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Prática dos professores

4.1. O conceito de prática dos professores

Existem inúmeras investigações que se referem à prática dos professores, sendo importante perceber do que se trata e como se define. Para (Saxe, 1999) as práticas podem ser definidas como atividades com um carácter recorrente (realizam-se frequentemente e não de forma pontual), socialmente organizadas (requerem a consideração de grupo social relevante e não de apenas um indivíduo) e facilmente reconhecíveis no quotidiano. É também a perspetiva assumida por Ponte, Quaresma e Branco (2012) que consideram possível articular uma noção de prática como atividade e também com uma abordagem do tipo cognitivo. Por sua vez, McDonough e Clarke (2003) e Boaler (2003) referem que a caracterização da prática letiva dos professores é complexa, pois esta é o resultado da influência de inúmeros fatores – por exemplo, conhecimento, crenças, vivências – que

42 intervêm em vários momentos. Ponte e Chapman (2006) também mencionam a influência do contexto de trabalho do professor na sua prática letiva.

Outros autores analisam as práticas profissionais e categorizam-nas. Por exemplo, Ponte e Serrazina (2004a) dividem-nas em três subcategorias: prática letiva (com influência direta na aprendizagem dos alunos), prática profissional na instituição e prática de formação.

A prática letiva dos professores é também caracterizada e analisada tendo por matriz a abordagem curricular, usualmente considerada como tradicional (usando expressões como “ensino transmissivo”, “ensino expositivo” e “ensino direto”) ou como inovadora (usando expressões como “ensino exploratório” ou, em inglês “reform

teaching” e “inquiry-based”). Por exemplo, Potari e Georgiadou-Kabouridis (2009)

situam as práticas dos professores em duas grandes abordagens de ensino: “exploratório” e “instructive”. Assumindo a perspetiva de teoria da atividade, falam em “ações” e “motivos”. Salientam as tarefas como elementos estruturantes da prática, falando em diferentes tipos de exercícios e em tarefas que levem os alunos a “investigar ideias matemáticas” (p. 18). Também referem aspetos da comunicação na sala de aula, por exemplo, referem que a professora colocava “questões de natureza mais aberta e encorajava as crianças a agir e a explicar as suas ações” (p. 18).

A descrição, análise e reflexão sobre os vários aspetos da prática dos professores pode contribuir para a sua melhoria. Nesse sentido, McDonough e Clarke (2003), com base em seis estudos de caso de professores considerados eficientes (desde o ensino pré- escolar até ao 2.º ano) assumem uma abordagem descritiva, indicando práticas com determinadas características, que na sua perspetiva, devem ser tidas em conta. As suas propostas incluem: (i) falar de forma clara para os alunos; (ii) propor-lhes tarefas adequadas e desafiantes, com diferentes tipos de resposta possível; (iii) estabelecer ligações com aprendizagens passadas; (iv) aproveitar os momentos de aprendizagem que surgem espontaneamente na sala de aula. Referem-se também ao recurso a diferentes metodologias, materiais e representações e à escolha de tarefas que provoquem o raciocínio matemático e a argumentação, para que os seus alunos expliquem o que pensaram e questionem o que ouviram e que apreciem e desfrutem a Matemática. Por fim, realçam a importância das expectativas que o professor deve ter relativamente aos seus alunos, bem como da reflexão e avaliação das tarefas. À semelhança destes autores, Boaler (2003) analisa algumas atividades observáveis na sala de aula tais como o trabalho, apresentação e discussão de resultados em grande grupo, o trabalho individual dos alunos,

43 o discurso unidirecional do professor e o seu questionamento aos alunos. Adverte, também, para o facto de, mais importante do que analisar o que os professores fazem, é saber como o fazem, que opções tomam e o que os influencia nessa escolha. Schoenfeld (2000), pelo seu lado, apresenta um modelo de análise do processo de ensino que pretende acomodar todos os tipos de ensino e funcionar em diversos níveis de análise (grain size), desde o planeamento curricular, ao planeamento das aulas, ao detalhe das interações fala a fala. Este modelo, que tem por base o conhecimento produzido em diversos campos de trabalho da Psicologia Cognitiva à Inteligência Artificial e à Educação, relaciona as tomadas de decisão do professor e as ações daí decorrentes em função do seu conhecimento, crenças e objetivos e, na sua perspetiva, fornece uma explicação sobre o que leva os professores a tomarem as suas decisões, no decurso do seu ensino. O autor apresenta os objetivos como metas que o professor se propõe atingir. Na sua perspetiva, estes podem ter vários níveis: objetivos abrangentes, anuais ou mensais, objetivos de aula e objetivos locais, nomeadamente, objetivos específicos que estão presentes em determinadas interações com os alunos. Relativamente à planificação, os objetivos podem ser predeterminados (previstos na imagem da aula) ou emergentes (surgindo espontaneamente no decorrer da aula). Além disso, divide os objetivos em três categorias – epistemológicos, de conteúdo e sociais – podendo uma dada ação decorrer, em simultâneo, dos três tipos de objetivos. Schoenfeld (2000) denomina como “plano de ação” a expectativa que o professor tem relativamente à sequência de ações que vai realizar na aula. Também aqui assinala vários níveis de análise, referindo que se pode começar por considerar um plano de ação em “larga escala”, fazendo uma decomposição sucessiva em planos de ação mais específicos que, por sua vez, podem ser divididos em segmentos ainda menores. Por outro lado, o autor denomina de “sequências de ação” aquilo que realmente ocorre e que pode ou não corresponder ao que o professor espera que aconteça e que são a base de análise do seu modelo. No seu modelo, cada aula é segmentada em unidades de análise sucessivamente mais pequenas. Esta decomposição em níveis sucessivos é estruturante da análise, sendo a descrição completa de uma aula feita a um nível muito específico. No entanto, este esquema permite apenas a descrição das sequências de ação, e numa análise completa, para além de incluir os objetivos implícitos, é necessário considerar muitas outras informações relativas a cada episódio. Por isso, Schoenfeld inclui, associada à sequência de ação, os respetivos objetivos (“goal

trace”, p. 256). Este modelo permite fazer uma análise aprofundada da prática letiva dos

44 além de descrever os acontecimentos, permite relacioná-los com os objetivos, crenças e conhecimentos do professor. Esta análise da sala de aula pode ser articulada com a análise do discurso do professor (recolhida em entrevistas, conversas informais, etc..), levando a compreender melhor a forma como este atua na sala de aula.

De forma geral, a prática letiva dos professores surge associada à noção de atividades (e.g., Boaler, 2003; Ponte, Quaresma e Branco, 2012) e a ações ou sequências de ações (e.g., Schoenfeld, 2000). A matriz curricular é forte em alguns autores, como em Potari e Georgiadou-Kabouridis (2009), mas é pouco visível noutros, que assumem uma abordagem mais descritiva (e.g., McDonough e Clarke, 2003). Em algumas destas investigações, como em Schoenfeld (2000), os autores analisam a prática dos professores, descrevendo de forma pormenorizada as suas características, o que pode facilitar a identificação dos fatores que as influenciam.