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O construto crescimento da empresa e sua operacionalização

O conceito de crescimento é mais amplo do que simplesmente o aumento de determinada quantidade medida como total de vendas, funcionários ou ativos. O conceito de crescimento, como usado por Penrose (1959, p.1-2), implica em um processo de desenvolvimento, de certa forma similar aos processos biológicos onde o aumento de tamanho é acompanhado por mudanças nas características do objeto que cresce. Não é, portanto, apenas um ajuste de tamanho apropriado para certas condições econômicas, em busca de uma otimização.

A questão de como operacionalizar a medição da taxa de crescimento não é simples. Penrose (1959, p. 25, 198 -199) reconheceu todas as dificuldades de se optar por uma forma de medição ou outra e sugeriu que os ativos fixos da empresa representam um indicador mais fiel do conceito de firma usado. Baum, Locke e Smith (2001) usaram três diferentes formas de avaliar o crescimento: taxa de crescimento das vendas, taxa de crescimento do número de funcionários e taxa de crescimento dos lucros. Acs e Audretsch (1990) usaram a taxa de crescimento de vendas para avaliar o crescimento de pequenas empresas. Caves (1998) também usou vendas totais para avaliar o crescimento. Um dos graves problemas de usar as vendas totais é que elas não capturam o crescimento decorrente da verticalização (PENROSE, 1959, p. 199), já que o aumento das operações decorrente da maior verticalização pode não ser refletido em maiores vendas. A empresa pode vender os mesmos volumes finais e apenas integrar-se verticalmente para trás, produzindo insumos que antes eram comprados de terceiros. Assim sendo, não existe um consenso de como medir o crescimento e qualquer opção deixa de lado alguns aspectos.

Outro aspecto a considerar é a questão da forma de crescimento. O crescimento pode ocorrer de maneira endógena e gradativa ou em saltos através de fusões, aquisições ou desinvestimentos relevantes. Esta possibilidade dificulta a propriedade das analogias biológicas que não prevêem descontinuidades ou mudança de identidade no desenvolvimento dos indivíduos. Em princípio, uma firma pode decidir construir uma nova planta industrial e criar novos mercados ou adquirir uma planta e

mercados de firmas já existentes. Se ambas as alternativas forem lucrativas, e se os efeitos concorrenciais da alternativa da aquisição forem desprezíveis, a firma escolherá a alternativa mais econômica e a aquisição só ocorrerá se for uma alternativa mais barata do que o crescimento interno (PENROSE, 1959, p. 154, 156).

A possibilidade da venda e aquisição de negócios que não são firmas completas pode afetar de forma considerável o processo de crescimento. Além de aumentar as alternativas disponíveis a firmas com a intenção de crescer em determinadas áreas, este processo cria um mercado para retificar “erros” cometidos no processo de diversificação, já que o processo de diversificação é, por natureza, experimental (PENROSE, 1959, p. 174-180).

Embora o processo de fusões e aquisições cause um crescimento não contínuo e com saltos, ele representa a realidade do fenômeno e não pode, portanto, ser excluído ou separado de uma análise da heterogeneidade da taxa de crescimento. O uso de uma taxa média, medindo o crescimento durante um período de três ou cinco anos em vez da taxa anual representa o processo melhor em função disso, já que após uma aquisição existe a tarefa da integração administrativa. Esta tarefa usa de forma intensa os serviços gerenciais disponíveis na organização de forma que eles acabam sendo o limite real do crescimento. Se a aquisição promove um crescimento em saltos, esta limitação criará períodos de estabilização em seqüência ao salto (PENROSE, 1959, p. 194).

