” a todo jornalista em início de carreira e ainda sem experiência.

83 De modo semelhante a Saint-Martin (1993), pode-se considerar o remo como um dos muitos esportes de

“elite”, e esse clubes que reúnem seus adeptos como sendo instituições que são diretamente orientadas para acumulação ou manutenção do capital social que, além disso, procuram ganhos simbólicos muito grandes, dada a garantia de se encontrar entre pessoas de “boa companhia”. “Trata-se menos de recorrer aos serviços ou às instalações que oferece o clube ou de estabelecer relações novas do que se se encontrar entre pessoas de mesma qualidade” (SAINT-MARTIN, 1993, p.34).

Diários Associados” (NASSER, 1965, p.52), tendo integrado dezenas de veículos das regiões Norte e Nordeste ao conglomerado84.

Eis-me então (...) transformado em judeu-errante da imprensa e do rádio, a palmilhar o solo nacional, com a missão que me confiou o Sr. Assis Chateaubriand de estender, até os limites brasileiros mais setentrionais, e depois ao Centro, no Oeste e no Extremo Sul, a rêde de casamatas e trincheiras dentro das quais se lutava, e como ainda lutamos, pela soberania nacional, pela grandeza da democracia, pelo impulsionamento do progresso do País, pela maior vitalidade, enfim, de todos os valôres éticos, morais, culturais e materiais desta grande Pátria, que sempre desejamos ver unificada pelo pensamento e pela ação, através de nossas rotativas e antenas (NASSER, 1965, p.53).

“Amigo dos poderosos, escravo dos humildes”. Com o tempo, Calmon passou a integrar os círculos da elite cearense, dos seus clubes e das suas reuniões, transformando-se num dos seus membros mais proeminentes. Todo o capital simbólico e social acumulado foi reconvertido em “várias campanhas de alto sentido público”, destacando-se sobretudo em dois casos. O primeiro é o da Santa Casa de Fortaleza, que passava por problemas à época. Um dos provedores do hospital, um desembargador, explicou a situação da instituição para Calmon e lhe fez um apelo: “Só o senhor com sua bondade, sua fé, seus jornais e sua rádio poderá fazer algo” (NASSER, 1965, p.57). Mobilizou assim os veículos que comandava numa campanha de doações, que acabou por restaurar a situação financeira do hospital. No segundo caso, tratava da construção da maternidade Assis Chateaubriand, à qual Rachel de Queiroz agradece no prefácio destacado logo acima. De igual modo, fez uma campanha na imprensa em prol do projeto, mas também aproveitou um banquete em sua homenagem, em função da sua promoção a Diretor-Geral dos Diários Associados”, para fazer o apelo às “figuras mais representativas da sociedade, da política, do comércio e da indústria do Ceará” (NASSER, 1965, p.63) que lá se encontravam. Foi igualmente bem sucedido na empreitada, e a maternidade foi inaugurada anos depois com a presença do próprio Assis Chateaubriand.

Foi por trazer da sua infância e da sua juventude os quadros todos, de dificuldades e necessidades dos chamados “pobres envergonhados”, que Calmon, muito antes de sua recente militância política, já comandava, iniciava e estimulava através dos jornais e emissoras que dirigia constantes, úteis e eficientes campanhas de