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A relação entre a Língua Portuguesa nos anos iniciais do Ensino Fundamental e o conhecimento em Libras no

2. O conhecimento em Libras no contexto escolar

As pessoas surdas carregaram, durante toda a história, uma carga imensa de incompreensão, pois não eram compreendidas perante suas dificuldades de comunicação com os ouvintes. Muitas vezes eram chamadas de loucas, doentes e incapazes de qualquer tipo de aprendizagem. Mas, no século XVI, os primeiros educadores de surdos surgiram com diferentes ensinamentos, entre eles o oralismo e a posição gestualista. O oralismo, de forma geral, não obteve tanto êxito, porém, a sinalização entre os surdos cresceu como forma de comunicação.

De acordo com a literatura na área, o monge beneditino espanhol Pedro Ponce de León foi o primeiro educador de surdos. Também na Espanha, Juan Pablo Bonet publicou o primeiro livro sobre educação de surdos, cujo conteúdo era o alfabeto manual e o título “Redação das Letras e Arte de Ensinar os Mudos a falar”. Outros estudiosos surgiram como o alemão Samuel Heincke, com método oralista, os norte-americanos Eduard Minner Gallaudet com o método manual e Alexandre Graham Bell, com o método oralista (Martins, 2012).

Já no Brasil, a primeira escola de surdos surgiu em 1857 como o Instituto dos Surdos-Mudos, hoje chamado INES, Instituto Nacional de Educação de Surdos. E atualmente, muitas escolas adotam a proposta bilíngue na educação dos surdos, com metodologias para o ensino de língua portuguesa e para o ensino da língua de sinais brasileira, Libras.2

Como já foi dito anteriormente, o processo educacional tem três elementos de fundamental importância: a escola, o aluno e o professor. A escola é o ambiente onde a criança tem um contato maior com o mundo exterior, além, é claro de sua própria família. É o local onde ocorrerão trocas de conhecimento e para isso, torna-se necessário que haja um claro processo de comunicação entre alunos ouvintes e surdos, entre professores e alunos surdos, en im, todos os alunos, sejam eles surdos ou ouvintes precisam que as oportunidades de conhecimentos sejam iguais.

Devemos ressaltar que a primeira língua a ser utilizada pelos surdos é a língua de sinais e depois, a aquisição da língua portuguesa

2 Maiores informações: <http://portalines.ines.gov.br/ines_portal_novo/?page_

como segunda língua. Logo, o conhecimento em Libras por parte do corpo docente e dos pro issionais da educação é de suma importância para que o aluno surdo não se sinta discriminado na sala de aula e para que possa se comunicar tranquilamente com aqueles à sua volta no convívio escolar.

A língua de sinais tem uma estrutura gramatical própria e com várias possibilidades de expressão. Por isso, deve ser usada no processo de aprendizagem do aluno surdo em sala de aula. Porém, a realidade em salas regulares para os alunos surdos não é tão fácil. Nem sempre existem profissionais habilitados em Libras, a sala não é adaptada para esse aluno surdo com materiais adequados, não há acompanhamento suficiente para que o aluno surdo desenvolva todas suas habilidades, enfim, de maneira geral, ainda se tem muito a caminhar para que os alunos surdos tenham a educação merecida (Unifenas, 2010).

O ensino de Libras é um desses caminhos necessários para que ocorram mudanças nas condições oferecidas pelas escolas aos alunos surdos. A diversidade, metodologias e estratégias diferentes, capacitação do professor, parcerias com as famílias fazem parte da educação inclusiva. A principal função da escola é possibilitar ao aluno adequar-se ao conhecimento ensinado pelo professor. Neste processo de ensino-aprendizagem, os conceitos oferecidos pela escola interagem com os conceitos do senso comum aprendidos no cotidiano e assim, a escola reorganiza os ensinamentos, modi icando-os, caso seja necessário. Para esclarecermos um pouco mais, mencionamos Salles (2004, p.3):

A Libras é dotada de uma gramática constituída a partir de elementos constitutivos das palavras ou itens lexicais e de um léxico que se estruturam a partir de mecanismos fonológicos, morfológicos, sintáticos e semânticos que apresentam também especi icidades, mas seguem também, princípios básicos gerais. É dotada, também, de componentes pragmáticos convencionais codi icados no léxico e nas estruturas de Libras e de princípios pragmáticos que permitem a geração de implícitos sentidos metafóricos, ironias e outros signi icados não literais. A Libras é a língua utilizada pelos surdos que vivem em cidades do Brasil, portanto não é uma língua universal.

Língua Brasileira de Sinais – Libras: a formação continuada de professores: discussões teóricas... 137 De acordo com Bassani e Sbardelotto (2010), os processos de desenvolvimento da linguagem incluem o conjunto de interações entre a criança e o ambiente, tornando-se necessário:

desenvolver alternativas que possibilitem aos alunos com surdez adquirirem linguagem própria e aperfeiçoarem seus potenciais. Quando uma criança surda tem acesso à sua língua natural, a língua de sinais, as possibilidades de desenvolvimento dessa criança aumentam porque a diferença entre uma criança surda e uma ouvinte está apenas na aprendizagem visual e não oral-auditiva. As famílias têm um papel muito importante nessas situações, principalmente quando os pais são ouvintes e precisam aprender a língua de sinais para auxiliarem no processo de comunicação e aprendizagem (Bassani; Sbardelotto, 2010, s/p).