Este trabalho, seguindo a abordagem da maioria dos autores que estudaram o tema crescimento de forma empírica (HART; PRAIS, 1956; MANSFIELD, 1962; SINGH; WHITTINGTON, 1975; HALL (1987); GEROSKI; MACHIN; WALTERS, 1997), não tratou separadamente os diferentes processos. A base de dados utilizada não permite a identificação dos processos de fusão e aquisição. Por outro lado, a análise da distribuição obtida, descrita na seção 5.1 não apresentou descontinuidades evidentes sugerindo que existe uma composição harmônica dos dois processos e suportando a abordagem de tratá-los em conjunto.

O presente trabalho usou duas formas de operacionalização do construto: a taxa de crescimento das vendas totais, mais freqüente em outros estudos, e a taxa de

crescimento do total de ativos fixos, como sugerido por Penrose (1959, p. 25). A primeira medida apresenta validade de conteúdo, pois muitos autores já usaram essa variável anteriormente para medir crescimento. A comparação entre os resultados obtidos a partir das duas formas de operacionalização permitiu verificar a validade convergente (SEKARAN, 2000).

Quanto ao período de medição também foram exploradas três alternativas: a taxa de crescimento anual, a taxa de crescimento composta para os dois últimos anos de cada período e a taxa de crescimento composta para os três últimos anos de cada período. Essas alternativas foram incluídas para garantir a validade de construto e a confiabilidade do estudo (SEKARAN, 2000).

Os dados de receita e ativos totais estão disponíveis na base de dados na moeda usada para reportar os resultados em cada país e em dólares americanos convertidos a cada período analisado. As taxas de crescimento disponíveis diretamente na base de dados não puderam ser usadas para esta pesquisa. Quando calculadas com os dados na moeda de origem de cada país elas incluem a inflação daquele país específico e não podem ser comparadas com dados de outros países. Quando calculadas com os dados convertidos a dólares americanos, elas incluem variações cambiais não controláveis que também impedem uma comparação adequada. Como exemplo deste último caso, pode citar-se a situação do Brasil em 1999 quando houve uma grande desvalorização cambial. Ao compararem-se os dados de 1999 e anos seguintes com 1998 observa-se uma grande redução do tamanho das empresas (um crescimento negativo), que é um artefato desta variação cambial.

Os dados originais em moedas locais foram então deflacionados a uma mesma data (ano 2000) usando-se o índice GDP deflator, disponível na base de dados The World Bank (2004). Em vários casos houve também mudanças de moedas nos países analisados. Este foi o caso, por exemplo, nos países da comunidade européia onde parte dos resultados foi reportada em Euros e parte nas moedas anteriormente usadas pelos países. Alguns países ainda reportam resultados regularmente em diferentes moedas. Foi feito um tratamento extensivo por país para colocar todos os dados em moedas e datas comparáveis para só então calcular as diversas taxas de

crescimento. Para isto foram criadas 47 planilhas em Excel, uma para cada país, contendo as observações referentes a cada um dos países com os dados de receita total, ativos totais e moeda considerada para estes dados. Nestas planilhas, os dados foram convertidos a uma moeda única e deflacionados para só então calcular- se as taxas de crescimento. A situação de cada país foi analisada em detalhe para identificar-se erros, mudanças de moeda e unidades e outros fatores que pudessem prejudicar a qualidade dos dados. Em situações de dúvida, as observações foram eliminadas. Um exemplo disto foram as observações referentes a anos anteriores a 1994 que apresentaram uma grande freqüência de inconsistências levando a decisão de eliminar da análise todas as observações dos anos de 1992 e 1993. O período de tempo considerado nas análises ficou entre 1994 e 2002.

As taxas de crescimento foram calculadas a partir da variável REVT (receitas totais) e AT (ativos totais), obtidas diretamente na base de dados e deflacionadas para o ano 2000 como segue.