Tanto escola, como pais são fundamentais para a formação da criança surda, pois a formação enquanto sujeito na sociedade depende do conhecimento formal e informal transmitido a essa criança. Isso porque muitas crianças surdas entram na escola sem o conhecimento em Libras e necessitam não apenas desenvolver, mas até mesmo aprender a língua de sinais. Daí, a importância de se ensinar Libras nas escolas de ensino fundamental para um bom desempenho do aluno surdo. As escolas precisam ter alternativas adequadas ao aluno surdo e as políticas educacionais devem criar mecanismos para prepararem os pro issionais que trabalharão com as crianças surdas.

3. Considerações ϐinais

Para Geraldi (2002), não só a linguagem se constitui pelo trabalho dos sujeitos, como estes se constituem pelo trabalho linguístico, em um processo recíproco. Neste, dá-se uma ação própria da linguagem que limita e estabiliza formas de raciocínio e formas de compreensão do mundo. Por sua vez, as ações com a linguagem e as ações sobre a linguagem produzem a possibilidade de ir além desses limites.

O aluno não deve ser visto como um receptor passivo, mas como interlocutor em potencial, que possui competência comunicativa apta a ser ampliada. Assim, as atividades em sala de aula devem levar em conta o que o aluno já sabe, o seu conhecimento prévio, a

sua experiência de vida. Por esse motivo, as re lexões voltadas para o ensino e para a aprendizagem de língua portuguesa padrão têm se ampliado, contribuindo para mudar aos poucos as práticas escolares, pois, linguagem é interação (Silva, 2007).

Saber escrever para um aluno ouvinte inclui, também, a capacidade de usar a variedade linguística adequada ao gênero de texto que se está produzindo, aos objetivos que se quer cumprir com o texto, aos conhecimentos e interesses dos leitores previstos, ao suporte em que o texto vai ser difundido, fazendo escolhas adequadas quanto ao vocabulário e à gramática. Isso envolve dedicar atenção à escolha de palavras e de construções morfossintáticas, com sensibilidade para as condições de escrita e de leitura do texto.

É preciso, ainda, saber valer-se de recursos expressivos apropriados ao gênero e aos objetivos do texto (produzir encantamento, comover, fazer rir, ou convencer racionalmente).

Conforme Val (s/d),

Essas capacidades de uso da escrita também podem ser ensinadas e aprendidas na escola desde cedo, num trabalho que alie alfabetização e letramento. É importante adquirir as capacidades de revisar e reelaborar a própria escrita. Tornar-se um usuário da escrita eficiente e independente implica saber planejar, escrever, revisar (reler cuidadosamente), avaliar (julgar se está bom ou não) e reelaborar (alterar, reescrever) os próprios textos. Isso envolve atitude reflexiva e metacognitiva de voltar-se para os próprios conhecimentos e habilidades para avaliá-los e reformulá-los. Por sua importância e necessidade, esta capacidade pode começar a ser desenvolvida na escola desde os primeiros e mais simples textos que as crianças produzem. A escrita do próprio nome num crachá, por exemplo, vai requerer critérios específicos de revisão e reelaboração: o nome está grafado corretamente? Com letra legível, de tamanho e cor que facilitam a visualização? Está disposto adequadamente no papel? (VAL, s/d).

Para um aluno surdo essas questões apontadas anteriormente, deverão ser adaptadas para que a criança surda possa desenvolver a produção textual dentro de suas características próprias de escrita.

Língua Brasileira de Sinais – Libras: a formação continuada de professores: discussões teóricas... 139 Não podemos comparar um texto escrito na língua padrão por um aluno ouvinte de um texto escrito por um aluno surdo. As produções serão diferenciadas dentro das condições de escrita desses alunos.

Assim, podemos considerar que a possibilidade de integração social, hoje, requer do cidadão muito mais do que o mero conhecimento das “primeiras letras”. Procurou-se fazer no decorrer deste texto algumas re lexões sobre a relação da língua portuguesa no ensino fundamental I e o conhecimento em Libras no contexto escolar. A aprendizagem da língua portuguesa padrão torna-se diferente para um aluno ouvinte e para um aluno surdo.

O aluno ouvinte terá a língua portuguesa como primeira língua e se desenvolverá nas normas linguísticas próprias dessa língua. Já o aluno surdo terá a língua portuguesa como segunda língua, desenvolvendo a aprendizagem da mesma nos padrões exigidos de uma criança surda. As adaptações quanto à aprendizagem tanto da língua portuguesa quanto da língua de sinais serão obrigatórias para que haja com sucesso um processo justo de ensino-aprendizagem tanto para alunos ouvintes quanto para alunos surdos.

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Capítulo VII

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