Taxas de crescimento da receita total: A taxa anual 1 1 t 1 100 t t REVT CRESCREC REVT ⎛ ⎞ = − × ⎝ ⎠ (3)

A taxa composta dos dois últimos anos

2 2 t 1 100 t t REVT CRESCREC REVT ⎛ ⎞ =⎜ − ×⎟ ⎝ ⎠ . (4)

A taxa composta dos três últimos anos

3 3 3 t 1 100 t t REVT CRESCREC REVT ⎛ ⎞ =⎜ − ×⎟ ⎝ ⎠ . (5)

Taxas de crescimento dos ativos totais A taxa anual 1 1 t 1 100 t t AT CRESCAT AT ⎛ ⎞ = − × ⎝ ⎠ (6)

A taxa composta dos dois últimos anos

2 2 t 1 100 t t AT CRESCAT AT ⎛ ⎞ =⎜ − ×⎟ ⎝ ⎠ . (7)

A taxa composta dos três últimos anos.

3 3 3 t 1 100 t t AT CRESCAT AT ⎛ ⎞ = − × ⎝ ⎠ (8)

Os dados obtidos por este processo totalizaram 80.320 observações, cobrindo 13.221 empresas, 9 anos e 47 países. Países com menos de 50 observações foram descartados da análise.

Esta abordagem de agregação no tempo da taxa de crescimento foi utilizada por duas razões principais. Primeiro, existem indicações na literatura que poderia haver compensações no crescimento de um ano em relação aos anos imediatamente anterior e posterior. Se uma empresa expande-se além dos limites de seus recursos ela deveria compensar isto nos anos seguintes: “... for in practice growth takes place in spurts, and periods of relative decline may well be followed by periods of accelerated growth.” (PENROSE, 1959, p. 213). Assim, uma taxa composta de dois ou três anos pode representar uma indicação mais sólida e confiável do fenômeno em estudo e menos sujeita a variações não explicáveis. Segundo, a implicação gerencial do crescimento como objetivo da empresa é diferente da lucratividade. O crescimento não representa um ganho para a empresa a não ser que o novo tamanho da operação seja mantido ou continue a crescer no futuro. A avaliação de uma taxa composta em um período mais longo reflete este aspecto.

Estas operacionalizações, quando aplicadas aos dados, apresentaram alguns valores extremos que não têm significado para o fenômeno que se quer estudar. Algumas taxas extremamente baixas ou extremamente altas aparecem como decorrência de vários fatores tais como erros e critérios contábeis, períodos de operação menores que um ano, grandes modificações na estrutura dos negócios como fusões, aquisições e desinvestimentos muito relevantes. Estes valores extremos não representam o construto crescimento da firma descrito anteriormente e prejudicando sua validade. Para minimizar este efeito, foi feito um corte nas taxas de crescimento eliminando-se os valores menores que -50% ou maiores de 100%. Estas observações que implicariam em uma redução de tamanho à metade ou um aumento ao dobro do tamanho período anterior foram, portanto desconsiderados. Um teste de consistência com uma amostra parcial foi feito para explorar outros limites de corte e seu efeito na composição da variância do crescimento. Não houve grandes diferenças com outros limites como -50 e +50%, -70% e +200%, indicando que a análise é robusta com relação aos limites escolhidos para este corte. A Tabela 2 mostra os totais de observações originais e os valores descartados para cada uma das variáveis. Em nenhum dos casos o total de valores descartados foi superior a 5% das observações válidas originais.

Tabela 2 - Observações eliminadas e total de observações utilizadas na análise final de crescimento

Variáveis Dados válidos originais Valores menores que -50% Valores maiores que 100% Valores utilizados na análise Total % Total % Total % Total % CRESCREC1 74515 100% 914 1.2% 2631 3.5% 70970 95.2% CRESCREC2 62512 100% 314 0.5% 1629 2.6% 60569 96.9% CRESCREC3 50780 100% 85 0.2% 989 1.9% 49706 97.9% CRESCAT1 72650 100% 750 1.0% 2838 3.9% 69062 95.1% CRESCAT2 60854 100% 280 0.5% 1740 2.9% 58834 96.7% CRESCAT3 49348 100% 100 0.2% 903 1.8% 48345 98.0%